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sexta-feira, 26 de agosto de 2022

A Democracia Mundial Enfraquecida: A Índia e o Mundo - Debasish Roy Chowdhury (Instituto Fernand Braudel, NYT)

A Democracia Mundial Enfraquecida

A Índia e o Mundo 

Por Debasish Roy Chowdhury

Debasish Roy Chowdhury é um jornalista indiano e co-autor de “To Kill a Democracy: India’s Passage to Despotism.”

 

O Primeiro Ministro Narendra Modi ficou, no mês passado, no telhado do novo prédio do Parlamento Indiano quase finalizado, construído para marcar os 75 anos de independência do país, e puxou uma alavanca. Uma comprida cortina vermelha caiu para revelar a estátua que coroa a estrutura. Muitos em toda a Índia engasgaram-se espantados.

 

O ícone de bronze de mais de seis metros - quatro leões sentados com as costas viradas um para o outro, encarando para fora - é o símbolo nacional reverenciado na Índia. As bestas normalmente são representadas como régias e sóbrias, mas essas pareciam diferentes: Suas presas apareciam, elas pareciam bravas, agressivas.

 

Para os críticos do Sr. Modi, a imagem repaginada no topo do Parlamento - um projeto desenvolvido sem debate ou consulta pública - reflete a rosnante “Nova Índia” que ele está criando.

 

Em seus oito anos no poder, o governo do Partido Bharatiya Janata do Sr. Modi profanou a democracia indiana, desposando de um majoritarismo supremacista hindu intolerante acima dos ideais de secularismo, pluralismo, tolerância religiosa e cidadania igualitária sobre os quais o país foi fundado depois de ganhar sua independência em 15 de agosto de 1947.

 

Fazendo comparações com a Alemanha Nazista, o regime usa maquinário governamental cooptado, desinformação e intimidação por turbas partidárias para silenciar críticos enquanto desumaniza a grande minoria Muçulmana, incitando ruptura social e violência. As liberdades civis são sistematicamente violadas.

 

A Índia, a maior democracia do mundo, é onde a batalha mundial entre o liberalismo e a tirania está sendo perdida. Ainda assim, democracias ocidentais como os Estados Unidos recusam-se a convocar o Sr Modi, e no lugar, cortejam-no para manter o acesso ao grande mercado indiano e pela utilidade do país enquanto bastião estratégico contra a China.

 

No ano passado, o Instituto Sueco V-Dem rebaixou a índia para uma “autocracia eleitoral”,  e a Freedom House sediada em Washington a rebaixou para “parcialmente livre”. O rebaixamento da Índia, com seu 1,3 bilhão de pessoas, derrubou o equilíbrio da liberdade global firmemente em favor da tirania, disse a Freedom House, com menos de 20% da população mundial vivendo hoje em países “livres”.

 

Embora a queda da Índia em direção a tirania tenha acelerado sob o governo do Sr. Modi, seria injusto colocar toda a culpa nele. Instituições governamentais enfraquecidas e desigualdade social - problemas que se agravaram desde os primeiros anos da índia - enfraqueceram sua democracia e proveram solo fértil para a democracia hindu enraizar-se.

 

          Apesar da pobreza generalizada, analfabetismo e extrema diversidade étnica, religiosa e social, a Índia abriu caminho, desde a independência, para o que tem sido chamado de democracia “improvável”. Ela adotou uma Constituição progressista, mas também conservou estruturas administrativas coloniais britânicas altamente coloniais que dão aos executivos nacionais e estaduais eleitos controle quase irrestrito sobre as instituições como a polícia e outras agências de cumprimento da lei. Combinado com leis draconianas de segurança e sedição, isso permite que os esses líderes eleitos reduzam a dissidência com impunidade. 

         

          O partido de Modi aprimorou essas ferramentas de repressão, mas não é o primeiro a transformá-las em arma

 

Eu cresci em Bengala Ocidental. Depois da independência, o estado foi liderado pelo Partido do Congresso Nacional, que mobilizou livremente capangas e a polícia para sufocar a oposição. Ele foi sucedido pelo Partido Comunista, que deteve o poder por 34 anos e emasculava totalmente as instituições estatais. Bengala Ocidental agora é governada por um partido cuja líder projeta a si mesma como alternativa nacional ao autoritarismo do Sr. Modi, mas foi acusado de utilizar e confiar na força bruta, comparsas e de culto à personalidade. Essas tendências despóticas há muito se espalham em nível estadual. O próprio Sr. Modi governou o estado ocidental de Gujarat com mão de ferro por quase 13 anos e foi acusado de incentivar protestos anti-muçulmanos em 2002.

 

          O poder arbitrário está enraizado na realidade de que a maioria dos partidos políticos é centrada na personalidade e dinástica, e a Índia é a rara democracia onde partidos políticos não são democráticos e não conduzem eleições internas.

 

          O dinheiro - e muitas vezes as ligações criminosas - tornaram-se fundamentais na política, Legisladores são comprados e vendidos. Muitos estão mal equipados para legislar, e no lugar, carimbam políticas de um alto executivo que muitas vezes está vinculado a interesses específicos que estão muito distantes do povo, como leis agrícolas que provocaram protestos de agricultores até serem revogadas no ano passado.

 

          Mas um obstáculo profundo e muito mais antigo para o desenvolvimento de uma democracia saudável e resiliente tem sido o fracasso histórico da Índia em garantir o bem-estar de seus cidadãos mais pobres. Centenas de milhares de crianças morrem de fome todos os anos, e mais de um terço é atrofiada por questões de desnutrição mesmo quando os bilionários Indianos sobem nas tabelas de riqueza mundiais.

 

          As políticas neoliberais agravam a desigualdade, com o Estado se afastando de responsabilidades fundamentais como saúde e educação. Isso gera uma vida de indignidade e impotência para milhões que se refugiam na identidade de grupo, gravitando ao redor de líderes fortes que prometem defendê-los de outros grupos e facilmente tornam-se viciados no opioide massivo da intolerância religiosa que agora é usado para redefinir a Índia secular como um estado Hindu.

 

          A composição do parlamento já reflete esse majoritarismo. Com 200 milhões, a população muçulmana Indiana é a terceira maior do mundo, depois da Indonésia e do Paquistão, representando cerca de 15% dos indianos. (Hindus representam cerca de 80%.) Mas os Muçulmanos detêm apenas 5% dos assentos parlamentares. O Partido Bharatiya Janata é o primeiro partido do governo nos 75 anos de história da Índia sem um único membro muçulmano do parlamento sequer.

 

          Leis e direitos são aplicados de forma desigual. Muçulmanos agora podem ser presos por rezar em público, enquanto peregrinos hindus são parabenizados por oficiais do estado. o estado celebra a religião Hindu, enquanto protestos são orquestrados contra costumes muçulmanos como o uso do hijab e o chamado à oração. grupos vigilantes hindus atacam muçulmanos e seus negócios.

 

          Um líder de alto escalão do Partido Bharatiya Janata chamou os refugiados Muçulmanos de Bangladesh de “cupins” comendo os recursos do país. Encorajados pelo apoio do estado, extremistas hindus agora ameaçam abertamente o genocídio e o estupro de Muçulmanos, enquanto o governo prende jornalistas que denunciam os atos de ódio. Em 15 de agosto, Dia da Independência, o governo libertou 11 condenados cumprindo penas de prisão perpétua por estuprar uma muçulmana e assassinar 14 membros de sua família durante o pogrom de Gujarat que ocorreu sob o comando de Modi.

 

          Instituições enfraquecidas pouco podem fazer para recuar. O judiciário ineficaz - há um acúmulo de 40 milhões de casos pendentes - gera o desdém popular pelo estado de direito. Antes conhecido por seu ativismo e independência, o alto judiciário agora trabalha principalmente em sintonia com o governo, e os Juízes da Suprema Corte bajulam Modi. A imprensa da Índia, que já prestou um papel fundamental em proteger a democracia, é pressionada a servir o regime.

 

          Aos 75 anos, após décadas de abuso institucional, a democracia indiana é frágil demais para resistir a um homem forte trazendo sua marreta às suas enfraquecidas fundações. Modi chama o parlamento de um “templo da democracia”. Mas as novas premissas da instituição em Nova Delhi são, em vez disso, um monumento à semidemocracia que ele está construindo, uma fachada oca que existe para legitimar o governo autoritário.

 

 

Para ler a notícia original do New York Times, clique no link a seguir: https://www.nytimes.com/2022/08/24/opinion/india-modi-democracy.html

 

terça-feira, 4 de janeiro de 2022

Há uma guerra civil no horizonte dos EUA? - David H. Freedman (Newsweek)

 Newsweek, Nova York – 29.12.2021

Millions of Angry, Armed Americans Stand Ready to Seize Power If Trump Loses in 2024

David H. Freedman

 

Mike Wompus" Nieznany is a 73-year-old Vietnam veteran who walks with a cane from the combat wounds he received during his service. That disability doesn't keep Nieznany from making a living selling custom motorcycle luggage racks from his home in Gainesville, Georgia. Neither will it slow him down when it's time to visit Washington, D.C.—heavily armed and ready to do his part in overthrowing the U.S. government.

Millions of fellow would-be insurrectionists will be there, too, Nieznany says, "a ticking time-bomb" targeting the Capitol. "There are lots of fully armed people wondering what's happening to this country," he says."Are we going to let Biden keep destroying it? Or do we need to get rid of him? We're only going to take so much before we fight back." The 2024 election, he adds, may well be the trigger.

Nieznany is no loner. His political comments on the social-media site Quora received 44,000 views in the first two weeks of November and more than 4 million overall. He is one of many rank-and-file Republicans who own guns and in recent months have talked openly of the need to take down—by force if necessary—a federal government they see as illegitimate, overreaching and corrosive to American freedom.

The phenomenon goes well beyond the growth of militias, which have been a feature of American life at least since the Ku Klux Klan rose to power after the Civil War.Groups like the Proud Boys and the Oath Keepers, which took part in the January 6thriot at the Capitol and may have played organizational roles, have grown in membership. Law enforcement has long tracked and often infiltrated these groups. What Nieznany represents is something else entirely: a much larger and more diffuse movement of more-or-less ordinary people, stoked by misinformation, knitted together by social media and well-armed. In 2020, 17 million Americans bought 40 million guns and in 2021 were on track to add another 20 million. If historical trends hold, the buyers will be overwhelmingly white, Republican and southern or rural.

America's massive and mostly Republican gun-rights movement dovetails with a growing belief among many Republicans that the federal government is an illegitimate tyranny that must be overthrown by any means necessary. That combustible formula raises the threat of armed, large-scale attacks around the 2024 presidential election—attacks that could make the January 6insurrection look like a toothless stunt by comparison. "The idea that people would take up arms against an American election has gone from completely farfetched to something we have to start planning for and preparing for," says University of California, Los Angeles law professor Adam Winkler, an expert on gun policy and constitutional law.

Both Democrats and Republicans are rapidly losing faith in the integrity of U.S. elections. Democrats worry that voter suppression and election interference from Republican state officials will deny millions of Americans their say at the polling booths. A PBS NewsHour/ NPR/ Marist poll in early November reported that 55 percent of Democrats saw voter suppression as the biggest threat to U.S. electionsRepublicans claim, contrary to the evidence, that Democrats have already manipulated vote counts through fraud to steal a presidential election. An October CNN poll found that more than three-quarters of Republicans falsely believe Joe Biden's 2020 election win was fraudulent.

According to the Constitution, Congress and the Supreme Court are supposed to settle those sorts of dueling claims. Given the growing intensity and polarization of political life, would either side accept a decision that handed a contested 2024 election result to the other?

Such a decision would more likely bring tens of millions of protesters and counter-protesters into the streets, especially around the U.S. Capitol and possibly many state capitols, plunging the country into chaos. Although many Democrats might be inclined to demonstrate, a larger percentage of Republican protesters would almost certainly be carrying guns. If the Supreme Court ruling, expected in mid-2022, on New York State Rifle & Pistol Association v. Bruen establishes an unrestricted right to carry a gun anywhere in the country, bringing firearms to the Capitol in Washington, D.C. could be perfectly legal. Says Winkler: "The Supreme Court may be close to issuing the ruling that leads to the overthrow of the U.S. government."

If armed violence erupts the 2024 elections, quelling it could fall to the U.S. military, which may be reluctant to take arms against U.S. citizens. In that case, the fate of the nation might well be decided by a simple fact: a big subset of one of the two parties has for years been systemically arming itself for this very reason.

"I hope it's just too crazy to happen here," says Erica De Bruin, an assistant professor of government at Hamilton College, who studies coups around the world. "But it's now in the realm of the plausible."

Enemy at the Gates

Many Republicans are increasingly coming to see themselves less as citizens represented by the federal government, and more as tyrannized victims of that government. More than three-quarters of Republicans reported "low trust" in the federal government in a Grinnell College national poll in October; only a minority of Democrats agreed. From this point of view, peaceful elections will not save the day. More than two out of three Republicans think democracy is under attack, according to the Grinnell poll, which echoes the results of a CNN poll in September. Half as many Democrats say the same.

Mainstream news publications are filled with howls of protest over political outrages by Republican leaders, who are reflecting the beliefs of the party mainstream. But the small newspapers in the rural, red-state areas that are the core of the Republican party's rank and file are giving voice to a simpler picture: Politics are dead; it's time to fight. "Wake up America!" reads a September opinion piece excoriating Democrats in The Gaston Gazette, based in Gastonia, N.C. "The enemy is at our gates, God willing it is not too late to turn back the rushing tide of this dark regime." The piece goes on to quote Thomas Paine's exhortation to colonists to take up arms against the British. "We are in a civil war," a letter published in September in The New Mexico Sun likewise warns Republicans, "between the traditional Americans and those who want to impose socialism in this country and thus obtain complete government control of its citizens."

Evidence that a significant portion of Republicans are increasingly likely to resort to violence against the government and political opponents is growing. More than 100 violent threats, many of them death threats, were leveled at poll workers and election officials in battleground states in 2020, according to an investigation by Reuters published in September—all those threat-makers whom Reuters could contact identified as Trump supporters. In October 2020, 13 men were charged with plotting to kidnap Michigan Governor Gretchen Whitmer, a Democrat; all of them were aligned with the political right. Nearly a third of Republicans agree that "true American patriots may have to resort to violence in order to save our country," according to a September poll conducted by the Public Religion Research Institute, a non-partisan group. That's three times as many as the number of Democrats who felt the same way.

Guns are becoming an essential part of the equation. "Americans are increasingly wielding guns in public spaces, roused by persons they politically oppose or public decisions with which they disagree," concludes an August article in the Northwestern University Law Review. Guns were plentiful when hundreds of anti-COVID-precaution protestors gathered at the Michigan State Capitol in May 2020. Some of the armed protesters tried to enter the Capitol chamber.

Those who carry arms to a political protest may in theory have peaceful intentions, but there's plenty of reason to think otherwise. An October study from Everytown for Gun Safety and the Armed Conflict Location and Event Data Project (ACLED) looked at 560 protests involving armed participants over an 18-month period through mid-2021, and found that a sixth of them turned violent, and some involved fatalities.

One indication of how far Republicans may be willing to go in violently opposing the government is their sanguine reaction to the January 6 insurrection at the U.S. Capitol. Republicans by and large see no problem with a mob of hundreds swarming and forcing their way into the seat of American government. Half of Republicans said that the mob was "defending freedom," according to a CBS/YouGov poll taken just after the insurrection. Today two-thirds of Republicans have come to deny that it was an attack at all, according to an October survey by Quinnipiac University. "There's been little accountability for that insurrection," says UCLA's Winkler. "The right-wing rhetoric has only grown worse since then."

Most Republican leaders are circumspect when it comes to supporting violence against the government, but not all. Former Milwaukee County Sheriff David Clarke, a controversial character who remains popular among many Republicans, reportedly told an enthusiastic gathering of Trump supporters in October that if and when a "serious" insurrection springs up, "there's very little you're going to be able to do about it."

 

Georgia Representative Marjorie Taylor Greene, another prominent Republican popular with the rank and file, opined that the January 6insurrectionists were simply doing what the Declaration of Independence tells true patriots to do, in that they were trying to "overthrow tyrants." The real threat to democracy, she added, are Black Lives Matter protesters and Democratic "Marxist-communist" agents. Greene and Representative Madison Cawthorn, a Republican from North Carolina, have referred to some of the insurrectionists as "political prisoners."

Trump himself, of course, has nurtured a constant undercurrent of violence among his supporters from the beginning of his first presidential campaign. In 2016 he publicly stated he could shoot someone in the street without losing any of his political support, and he went on to encourage attendees at his rallies to assault protesters and journalists. When demonstrators at a rally in Miami were being dragged away, Trump warned that next time "I'll be a little more violent." At a 2016 rally in Las Vegas, he openly complained to the crowd that security wasn't being rough enough on a protester they were removing. "I'd like to punch him in the face, I'll tell you," he said.

 

Para acessar a íntegra:

https://www.newsweek.com/2021/12/31/millions-angry-armed-americans-stand-ready-seize-power-if-trump-loses-2024-1660953.html