Devo dizer, de pronto, que não concordo com todos os argumentos desse professor, embora ele toque em problemas reais da educação brasileira. Mas há uma tendência a insistir no aumento de verbas e na responsabilização dos governos, em geral, pelo estado calamitoso da educação pública. Jamais leio num desses artigos que a culpa é dos professores, mal formados, dos pedagogos freireanos, lunáticos e equivocados, enfim, de pessoas, hoje no governo ou nos sindicatos de professores. A culpa é sempre das "estruturas", entenderam?
Paulo Roberto de Almeida
Controle social da educação
Mozart Neves Ramos
Jornal da Ciência (JC E-Mail), 06 de setembro de 2012
Mozart Neves Ramos é professor da Universidade Federal de Pernambuco, é membro do Conselho de Governança do Todos Pela Educação e do Conselho Nacional de Educação. Artigo publicado no Correio Braziliense de hoje (6).
Há mais de um ano vem sendo travada no Congresso Nacional grande batalha por mais recursos para a Educação. Essa justa luta se expressa pela necessidade de elevar a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) o investimento no setor até o fim da vigência do plano, que é de 10 anos, conforme projeto de lei que regulamenta o novo Plano Nacional de Educação.
Significa colocar cerca de R$ 150 bilhões a mais do que hoje é investido na educação pública. Os últimos números apresentados pelo Ministério da Educação (MEC) revelam que um aluno da educação básica custa ao País, por ano, algo em torno de R$ 3.500, menos do que é investido por países vizinhos, como México e Chile, e muito menos do que se investe nos países da União Europeia. Por isso, é justa a luta por mais recursos na educação básica.
Duas recentes reportagens publicadas no Correio Braziliense e na Agência Pública revelam que mesmo os insuficientes recursos destinados à educação não chegam plenamente à escola. O dinheiro fica no "meio do caminho". O CB cita o trabalho realizado pelo professor Clóvis de Melo, da Universidade Federal de Campina Grande, que mostrou que, quanto mais a corrupção desvia as verbas destinadas à educação, mais baixos são os salários dos professores e as notas das escolas municipais, refletidas pelo Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), divulgados recentemente pelo MEC.
A Agência Pública cruza os dados dos desvios de verbas destinadas à educação com os relativos à qualidade do aprendizado em municípios do Pará - em particular nos municípios de Portel e Anajás -, e mostra salas de aula em ruínas, alunos sem livros, cadernos e merenda, e um transporte escolar impróprio, sem as mínimas condições de segurança. Um caos educacional. A sociedade até que tenta fazer o controle social dos recursos, mas é intimidada pelo poder local.
A verba repassada pelo governo federal representa, para 25% dos municípios (algo em torno de 1.500), 70% da receita das prefeituras. Boa parte dela vem do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), cujos recursos vêm crescendo substancialmente ao longo dos últimos anos. Em 2007, os recursos do Fundeb, que eram de R$ 48 bilhões, saltaram, em 2011, para R$ 94 bilhões. Portanto, em cinco anos, dobraram. A previsão para este ano é de R$ 114 bilhões. Não obstante o crescimento, o investimento per capita/ano na educação básica ainda é insuficiente.
Por seu lado, também é preciso fazer que mesmo os insuficientes recursos cheguem à escola em vez de serem desviados. Nesse sentido, impõe-se fortalecer o controle social da educação. Conselhos de administração do Fundeb até que existem, mas o que se verifica na prática é forte influência do Poder Executivo na escolha dos membros, o que, em geral, lhe dá maioria nas votações das prestações de conta e resulta na escassez de conselheiros qualificados para a função - especialmente nos municípios de menor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) - e numa limitada estrutura dos órgãos de controle, tais como as promotorias de Educação dos Ministérios Públicos.
Nesse contexto, vale registrar que o controle da gestão pública não envolve apenas o aspecto da legalidade - isto é, o fato de as ações do governo estarem ou não de acordo com a lei e os regulamentos. Envolve também, segundo a Controladoria-Geral da União (CGU), as dimensões de eficiência, eficácia e efetividade. Implica verificar se as políticas governamentais estão produzindo os resultados esperados a custo razoável (eficiência: relação custo-benefício), se as metas e objetivos do governo estão sendo alcançados (eficácia) e se a população está satisfeita com os serviços prestados (efetividade: melhora da qualidade de vida da população).
Os últimos resultados do Ideb 2011 mostraram que, apesar do aumento dos investimentos dos recursos públicos em educação, cerca de 20% dos municípios tiveram resultados piores que os de 2009. Por fim, vale também registrar os esforços que alguns Tribunais de Contas, como os de Mato Grosso do Sul e de Pernambuco, vêm realizando para fazer valer as dimensões de eficiência, eficácia e efetividade no bom uso dos gastos públicos com o setor.
Alinhar os justos esforços por mais recursos com o melhor uso é essencial para que a educação dê o salto de qualidade tão necessário e esperado. É bom lembrar que investir corretamente o dinheiro público não é mérito, é dever. Mérito é investir com eficiência, eficácia e efetividade.
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