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terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Previsões Imprevidentes: dez anos de desacertos contínuos (2004-2014) - Paulo Roberto de Almeida

Como eu estava explicando anteriormente, eu acerto quando erro.
Minhas previsões, assim como era o livro de economia do coronel Hugo Chávez, se destinam a ser lidas al revés. Assim como o finado caudilho -- que seus amigos o tenham -- fazia tudo ao contrário dos livros de economia -- tanto que eu havia começado a escrever um manual para ele, um text book, que seria algo assim como um Economics 010, mas parei depois que o pobre se foi desta para pior -- os meus textos são feitos para serem lidos no sentido contrário ao pretendido.
Quanto mais eu erro, mais eu acerto, compreenderam?

Registre-se que na tarefa eu tenho colaboradores prestimosos -- a quem preciso agradecer a preciosa ajuda -- que são os companheiros, esses mesmos que estão por aí: apedeutas, nefelibatas, ingênuos de carteirinha, keynesianos de botequim, true believers, crentes fundamentais e fundamentalistas de ocasião, enfim, oportunistas de todos os matizes.
Cada vez que eu tento fazer previsões grandiosas para o Brasil, eles veem e, pimba! Bagunçam tudo, invariavelmente.
Assim as minhas previsões nunca acertam, o que eu preciso de fato agradecer, pois elas são feitas para isso mesmo, para falhar miseravelmente a cada ano.

Mas atenção: eu ainda não elaborei as previsões para 2015.
Esse ano promete. Com tudo o que já tivemos, e ainda teremos, será um ano difícil.
Eu, sempre generoso com amigos e inimigos, tento ser o mais abrangente possível, e só prever bondades para o Brasil, mas os companheiros se empenham duramente em me desmentir.
Vamos ver como fica: eles estão treinados nos desastres, e eu estou quase ficando sem recursos, devido a tantos gênios da incompetência.
Em todo caso, se vocês querem saber tudo o que eu já previ de errado, coloco a lista aqui abaixo.
São dez anos completos de desacertos.
Um sucesso total!

Conto com os companheiros para não me deixarem falhar ainda desta vez!
Pode ser ainda, mais uma vez, minha gente?
Segurem-se: 2015, aqui vamos nós...
Paulo Roberto de Almeida


Previsões Imprevidentes: dez anos de desacertos contínuos

Paulo Roberto de Almeida
Lista elaborada em Hartford, em 23 de dezembro de 2014.

1) 1177. “Astrologia diplomática: Especulações sobre a política internacional em 2004 (e além)”, Brasília, 11 janeiro 2004, 4 p. Paródia às previsões astrológicas, especulando sobre comportamentos da ONU, do império, da Europa, África, Brasil, Mercosul, comércio internacional, meio ambiente, direitos humanos e os astrólogos diplomáticos em 2004 e mais além. Distribuído em listas de relações internacionais. Retomada integralmente no trabalho 2736. “Astrologia Diplomática: minhas previsões de dez anos atrás para dez anos à frente”, Hartford, 22 dezembro 2014, 2 + 5 p. Nova introdução ao trabalho n. 1177 (de janeiro de 2004), com as mesmas previsões de dez anos atrás, reforçadas. Blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/12/astrologia-diplomatica-minhas-previsoes.html) e disseminado no Facebook. Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9870651/2736_Astrologia_Diplomatica_2004_e_2014_).

2) 1369. “Sete previsões Imprevidentes: minha ‘caixa de surpresas’ para o novo ano”, Gramado, 27 dezembro 2004; Brasília, 4 jan. 2005, 12 p. Antecipações impossíveis para o novo ano. Publicado na revista Espaço Acadêmico (ISSN: 1519-6186; a. IV, n. 44, jan. 2005; http://www.espacoacademico.com.br/044/44pra.htm). Relação de Publicados n. 537. Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9870781/1369_Sete_previs%C3%B5es_Imprevidentes_minha_caixa_de_surpresas_para_o_novo_ano_2005_).

3) 1518. “Astrologia diplomática?”, Brasília, 31 dezembro 2005, 2 p. Comentário de estilo jocoso sobre as previsões astrológicas para 2006, que cobriram igualmente a área da política externa. Postado no blog PRA (http://paulomre.blogspot.com/2005/12/102-astrologia-diplomtica.html#links). Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9870863/1518_Astrologia_diplom%C3%A1tica_2005_).

4) 1510. “Resoluções de Ano Novo: uma nova ‘caixa de surpresas’ para o ano que se inicia”, Brasília, 23 dezembro 2005, 9 p. Novas promessas para cumprimento durante o ano, mas aplicadas à atual realidade política brasileira. Publicado na revista Espaço Acadêmico (a. V, n. 56, janeiro 2006; http://www.espacoacademico.com.br/056/56almeida.htm). Relação de Publicados n. 618. Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9870980/1510_Resolu%C3%A7%C3%B5es_de_Ano_Novo_uma_nova_caixa_de_surpresas_para_o_ano_que_se_inicia_2005-2006_).

5) 1703. “Previsões para o ano da graça de 2007: sempre otimista quanto à sua impossibilidade”, Brasília, 24 dezembro 2006; 4 p.; revisão ampliada: 29 dezembro, 13 p. Objetivos inatingíveis no Brasil, na continuidade das previsões de 2004 e das resoluções de 2005. Versão curta publicada em Via Política (1 janeiro 2007); versão longa: Espaço Acadêmico (ano 6, n. 68, janeiro 2007; link: http://www.espacoacademico.com.br/068/68pra.htm). Feita versão resumida e ligeiramente modificada, em 2/01/2007, para o site do Instituto Millenium, sob o título: “Previsões imprevidentes para 2007: Um novo exercício de resultados contrários”; publicado em quatro partes a partir do dia 3.01.2007 (links: Parte 1; Parte 2, em 4.01.2007; Parte 3, em 5.01.2007; e Parte 4, em 8.01.2007. Relação de Publicados n. 738, 739. Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871046/1703_Previs%C3%B5es_para_o_ano_da_gra%C3%A7a_de_2007_sempre_otimista_quanto_%C3%A0_sua_impossibilidade_2006-2007_).

6) 1855. “Minhas previsões imprevidentes para 2008 (com mil perdões pelo ligeiro atraso...)”, Brasília, 29 janeiro 2008, 4 p. Continuidade da série de astrologia político-econômica. Espaço Acadêmico (ano VII, n. 81, fevereiro 2008; link: http://www.espacoacademico.com.br/081/81pra.htm). Relação de Publicados n. 819. Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871124/1855_Minhas_previs%C3%B5es_imprevidentes_para_2008).

7) 1963. “Previsões imprevisíveis em tempos de crise global: minha astrologia econômica para 2009 (e mais além)”. Brasília, 16 dezembro 2008, 12 p. Mais uma da série das “profecias não realizáveis”, como é costume a cada começo de ano. Via Política (22.12.2008). Espaço Acadêmico (ano 8, n. 92, janeiro 2009; link: http://www.espacoacademico.com.br/092/92pra.htm). Republicado, sob o título de “Minha astrologia econômica para 2009”, no boletim digital Dom Total (09/04/2009; link: http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=586). Relação de Publicados 884. Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871154/1963_Previs%C3%B5es_imprevis%C3%ADveis_em_tempos_de_crise_global_minha_astrologia_econ%C3%B4mica_para_2009_e_mais_al%C3%A9m_).

8) 2070. “A Primeira Década do Século 21: um retrospecto e algumas previsões imprevisíveis”, Voo Beijing-Paris: 6.12.2009; voo Paris-São Paulo: 9.12.2009; Brasília: 19.12.2009, 13 p. Revisão dos dez anos transcorridos desde 2000 e algumas questões pendentes para a próxima década. Publicado Espaço Acadêmico (ano 9, n. 104, janeiro 2010, p. 27-37; link: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/9117/5140). Dividido em duas partes para publicação no Via Política: 1) “Balanço da primeira década do século 21: um retrospecto pessoal”, (2.01.2010); 2) “Brasil: o que faremos dos próximos dez anos?” (). Disponível no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/2070PrimeiraDecadaSec21.pdf). Relação de Publicados n. 945 (Via Política) e 946 (Espaço Acadêmico). Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871188/2070_A_Primeira_D%C3%A9cada_do_S%C3%A9culo_21_um_retrospecto_e_algumas_previs%C3%B5es_imprevis%C3%ADveis_2009-2010_).

9) 2231. “Previsões imprevisíveis para o Brasil em 2011: Resoluções para o novo governo à maneira de Benjamin Franklin”, Brasília, 17 dezembro 2010, 8 p. Especulações sobre um conjunto de resoluções do novo governo com base no trabalho “995TrezeResoluAnoNovo”, contendo princípios de boa conduta moral de Benjamin Franklin. Espaço Acadêmico (vol. 10, n. 116, janeiro de 2011, p. 101-107; ISBN: 1519-6186; link: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/12090/6479). Republicado em Via Política (17.01.2011) e em Dom Total (20.01.2011; link: http://www.domtotal.com.br/colunas/detalhes.php?artId=1773). Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871225/2231_Previs%C3%B5es_imprevis%C3%ADveis_para_o_Brasil_em_2011_Resolu%C3%A7%C3%B5es_para_o_novo_governo_%C3%A0_maneira_de_Benjamin_Franklin_2010-2011_). Relação de Publicados n. 1017.

10) 2345. Previsões imprevisíveis para 2012, Brasília, 16 dezembro 2011, 2 p. Postado no blog Diplomatizzando (16/12/2011; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/12/minhas-previsoes-imprevisiveis-para.html). Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871255/2345_Previs%C3%B5es_imprevis%C3%ADveis_para_2012).

11) 2455. “Minhas Previsões Imprevisíveis para 2013 (não custa continuar tentando, para ver se em algum ano dá certo...)”, Brasília, 20 Dezembro 2012, 4 p. Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2012/12/minhas-previsoes-imprevisiveis-para.html). Postado novamente no blog em 24/12/2013; (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2013/12/revisando-as-previsoes-imprevisiveis.html). Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871306/2455_Minhas_Previs%C3%B5es_Imprevis%C3%ADveis_para_2013).

12) 2544. “Previsões imprevidentes para 2014: sempre apostando no melhor”, Hartford, 14 Dezembro 2013, 6 p. Exercício habitual de chutes aleatórios, no sentido de apostar no que pode dar errado. Divulgado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2013/12/previsoes-imprevidentes-para-2014-paulo.html). Disponível no Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9871336/2544_Previs%C3%B5es_imprevidentes_para_2014_sempre_apostando_no_melhor).

Paulo Roberto de Almeida

Astrologia Diplomatica: minhas previsoes de dez anos atras para dez anos 'a frente...

Todo ano eu faço as minhas "previsões imprevidentes", a exemplo dos melhores videntes, astrólogos, adivinhadores, chutadores, voyeurs (ops) da atualidade, desses que andam pelos jornais, ou nos programas populares anunciando catástrofes (eventualmente benesses também), mortes de artistas e de políticos, alguma melhora aqui, outra piora acolá, para a satisfação de alguns, o desespero de outros, e o divertimento democrático de todos os que se deixam levar pelo besteirol anual.

À diferença, porém, das previsões "normais" -- quero dizer, essas que costumam dar certo -- as minhas são feitas justamente para não acertar, pois elas apostam na natural capacidade dos seres humanos de sempre desmentir aquilo que de melhor podemos esperar deles, ou seja, sensatez, equilíbrio, sentido da medida, desejo de fazer o bem, não mentir, não gastar demais o dinheiro dos outros, enfim, essas coisas que acontecem invariavelmente, a despeito do otimismo dos astrólogos, dos videntes, dos adivinhadores, etc.

As minhas previsões não: elas têm isso de certo que só funcionam se derem errado, ou seja, se eu não acertar uma só, no que eu terei sucesso total.

Fazem dez anos que eu persigo os desacertos, mas devo dizer que nisso sou ajudado enormemente pelo governo dos companheiros: eles sempre se esforçam para desmentir as nossas previsões mais prosaicas, as mais sensatas, as medidas mais adequadas para consertar este país no plano econômico, no campo político, e sobretudo no plano ético. Eles nunca falham os companheiros: sempre erram, e com isso me ajudam a acertar as minhas previsões ao contrário.
Como já se passaram dez anos de desacertos corretos, vou revisar as previsões de cada um dos dez anos passados, fazer o balanço de meus desacertos (espero sucesso total, triunfo pleno nos enganos) e, para persistir nesse hábito malsão, preparar novas para 2015, com a ajuda dos companheiros, obviamente. Conto com eles para me ajudar a não acertar nenhuma das novas previsões, ou seja, para errar completamente, no que eu terei sucesso pleno nas minhas novas previsões imprevidentes.
Antes de começar, porém, um novo exercício, vou postar aqui a primeira da série, que ainda não tinha todo o arcabouço epistemológico e a profundidade conceitual das "previsões imprevidentes", que começaram um pouco mais adiante, como vocês terão a oportunidade de conhecer, se ainda não o fizeram.
Esta que vai abaixo não passa de uma mera astrologia diplomática, isto é, uma mal concebida trapaça internacionalista, que não deveria dar certo em qualquer hipótese. E não é que eu acertei todas? Os mesmos problemas se eternizam no plano internacional, o que prova que se o mundo gira, os problemas sempre ficam onde estão, se é que eles não ficam piores.
Esta astrologia foi feita no início de 2004, e deveria valer para os doze meses seguintes apenas.
Mas, como vocês que trabalham nas relações internacionais já perceberam, certas coisas se eternizam e se mantêm intocáveis. Por isso acho que o meu exercício de astrologia serve igualmente para agora e para os dez anos seguintes.
A conferir.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 22 de dezembro de 2014


Astrologia diplomática
Especulações sobre a política internacional em 2004 (e além)

Paulo Roberto de Almeida
Brasília: 11 de janeiro de 2004

Todo final ou todo começo de ano é a mesma história: os jornais e revistas trazem aquelas previsões dos astrólogos para o começo do próximo ano, e tome promessa de catástrofes, mortes, assassinatos, traições, acidentes terríveis e outras pragas anunciadas previamente. O problema, atualmente, é que esses “astrólogos de carteirinha” já não se contentam mais com o menu habitual dos ricos e famosos, dos artistas de Hollywood (ou de novela) e um ou outro político. Não: eles já deixaram a seara das catástrofes naturais, dos acidentes de avião e das mortes das vedetes, para enveredar pelos arcanos da alta política e da política econômica oficial. Eles se profissionalizaram e se especializaram, como convém a toda economia moderna funcionando a plena carga da divisão social do trabalho (Durkheim que me perdoe, mas os astrólogos contribuem para reduzir o grau de “anomia” social).
Deve ter gente que coleciona as previsões mais picantes para conferir até o final do ano, mas confesso que eu sempre perco os recortes no meio do caminho. Quando a pilha geológica dos meus materiais “para ler depois” deixa o pré-cambriano de janeiro para o jurássico de maio a memória enfraquece; quando chega então no pleistoceno de novembro, já não há jeito de encontrar mais nada: tudo está soterrado e será descartado na próxima mudança.
Por isso, desta vez resolvi fazer diferente: vou criar minhas próprias previsões, num terreno que é o meu, obviamente, pois que eu não tenho permissão do sindicato dos astrólogos para invadir sua reserva de mercado e fazer previsões estapafúrdias sobre os temas que lhes são caros. Vou ficar na minha própria selva, que é muito mais complicada do que o mundo de Hollywood e dos cenários de novelas, e vou fazer mais: vou deixar minha lista postada na minha página (www.pralmeida.org) o ano inteiro, mas sem qualquer garantia de satisfação ou seu dinheiro de volta. Fica valendo apenas como exercício de imaginação criadora, num mundo que se repete a cada ano.
Aqui está, portanto, minha astrologia diplomática para o ano de 2004 (e além), com a ressalva de que eu não consultei as entranhas de nenhum animal, não tracei mapas astrais de nenhum líder da política mundial, não segui o curso zodiacal de países ou organizações. Tudo é resultado da mais pura e anárquica especulação, sem compromisso de cumprimento. Como se trata da primeira tentativa, a margem de erro supera 60%, mas prometo melhorar o grau de acerto antes do Brasil ingressar no Conselho de Segurança, o que deve me dar uns vinte anos de aperfeiçoamento. Sem mais delongas, eis minha lista:

ONU:
Enfrentará uma nova crise financeira em 2004 e não terá recursos para mais de duas missões e meia de paz e é só. Convocará uma conferência de chefes de Estado para discutir o problema da fome e das epidemias que atingem os países mais pobres: todos prometerão ajudar e o mundo continuará igual ao que sempre foi. Haverá discussões (intermináveis) sobre a reforma da Carta e a ampliação do Conselho de Segurança, sem conclusões firmes, porém. Aprovará um sem número de resoluções para resolver os mais variados problemas da humanidade: metade delas terá os Estados Unidos como único opositor (por vezes acompanhados de Israel e do Reino Unido). O Brasil abrirá o debate anual na Assembleia Geral, com um discurso no qual defenderá o multilateralismo.

Império:
Aprofundará o seu comportamento imperial, mas com algumas sutilezas, em um ano eleitoral. Continuará a não ligar para o mundo, mas fará de conta que está realmente interessado na paz e na cooperação internacionais. Continuará caçando terroristas durante o ano e alternando os alarmes amarelo e laranja. Vai legalizar imigrantes ilegais, mas um número ainda maior de candidatos passará a demandar fronteiras muito mais vigiadas. Algumas centenas de brasileiros serão deportados, gentilmente, e outros milhares continuarão tentando entrar, de forma pouco gentil. O presidente republicano será reeleito, ou então tomará seu lugar um candidato democrata. O Congresso confirmará que deseja a Alca mas que não pretende fazer nenhum esforço para abrir suas fronteiras agrícolas ou desmantelar os protecionismos setoriais. Aumentará a exportação de enlatados de Hollywood e a importação de cérebros do resto do mundo.

Europa:
Continuará tendo problemas de formação de maiorias para decidir a introdução do décimo-quinto tratado de reforço de uma união cada vez mais estreita entre seus povos, desta vez em número de 45 (contando as minorias), o que deve dar algo como 82 traduções cruzadas na Comissão, inclusive do grego para o finlandês e do sueco para o esloveno. Suas famílias continuarão não fazendo filhos, e por isso recorrerão aos imigrantes para manter a oferta de mão-de-obra barata. Continuarão enchendo a paciência do resto do mundo para que este reconheça exclusividade de apelações de origem (em queijos, bebidas e outras especialidades) que eles mesmos exportaram para o resto do mundo, com os seus emigrantes, cem anos atrás. Continuarão a manter vacas com contas em banco, porcos com talão de cheques e agricultores com cartões de crédito da própria Comissão, esperando que agricultores do Terceiro Mundo se contentem com algumas migalhas que vão jogar pela janela. Ainda assim, será um ótimo lugar para se fazer turismo cultural e gastronômico.

África:
Terá cessado duas guerras, mas começado outras três, com combatentes cada vez mais jovens (alguns empunharão a AK-47 com uma mão e a mamadeira com a outra). A entrada de recursos públicos para combater a Aids será compensada pela exportação de capitais privatizados para aumentar contas nos bancos off shore. Continuará fornecendo candidatos à imigração nos países europeus. Trapaceiros nigerianos continuarão enviando milhões de mensagens eletrônicas para confirmar que o tio ex-presidente ou o ministro da construção desejam lhe transferir 25% do seu patrimônio desde que você consinta em lhes passar o número de sua conta em banco: será a contribuição africana para resolver em parte o problema da má distribuição de renda no mundo.

Brasil:
Apesar da reforma ministerial, a imprensa continuará especulando sobre a entrada de novos ministros na equipe de assessores do presidente. Também se discutirá muito o crescimento da economia, o aumento da oferta de empregos, a reforma trabalhista, a política e a crise das universidades, a redução dos impostos e o aumento das prestações sociais, bem como dos investimentos do governo em obras de infraestrutura. Haverá troca-troca partidário logo depois das eleições municipais e nova mudança de regras para as eleições de 2006. A próxima novela do horário nobre se espelhará na vida política do País, o que fará, pela primeira vez na história, decrescer o nível de audiência desse tipo de programa. Os discursos ainda serão superiores ao número de medidas-provisórias, com previsão de equilíbrio em 2005. Continuará em seu esforço para ingressar no Conselho de Segurança e para liderar a América do Sul, com progressos sensíveis nas duas frentes.

Mercosul:
A união aduaneira se reforçará, mas antes haverá um curto estágio de cinco anos por um espaço de preferências tarifárias e mais três numa zona de livre comércio. Sua expansão recomendará reuniões de cúpula de dois dias, para dar tempo a todos os discursos, mas a Secretária Administrativa comprará um avião próprio para seguir todas as reuniões de todos os subgrupos técnicos do mercado comum (em preparação). O grupo de educação começará a redação de um manual de portunhol e a própria Secretária Administrativa de um Mercosur for beginners ou de um Idiot’s Guide to Mercosur.

Antiglobalizadores:
Continuarão com suas ruidosas reuniões, mas cada vez mais globalizadas e mais capitalizadas. Com isso conseguirão prolongar a vida útil do Fórum de Davos, que já vinha cansando empresários e acadêmicos. Também estimularão o turismo alternativo, as edições alternativas e os discursos alternativos, criando uma pujante economia de iniciativas antiglobalização que conseguirá, finalmente, salvar o capitalismo de sua atual fase de estagnação econômica e de baixo crescimento. Serão lançados derivativos financeiros do Fórum Social Mundial, para os que desejam aplicações alternativas, com dinheiro não contaminado pelo desejo de lucro e pelo vício da exploração do homem pelo homem. Serão os únicos fluxos financeiros a recolher a Tobin Tax, num esquema administrado pela ONU, que vai reverter em benefício de organizações alternativas do Terceiro Mundo, isto é, para eles mesmos.

Comércio internacional:
Continuará sendo uma guerra por outros meios, ou continuará tendo mais a ver com a política do que com a economia. As vantagens comparativas ricardianas terão uma nova interpretação, patrocinada pela Comissão Europeia e pelo Congresso americano, que tentarão modificar simultaneamente todos os livros textos de economia. Seus autores se refugiarão numa ilha deserta, reproduzindo a simulação do Robinson Crusoé que figura nesses livros textos, como exemplo de economia fechada e sem trocas. A despeito disso, as trocas se farão cada vez mais entre multinacionais, que serão em sua maioria ocidentais intercambiando produtos chineses. Indianos também vão começar a exportar uma parte de sua mão-de-obra para a Rússia, que padece de demografia declinante. Haverá dumping de ministros socialdemocratas, numa primeira antecipação da aplicação da cláusula social em escala universal.

Meio Ambiente:
Cada vez mais protegido, por discursos, de dirigentes políticos, e na prática, por barcos e aviões armados de radares e mísseis das organizações não-governamentais mais agressivas. Povos indígenas, por sua vez, contarão com dirigíveis não-poluentes para supervisionar suas explorações minerais e agrícolas (sustentáveis). Técnicas de clonagem ressuscitarão espécies desaparecidas, mas as ONGs ecológicas alertarão para os desequilíbrios para o meio ambiente do século 21, não acostumado com predadores do passado. Desaparecerá a agricultura tradicional e os supermercados serão divididos em seções de transgênicos e de orgânicos, com filas separadas nos caixas para evitar contaminação recíproca.

Direitos Humanos:
Serão inclusivos, com os aspectos psicológicos contemplados em nova convenção da ONU. Animais clonados também serão incluídos na categoria. O direito à democracia derrubará o último ditador asiático, mas uma ilha do Caribe continuará resistindo aos ditames do Império. Todos os habitantes do planeta terão direito a uma renda mínima, cujo programa será universalizado graças aos esforços de um senador brasileiro, e a ONU supervisionará sua aplicação até o ano de 2075, quando se espera que o último pobre poderá adquirir uma bicicleta chinesa movida a hidrogênio.

Astrólogos diplomáticos:
Serão uma categoria reconhecida e cada vez mais disseminada, antes mesmo da formalização da profissão de “internacionalista”. Terão seu próprio sindicato e sua colônia de férias e farão congressos anuais para trocar previsões sobre os países em que vivem. O mundo será muito mais divertido e feliz com eles, pois eles poderão abolir completamente as guerras e as epidemias de suas previsões, aproveitando para abater o preço dos manufaturados e para elevar os das commodities. Ou não?

A conferir no começo de 2005.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília: 1177, 11 de janeiro de 2004