Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
quarta-feira, 26 de maio de 2010
Por favor, pode martelar o meu pé, nao está doendo, em absoluto, imagine, fique a vontade...
E o pior é que agitar medidas retaliatórias (que sabemos não serão aplicadas, é tudo de mentirinha) constitui a pior maneira de encaminhar esse renitente problema argentino, que é um problema para o próprio país.
Eu fico me perguntando onde está a inteligência de certas pessoas.
Não é porque um vizinho faz uma enorme burrice (como estragar o seu próprio jardim, por exemplo, que é o que metaforicamente está fazendo a Argentina), que também vamos fazer igual, para demonstrar que nós também podemos fazer as mesmas besteiras...
Eu me fico perguntando...
Paulo Roberto de Almeida
Brasil vai retaliar a Argentina
Daniel Rittner, de Buenos Aires
Valor Econômico, 26/05/2010
Em teoria, o dia D para a aplicação das barreiras a alimentos importados com similares fabricados na Argentina é 1º de junho
O Ministério do Desenvolvimento já tem uma ação pronta para ser adotada como represália às barreiras da Argentina contra a entrada de alimentos importados, que deixaram caminhões brasileiros retidos na fronteira: o retardamento na liberação das licenças não automáticas de importação para produtos argentinos, respeitando o prazo máximo de 60 dias, estabelecido pela OMC.
Desde outubro, quando as licenças não automáticas estiveram no centro de uma crise comercial entre os dois países, esse sistema foi adotado para mercadorias como vinhos, lácteos e frutas. No entanto, os presidentes Lula e Cristina Kirchner se acertaram e as licenças começaram a ser expedidas em até uma semana pelo Brasil. Agora, pretende-se atrasar a liberação, para mostrar à Casa Rosada que o país não aceitará as novas restrições a alimentos. Seria uma operação tartaruga na análise das licenças.
"Em breve receberemos reclamações dos argentinos", ironizou uma fonte do governo brasileiro. O risco é provocar uma escalada na tensão comercial. Para o Ministério do Desenvolvimento e o Itamaraty, não vale a pena correr esse risco pelo volume de exportações brasileiras afetadas pelas novas barreiras, mas pela forma como a Argentina as adotou, sem comunicação prévia, conforme havia sido acordado entre Lula e Cristina.
Em teoria, o dia D para a aplicação das barreiras a alimentos importados com similares fabricados na Argentina é 1º de junho. Na prática, embora o foco principal sejam produtos europeus, mercadorias brasileiras como milho enlatado e molho de tomate já foram afetadas. Uma das empresas que sentiram o efeito das barreiras foi a Bauducco. Agindo preventivamente e por pressão do secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, que resiste em oficializar a medida, os importadores deixaram de comprar produtos do Brasil e de outros fornecedores.
Depois de forte reação dos parceiros comerciais, Moreno prometeu aos importadores analisar "caso a caso" a importação de alimentos. Na semana passada, Cristina negou a aplicação das medidas. Tudo isso causou mais confusão entre os exportadores brasileiros, mas o governo avalia que muitos deles deixaram de fechar contratos.
Duas respostas foram, a rigor, praticamente descartadas no curto prazo: levar o caso à OMC ou ao mecanismo de solução de controvérsias do Mercosul. Essa última medida está sendo sugerida pela Fiesp. Mas o governo avalia que seriam ações inócuas - até uma decisão da OMC ou do tribunal do Mercosul, com a realização de consultas bilaterais ou a formação do "júri", há um intervalo de cerca de dois anos. Lula e Cristina se encontraram ontem em Buenos Aires, nas celebrações do bicentenário da Revolução de Maio, que iniciou o processo de independência argentina. Trocaram abraços e sorrisos, mas não falaram sobre barreiras.
terça-feira, 25 de maio de 2010
Argentina: da leniencia à retaliacao?
Mas os empresários brasileiros começam a falar em medidas de retorsão contra o protecionismo ilegal, abusivo e discriminatório da Argentina.
Não acredito que essa via prospere, pelo menos não neste governo.
Mas os interlocutores estão começando a perder a paciência...
Empresários exigem resposta dura contra barreira argentina
Renato Carvalho
DCI, 25 de maio de 2010
Os empresários brasileiros, representados pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), vão entregar nesta semana um documento que propõe respostas duras à barreira imposta pela Argentina contra a importação de alimentos brasileiros. Em um primeiro momento será sugerido ao governo que utilize as cláusulas do tratado que deu origem ao Mercosul, que veta este tipo de impedimento imposto pelo governo argentino. Mas já se fala até em usar o mesmo instrumento para bloquear as importações de alimentos argentinos.
Levantamento feito pela Associação Brasileira de Comércio Exterior (Abracex), com base em dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), mostra que as exportações de alimentos do Brasil para a Argentina em 2010, até abril, somaram US$ 182 milhões. Enquanto isso, as importações brasileiras somaram US$ 1,072 bilhões no mesmo período.
A Argentina só tem a perder com essa barreira. Nossas importações são cinco vezes maiores que as importações. Os próprios empresários argentinos já estão muito preocupados em perder um mercado como o Brasil, afirma Roberto Segatto, presidente da Abracex.
Segatto chama a atenção para a possibilidade de substituir a Argentina por outros mercados, tanto no que diz respeito a exportação como a importação. Podemos importar vinho do Chile, por exemplo, e farinha de trigo dos Estados Unidos e Canadá. Já os exportadores podem procurar outros mercados, e também direcionar para o mercado interno, que está com uma demanda muito forte, afirma.
Problema político
Somente na semana passada, os atacadistas argentinos cancelaram 25% das compras de alimentos e bebidas dos produtores brasileiros, segundo informações vindas de Buenos Aires. Na opinião de Segatto, a questão política é o principal fator que incentiva o governo a levantar as barreiras, e o brasileiro a não tomar iniciativas duras em resposta. Empresários brasileiros e argentinos são radicalmente contra estas medidas.
A presidente Cristina Kirchner desmente medidas de restrição à entrada alimentos. De fato, não existe nenhuma medida escrita que restrinja a entrada dos alimentos estrangeiros similares aos da produção local. A ausência de uma medida formal inibe os países prejudicados em suas reclamações contra a Argentina.
As restrições foram transmitidas verbalmente pelo secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, aos importadores e supermercadistas, nos primeiros dias de maio. Na ocasião, Moreno afirmou que ninguém poderia mais comprar de outros países alimentos que são produzidos pela indústria local. Moreno ameaçou com inspeções da Receita Federal nas empresas que desobedecerem a suas sugestões.
As mercadorias que haviam sido despachadas antes da ordem de Moreno ainda fazem filas nos portos e nas fronteiras da Argentina com o Brasil, Paraguai, Uruguai e Chile. Informações vindas das associações empresariais uruguaias dão conta de que os exportadores do país vizinho não recebem pedidos de compras da Argentina há mais de 10 dias.
O presidente José Pepe Mujica pediu explicações ao governo de Cristina e vai discutir o assunto pessoalmente com a colega em um encontro marcado para o dia 4. No Chile, a situação é similar. Tanto que a pressão dos empresários chilenos ao presidente Sebastián Piñera levou o governo a tirar dos arquivos o único problema pendente de seu país com a Argentina na Cordilheira. Piñera reclamou uma disputa territorial com a Argentina.
O presidente do México, Felipe Calderón, enviou uma carta ao seu embaixador em Buenos Aires pedindo detalhes sobre as barreiras das quais os empresários mexicanos se queixam ao governo. As restrições contra os alimentos também despertaram a fúria da UE e da China.
Não só alimentos e bebidas sofrem restrições para entrar no mercado argentino. Pneus, disjuntores, aparelhos de ar condicionado, roupas, linhas, pisos, rodas, ventiladores, talheres de aço inoxidável, eletrodomésticos e vários outros fazem parte de uma lista de quase mil itens de origem de outros países que são barrados pelo governo têxteis.
A Argentina desencadeou 97 processos de antidumping contra a China. Mais de 400 produtos chineses estão sujeitos ao licenciamento não automático. Anunciado no final do mês passado, o contra-ataque chinês começou a ser executado na quinta-feira. O país asiático impôs restrições ao óleo de soja argentino e no porto de Rosário, principal complexo exportador de soja do país, os embarques estão cancelados.
Os empresários brasileiros, representados pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), vão entregar nesta semana um documento que propõe respostas duras contra a barreira imposta pela Argentina à importação de alimentos brasileiros.
Em um primeiro momento será sugerido ao governo que utilize as cláusulas do tratado que deu origem ao Mercosul, que veta este tipo de impedimento imposto pelo governo argentino. Mas já se fala até em usar o mesmo instrumento para bloquear as importações de alimentos argentinos.
Levantamento feito pela Associação Brasileira de Comércio Exterior (Abracex), com base em dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), mostra que as exportações de alimentos do Brasil à Argentina em 2010, até abril, somaram US$ 182 milhões. As importações brasileiras de alimentos argentinos somaram US$ 1,072 bilhão no período.
A Argentina só tem a perder com essa barreira. Nossas importações são cinco vezes maiores que as importações. Os próprios empresários argentinos já estão muito preocupados por poder vir a perder um mercado como o Brasil, afirma Roberto Segatto, presidente da Abracex.
Segatto chama a atenção para a possibilidade de substituir a Argentina por outros mercados. Podemos importar vinho do Chile, por exemplo, e farinha de trigo dos Estados Unidos e do Canadá. Já os exportadores podem procurar outros mercados, e também direcionar para o mercado interno, afirma.
A China também enfrenta problemas com o governo argentino, e já iniciou retaliação. O país asiático impôs restrições ao óleo de soja argentino, e no Porto de Rosário, principal complexo exportador de soja do país, os embarques foram cancelados.
sábado, 15 de maio de 2010
Com integradores como esses, nao precisamos de "desintegradores"...
A Argentina prova que é possível, sim, graças à inteligência e a memória prodigiosa que possuem certas pessoas, reincidir várias vezes nos mesmos erros, tanto em matéria de economia interna -- vocês sabem, controle de preços, de câmbio, dirigismo, essas coisas -- como em matéria de economia internacional: política comercial, cambial, de investimentos, etc.
Os argentinos vem fazendo as mesmas bobagens, repetidamente, há pelo menos 80 anos: não surpreende, assim, que o país ande cada vez mais para trás.
Agora, nessa questão da integração, tanto argentinos quanto brasileiros, erraram e continuam errando, falando em retaliações comerciais (inclusive um ministro de Estado).
My God, as pessoas não sabem que existem regras multilaterais que comandam os processos de tarificação, de defesa comercial, de simples relacionamento comercial. Elas ainda estão naquela fase pré-histórica, em que um ataque da tribo inimiga comandava a formação de um batalhão de voluntários para ir lá e desmantelar com os atacantes.
A lei da selva, na verdade, vive na cabeça das pessoas: ela fala espanhol, portugiês, inglês...
Por vezes me pergunto se as pessoas são alfabetizadas...
Paulo Roberto de Almeida
Argentina teme retaliação
Da Redação
Diário do Comércio e Indústria,
Quarta-feira, 12 de maio de 2010
Os empresários brasileiros ganharam ontem uma parceria de peso contra as novas barreiras alfandegárias que o governo argentino está programando e que poderá entrar em vigor no início de junho. É que empresários argentinos de grande porte na participação no PIB daquele país temem represálias brasileiras à importação de alimentos. Em reunião ontem, na câmara de empresas alimentícias da Argentina, os empresários defenderam claramente a necessidade de se respeitarem os acordos comerciais internacionais diante da possibilidade de imposição de barreiras do governo à importação de alimentos, o que poderia provocar represálias.
A Coordenadoria de Indústrias de Produtos Alimentícios (Copal) frisou que sustenta firmemente a urgência de que toda medida de política comercial respeite os critérios dos tratados internacionais dos quais a Argentina faz parte. O respeito aos acordos é uma das garantias necessárias para evitar represálias no comércio mundial, ressaltou o comunicado oficial da entidade.
A reação ocorreu assim que se confirmaram informações segundo as quais a Secretaria de Comércio argentina pediu às grandes redes de supermercados que deixem de importar produtos alimentícios, o que afeta exportadores do Brasil e da União Europeia (UE). As barreiras comerciais para proteger a indústria alimentícia argentina ante uma eventual avalanche de importações decorrente da desvalorização do euro favoreceriam os exportadores da UE e desviariam à Argentina parte do comércio entre Brasil e o bloco europeu.
O ministro da Economia argentino, Amado Boudou, disse que é preciso cuidar do mercado interno e dos produtores nacionais, mas evitou falar de medidas concretas.
Brasil e UE são os principais parceiros comerciais da Argentina. O Brasil exporta anualmente US$ 22 bilhões em alimentos à Argentina e importa US$ 1 bilhão, segundo dados da Copal. Os alimentos importados representam cerca de 3% dos que oferecem os supermercados no mercado argentino, segundo cálculos de fontes do setor. O assunto causou mal-estar no Brasil e de países da União Europeia.
A Secretaria de Comércio começaria a aplicar barreiras à importação de uma lista de alimentos, dentre os quais frangos do Brasil.
terça-feira, 9 de março de 2010
1773) Retaliacao é sempre prejudicial a si mesmo...
A retaliação do nabo silvestre
Editorial O Estado de S.Paulo, Terça-Feira, 09 de Março de 2010
Os consumidores de ameixas e abrunhos frescos, gomas de mascar sem açúcar e óleos de nabo silvestre - refinados e em bruto - devem preparar-se para um forte aumento de preços. Mas seu sacrifício será justificado por um objetivo estratégico. Aqueles produtos foram incluídos na lista de retaliação comercial aos Estados Unidos ? em tese, uma compensação pelos subsídios ilegais aos produtores e exportadores americanos de algodão. Os subsídios causaram distorções nos mercados e prejudicaram os produtores brasileiros e de outras nacionalidades. A Organização Mundial do Comércio (OMC) condenou as subvenções, mas o governo americano recusou-se a mudar sua política. Diante disso, o Brasil foi autorizado oficialmente a retaliar, com base nas normas do comércio internacional. Mas a retaliação bilateral é uma solução quase sempre insatisfatória, principalmente quando aplicada contra uma grande potência. Essa falha do sistema de regulação comercial é agora mais uma vez comprovada.
As autoridades brasileiras obviamente não desejam impor a retaliação. A nota do Itamaraty a respeito do assunto não permite dúvida quanto a isso. O Brasil, segundo a nota, "permanece aberto a um diálogo com os EUA" para a busca de "solução mutuamente satisfatória para o contencioso".
A melhor solução seria o abandono dos subsídios ao algodão. Mas o governo brasileiro poderia levar em conta outras propostas, como, por exemplo, a eliminação de barreiras ao ingresso de certos produtos no mercado americano. Mas nenhuma proposta concreta havia sido apresentada até ontem.
Segundo a secretária de Estado Hillary Clinton, em visita ao Brasil na semana anterior, seu governo teria interesse em discutir alternativas à retaliação. O secretário do Comércio dos Estados Unidos, Gary Locke, chega hoje a Brasília e deve conversar sobre o assunto, mas questões de direito comercial pertencem à jurisdição de seu colega Ron Kirk, representante dos Estados Unidos para comércio internacional. O governo brasileiro não teria por que retardar a divulgação da lista. As barreiras, se forem aplicadas, só entrarão em vigor dentro de um mês.
A relação da Camex, com 140 itens, foi concluída depois de consultas ao setor privado. Tomou-se o cuidado de não produzir uma lista suicida. Evitou-se aumentar o imposto de importação de máquinas e insumos necessários à indústria e procurou-se poupar o consumidor de grandes incômodos.
A lista inclui alguns produtos mais óbvios do que abrunhos frescos e óleos de nabo silvestre, como amplificadores de som, cosméticos e certos tipos de automóveis. Se a retaliação for aplicada, o incômodo causado aos produtores americanos será infinitamente menor que os danos sofridos pelo setor brasileiro do algodão.
O comércio afetado pelas novas barreiras foi estimado em US$ 591 milhões. Se houver algum efeito, será pulverizado entre vários setores, enquanto os prejuízos causados ao setor algodoeiro do Brasil foram concentrados. Será uma surpresa se as perdas impostas àqueles setores forem suficientes para afetar a política americana.
O governo brasileiro poderá recorrer a um segundo lance. A OMC autorizou uma retaliação no valor de US$ 829 milhões. O Brasil ainda poderá aplicar medidas correspondentes a US$ 238 milhões, mas dirigidas a outros alvos: a propriedade intelectual e os serviços. As ações, nesse caso, poderão ser mais efetivas, levando os setores atingidos - o farmacêutico é um dos mais prováveis - a pressionar o presidente Barack Obama para buscar um acordo com o Brasil.
O governo americano conhece essa possibilidade, mas nem por isso mostrou interesse efetivo em negociar. Ao contrário, logo depois de chegar ao País, o novo embaixador americano, Thomas Shannon, falou em contrarretaliação, como se a parte condenada por violação das normas internacionais fosse a vítima, não a culpada.
Na ausência de propostas americanas, o Brasil, segundo a nota do Itamaraty, faz valer seu direito, "autorizado pela OMC". Dessa forma, "busca salvaguardar a credibilidade e legitimidade do sistema de solução de controvérsias daquela organização". Mas é difícil falar de credibilidade quando a eficácia das normas depende do poder de retaliação das partes. No fim, a força pode prevalecer, e o governo americano sabe disso. Quanto a esse ponto, o presidente Obama ainda não se mostrou diferente de seus antecessores.