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domingo, 28 de outubro de 2018

O caminho da prosperidade - Antony Mueller (2011)

Ordem Livre, Postado em 25 de Outubro, 2011.

O governo brasileiro colocou a eliminação da miséria no topo da sua lista de prioridades políticas. Assim o governo atual continua a política da promoção do crescimento econômico como foi feito do governo anterior com o chamado PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. No entanto, com o crescimento econômico, a questão não é tanto de alcançar altas taxas de crescimento por um curto período de tempo; o verdadeiro desafio é se se pode sustentar o crescimento econômico ao longo do tempo.

O desenvolvimento econômico é uma maratona e o que parece às vezes bem sucedido no curto prazo se mostra desastroso no longo prazo. Gastos públicos e intervencionismo funcionam para instigar um surto de crescimento, mas para alcançar a prosperidade duradoura precisa-se boa governança e de uma economia livre.

Gastos não garantem crescimento econômico
Qualquer governo pode instigar um surto de crescimento econômico por um período limitado através de programas de despesas financiadas com empréstimos.  Dependendo das condições do início de tais programas – como, por exemplo, o tamanho da dívida e o nível do crescimento antecedente – políticas de endividamento podem produzir altas taxas de crescimento econômico. No entanto, o problema é se os custos desses programas estão em linha com os benefícios dos projetos financiados pela dívida. Por exemplo, uma estrada para lugar nenhum irá aumentar a taxa de crescimento econômico durante o período da sua construção, mas no longo prazo isso não vai trazer benefícios que poderiam compensar o custo.

Um projeto como esse, então, representaria um desperdício de recursos e não apenas não contribuirá para um maior crescimento como diminuirá o nível de bem-estar no futuro. Não são raros os projetos do governo que receberam muito aplauso durante o tempo do seu planejamento, mas no final de sua realização representavam nada mais que cargas pesadas. O caminho certo para a prosperidade é através da produtividade. Mais produtividade permite o aumento de salários. A chave para eliminar a miséria encontra-se na produtividade. O aumento da produtividade requer a acumulação de capital e progresso tecnológico; e é na fracasso em se ganhar produtividade que se encontra a causa principal para a persistência da miséria em um país como o Brasil.

Inovação
Enquanto existem cada vez menos governos que acreditam que com mais gastos públicos ou com a socialização da produção pode-se sair da pobreza, ainda existem muitos que acham que sua atividade é indispensável para o progresso econômico. Para esses governos, a inovação é o novo slogan, um lema que pode ser ouvido em todo o mundo. Mas com a promoção de inovação pelo governo também o que se vê à primeira vista é diferente dos resultados no final. Dado que o progresso tecnológico pela inovação é uma necessidade para atingir níveis mais elevados de renda per capita, parece quase natural para os governos que se empenhem em fomentar esse caminho. E ainda, quando a distância entre os países mais ricos e as economias emergentes se torna mais estreita, esses países sentem a necessidade de aumentar a inovação própria em vez de simplesmente importar conhecimentos do exterior.

No entanto, como é o caso com qualquer outro empreendimento, gastos para a inovação representam custos. Alguns governos, de fato, não aprenderam essa lição até hoje e continuam a confundir despesa com crescimento econômico. Mas temos também governos, aparentemente mais esclarecidos, nos quais se abandonou o primitivismo de confundir gastos com benefícios. Alguns governos presumem que o caminho para sair da miséria com mais crescimento econômico precisa de inovações através de mais gastos governamentais em tecnologia. O que se esquece nessa linha de raciocino é que gastos públicos, enquanto podem promover alguns tipos de inovação, podem impedir outras inovações com mais benefícios.

Desvio de fundos
Governos gostam de usar o tamanho dos seus gastos públicos para ciência e tecnologia como indicador de seu apoio ao progresso econômico. Para receber financiamento público os pesquisadores em empresas e universidades são incentivados a elaborar projetos que estão mais em linha com o que se presume que sejam as preferências da comissão de julgamento do que com o mercado. E no final? Quantas vezes algo realmente útil surgiu desse financiamento do governo? Na verdade, o registro geral de sucesso do financiamento público de projetos de pesquisa é bastante sombrio. De fato, além de pesquisa para projetos militares (incluindo a tecnológica nuclear e espacial) quase nada se nota de invenções úteis que têm origem no financiamento público. Quase todas as grandes invenções e inovações que encontraram um grande mercado por serem altamente úteis foram inventadas não somente sem a ajuda do governo, mas, frequentemente contra a resistência das instituições governamentais e seus conselheiros experts.

A tecnologia não tem valor intrínseco.  O que é tecnologicamente mais eficiente não precisa ser também economicamente o melhor investimento. Sempre há mais projetos que se pode realizar e existem mais tecnologias já prontas que se pode implantar. Fazer essas escolhas é uma das tarefas principais dos empreendedores. A imprevisibilidade de qual será a melhor tecnologia no futuro requer a concorrência empresarial como método de descobrimento.

Raízes da prosperidade
Quase todos os produtos altamente úteis e práticas da nossa vida diária, as coisas que tornam a vida cotidiana menos pesada, não foram resultado de projetos de pesquisa promovidos pelos governos, mas sim resultado da iniciativa privada. O histórico se torna ainda pior para o governo quando se comparam os recursos gastos com o sucesso mercantil. Invenções e inovações surgem da inspiração humana; elas são o resultado da capacidade da mente humana de gerar ideias. Uma nova ideia é uma surpresa e, como qualquer outra surpresa, ela não pode ser prevista. Desta forma, a criação de novas ideias é o oposto da burocracia e é o oposto do estado. Acreditar que um burocrata estatal em algum ministério ou agência pública deve ser capaz de conceber produtos para um mercado que ainda não existe é bastante absurdo. Na verdade, a imprevisibilidade é fundamental para a inovação.

O caminho para o progresso econômico não é o seu planejamento, mas o método que traz o sucesso é o experimentação na forma de tentativa e erro. Ninguém sabe antes de experimentar qual será a direção certa da solução. Assim, essas economias mais prósperas são aquelas que deixam uma multidão de empreendedores livres para buscar o caminho certo. A grande vantagem do capitalismo se encontra no fato de que novas empresas podem se estabelecer e crescer com novos produtos. Assim, o que conta são baixas barreiras de entrada.

O que não importa é se o projeto que é promovido pelo estado leva a um patente – as bibliotecas dos escritórios públicos de patentes estão cheio de patentes inúteis. O ponto que importa é se o projeto leva a um produto comercializável. No final, ninguém além do consumidor é quem decide sobre a qualidade do produto.

Conclusão
A solução para sair da pobreza e manter a prosperidade não se consegue com mais gastos públicos. Gastos significam custos, e gastos sem benefícios são nada mais que cargas. O que é necessário para obter um crescimento econômico e sair da miséria para sempre é a inovação. Inovação, por sua vez, requer liberdade. O progresso tecnológico floresce nas sociedades que possuem uma atmosfera de criatividade que engloba toda a economia e a sociedade, conjunto com a cultura.

Os fundamentos para a inovação encontram-se numa economia livre dentro de uma sociedade criativa. Para as empresas, incentivos à inovação são dados quando a carga fiscal é baixa, as restrições burocráticas são minimizadas e quando a concorrência é intensa.


Antony P. Mueller é doutor em economia pela Universidade de Erlangen-Nuremberg, na Alemanha, e atualmente atua como professor na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Ele é o fundador do Continental Economics Institute e mantém os blogs Economia Nova, Cash and Currencies e Sociologia econômica.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Acordo Ortografico do Bom Senso: bastam duas linhas - Francisco Seixas da Costa, Joao Costa

Absolutamente sensato o João Costa. Em lugar de procurar sarna para se coçar -- ou talvez procurando, e deixando os lucros da operação com as editoras, que teriam de reimprimir e publicar todos os livros adotados oficialmente nas escolas, com despesas incomensuráveis para os governos (talvez tenha sido intencional) -- os países da CPLP, essa construção genial da civilização lusitana, poderiam adotar a proposta de acordo sugerida pelo João Costa: basta que todos os países membros desse conclave intelectual, literário e cultural, aceitem reciprocamente as respectivas ortografias para que os livros circulem livremente entre eles. E que as pessoas sejam livres para aceitar a ortografia que desejarem, desde que não ofenda regras mínimas de gramática e de construção estilística, todo o resto seria aceitável.
Não seria mais prático assim?
Paulo Roberto de Almeida

O Acordo poderia ter duas linhas...
Francisco Seixas da Costa
Blog duas ou três coisas, 18/05/2015

Um amigo que muito prezo, escreveu um texto delicioso sobre o Acordo Ortográfico, sob o título em epígrafe, que lhe pedi que me deixasse publicar por aqui. Ele aí vai:

"Para que fique bem clara a minha posição sobre o Acordo Ortográfico: percebo que este dispositivo interesse aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros para dar uma imagem de cooperação entre os países de língua portuguesa. Se tivesse sido eu a escrevê-lo, teria a seguinte formulação:

Artigo único:

Reconheçam-se como válidas, em todos os países da CPLP, as normas ortográficas em vigor nos restantes países.


Esta formulação permitiria que o uso de qualquer variante ortográfica não pudesse ser penalizado ou considerado ilegítimo em qualquer país de língua oficial portuguesa ou em qualquer contexto de uso da língua.

Esta não foi a opção de quem negociou o Acordo Ortográfico, tendo sido preferida uma versão que tenta unificar a ortografia.

Quem me conhece sabe que não consegue arrancar de mim nenhuma posição inflamada a favor ou contra o Acordo Ortográfico. Sei que a ortografia é uma mera convenção, que nenhuma versão da nossa ortografia foi coerente entre transparência ou etimologia e que esta e outras versões de instrumentos de normalização ortográfica têm problemas técnicos já assinalados por vários. Não me parece que a versão 1990 seja pior ou melhor do que a versão 1945 – basta pensar no uso do hífen. É apenas uma convenção – o facto de “hospital” se escrever com h.

Muito do debate em torno do Acordo Ortográfico rasa o absurdo e descreve as consequências da sua aplicação como algo próximo do Armagedão. Há dados que me fazem manter-me longe deste debate.

Sempre que sai uma notícia num jornal sobre o Acordo Ortográfico, surgem centenas de comentários de leitores que, horrorizados, listam os horrores do Acordo Ortográfico em mensagens pejadas de erros ortográficos.

Ouvia, há tempos, alguém que tinha escrito “nada a opôr [sic]” vociferando que não retirava o acento circunflexo, porque se recusa a escrever com o Acordo Ortográfico, que sempre escreveu assim e não vai mudar!

O mesmo, tal e qual, ouvi de alguém que, num programa de rádio, dizia: “não é por causa dos brasileiros que vou tirar a cedilha de vocês”!

A obsessão com a ortografia e tudo o que se diz sobre o seu impacto no mundo é a consequência de uma escolarização em que as produções escritas são, tradicionalmente, corrigidas em função de desempenhos temáticos e ortográficos. Coesão e coerência, conformidade com sequências textuais ou explicitação de regras de pontuação são dimensões da escrita a que a escola nunca prestou a devida atenção, que justificam muitos problemas de escrita (e leitura) e que explicam que se dê tanta importância à ortografia.

Tratando-se apenas de uma convenção, a ortografia não gera penalizações. Se eu escrever a minha lista de compras para o supermercado com inúmeros erros, ninguém saberá e, mesmo que saiba, nada acontece. Só no sistema educativo é que há penalização do erro e é interessante verificar que a introdução do Acordo Ortográfico no sistema educativo se deu sem problemas.

Se é verdade que a ortografia é uma mera convenção e que quem redigiu o Acordo visou uma unificação da ortografia, também é verdade que qualquer pessoa minimamente informada sobre as variantes do português deveria saber que as diferenças fundamentais entre o português usado em Portugal, no Brasil, Angola, Moçambique não estão na ortografia. Tente-se escrever um texto em conjunto com um colega brasileiro e veja-se como se tropeça em cada linha. Há um evidente desconhecimento da língua portuguesa na génese de algumas decisões políticas, o que é confrangedor.

Passados vinte anos sobre a criação deste Acordo, não são ainda evidentes os passos claros que a CPLP está a dar para uma eficiente política de língua. Para dar apenas um exemplo, ainda não se vislumbra uma política comum sobre o ensino de português no estrangeiro.

Dito tudo isto, alguns amigos que conhecem esta minha posição (ou ausência de posição), perguntam-me se uso ou não o Acordo Ortográfico. Comecei a usar no dia em que li um arrazoado de argumentos nacionalistas e de comentários racistas sobre os restantes países da CPLP a propósito do Acordo Ortográfico. Pensei que não queria ser identificado com aquele tipo de argumentação e nesse mesmo dia passei a utilizar, sem grande dificuldade, a nova convenção ortográfica (nunca senti aquela insegurança de que alguns falam, dizendo “Agora não sei como se escreve”).

Passados alguns meses, participei numa reunião em que, em defesa do Acordo Ortográfico, ouvi um eminente académico tecer comentários absolutamente nacionalistas e a rasar o racismo... Fiquei sem saber o que fazer e, pela primeira vez, me deparei com a hesitação de não saber como escrever.

Cresce em mim a vontade de reagir de forma adolescente e não usar o Acordo quando escrevo àqueles que o defendem ferozmente e usar quando escrevo aos que são violentamente contra. Mas, por vezes, tenho de escrever a ambos e, nessa altura, penso: isto é apenas uma convenção, para quê gastar tempo a pensar no assunto?

Se se tivessem ficado pelas minhas duas linhas, ter-se-ia poupado muito tempo...

João Costa

PS: Ao reler o texto, apercebo-me de que, por vezes, o Acordo Ortográfico não tem mesmo importância nenhuma na forma como se escreve. E garanto que não foi intencional.