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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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domingo, 30 de janeiro de 2022

A miséria da educação brasileira não se deve a pouco dinheiro - Simon Schwartzman

 Transcrevo matéria copiada da lista Roda Democrática sobre a MAIOR TRAGÉDIA brasileira, a não educação, com base em artigo de Simon Schwartzman sobre os gastos do Brasil nessa esfera.

Paulo Roberto de Almeida 


O Brasil investe pouco em educação?  

3º episódio da série “A falência do modelo de Estado: sem mudar a topologia, nada muda!”  

“Para isso existem as escolas: não para ensinar as respostas, mas para ensinar as perguntas. As respostas nos permitem andar sobre a terra firme. Mas somente as perguntas nos permitem entrar pelo mar desconhecido.” Rubem Alves  

Um dos poucos assuntos que é uma unanimidade no Brasil é a Educação (saúde também). Pergunte a qualquer pessoa: “Você acha que a Educação deveria ser uma prioridade nacional?” e veja a resposta. Garanto que 99% das pessoas vão responder “SIM!”. Enfaticamente.  

No entanto, os resultados educacionais são muito ruins. Segundo Simon Schwartzman, “os dados do PISA, a pesquisa internacional da OECD sobre a qualidade da educação, mostravam que, dos 47% dos jovens de 15 anos que conseguiam chegar ao fim da escola fundamental ou início da média, 67% não tinham os conhecimentos mínimos de matemática esperados para a série, 18.8% não tinham a capacidade mínima de leitura, e 54% não dominavam os conceitos básicos de ciência. Os outros 53% tinham ficado para trás, ou desistido de estudar. Aos 18 anos, em 2012, somente 29% dos jovens haviam conseguido chegar ao último ano do ensino médio ou haviam entrado no ensino superior, e metade já havia deixado de estudar. Quem olha os dados vê a tragédia que está ocorrendo, mas a maioria da população, talvez por ter conhecido dias piores, não enxerga o problema”.  


Por que a educação brasileira é este desastre?  

Simon Schwartzman

https://www.schwartzman.org.br/sitesimon/

A resposta mais comum é: “falta dinheiro” ou “Investimos pouco”.  

Será?  

No Brasil, o gasto público em educação como percentual do produto interno bruto (PIB) é de 6,3% (Fonte: MEC/Inep/DEED), maior do que a média dos países da OCDE (4,4%) ou mesmo de países como Suécia (5,8%), Bélgica (5,7%), Islândia (5,7%) e Finlândia (5,8%). O Brasil só fica abaixo da Noruega (7,2%).   

Portanto, não falta dinheiro nem investimos pouco em educação.   O problema é outro. Não falta dinheiro nem investimento, mas investimos mal.   

Proporcionalmente, gastamos muito mais do que deveríamos no ensino superior, em detrimento do ensino básico e fundamental. O gasto por aluno do Ensino Superior (R$ 28.640,00) é 3,8 vezes maior que o que gastamos com o aluno da Educação Básica (R$ 6.823,00) mesmo considerando que neste último caso existe o custo da merenda escolar. Nos países desenvolvidos da OCDE, o gasto com aluno do ensino superior é apenas 1,8 vezes maior que o gasto com alunos do ensino básico. Gastamos, portanto, mais do que o dobro dos países da OCDE com o ensino superior (em comparação com o ensino básico e fundamental). Vejam a tabela.  

Outro paradoxo é que 80% dos alunos do ensino médio estudam em escolas públicas, mas apenas 36% destes alunos entram numa universidade (quando o aluno vem da rede privada este percentual mais do que dobra: 79,2%).   

A sociedade investe (proporcionalmente) muito mais nos alunos de Ensino Superior e mais da metade destes alunos são oriundos da rede privada de ensino médio. Ou seja, alunos que pagavam o ensino médio vão estudar gratuitamente no ensino superior, que é muito mais caro.   

Em resumo, o problema da educação brasileira não é “falta de verbas”, mas a necessidade de inverter nossas prioridades. A prioridade deve ser o ensino básico e fundamental (sem descuidar do Ensino Superior). Ponto.  

Investimos, proporcionalmente, menos do que deveríamos no ensino básico e fundamental e, sobretudo, investimos mal. Não se trata apenas de melhorar o salário dos professores ou os prédios, mas sobretudo de criar uma plataforma, um ambiente, que permita a cada aluna(o) aprender no seu ritmo. Em colaboração com alunos e professores de qualquer lugar do Brasil e, porque não, do mundo.  A criação deste ambiente, que conjuga o ensino físico com o virtual é hoje um dos focos de atuação do CRIE. Estou convencido que ele promoverá uma verdadeira revolução na educação, mas este é assunto para uma outra conversa...   

O ponto chave aqui é termos um outro modelo de Educação, com foco no ensino básico e fundamento, acessível a todos os cidadãos.   A topologia do Estado brasileiro está montada para funcionar de forma excludente. No caso da Educação, está montada para privilegiar as Universidades, que acabam sendo acessíveis a quem teve dinheiro para pagar um ensino básico e médio privado. Não adianta dar mais dinheiro para um modelo excludente e elitista. Nem achar que a política de cotas nas universidades vai resolver estes problemas. Sem mudar a topologia, nada muda de fato.   

Precisamos de um outro modelo educacional, não para ensinar as respostas, como disse Rubem Alves, mas para ensinar a fazer perguntas. A principal meta da educação, neste século XXI, é criar homens e mulheres que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens e mulheres criadores, inventores, descobridores, capazes de navegar por mares nunca dantes navegados.  

Até a semana que vem!  

PS: para acompanhar esta série de posts sobre a Topologia Do Estado, siga o blog  https://crie-inteligenciaempresarial.blogspot.com/

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Até quando suportaremos? - Luiz Werneck Vianna, Carlos Alberto Torres, Paulo Roberto de Almeida

 Transcrevo do FB de Roda Democrática, que por sua vez copiou de Decisões Interativas, este artigo de Luiz Werneck Vianna, introduzido por Carlos Alberto Torres. Devo dizer que concordo com ambos em seus argumentos descritivos da situação, mas discordo radicalmente da conclusão, aliás pouco conclusiva, de Luiz Werneck Vianna, que pretende que:

"O lixo do atraso está pronto para ser varrido."

Não, não está, ele está mais pujante do que nunca, e pretende continuar no próximo governo, que, como todos os precedentes, depende de um Congresso formado por um estamento parlamentar basicamente corrupto para dispor de um mínimo de governança. Não estamos perto de eliminar o atraso...

Paulo Roberto de Almeida


terça-feira, 9 de novembro de 2021


Até quando suportaremos?


A palavra autorizada do sociólogo Luiz Werneck Vianna nos auxilia a reconhecer o contexto histórico-político em que se desdobrarão os próximos acontecimentos.

 

Permito-me ressaltar, com o meu olhar, contemplando o amplo quadro de análise com que o artigo nos brinda, três pontos estratégicos, que dele se podem deduzir, para desbloquear o desenvolvimento de nossa democracia:

1.              O caráter democrático do combate à corrupção e para acabar com a impunidade;

2.             A superação do risco de um golpe militar de Bolsonaro apoiado por militares nostálgicos do regime militar instaurado em 1964;

3.             A necessidade histórica de superarmos a polarização bolsonarismo versus lulopetismo para dar espaço ao projeto da democracia; ou seja, “o lixo do atraso está pronto para ser varrido”.


 

Com a palavra Werneck Vianna, em Horizontes Democráticos, 9 de novembro de 2021 (*)

 

Até quando vamos tolerar o saque de uma gangue instalada no coração da política brasileira que se apropria do que é ganho pelos brasileiros que mourejam para ter o pão de cada dia?

 

Até quando vamos permanecer passivos diante dos crimes continuados que perpetram mesmo diante de uma sociedade vítima de uma cruel pandemia que ceifou a vida de 600 mil cidadãos, parte dos quais poderia ter sobrevivido não fossem as ações criminosas da quadrilha que pretendeu tirar proveito da calamidade sanitária que ainda nos aflige em negócios escusos?

 

Até quando será permitida a eles comprometer nosso futuro com a depredação da nossa natureza e dos recursos nossos humanos privando as novas gerações de uma formação que lhes permita o acesso a uma vida ativa e produtiva? Quem são os nossos algozes e de onde extraem o poder com que nos assolam? 

 

Não fomos objeto de uma conquista militar por parte de um país inimigo que nos imponha pela força a vassalagem como a antiga Roma reinava em seu vasto império. Ao contrário, estamos submetidos a naturais da terra com nomes e sobrenomes conhecidos, não poucos de longa data, herdeiros da nossa história comum de contubérnio entre o latifúndio e a escravidão. Essa marca de registro do nosso DNA, tantas vezes diagnosticada e não poucas combatidas pelos que tentam extirpá-la sem êxito, persiste como mácula em nossa formação, resistente ao que foi a obra da Abolição, que deixou ao desamparo a população liberta com sua opção preferencial pela emigração massiva dos pobres europeus, e na forma de república sem povo que se criou aqui com o protagonismo dos militares e dos proprietários de terras paulistas.

 

Tal herança maldita, longe de perder influência com os sucessivos surtos da modernização do país, foi preservada em suas linhas principais, exemplar o processo de industrialização conduzido por uma política de Estado que sintomaticamente se aliou às elites agrárias. No caso, nada de melhor expressa essa aliança do que a legislação trabalhista do governo Vargas nos anos 1930 do que a exclusão dos trabalhadores da terra dos direitos concedidos aos urbanos. 

 

Classicamente, configuraríamos o tipo de modernização conservadora, confirmado nas décadas seguintes, com os resultados nefastos que hoje se estampam aos olhos de todos como na abissal desigualdade social reinante entre nós, raiz dos processos pelos quais as elites proprietárias se apropriam do poder político e fazem uso dele para preservar seus privilégios.

 

Raimundo Faoro, em ensaio magistral sobre a modernização nacional procura demonstrar seus elos de ligação com as reformas modernizadoras introduzidas pelo marquês de Pombal em Portugal de fins do século XVIII, que se aproveitou de recursos do despotismo político para introduzi-las ao tempo em que conservavam os setores privilegiados como a nobreza e o clero. Sem bases novas de sustentação, suas mudanças não resistiram à duração de um reinado e tiveram frustrados seus objetivos. Tal modelagem pombalina, conclui Faoro, nunca abalada ter-se-ia conformado na plataforma de todas as modernizações brasileiras, cujas mudanças sempre impuseram o resultado de ainda mais reforçar o domínio das forças conservadoras.

 

Quase ironicamente, o argumento de Faoro sugere que, por volta dos anos 1870, a tal revoada das ideias novas de que fala a bibliografia no seu culto à ciência importado pelo positivismo mal ocultaria o retorno do espírito pombalino de cientificismo. O lugar de assentamento dessas novas ideias seria a das academias militares, o da Escola Politécnica e das faculdades de medicina. O positivista Comte teria recuperado Pombal. A emergência das novas elites intelectuais forjadas nessas instituições teria dado origem ao pathos de um desenvolvimento e de uma industrialização induzida pelas luzes da ciência mediante ações orquestradas por elas. 

 

Nesse novo cenário, sob a república, os militares são investidos de papel de protagonismo e com advento do Estado Novo, em 1937, se tornam hegemônicos na condução da política brasileira e, a partir daí, atores privilegiados na condução da industrialização acelerada do país, presentes na construção de Volta Redonda, na Petrobras, assim como na imensa malha das empresas estatais. O script, longamente ensaiado cumpriria seu enredo: a modernização brasileira teria um andamento conservador sob a tutela militar.

 

O desafio a esse andamento, no começo dos anos 1960, centrado em um programa de reformas sociais, entre as quais a agrária, proposto pelo governo João Goulart, com ampla base popular, encontrará seu desenlace no golpe de 1964, quando os militares se auto-investirão dos papeis de condutores da modernização pelo alto, com atenção especial à questão agrária, tal como se evidenciou na implantação do agronegócio.

 

Essa história de frustações e de desencantos das modernizações autoritárias podem, até elas, conhecer o sortilégio da astúcia na história, pois os processos que desatam contêm em si a possibilidade de trazer o moderno como antídoto a elas, tal como ocorreu nos idos dos anos 1980 quando foram derrotadas por uma coalizão ampla de forças democráticas escorada por massivas manifestações populares. Lá como agora onde se generaliza a percepção de que o país está sem rumo e dirigido por caminhos equívocos que somente trazem o aprofundamento da miséria social reinante, por toda parte, inclusive em setores das elites, soam os sinais de que isso que aí está deve ser interrompido como solução de salvação nacional.

 

A derrota da fascitização da sociedade, a essa altura consumada, culminou, como último recurso para esse governo de militares nostálgicos da ditadura do AI-5 se manterem no poder, na cínica aliança aos políticos avulsos do Centrão sempre aplicados em suas pretensões de roer até os ossos o patrimônio comum. Tal mudança de rota se afasta radicalmente das tradições modernizadoras brasileiras, inclusive daquelas que se originaram nos meandros das corporações militares. O lixo do atraso está pronto para ser varrido.


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(*) https://horizontesdemocraticos.com.br/ate-quando-suportaremos/