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terça-feira, 8 de setembro de 2015

Ditadura militar brasileira: Itamaraty colaborou na espionagem de exilados (OESP)

A matéria traz mais algum complemento de informação e pode servir para ampliar este meu estudo sobre o Itamaraty sob o AI-5, feito alguns anos atrás:
Paulo Roberto de Almeida
“Do alinhamento recalcitrante à colaboração relutante: o Itamaraty em tempos de AI-5” 
In: Oswaldo Munteal Filho, Adriano de Freixo e Jacqueline Ventapane Freitas (orgs.),  
“Tempo Negro, temperatura sufocante": Estado e Sociedade no Brasil do AI-5 
(Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio, Contraponto, 2008; 396 p. ISBN 978-85-7866-002-4; p. 65-89). 
Link no site pessoal: http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/103BrasilAI5.html. 
Disponível em Academia.edu: https://www.academia.edu/5794095/066_Do_alinhamento_recalcitrante_%C3%A0_colabora%C3%A7%C3%A3o_relutante_o_Itamaraty_em_tempos_de_AI-5_2008_.
 Relação de Trabalhos nº 1847.

Itamaraty vigiava exilados antes da queda de Allende
Wilson Tosta
O Estado de S. Paulo, 8/09/2015

Passos dos brasileiros eram monitorados por agentes da ditadura, revelam documentos do extinto Centro de Informações do Exterior
Depois de 42 anos da deposição do governo de Salvador Allende (1908-1973) no Chile, documentos secretos do extinto Centro de Informações do Exterior (CIEx) detalham como agentes da ditadura militar do Brasil vigiavam exilados brasileiros antes do golpe.
Na papelada do Arquivo Nacional, há dados sobre viagens e reuniões dos ativistas. Misturam-se a análises da política local, bastidores da crise e listas de presos – essas, já depois que a ditadura chilena se instalara.
Um dos focos da vigilância do CIEx era a Associação Chileno-Brasileira de Solidariedade (ACBS). Entre os exilados espionados estavam o ex-ministro do Trabalho Almino Affonso, o ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) e hoje senador José Serra (PSDB-SP) e o poeta Thiago de Mello.
Há ainda detalhes de reuniões sociais, políticas ou de caráter cultural, da comunidade de exilados brasileiros e dados sobre o suposto sustento financeiro das organizações formadas por brasileiros no exílio chileno à época.
O CIEx era um braço da comunidade de informações. Funcionava no Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Foi criado em 1966 e operou até os anos 80. Oficialmente, não existia. O CIEx escondeu-se sob outros nomes, insuspeitos. Chamou-se Assessoria de Documentação de Política Exterior (Adoc) e Secretaria de Documentação de Política Exterior (Sedoc). Manteve ligações com o Serviço Nacional de Informações (SNI).
“Em 26 de julho de 1973, às 19h30, no Teatro La Reforma de Santiago do Chile, o refugiado brasileiro Alexandre Manuel Thiago de Mello (“Manduka”) deu um recital de música brasileira de protesto em homenagem à festividade cubana da ‘tomada do Quartel Moncada’, sob o patrocínio de estudantes universitários esquerdistas da Universidade do Chile e da Associação Chileno-Brasileira de Solidariedade (ACBS)”, afirma o Informe 420/73, de 11 de setembro de 1973.
“O recital contou com cerca de 500 assistentes, entre os quais se encontravam o pai do marginado, Amadeu Thiago de Mello, e os asilados brasileiros Almino Affonso, Armando Ziller, José Ferreira cardoso, José Chirico Serra, Theotonio dos Santos, Gerson Gomes, Francisco Whitaker Ferreira, Estevam Strauss, Alaor da Silva Passos, José Maria Rabelo, Arutana Terena Coberio e outros não identificados”, diz.
Outro Informe do CIEx da mesma data, o número 427/73, mostra mais indícios da ação de espiões contra a entidade. “O refugiado brasileiro Antonio Bezerra Baltar, funcionário da Cepal/ONU, deverá regressar a Santiago do Chile, proveniente dos Estados Unidos, através da América Central, trazendo a soma de US$ 25 mil, em dinheiro, para a Associação Chileno-Brasileiro de Solidariedade (ACBS)’ e para o ‘Instituto de Estudos Sociais e Econômicos (IESE)’”, afirma.
Ainda no 11 de setembro, o Informe CIEx número 250/73 focava a ACBS. “Em anexo, fotocópia de documento enviado pelo asilado brasileiro José Ferreira Cardoso, presidente da ACBS, aos representantes do Partido Comunista Brasileiro, Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, Ação Libertadora Nacional, Partido Operário Comunista, ‘PP-1’ e mais dez grupos de asilados e refugiados brasileiros no Chile, no qual propõe uma reunião do ‘conselho’ da ACBS com as respectivas organizações subversivas, com a finalidade de aclarar alguns problemas pendentes entre a ACBS e os referidos grupos”, afirma o texto.
“Esta iniciativa (...) prende-se a pressões oriundas do Comitê de Denúncia à Repressão no Brasil (CDR) através de seu coordenador-geral, Francisco Whitaker Ferreira, no sentido de que dinheiro doado por organizações internacionais à ACBS passe a ser utilizado, exclusivamente, pelo CDR e pela Frente Brasileira de Informações.”
Outro exilado brasileiro cujos passos foram seguidos pelo CIEx foi Gerson Gomes. Identificado como funcionário da ONU, ele teve cópia de seu cartão de identidade distribuído à comunidade de informações em informe, segundo o qual, ele teria viajado à Europa e trazido “uma indeterminada quantia em dólares para atender às atividades subversivas”.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

DIP: os companheiros adorariam ter um...


NESTA DATA
O Departamento de Imprensa e Propaganda é fechado por Getúlio Vargas
O fim do Departamento de Imprensa e Propaganda aconteceu em 25 de maio de 1945.
Opinião e Notícia, 25 de maio, 2014

O Departamento de ImpreNsa e Propaganda (DIP) fora criado mediante a preocupação de Getúlio com o desenvolvimento dos meios de comunicação no país. Com isso, ele via necessidade de controlar, manipular, regular e censurar todas as empresas comunicacionais que atuavam em solo brasileiro. Outro motivo para a criação desse órgão era o de que Vargas chegara ao poder sem nenhum suporte partidário e precisava fortalecer sua imagem perante a massa e disseminar os ideais do Estado Novo.
Com isso, o DIP começou a controlar todos os meios de comunicação existentes no país. Sobre o comando de Lourival Flores, os departamentos de divulgação, radiodifusão, teatro, cinema, turismo e imprensa do órgão tinham como tarefas ordenar, guiar e centralizar a publicidade local e exterior; censurar todos os tipos de empresas e promover eventos patrióticos e exposições. Para melhorar a imagem de Getúlio, foi criado o programa “Hora do Brasil”, o qual transmitia uma série de matéria exaltando as realizações feitas no governo. Além disso, foi incluído em todas as sessões de cinema, antes do filme começar, uma série de documentários em formato de curta-metragem, que ficou conhecido como “Cinejornal Brasileiro”.
O Departamento era visto como um ‘superministério’, por ser de extrema eficácia e de suma importância para Getúlio Vargas. E com tanta influência sobre os meios midiáticos, no dia do aniversário do presidente, 19 de abril, o departamento o intitulou como “Dia do Presidente”, fato que obrigava a imprensa fazer propaganda da ditadura.
A força e o medo que a censura do DIP causava era visto nas redações dos jornais na época. Os jornalistas sempre minimizavam as informações contra Getúlio ou o governo de qualquer forma possível. Caso os agentes do DIP encontrassem algo relativo sobre Vargas, eles tinham autonomia para suspender o fornecimento de papel e até fechar a empresa. As empresas que falavam bem do Getúlio tinham seu espaço publicitário comprado para a implantação da propaganda oficial. O fim do DIP aconteceu em 1945, após o fim da censura feita no jornal O Estado de São Paulo.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Uma visao mais equilibrada do regime militar brasileiro - Daniel Aarao Reis


Em nova obra, professor da UFF analisa a participação da sociedade durante a ditadura e defende a discussão sobre a tradição autoritária brasileira


Por Leonardo Cazes
O Globo, 15/02/2014

No ano em que se completa o cinquentenário do golpe que derrubou o presidente João Goulart da presidência e deu início à ditadura, Daniel Aarão Reis, professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF), defende que é preciso aprofundar o debate sobre as conexões civis do regime militar. Em seu novo livro, “Ditadura e democracia no Brasil” (Zahar), ele avalia algumas das relações entre a sociedade e as Forças Armadas, além de propor uma diferenciação entre ditadura e estado de direito autoritário. Em entrevista ao GLOBO, Aarão Reis diz que, sem o conhecimento e a discussão sobre os fundamentos sociais e históricos da ditadura, não será possível avançar.

Quais as principais mudanças e descobertas, nos últimos dez anos, no campo dos estudos sobre a ditadura militar brasileira?

A grande novidade nessa última década é que se fortaleceu uma corrente crítica à principal tendência da historiografia sobre o período. A história da ditadura que ainda permanece hegemônica no Brasil, encarnada em grande parte pelo Arquivo Nacional e em certa medida pela Comissão Nacional da Verdade, se recusa a considerar a ditadura nas suas complexas relações com a sociedade brasileira. Imagina que a ditadura foi imposta de cima para baixo e enfatiza, quase que exclusivamente, a resistência à ditadura. Ulysses Guimarães, por exemplo, é uma grande figura da resistência democrática, foi chamado de “Senhor Diretas” e presidiu a Constituinte. Mas pouca gente sabe que ele foi um dos líderes da Marcha da Família com Deus pela Liberdade e apoiou o golpe de 1964. Ele fez parte da comissão do Congresso que tentou elaborar o primeiro Ato Institucional, mas os militares não gostaram e assumiram a responsabilidade. A própria CNBB, que exerceu um papel importante na divulgação de violações contra os direitos humanos durante a ditadura, apoiou o golpe. D. Paulo Evaristo Arns era bispo de Petrópolis e foi apoiar as tropas do General Olímpio Mourão Filho que desciam de Minas para o Rio. É preciso estudar as complexas relações que se estabeleceram. Houve muita colaboração, cumplicidade, zigue-zagues. Juscelino Kubitscheck, sobre quem até hoje há suspeitas de que foi assassinado pelos órgãos de segurança, apoiou o golpe, mesmo que com reservas. Ele cabalou o voto para a eleição de Castello Branco no Congresso. Tudo isso é silenciado. Quem sabe, não fala no assunto.

É por isso que no seu livro recém-lançado, “Ditadura e democracia no Brasil”, o senhor enfatiza a participação civil tanto no golpe quanto no regime?

Não é à toa que cada vez mais gente fala em uma ditadura civil-militar, não apenas uma ditadura militar. A noção de uma ditadura militar foi criada logo depois do golpe pelas esquerdas derrotadas. Era um recurso político legítimo na época, porque a gente queria isolar a ditadura. Fingíamos ignorar os apoios que ela tinha no mundo civil e a designávamos de militar. Essa ideia inicial, politicamente legítima, vai sendo incorporada por todos que migram de uma posição de tolerância ou cumplicidade ativa com a ditadura para as oposições. Vai haver uma migração maciça, principalmente a partir de 1973, 74, de líderes do regime e de segmentos sociais que encontraram na expressão “ditadura militar” um verdadeiro bálsamo para absolver e esconder as suas relações. A apoteose desse tipo de perspectiva foi a colocação do marco cronológico do fim da ditadura, que é construído em função de premissas e perspectivas teóricas e políticas. Fixou-se o marco em 1985, na posse de José Sarney. Ora, o Sarney foi homem da ditadura desde o início e uma de suas lideranças, mas essa cronologia ganha coerência porque a ditadura era militar e ele foi o primeiro presidente civil. Se a ditadura fosse entendida como um complexo civil e militar, seria mais problemático colocar esse marco. Creio que, passados tantos anos, embora a resistência à ditadura mereça e continuará merecendo atenção nos nossos debates, essa tendência de rever a história vai crescer. Se você assume esse ponto de vista, apontando os fundamentos sociais e históricos, há áreas incríveis que merecem estudo, como os sindicatos, que tiveram um crescimento gigantesco durante a ditadura.

Description: http://oglobo.globo.com/blogs/arquivos_upload/2014/02/110_144-Capa-DanielAarao.jpgA ditadura sempre esteve muito preocupada em manter uma aparência de legalidade e com a sua legitimidade. Manteve o Congresso Nacional aberto e criou uma nova Constituição em 1967. Por quê?

A ditadura se instaurou em nome da democracia. Essa é uma diferença importante a se fazer entre as ditaduras anteriores e posteriores à Segunda Guerra Mundial. No Estado Novo, o Getúlio não tinha nenhum problema em dizer que aquele regime era autoritário porque a democracia estava muito desprestigiada à época. A União Soviética se desenvolvia a passos gigantescos e não era uma democracia, o nazifascismo aparecia como uma alternativa universal e recusava a democracia. Muitos regimes na Ásia, África e América Latina adotaram formas corporativistas autoritárias, como o Brasil. Já depois da Segunda Guerra, feita em nome da democracia e contra o nazifascismo, era muito mais difícil legitimar um regime contra a democracia. O movimento de 1964 foi feito em defesa da democracia e contra a corrupção. Muitas lideranças políticas que apoiaram o golpe acharam que os militares iam fazer uma intervenção rápida. Cassariam os comunistas, os trabalhistas e as esquerdas mais radicais e abririam caminho para as eleições presidenciais de 1965. O apoio de JK a Castello Branco se insere aí, porque Juscelino era um dos fortes candidatos, assim como Carlos Lacerda e Adhemar de Barros. Esses líderes civis que participam do golpe eram liberais autoritários. Tinham medo de que uma democracia ampla no Brasil incitasse as massas à luta e que isso provocasse uma revolução social no país. A farsa da Constituinte do Castello marca o início do estado de direito autoritário que vai de março de 1967 a dezembro de 1968, com o AI-5.

No livro, o senhor marca uma diferença entre esse estado de direito autoritário e a ditadura propriamente dita. Poderia explicar melhor?

Eu tento fixar um critério para conceituar um governo como ditatorial ou não. O critério que eu coloco é óbvio, o do estado de exceção. É quando o governo faz e desfaz leis a seu bel-prazer, não passando por nenhuma instância de controle nem sendo controlado por nenhuma instância. O governo inventa os meios legais como quer, como a figura jurídica do banimento, criada para permitir a libertação dos 15 presos trocados pelo embaixador americano em 1969. A república entre 1946 e 1964 era um estado de direito autoritário. Quase metade da população não votava porque era analfabeta. Ninguém chama o governo Dutra de ditadura, mas na contagem do PCB, então na ilegalidade, 51 militantes foram mortos em manifestações. No regime militar, a ditadura é reativada em dezembro de 1968, com o AI-5, e segue até 1979. Do governo Figueiredo até 1988, temos um estado de direito autoritário. Na Constituição de 1988, que sem dúvida é a nossa carta mais democrática, ainda subsistem claramente aspectos autoritários, como o direito dos militares intervirem na vida política nacional desde que sejam chamados pelo chefe de um dos três poderes. Isso é de um autoritarismo enorme e foi incluído por pressão dos milicos à época. Poderíamos mencionar outros, como a concentração de poder que cria um presidencialismo de caráter imperial e as medidas provisórias. Desde 1889, quando não tivemos ditaduras, tivemos um estado de direito autoritário no Brasil.

Muito se discute atualmente sobre as heranças da ditadura. Como essa tradição autoritária que o senhor aponta se manifesta hoje?

Uma prática que persiste é a tortura. A tortura foi política de Estado em alguns governos da Primeira República e nas ditaduras do Estado Novo e de 1964. Ela antecedeu e continuou após essas ditaduras e está aí até hoje nas delegacias, nos quartéis. É uma tradição maldita que vem da escravidão. A posição favorável à tortura encontra-se disseminada na sociedade brasileira. O Núcleo de Estudos da Violência da USP, em pesquisa de 2011, apontou que 48,5% dos entrevistados admitiam a tortura em determinados casos. Você pode presumir que esse número é muito maior, pois muita gente não assume essa posição para o pesquisador, mesmo com a garantia do anonimato. Os fundamentos sociais e históricos da ditadura precisam ser discutidos e compreendidos. O autoritarismo permeia toda a sociedade brasileira. De modo nenhum nossa democracia está a salvo de surtos autoritários. A gente viu agora mesmo nas manifestações de 2013 como políticos de diversos partidos se comprometeram com uma repressão desapiedada sobre o movimento. A Polícia Militar mata cotidianamente pessoas no Brasil todo, os índices são demenciais comparados a outros países, e isso está naturalizado. Embora haja críticas muito severas aos black blocs, as críticas à PM são muito moderadas. No Rio, o governador Sérgio Cabral, eleito democraticamente, tentou criar uma estrutura denunciada e repudiada como uma reedição do DOI-Codi, e recuou. Mas o simples fato dele ter proposto é muito simbólico. Sem lidar com a nossa tradição autoritária, as ditaduras não se explicam. O Estado Novo se instaurou em 1937 quase sem resistência e acabou em 1945 em uma transição pelo alto. Em 1964 e em 1979, foi muito parecido. É preciso discutir isso seriamente