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quinta-feira, 2 de julho de 2020

Minha lista pessoal das não-realizações do chanceler acidental- Paulo Roberto de Almeida

As não-realizações do chanceler acidental


Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: contribuição a um balanço; finalidade: debate público ção]



Preocupado em ser defenestrado do cargo, em virtude de um ano e meio de absoluta ineficiência na gestão do Itamaraty — ao tornar o Brasil um país pária no mundo —, o chanceler acidental ordenou a todas as unidades do Itamaraty que produzissem uma lista sintética de realizações.
Segundo circulou por todas as chefias, o pedido do Gabinete foi para fazer “um balanço de um ano e meio de gestão, com a conclusão de acordos, a eleição para o CDH, a eleição do nosso candidato na OEA, os investimentos dos países do Golfo, o convite para integrar o novo G-7, as repatriações, a reestruturação do Mercosul, acordos automotivos, os acordos com os EUA em tecnologia e defesa, a redução de gastos com fechamento de Embaixadas e vagas no exterior, etc..
O pedido está sendo feito para todas as secretarias.”
A lista não deveria ser exaustiva, mas precisaria conter “só o que foi feito,  muito brevemente”, e finalizava por uma ordem clara: “O pedido é urgentíssimo.”
Pois bem, consciente de que o chanceler acidental reune muito mais não-realizações do que realizações, apresso-me em estabelecer a minha lista, que pode não ser do agrado do dito chanceler, mas tem a vantagem de ser muito mais fiel à realidade do que a sua listinha de invenções altamente exageradas. Vamos a ela:

1.          Uma crença míope de que o “make America Great Again” era um chamamento de Trump para “salvar o Ocidente”;
2.          Uma outra crença beata em que “o Brasil acima de tudo”, era realmente um ato desprendido de patriotismo e não um subterfúgio para colocar à família acima de todos;
3.          Uma terceira crença, mais equivocada ainda, de que foi escolhido para conduzir o “novo Itamaraty” pelos caminhos de Deus e da Virgem Maria, quando o que se esperava desse personagem dotado de uma angústia propriamente kirkegaardiana era apenas submissão absoluta a seus novos mestres e senhores escrupulosos quanto ao controle total de todos os seus atos;
4.          A ilusão ingênua de que todas aquelas noites mal dormidas, na redação febril de textos tresloucados de devoção às novas causas do bolsolavismo lunático — num blog wagnerianamente chamado de “Metapolítica 17: contra o globalismo” —, fossem realmente servir de suporte intelectual a grandes aventuras no campo do “espírito que anda”, quando — com a minha solitária exceção — ninguém ligou a mínima para aqueles textos gongóricos, sem qualquer coerência doutrinal, apenas surrealistas na expressão mais errática da palavra;
5.          A pretensão de ser admirado e aplaudido por frases duramente capturadas no latim, no grego, no alemão e no tupi-guarani, quando aquilo só foi objeto do ridículo, uma vez que a pretensão alegada era a de fazer uma “política externa para o povo”;
6.          A loucura totalmente antidiplomática de querer fundar sua ação à frente do Itamaraty — uma Casa multilateralista por excelência — numa santa cruzada contra o “globalismo”, esse monstro metafísico que parecia encarnar todos os males da modernidade progressista, quando a intenção real era a de proceder a um retrocesso em regra, na direção das pregações místicas de tradicionalistas como René Guénon e de fascistas como Julius Evola, intermediados pelo subsofista da Virgínia, que lhe deu cobertura e patrocínio desde a anunciada adesão a uma inexistente campanha de “salvamento do Ocidente” por um egocêntrico que só pensava em seu país;
7.          Uma deformação caolha dos sentimentos patrióticos de muitos brasileiros, em especial os militares,  transformado em uma defesa de um nacionalismo rastaquera, que limitou o relacionamento antigamente universalista da diplomacia brasileira a uma pequena tribo de outros populistas nacionalistas que também só pensavam limitadamente em seus próprios países, não em qualquer aliança mundial da nova direita;
8.          Uma investida estúpida contra uma inexistente “China maoísta” — superada desde quatro décadas —, seguindo uma outra estúpida concepção de que o gigante asiático queria exportar o regime comunista, não todas as manufaturas produzidas pela maior locomotiva econômica do planeta, e principal compradora de nossas maiores exportações;
9.          Uma vergonhosa diplomacia de submissão automática aos projetos eleitoreiros de Trump — no tocante ao Irã, à China, à Israel e Venezuela— , conformando grave violação de preceitos constitucionais de “independência nacional” e de “não intervenção nos assuntos internos de outros Estados”, no limite da traição aos interesses nacionais e, na prática, levando ao completo isolamento do Brasil na região e no mundo;
10.       Uma absolutamente ridícula postura “anticlimatista”, junto com o antiministro do 1/2 ambiente, que tornou o Brasil um alvo fácil de comentários jocosos nas reuniões do setor, e de desprezo depreciativo por parte da comunidade científica engajada na agenda da sustentabilidade;
11.       Zombarias ainda mais jocosas por parte de sucessores dos perpetradores alemães e de vítimas judaicas do Holocausto quando tentou “provar”, contra as mais comezinhas evidências históricas, que o Nazismo era “de esquerda”, da mesma espécie que o odiado comunismo (que como se sabe encontra-se ativo e dinâmico, materializado inclusive no “comunavirus” dos maoístas chineses);
12.       Uma revolução hierárquica e gerencial no Itamaraty, materializada no afastamento brutal de postos de chefia de experientes embaixadores, colocados sob as ordens de ministros de segunda classe , conformando aquela situação esquizofrênica que os militares chamam de “coronéis mandando em generais”;
13.       Uma outra traição ainda mais grave, escabrosa mesmo, aos princípios e normas que regem o funcionamento do Serviço Exterior, tendente a contratar para cargos de responsabilidade no Itamaraty pessoas de fora do quadro de servidores públicos admitidos por concurso, apenas para contemplar um ou outro fanático da mesma seita dos tradicionalistas, mas — o que é muito pior — totalmente identificados com o serviço a uma potência estrangeira;
14.       Por fim, mas não menos grave, o total descomprometimento com temas relevantes da agenda externa do país em nome da adesão a mistificações ideológicas que se revelam objetivamente prejudiciais aos interesses nacionais concretos do Brasil.

Estas são, resumidamente, as não-realizações do patético chanceler acidental, o diplomata mais inepto e submisso a desígnios estranhos aos interesses nacionais e aos padrões tradicionais de trabalho do Itamaraty que jamais se sentou na cadeira de Rio Branco, para vergonha da quase totalidade do corpo profissional da Casa. A maioria dos diplomatas encontra-se de fato indignada com as aberrações fabricadas em 18 meses de diplomacia esquizofrênico, apenas que intimidada pelos arroubos autoritários do pior chanceler em quase dois séculos de nossa história de serviço exterior de qualidade.
O fato é que o chanceler acidental envergonha o Itamaraty, o governo e o Brasil. Está mais do que na hora de colocar um ponto final à mediocridade operacional e à indigência intelectual de sua desastrosa gestão.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2 de julho de 2020


quarta-feira, 24 de junho de 2020

Guilherme Casarões: sobre a destruição do Itamaraty, pelos mesmos que fazem guerra cultural de extrema direita

Permito-me postar uma série de tuítes do Guilherme Casarões sobre a destruição do Itamaraty pelos olavo-bolsonaristas, fanáticos antiglobalistas, que eu classificaria de demenciais:


Guilherme Casarões
Flag of Brazil

Desinformador profissional certificado pelo chanceler Ernesto Araújo. Professor/pesquisador no resto do tempo. Pai de dois
❤
. RT ≠ endosso. Opiniões pessoais.


24 de Junho de 2020

Conversation
Para onde vai a @FunagBrasil
? A política externa populista de @jairbolsonaro é parte integral da guerra cultural bolsolavista, em que instituições são desmoralizadas, aparelhadas e destruídas. O Itamaraty está sob ataque - e a corrupção da FUNAG faz parte do processo.



1) A destruição da inteligência acumulada pela FUNAG, braço acadêmico do Itamaraty, começou antes mesmo do início do governo. O manual de História do Brasil, do grande @joadani, foi retirado do site, onde poderia ser baixado gratuitamente. O problema do livro? Este parágrafo:


Replying to @GCasaroes
2) A 2ª pancada ocorreu no começo do mandato. @PauloAlmeida53 foi demitido do cargo de diretor do IPRI após republicar expoentes do "deep state" tucano-globalista, Rubens Ricupero e o ex-presidente @FHC. Nem Paulo nem Ricupero escondiam suas discordâncias com o antiglobalismo.



3) Ao longo de 2019, @ernestofaraujo se recusou a publicar 2 livros sobre política externa. O do embaixador Synesio Goes foi vetado por ter o prefácio escrito por Ricupero. O da pesquisadora Mathilde Chatin, barrado graças ao prefácio de Celso Amorim.

Com censura a obras acadêmicas, Araújo ameaça a imagem do próprio Itamaraty
https://t.co/ptfu0NMpfz?amp=1
https://brasilianismo.blogosfera.uol.com.br/2019/08/02/com-censura-a-obras-academicas-araujo-ameaca-a-imagem-do-proprio-itamaraty/

[Abro um parênteses, aqui, para transcrever o que Guilherme Casarões linkou, pois eu ainda não tinha tomado conhecimento dessa matéria, que cita o meu livro de 2019: "Miséria da Diplomacia", livremente disponível em meu blog Diplomatizzando]

Uma reportagem publicada pela Folha revela que o Itamaraty se recusou a publicar um livro do embaixador Synesio Sampaio Goes Filho por conta do prefácio da obra, escrito por Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington e também historiador da diplomacia –e visto como desafeto pelo atual ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.
O caso não é isolado, entretanto, e o clima de revisão e censura também atinge outras obras que passam pelo MRE. Esta tendência cria uma ameaça à imagem de profissionalismo, olhar crítico e independência do Itamaraty no resto do mundo.
Em seu livro mais recente, que não foi publicado pela Funag, o diplomata Paulo Roberto de Almeida cita pelo menos um outro caso em que a censura ocorreu neste ano.
"Uma tese de doutorado defendida no King's College, da Universidade de Londres, por Mathilde Chatin – Brazil: a new powerhouse without military strength? – A conceptual and empirical quest about an emerging economic power –, já aprovada para publicação pelo Conselho Editorial da Funag em 2018 foi congelada definitivamente por incluir um prefácio do ex-ministro Celso Amorim, no cargo durante o período coberto pelo trabalho acadêmico", diz Almeida em "Miséria da Diplomacia: A Destruição da Inteligência no Itamaraty"(Boa Vista: Editora da UFRR, 2019).
A mesma Folha relatou à época que a demissão ocorreu após Almeida republicar, em seu blog pessoal três textos recentes sobre a crise na Venezuela, um assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, outro pelo embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero e o terceiro pelo atual ministro das Relações Exteriores.
Na época, o clima de perseguição dentro do ministério levou à preocupação com o uso mais frequente da censura.
A imposição de censura no Itamaraty, especialmente quando direcionada a obras acadêmicas e de história, aumenta o risco pelo qual vem passando um dos principais ativos da diplomacia brasileira.
Por anos, o Itamaraty foi reconhecido internacionalmente como um dos serviços de política externa mais ativos e competentes do mundo. O profissionalismo e senso crítico dos diplomatas brasileiros são mencionados com frequência por estrangeiros que trabalham com política externa, que elogiam o preparo e conhecimento dos representantes do Brasil. Com a imposição de censura, é possível que o serviço de política externa do Brasil perca parte da sua capacidade crítica, que ajuda a promover esta imagem de competência da presença brasileira no exterior.

[Retomo Guilherme Casarões]:   

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4) Como se não bastassem as censuras, a turma olavista ocupou-se em promover conceitos frágeis, meio conspiratórios, como o novo léxico da política externa brasileira. A construção da "novilíngua" da extrema direita começou com o evento abaixo, em mai/19. http://institutoriobranco.itamaraty.gov.br/artigos/60-noticias/85-funag-e-irbr-promoveram-a-palestra-governanca-global-e-autodeterminacao-popular-de-filipe-g-martins-assessor-especial-do-presidente-da-republica
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5) Em jun/19, um grande evento "internacional" trouxe expoentes da guerra cultural antiglobalista para denunciar George Soros, o STF, Paulo Freire, o @ForodeSaoPaulo, os Illuminati e a Nova Ordem Mundial. À exceção do palestrante americano, todos são orgulhosos alunos do Olavo.

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6) 
fez a abertura do evento, denunciando a "pseudorreligião globalista" a partir de uma leitura torta de Nietzsche e Marx. O ponto mais alto da fala foi a celebração do discurso de 6 MINUTOS de Bolsonaro em Davos, por ter tido a bravura de falar de Deus.


7) Em dez/19, foi a vez do jurista/influencer olavista Evandro Pontes falar sobre as "virtudes do nacionalismo" a partir do livro do filósofo Yoram Hazony, que basicamente opõe o nacionalismo benigno ao totalitarismo da governança global. A construção da novilíngua segue firme.



8) Com o advento da pandemia, a FUNAG passou a realizar seminários virtuais sobre "a conjuntura internacional pós-coronavírus". Evento no mínimo curioso p/um chanceler que, dias antes, problematizou a pandemia de Covid19 como uma questão "terminológica", seguindo o mestre Olavo.


Carlos Malamud: Ernesto Araújo destrói credibilidade da política externa e abala o Itamaraty

Ernesto Araújo destrói credibilidade da política externa e abala o Itamaraty

A gestão de Ernesto Araújo no Itamaraty é vista como desastrosa por analistas e estudiosos de todo o mundo. Araújo retirou o Brasil de fóruns regionais como a Unasul e a Celac, fechou sete embaixadas na África e Caribe e submeteu o país aos EUA. “O país se encontra no maior isolamento diplomático dos últimos 50 anos”, afirma o historiador Carlos Malamud
Ernesto Araújo
Ernesto Araújo (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Sob o governo de Jair Bolsonaro e a gestão de Ernesto Araújo na Chancelaria brasileira, o Itamaraty, uma das mais sólidas instituições do Estado nacional, sofreu um abalo em suas estruturas. Araújo retirou o Brasil de fóruns regionais como a Unasul e a Celac, fechou sete embaixadas na África e no Caribe que haviam sido abertas nos anos Lula-Dilma Rousseff, mudou posições históricas na ONU para alinhar-se aos Estados Unidos, impôs dificuldades em negociações ambientais e privilegiou o relacionamento na Europa com dois países comandados por líderes da extrema direita, aponta reportagem do jornal Valor
“O país se encontra no maior isolamento diplomático dos últimos 50 anos”, afirmou o historiador Carlos Malamud, apontado como um dos 50 intelectuais ibero-americanos mais influentes pela revista espanhola “Esglobal” e hoje pesquisador do Real Instituto Elcano, em Madri. 
Para ele, a boa fama da diplomacia brasileira “está se dilacerando” na Europa e atualmente “seria impensável” ver o Brasil à frente de grandes coalizões de países emergentes em fóruns multilaterais, como ocorreu no passado. 
A destruição da imagem do Brasil está relacionada ao discurso de Ernesto Araújo sobre a questão ambiental, a subordinação do país ao governo de Donald Trump e a postura de Bolsonaro de desleixo em face da pandemia de Covid-19.  
O distanciamento da atual gestão do Itamaraty de posições anteriormente defendidas pela diplomacia brasileira é tanto, que a Associação dos Diplomatas Brasileiros (ADB) manifestou o temor de que representações do país no exterior e seus profissionais passem a ser alvos de ataques, por conta de atitudes como a promessa de mudança da embaixada em Israel para Jerusalém e do apoio ao ataque americano que matou o general iraniano Qassem Soleimani no Iraque. 
A reportagem cita a ironia do diplomata aposentado Roberto Abdenur, ex-embaixador em Washington. Ele diz que o Brasil hoje só tem “três países e meio” como amigos: Israel, Hungria e Polônia. “Meio são os Estados Unidos, porque estamos excessivamente alinhados com as ideias do Trump e antagonizamos com a outra metade, os democratas”, afirmou Abdenur, em um seminário virtual da ADB, na semana passada. Ele vê uma brutal ruptura da atual política externa com o patrimônio diplomático brasileiro. O resultado é o encolhimento da presença do Brasil no plano internacional. 
A gestão de Ernesto Araújo também provocou abalos nas relações internas do ministério, com a instalação de uma "caça às bruxas". 
“O clima é de humilhação e caça às bruxas”, diz o ex-ministro da Cultura e deputado federal Marcelo Calero (Cidadania-RJ), que se licenciou da carreira diplomática para o exercício do mandato. Ele encaminhou ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a proposta de criar uma comissão de acompanhamento externo do Itamaraty. “Moderação e previsibilidade são atributos da própria diplomacia, mas hoje existe uma contaminação pela ideologia, um fanatismo quase místico”, afirma.