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sexta-feira, 25 de maio de 2012

Desindustrializacao: um debate importante

Recebi, a propósito deste meu post:

SEXTA-FEIRA, 25 DE MAIO DE 2012


o seguinte comentário:

Eu sou bastante cético com esse negócio de desindustrialização. Não tenho dúvidas de que é um processo normal de maturidade: depois que vc encheu a pança e comprou seu mobiliário e bagulhos eletrônicos, nada mais natural que suas demandas passem a ser viagens, jantar fora, cuidar dos dentes, da pele, fazer academia e ter um bom corretor para administrar seus investimentos. Como não dá para importar a maioria dos serviços, eles serão produzidos internamente. Então a Finlândia terá uma participação da indústria no PIB menor que a China, que terá uma participação da agricultura no PIB menor que a de Serra Leoa.
Agora, fica essa dúvida com relação ao timing. O Brasil tem uma relação indústria/PIB de 13%. De fato é pouco comparado com a maioria dos países no nosso estágio. Mas existem exceções, certamente. O Chile mesmo é um país de indústria fraca relativamente e commodities puxando a economia já a bastante tempo. E não parece estar fracassando. A Austrália e a Noruega também são grandes exportadores de commodities. Da última vez que chequei a Noruega tinha o maior PIB per Capita e a Austrália um dos maiores. Ambos superiores à Alemanha, que tem uma porção maior de indústria na composição do PIB.
Sei não... acho que o pessoal menospreza demais o potencial econômico do agrobusiness, do petróleo, do ferro, sei lá mais o que... Tenho sérias dúvidas a respeito da ideia de que é ruim ser um fazendão. Obviamente é contra-intuitivo. À primeira vista parece que vender TV é melhor, ou de alguma forma superior, que vender soja, mas vá falar isso para algum produtor de soja do centro-oeste. Vantagens comparativas.
Quanto à questão da qualificação da mão-de-obra, concordo plenamente. Mas isso independe de sermos um fazendão ou uma Manchester. Se formos ser um fazendão, vamos precisar de bons engenheiros agrícolas, "pesquisadores agrícolas", etc, e de bons dentistas, esteticistas, guias de turismo e chefes de cozinha para satisfazer as demandas do dono da fazenda por serviços.
abraços, Zamba



Permito-me comentar, de meu lado.


O debate vem sendo obscurecido por fatores conjunturais, que podem se tornar estruturais. O problema é que os primeiros também são causados por falhas estruturais e requerem remédios sistêmicos, mais amplos.
Existem vários fatores, entre eles a concorrência estrangeira e o câmbio, mas independentemente disso, é um FATO que o Brasil se tornou caro demais, sob qualquer critério.
Se formos na origem dos problemas que afligem a indústria brasileira, encontraremos fatores inteiramente MADE IN BRAZIL, ou seja, de responsabilidade do governo, uma vez que temos recursos, mercado, energia suscetíveis de competir internacionalmente, menos, é claro, a qualidade dos recursos humanos (mas isso também é responsabilidade da sociedade e do governo). Ou seja, todos os fatores que nos afetam negativamente poderiam ser "consertados" com politicas macro e micro, e setoriais, corretas, duradouras, persistentes, que poderiam ser resumidas não num grande "projeto nacional"-- pois isso é bobagem acadêmica -- mas na criação de condições favoráveis ao empreendedorismo, um bom ambiente de negócios, para o investimento privado (se o Estado, claro, não fosse o despoupador líquido que é).


Computado, pois, esse fator de falhas NÃO de MERCADO, mas FALHAS DE GOVERNO, resta a concepção que a sociedade brasileira e suas elites se fazem de uma economia moderna e funcional. Ouso dizer que a maior parte das pessoas defende uma visão industrial que eu chamaria de stalinismo industrial, possuir todas as áreas funcionando, integradas verticalmente, servindo ao mercado interno, o que me parece singularmente atrasado nas condições atuais da globalização.
Mas, mesmo em termos históricos, sem globalização preeminente, países se desenvolveram com base em atividades primárias e agrícolas, como Dinamarca, Canadá, Nova Zelândia, Austrália e os próprios EUA. Não há nada de errado em ter uma agricultura moderna, competitiva, exportar minérios, recursos naturais, etc, bastando agregar valor em várias etapas da oferta, que não precisa ser totalmente manufatureira (mas acaba sendo, quando existe uma valorização e aproveitamento das vantagens comparativas). A capacitação humana e o adensamento de cadeias se dão, quando o governo faz aquilo que só ele pode fazer -- infraestrutura, recursos humanos, bom ambiente de negócios, etc, -- e deixa o setor privado (nacional ou estrangeiro, não importa muito) fazer o que sabe fazer melhor, produzir e vender com o objetivo de maximizar lucro.


Governos intervencionistas costumam fixar objetivos distributivistas que prejudicam os negócios e diminuem o investimento.


Não creio que as elites brasileiras, políticas e econômicas, estejam preparadas para empreender essa pequena revolução mental, que na verdade é grande, dado o volume de true believers no stalinismo industrial.
Acho que vai demorar bastante tempo para o Brasil se educar economicamente, tantas são as deformações de nossas elites...
Paulo Roberto de Almeida 

terça-feira, 24 de abril de 2012

De conservadores e de reacionários: algumas precisoes minhas


Recebo, de um leitor deste blog, o seguinte comentário ao post indicado abaixo, que se pretende, provavelmente, irônico, mas que me parece um pouco ingênuo, e até enviesado.

Vejamos o que me escreveu esse leitor: 
Nada melhor do que ser criticado pelo próprio Paulo Roberto de Almeida, um dos baluartes do conservadorismo desse país. Obrigado PRA, voce acabou de fazer a alegria dos autores do discurso. em De volta ao problema das "injusticas sociais" em diplomacia: dia do diplomata
Entendo que se trata de um colega, que se julgou atingido pelos meus comentários (muito simplórios, na verdade) ao sentido de alguns discursos feitos no dia do diplomata. Não disse tudo o que pensava, evidentemente, tanto por falta de tempo, quanto por sentido de disciplina, pois existe uma lei do Serviço Exterior (que não é exatamente a lei da mordaça, mas controla, digamos assim, as manifestações dos diplomatas). Ainda que não existisse nada, a maior das censuras é justamente aquela exercida por colegas da Casa, sejam os superiores (que costumam ser "feudais", em hábitos e pensamento), seja pelos "horizontais", que geralmente vivem num ambiente de fofocas recíprocas (o que sempre detestei e que invariavelmente desprezei ao longo de toda a minha carreira). 
Mas presumo que se trate, mais provavelmente, ou quase certamente, de um dos redatores do discurso dos alunos, uma obra coletiva, como especificado em "epígrafe". Ou seja, todos eles, ou pelo menos certo número deles, leram o meu post e resolveram me criticar, através do comentário postado anonimamente. Não haveria mal nenhum se eles assinassem como o "coletivo que redigiu o discurso da turma de formandos", mas entendo que eles têm o direito de permanecer anônimos: seja por timidez, seja por vergonha, seja pelo temor reverencial de falar com voz própria numa casa freudianamente castradora, eles preferem permanecer anônimos. Não tem importância, eu responderei ao comentário -- o que é um direito meu, como "dono" do blog, ainda que poderia ficar calado, ou indiferente, já que muitos recomendam não polemizar -- pois que considero que toda oportunidade é boa para debater socraticamente sobre questões reais.
Então, vamos tentar debater democraticamente com o tal de "coletivo"...

Todos têm o direito de falar, de ser ouvidos, e de receber comentários pelos argumentos exibidos. É o que sempre faço aqui, publicando mesmo as críticas mais grosseiras que me são dirigidas, mas que me servem de novas oportunidades de reflexão, seja sobre o caráter das pessoas, seja como estímulo a escrever novos textos, em benefício do esclarecimento dos mais jovens (e entendo que os mais velhos sejam um pouco impermeáveis a novos argumentos ou a alguma didática não solicitada). 

Constato, em primeiro lugar, que o coletivo está contente -- embora, permito-me considerar essa expressão de contentamento como razoavelmente hipócrita -- mas também constato que a intenção real era a de me criticar. Pois não é que eles atingiram seus objetivos de serem lidos e percebidos como defensores de um novo paradigma diplomático, mais democrático, mais inclusivo, mais igualitário? Entendo que o coletivo, evidentemente, esperava elogios a granel. E não é que logo vem, imediatamente, uma crítica sutil, que eles perceberam como conservadora? Eu poderia ter sido mais extensivo, didático, rebatendo cada um dos pontos relevantes do discurso coletivo, mas preferi apenas insinuar, para incitar à reflexão. Quando é que vamos ter debate real neste país, não apenas slogans, ou atitudes de recusa, rechaçando o diálogo, e despachando o suposto “adversário” com dois ou três rótulos simplificadores? Seria pedir muito? Mesmo a jovens que estão se iniciando na vida profissional, e que ainda não se acomodaram à mesmice do cotidiano, depois de longos anos na morosidade burocrática?

Mas passemos ao que interessa. Eu, não sei bem por que, sou designado como:
"um dos baluartes do conservadorismo desse país"
e daí decorre que: 
"Obrigado PRA, voce acabou de fazer a alegria dos autores do discurso."

Bem, concedo. Se o "coletivo" ficou contente com tão pouco, posso então aumentar o contentamento coletivo precisando meus motivos de discordância, e eles são muitos. Mas não vou fazê-lo agora, pois não é caso de dar aulas de sociologia, de história ou de economia a jovens que acabam de fechar os livros de estudos. Vamos primeiros corrigir o "coletivo", restabelecendo a verdade dos fatos, que passo agora a expor.

Eu seria, então, um dos baluartes do conservadorismo no Brasil?
Isso representa, como se diz em francês, me fazer muita honra e muita desonra, ao mesmo tempo. Não me lembro de jamais ter sido identificado com o pensamento conservador brasileiro, pois inexistem textos meus identificados com essa corrente, cujos expoentes eu desconheço, no Brasil.
Aliás, desafio o "coletivo" a indicar quem seriam os pensadores conservadores do Brasil. Buscando muito poderíamos encontrar, talvez, Gustavo Corção, um nome do qual os jovens nunca ouviram falar, e talvez Miguel Reale, mais conhecido, mas seria duvidoso colocar este último entre os conservadores. O primeiro sim, foi assumidamente, deliberadamente, orgulhosamente, conservador, mas ele não deixou "filhos intelectuais", se ouso dizer. O segundo foi de certa forma um renovador do pensamento doutrinal, e filosófico do Direito no Brasil, mas eu sou muito incompetente na matéria para opinar.
O conservadorismo no Brasil, muito diferente da tradição inglesa, é algo, assim, próximo da lepra, uma enfermidade mental da qual ninguém quer ser acusado. Ninguém quer ser chamado de conservador, e até os conservadores políticos – não filosóficos, pois estes inexistem – querem ser progressistas. Mesmo liberais se pretendem “sociais. Talvez
Talvez o "coletivo" esteja pensando em Olavo de Carvalho, mas nisso eles se enganam redondamente. A menos que OC se defina, ele mesmo, como conservador, eu o considero, simplesmente, como um polemista arguto, que tem suas crenças, sim, mas raramente identificadas com o que se chama, filosoficamente, de conservadorismo, à la Burke, à la Oakeshot. OC, que foi marxista, hoje se opõe aos comunistas e ao marxismo em geral, mas isso não basta para fazer dele um conservador, que é bem outra coisa. Quem seriam, portanto, os conservadores no Brasil? Esclareçam-me, por favor.
Desafio o "coletivo" a encontrar um único texto meu que possa ser identificado com o conservadorismo. Ou eles não sabem o que é isso, ou eles são levianos nas acusações. Minha lista de trabalhos está disponível no meu site, podem buscar.
Por outro lado, de modo geral, não me considero baluarte de nada, absolutamente nada, neste país. Sou apenas eu, e meu computador, e minhas leituras, só isso. Não pertenço a partidos (e jamais ingressaria em qualquer um deles), não me filio a clubes filosóficos, a crenças religiosas ou espirituais (sou total e resolutamente irreligioso), não gosto de agrupamentos e movimentos. Não pretendo, sobretudo, liderar nada, conduzir qualquer movimento ou corrente de opinião, não quero ser apontado como líder de qualquer coisa, quero apenas permanecer o que sou: um espírito livre, que, a despeito dessas amarras institucionais temporárias, se afirma soberanamente dono das próprias ideias, sem qualquer servilismo a pessoas ou instituições, sem qualquer temor reverencial de quem quer que  seja, anarquicamente livre, como podem ser as pessoas que não temem pensar com a própria cabeça e expressar o que pensam, mesmo em prejuízo de situações, benefícios e privilégios. Acho que ficou claro, assim; portanto, esqueçam o baluarte...

Dito isto, vamos esclarecer o que é ser conservador e, a partir daí, medir a distância que me separa daqueles que classifico como os verdadeiros conservadores do país.

Como pode ser conservador alguém, como eu, que pretende mudar TUDO no Brasil? Mais do que simplesmente mudar, ou reformar, o que eu quero, basicamente, é revolucionar tudo, de A até Z, tudo o que existe de políticas equivocadas, em todas as áreas que são objeto de certa relevância social. 
Em contrapartida, considero alguns -- ou vários, quem sabe todos? -- que estão atualmente no poder, como essencialmente conservadores, quando não absolutamente reacionários. Querem ver como? Vamos lá.

1) Política:
Considero nossa Constituição anacrônica, defasada, ridiculamente conservadora, equivocada, idealista, ingênua, burra e sumamente estúpida em várias áreas, sobretudo econômicas e sociais. Querem ver? Uma Constituição que começa por pretender regulamentar em detalhes toda a vida social é radicalmente estúpida, pois obriga a sociedade, o legislativo, a entrar, cada vez, num doloroso processo de revisão constitucional, para regular ou transformar direitos de gregos e goianos. Estúpido, pois não? A vida, a economia, as transações globais são dinâmicas, e constitucionalizar tudo em detalhes é de um conservadorismo atrás, pois obriga tudo a permanecer estável por muito tempo.
O ideal, portanto, seria fazer uma Constituição mais enxuta, tratando apenas de questões essenciais e remetendo muita do que é secundário para a legislação infraconstitucional. A sociedade brasileira, dinâmica, criativa, cambiante, não merece a Constituição que tem. Quais são os projetos dos companheiros para mudá-la. Eu tenho vários.
Os companheiros que VOTARAM contra a CF, agora se opõem às mudanças simplificadoras; eles querem apenas acrescentar mais penduricalhos de direitos corporativos nessa pobre coitada. 
Procurem, por exemplo, quantos vocábulos "direito" existem: vocês vão encontrar, salvo engano, mais de 70. Procurem agora palavras como obrigações, ou eficiência, ou produtividade: necas de pitibiribas, não é? Pois é: parece que o monstrengo constitucional não serve para avançar, apenas para conservar...
Em outra esfera, a nossa representação política (proporcional) é deformada, monstruosamente deformada, e isso é um insulto à sociedade. Nosso Congresso, de maneira geral, é inflado, obeso, gastador, quase irrelevante. Perguntem quem são os "conservadores" que querem mudar isso, e os "progressistas" que querem manter tudo como está? Eu mudaria tudo, mas reconheço que os conservadores, os reacionários vão simplesmente sentar e não fazer nada. Aliás, é o que já acontece...

2) Economia:
O Brasil não apenas avança lentamente, a passos de cágado, acompanhando por baixo o ritmo da América Latina e do mundo, mas também recua, institucionalmente, filosoficamente, operacionalmente. Os companheiros no poder são adeptos de ideias velhas, conservadoras, de 50 ou 60 anos atrás, que aprenderam quando ainda estavam na faculdade mas nunca conseguiram avançar para ideias mais modernas, progressistas, reformistas ou revolucionárias. 
São conservadores, ou reacionários, e dou exemplos: querem reproduzir o planejamento da era militar, o intervencionismo dos anos 1950 e 60, o protecionismo dos anos 1970 e 80, as manipulações monetárias e cambiais dos anos 1980, e por aí vai. A política industrial tem saudades de um tempo que não volta mais, as "receitas tecnológicas" são de “avestruz”, o subvencionismo é da gloriosa era militar -- quem diria? -- e o pensamento econômico é esse keynesianismo de botequim, tosco, rústico, mal aprendido em manuais de segunda mão -- inclusive porque Keynes era bem mais sofisticado -- que não suportaria um exame de faculdade de segundo ano.  As políticas industriais e comerciais misturam indústria infante à la List e tarifas hamiltonianas -- século 19, portanto -- e protecionismo à la Manoilescu (anos 1920 e 30, neste caso). O que de mais  moderno eles têm a apresentar é a contrafação de Hamilton, List e Manoislescu, na figura patética de um coreano de Cambridge (My God!) que desconhece a história e não sabe que representa uma reencarnação mal ensaiada do prebischianismo simplificado. O furtadismo, a doutrina daquele que sempre pretendeu que um pouco de inflação não faz mal, tem adeptos em todas as partes.
Eu gostaria de revolucionar tudo isso, mas os companheiros adoram ideias velhas, tanto que escolheram como seu guru intelectual, e homenageado ocasional, alguém que é coerente, há meio século, com as mesmas ideias atrasadas que já defendia naquela época. 
E eu sou o conservador? Mon Dieu, eles não sabem o que é ser conservador. Não sou eu quem recomenda leituras dos anos 1940 e 1950 aos alunos, ideias defasadas e metodologicamente simplórias, em lugar de se alimentar das modernas pesquisas de arquivos e de testes empíricos. Deixemos a paranoia de lado, e fiquemos apenas com a teoria conspiratória, aquela que divide o mundo entre poderosos e oprimidos. Tudo isso é um pouco velho, não é?
Os reacionários não conseguem se destacar dos moldes mentais que presidiram seus estudos de meio século atrás. Poderia multiplicar os exemplos em economia, e todos eles estão invariavelmente presentes em certos posts, mas creio que posso parar por aqui. O exercício seria um pouco arriscado no plano da desconstrução mental.

3) Educação:
Aqui a inversão é notável, e eu diria mesmo patética e dramática. Os companheiros acabam de eleger como "patrono da educação no Brasil" uma figura desonesta -- que roubou suas ideias de um outro, sem sequer reconhecer o feito --, que elogiava os experimentos de "criação do homem novo" nas revoluções cubana e maoísta (e que jamais se redimiu em função dos crimes cometidos por seus símbolos ideológicos), que é responsável pelo atraso pedagógico e mental da educação brasileira, e cujas "lições" estúpidas mantêm os cursos de pedagogia e as "saúvas" do MEC aferradas a essas ideais atrasadas, em detrimento da educação brasileira (não sou eu quem digo, basta ver os resultados do PISA...).
Eu gostaria de revolucionar o setor, mas reconheço que é difícil, a começar pelo atraso mental que o guru promoveu, pelas ideias equivocados patrocinadas pela burocracia do MEC, pelo desleixo geral que convive com a máfia sindical isonomista e anti-mérito das associações de professores.
O conservadorismo, e até o reacionarismo é notável e absolutamente trágico na esfera educacional, e desde já reconheço que isso não vai ser corrigido, e que o Brasil vai continuar recuando por anos e anos à frente.

4) Governança, instituições:
Eu reconheço que o Estado trabalha mal, é ineficiente, e gostaria de mudar muita coisa, revolucionar a administração pública, acabar com a estabilidade (em quase todos os níveis e funções), acabar com o isonomismo debilóide, redistribuir funções, promover a eficiência, aferição por resultados e por méritos, instrumentos de accountability, benchmarks para várias atividades de agências públicas, market-like inducements, enfim, um sem número de mudanças que não reputo em classificar como revolucionárias para o Estado e a sociedade brasileiras.
Pergunto, ao "coletivo", quantos projetos de reforma, nesses vários setores foram encaminhados pelos companheiros no poder?
Legislação trabalhista, que todos sociólogos -- e suponho que "coletivo" estudou isso nos cursos preparatórios -- apontam como herdada do fascismo mussoliniano, que precisaria ser modernizada? Onde estão as propostas dos progressistas?
Onde está a abolição da cobrança compulsória, fascista, do imposto sindical, que os sindicalistas alternativos, nos tempos de oposição aos pelegos, diziam querer eliminar? O que fizeram depois de instalados no poder? Deram um naco sem contrapartida e sem necessidade de justificativa para as centrais, que elas mesmas são emanações de uma das mais pujantes "indústrias"  do Brasil atual, junto com a "teologia da prosperidade": a criação de sindicatos artificiais, no papel, apenas para capturar o imposto sindical.
Nossa (in)Justiça, canhestra, lenta, dominada pelo processualismo que delonga os litígios, cabendo esperar, em média, OITO anos por uma "solução", tudo isso tem proposta de reforma progressista, revolucionária? Eu, por exemplo, gostaria de reformar os códigos processuais, controlar juízes corruptos, acabar com a procastinação, os monopólios indevidos (como os da OAB), a fúria controladora irracional de procuradores e desembargadores que atuam com base em suas ideias, não com base nas leis. Mas reconheço, aqui também, que nada se fez durante todos esses anos; e nada se pretende fazer, ou existem projetos dos não-conservadores nessa área?

5) Social:
Pois é: antigamente era "reacionário" distribuir ajuda, esse "ópio do povo" que eterniza a dependência e constrói currais eleitorais. O que se fez desde alguns anos para cá? Eu pretenderia qualificar pelo emprego, sempre, para que cada um busque sua renda no mercado, não esperasse um favor do Estado, a coisa mais reacionária, mais embrutecedora da dignidade cidadã que pode haver.
Em matéria de reforma agrária, por exemplo, não existe nada de mais reacionário do que o modelo regressista, minifundista, antimercado e antiexportador, que pretendem promover os verdadeiros patronos do MDA, os neobolcheviques do MST, uma reencarnação de totalitários de um século atrás que pensa que vai fazer o Brasil retornar meio século, quando a reforma agrária tinha algum sentido social. Hoje não tem nenhum, nem econômico, diga-se de passagem, mas os reacionários se aferram a coisas do arco da velha, a textos de Caio Prado, a figuras como Julião e outros ícones ultrapassados. Acho melhor revolucionar o campo, pela capitalização, seguro agrícola, integração de mercados, concorrência mundial, abolição de subsídios, essas coisas das quais os companheiros tem horror, reacionários que são. Quem é conservador?

Poderia continuar desfilando os motivos pelos quais eu me qualifico como reformista, ou mesmo revolucionário, em face dos verdadeiros conservadores e reacionários que hoje pontificam soberanamente com soluções do século 20 ou mesmo do século 19, propostas anacrônicas para velhos problemas sociais, entre elas o insulamento stalinista na área econômica, o distributivismo canhestro na área social, a defesas das corporações medievais na área institucional, ideias defasadas em todas os níveis da educação. Mas, não creio que seja mais necessário. Basta o que vai acima.

Vou apenas me ater ao final do comentário: "voce acabou de fazer a alegria dos autores do discurso".
Mas como? Eles se contentam com tão pouco?
Eles se contentam com uma crítica superficial e rasteira?
Poderia ser muito mais contundente e analisar uma a uma as "ideias" externadas nesse discurso "coletivo", mas vou poupar os colegas desta decepção.
Talvez eu o faça um dia, mas não convém abalar convicções tão bem arraigadas -- depois de dois anos, ou quase, de reeducação -- num simples golpe revisionista. Leituras sempre ajudam; observação da realidade, também. Tenho muitos trabalhos escritos que abordam alguns dos temas tratados nesses discursos, a começar por "13 Ideias" que podem ser lidas em meu site (suponho). 

Como diria Marx, que pode ser considerado um revolucionário, acredito, "deve-se duvidar de tudo". Nisso estou plenamente com ele, inclusive e sobretudo na sua vontade de disseminar o novo modo de produção, para acelerar a marcha da história.
O "coletivo" deveria se juntar coletivamente e debater novamente as ideias classistas, racialistas, distributivistas ingênuas, sexistas que defenderam. Acho que o Brasil está acima desse tipo de divisão artificial, e seria bem melhor se a sociedade não se dividisse nessas linhas, o que seria altamente prejudicial para a sociedade e para a própria diplomacia.
Um dia volto ao assunto, quando divergir não for mais o equivalente de desafio à autoridade e um ingresso no ostracismo. Muito progressista, certamente...
E, sinceramente, preferiria debater com pessoas reais, não com um coletivo anônimo. Um pouco de coragem, pessoal, a Casa não é tão carrasca assim…

Paulo Roberto de Almeida 
(Trier, 24 de Abril de 2012)

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Cesar Maia contra o voto de lista: germe do autoritarismo

Importante artigo do ex-prefeito Cesar Maia sobre os perigos para o sistema democrático brasileiro do modelo político-eleitora privilegiado pelo PT.


A FALÁCIA E A GRAVIDADE DO VOTO EM LISTA NO BRASIL!
Cesar Maia, 27/09/2011
    
1. Acompanhando as últimas eleições na América Latina e a dinâmica partidária dos últimos anos, a conclusão é uma só. A introdução do voto em lista no Brasil seria o caminho inexorável para um regime autoritário com o PT caminhando para um sistema de partido único, exponenciando o regime de executivo hegemônico, tão comum no continente.
     
2. Com a exceção do Uruguai, do Chile, da Costa Rica e do México, que tem uma estrutura estável de partidos, em longo prazo, com um quadro ternário (Uruguai, México e Costa Rica), ou quaternário (Chile), nos demais países o voto em lista está liquidando com a separação entre eleição parlamentar e presidencial, produzindo um efeito-arrastre da segunda sobre a primeira. Isso se viu claramente nas eleições peruanas de abril e guatemaltecas de setembro, ambas em 2011.
     
3. Mas há um efeito ainda mais grave. A organicidade política, a desideologização, o poder pelo poder, o clientelismo e o patrimonialismo fragilizam o mandato parlamentar. Com isso, sempre que o líder governante e seu partido tenham vocação hegemonista, o quadro partidário se dissolve, seja em relação aos partidos que dão apoio ao governo, como os de oposição.
     
4. Se "mensalarizar" assalaria o exercício do voto dos parlamentares, muito mais seria o voto dos convencionais articulados com esses. Com isso, inscreve-se num partido quem quiser e se constrói a lista partidária. A facilidade com que se faz isso pelo continente explica a quantidade de partidos que são criados para fugir do assalto a seus partidos anteriores.
      
5. Uma coisa é num sistema pluripartidário, como o brasileiro, em que o partido de maior representação parlamentar tem 16,5% e o voto é nominal. Outra coisa seria um partido ter 30% do Parlamento e o voto ser em lista. Em pouco tempo, estrutura partidária estaria transformada em sublegenda daquele partido, se ele tiver pretensões hegemonistas, como é o caso do PT. Basta ver a formação do ministério de seus governos, das estatais e dos espaços de máximo poder financeiro, como os fundos de pensão das estatais, a Petrobras, Banco do Brasil, CEF... Isso sem falar na prática de entregar a cabeça do ministério a um partido e o cérebro, os pulmões, coração, fígado, pernas e braços ao PT.
       
6. NaArgentina, nas eleições parlamentares de junho de 2009, os Kirchners perderam o controle do congresso. Durou pouco. Aliás, na Argentina, há um curioso método de engordar as listas. São os candidatos "testemunhais". Nomes de destaque, inclusive com cargos nos executivos ou legislativos dos três níveis, que são inscritos como cabeças de listas. Após a eleição, renunciam ao mandato com a garantia da lista inchada pelos votos a ele. Isso de forma aberta. Na Argentina a impopularidade da presidente foi corrigida em dois anos, sob o impacto da morte de seu marido, do hegemonismo do executivo, da propaganda descarada e da perseguição à imprensa e dos abusos fiscais.
      
7. Aprovar o voto em lista no Brasil, mesmo com a armadilha de valer (agora!) para metade dos eleitos, será um suicídio coletivo, tipo Jim Jones, para todos os partidos relevantes como PMDB, DEM, PSDB, PTB, PSB, PP, PDT, PR. Será a "tiriricação" da política brasileira, só que os palhaços serão esses partidos. E todos nós.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Partido Novo: um debate que se engaja (sempre relevante)...

Tenho acompanhado o processo de formacao do Partido Novo, seja pela imprensa, seja, agora, no proprio site do Partido, e ja troquei algumas mensagens com membros do Diretorio Nacional provisorio, tendo eu reclamado da ausencia de um programa mais elaborado.
Tambem tinha postado um comentario critico do economista Mansueto Almeida (nao se trata de parente meu), que foi respondido pelos responsaveis pelo Partido Novo (que tambem reagiram diretamente no meu post reproduzindo essa critica), e que volta a ser objeto de uma treplica do mesmo economista.
Creio que o debate constitui uma das facetas mais importantes da atividade politica aberta aos cidadaos conscientes e participantes. Por isso vou postar aqui tudo aquilo que me parecer importante para esse debate.
Paulo Roberto de Almeida

Esclarecimento do Diretório Nacional do Partido Novo
Blog do Mansueto Almeida
17/03/2011

Me sinto na obrigação de reproduzir na página principal deste blog, explicações enviadas pelo Diretório Nacional do Partido Novo e por um dos seus fundadores, o senhor Roberto Motta, em relação ao post que escrevi sobre esse partido. Quando em post anterior mostrei certo ceticismo em relação à criação deste partido, de forma alguma tive a intenção de tentar desestimular a sua criação ou mesmo de afirmar, categoricamente, que o partido não contribuiria para o debate no Brasil ou que seria pequeno.

Apenas levantei quatro pontos de alerta baseado no que lí em uma matéria de jornal, que a nota do partido enviada a este blog ajuda a esclarecer. Qualquer manifestação política e a organização de grupos da sociedade para debater a melhoria do serviço público e promover o desenvolvimento do Brasil devem ser estimuladas e, assim, o grupo que está formando o Partido Novo está de parabéns.

O que tentei fazer foi apenas um alerta, para não pensarmos que os maiores problemas do Brasil se restringem a problemas de gestão. Temos uma carga tributária elevada porque a sociedade brasileira fez opção por uma série de serviços e transferências sociais que têm um elevado custo. Assim, precisamos cada vez mais debater o custo e benefício das politicas públicas e, talvez, o Partido Novo possa começar a promover esse debate junto à sociedade brasileira.

Novamente, sou a favor de qualquer manifestação política que contribua para o debate de idéias, pois hoje no Brasil me assusta a falta de debate seja na sociedade seja no Congresso Nacional. Decisões importantes são tomadas a toque de caixa por Medidas Provisórias sem que se analise os prós e contras dessas medidas ou mesmo o uso alternativo de recursos públicos. Assim, espero que o Partido Novo possa ter uma atuação forte e politica para melhorar o Brasil e que venha a contribuir para o debate de desenvolvimento econômico.

Mansueto Almeida

Nota do Diretório Nacional do Partido Novo

O contraponto feito por Mansueto Almeida sobre o sentido que possa fazer o Partido Novo é muito bem vindo e recebido como um incentivo. Na verdade, uma iniciativa que não fizesse sentido algum dificilmente estimularia o articulista a reflexões tão intensas e eruditas. Os quatro motivos analisados, pelos quais se chegaria à conclusão de que o Partido Novo é uma utopia e por isso não vai dar certo, são na verdade quatro desafios para serem enfrentados por quem queira exatamente fazer algo novo.

O primeiro ponto, a respeito da suposta ingenuidade em pretender que o Estado tenha uma preocupação semelhante à das empresas privadas quanto à eficiência de gestão, exige que se distinga entre o que é semelhante e o que não é. Eficiência em matéria de administração é a maneira de se planejar e obter o melhor resultado possível, ao menor custo e no menor tempo. Isso tanto vale para a administração pública quanto para a iniciativa privada. O Partido Novo não supõe que a gestão publica e a gestão privada sejam semelhantes em tudo. São substancialmente diferentes sob vários aspectos relevantes. Os objetivos predominantemente sociais da administração pública são fundamentalmente diferentes dos objetivos de lucro da iniciativa privada. Mas, ambas podem e devem ser organizadas segundo os seus padrões próprios de eficiência. O que não se pode é aceitar que pela natureza da gestão publica ela deva necessariamente se pautar pelo improviso, por interesses subalternos, pelo desperdício, pela falta de objetividade, pela inversão de prioridades e pelo desprezo do fator tempo.

A segunda abordagem fala sobre a ineficiência do serviço público como forma planejada de desestimular a demanda. Pode ser uma verdade, e as fontes citadas pelo articulista atestam isso. É muito triste que seja assim. Mas, não precisa ser uma verdade definitiva. Pode ser mudada. É imoral racionar a procura do serviço público pelo maltrato a quem dele necessita. Não dá para aceitar que o Estado faça mal feito simplesmente porque se fizer bem feito vai enfrentar maior demanda pelos serviços que deve prestar. Quando se propõe um Partido Novo, é justamente para enfrentar situações como essa, para quebrar paradigmas arcaicos, que exigem uma forma nova de encarar os deveres e possibilidades do Estado e sua gestão.

A terceira razão de descrença no projeto do Partido Novo é fruto de um equívoco. Como citado no site do NOVO, menos de 7% dos fundadores são empresários. Na verdade a grande maioria é formada por profissionais liberais. Um partido efetivamente voltado para o bem comum, e não para projetos pessoais, não pode ser desta ou daquela classe social, desta ou daquela etnia, crença ou região. O Partido Novo só estará consolidado quando tiver em seus quadros de pensamento e militância representantes de todos os segmentos que formam a variada sociedade brasileira e representantes de todas as regiões do país.

O quarto ponto trazido à discussão pelo articulista é a questão da profissionalismo político. O tema coloca em confronto dois valores respeitáveis. Um, é o valor da experiência. Outro e o valor da renovação. No equacionamento desses dois valores, ambos importantes, o que o Partido Novo entende necessário é que se evitem os vícios das estruturas que deixam de satisfazer aos fins para os quais foram concebidas e criadas, para satisfazer às oligarquias que as ocupam. A política, o interesse sadio pela polis, não é efêmero, não é episódico, nem está reduzido a um ou dois mandatos. A participação política deve ser uma constante na vida de todo cidadão. Mas, hoje é pacífico que um prefeito, governador ou presidente não se pode eleger mais de duas vezes seguidas para o mesmo cargo, embora não esteja obrigado a abandonar a vida política após o segundo mandato. Da mesma forma, prega o Partido Novo, o legislador não se deve perpetuar em nenhuma casa legislativa. As acuradas ponderações do articulista sobre os jogos democráticos, e os não tão democráticos, que se praticam nas casas legislativas, seja na formação e condução das comissões, seja no encaminhamento dos projetos de lei, teriam melhores possibilidades de atender ao interesse público se fossem conduzidas sem a preocupação de perpetuar carreiras. É em nome da reeleição e no interesse da permanência no cargo que se fazem muitas das articulações e votações pouco republicanas.

Por último, concordamos , que um partido político independente dos vícios da política que, de modo geral e com honrosas exceções, se pratica no Brasil é uma utopia. Mas, a utopia é que move os homens de boa fé em direção ao horizonte. Utopia não é fantasia. É a realidade possível, em que se acredita. Quem acredita caminha em direção ao horizonte.

Sugerimos ao articulista, se houver interesse, uma consulta ao nosso site (www.novo.org.br) onde certamente as informações serão mais esclarecedoras do que apenas a leitura do artigo na imprensa. Desde já tambem registramos o convite ao articulista, que tendo gostado das ideias, se junte ao NOVO, para elaboração de propostas especificas que possam ser discutidas no momento adequado.