O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador holocausto. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador holocausto. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Um judeu antissionista e contra a ocupacao de Israel de territorios palestinos - Marcelo Gruman

Transcrevendo um comentário sincero, independente de quais sejam suas posições. Trata-se de um "intelectual" (ou algo próximo a isso) judeu, que não se sente representado por Israel e que está cançado do vitimismo para justificar o expansionismo israelense.
Paulo Roberto de Almeida

Não em meu nome
Marcelo Gruman (*)
[Recebido em 4/08/2014, de Maurício David]

Na minha adolescência, tive a oportunidade de visitar Israel por duas vezes, ambas na primeira metade da década de 1990. Era estudante de uma escola judaica da zona sul da cidade do Rio de Janeiro. As viagens foram organizadas por instituições sionistas, e tinham por intuito apresentar à juventude diaspórica a realidade daquele Estado formado após o holocausto judaico da Segunda Guerra Mundial, e para o qual todo e qualquer judeu tem o direito de “retornar” caso assim o deseje. Voltar à terra ancestral. Para as organizações sionistas, ainda que não disposto a deixar a diáspora, todo e qualquer judeu ao redor do mundo deve conhecer a “terra prometida”, prestar-lhe solidariedade material ou simbólica, assim como todo muçulmano deve fazer, pelo menos uma vez na vida, a peregrinação a Meca. Para muitos jovens judeus, a visita a Israel é um rito de passagem, assim como para outros o destino é a Disneylândia.

A equivalência de Israel e Disneylândia tem um motivo. A grande maioria dos jovens não religiosos e sem interesse por questões políticas realizam a viagem apenas para se divertir. O roteiro é basicamente o mesmo: visita ao Muro das Lamentações, com direito a fotos em posição hipócrita de reza (já viram ateu rezando?), ao Museu da Diáspora, ao Museu do Holocausto, às Colinas do Golan, ao Deserto do Neguev e a experiência de tomar um chá com os beduínos, ir ao Mar Morto e boiar na água sem fazer esforço por conta da altíssima concentração de sal, a “vivência” de alguns dias num dos kibutzim ainda existentes em Israel e uma semana num acampamento militar, onde se tem a oportunidade de atirar com uma arma de verdade. Além, é claro, da interação com jovens de outros países hospedados no mesmo local. Para variar, brasileiros e argentinos, esquecendo sua identidade étnica comum, atualizavam a rivalidade futebolística e travavam uma guerra particular pelas meninas. Neste quesito, os argentinos davam de goleada, e os brasileiros ficavam a ver navios.

Minha memória afetiva das duas viagens não é das mais significativas. Aparte ter conhecido parentes por parte de mãe, a “terra prometida” me frustrou quando o assunto é a construção de minha identidade judaica. Achei os israelenses meio grosseiros (dizem que o “sabra”, o israelense “da gema”, é duro por natureza), a comida é medíocre (o melhor falafel que comi até hoje foi em Paris...), é tudo muito árido, a sociedade é militarizada, o serviço militar é compulsório, não existe “excesso de contingente”. A memória construída apenas sobre o sofrimento começava a me incomodar.

Nossos guias, jovens talvez dez anos mais velhos do que nós, andavam armados, o motorista do ônibus andava armado. Um dos nossos passeios foi em Hebron, cidade da Cisjordânia, em que a estrada era rodeada por telas para contenção das pedras atiradas pelos palestinos. Em momento algum os guias se referiram àquele território como “ocupado”, e hoje me envergonho de ter feito parte, ainda que por poucas horas, deste “finca pé” em território ilegalmente ocupado. Para piorar, na segunda viagem quebrei a perna jogando basquete e tive de engessá-la, o que, por outro lado, me liberou da experiência desagradável de ter de apertar o gatilho de uma arma, exatamente naquela semana íamos acampar com o exército israelense.

Sei lá, não me senti tocado por esta realidade, minha fantasia era outra. Não encontrei minhas raízes no solo desértico do Negev, tampouco na neve das colinas do Golan. Apesar disso, trouxe na bagagem uma bandeira de Israel, que coloquei no meu quarto. Muitas vezes meu pai, judeu ateu, não sionista, me perguntou o porquê daquela bandeira estar ali, e eu não sabia responder. Hoje eu sei por que ela NÃO DEVERIA estar ali, porque minha identidade judaica passa pela Europa, pelos vilarejos judaicos descritos nos contos de Scholem Aleichem, pelo humor judaico característico daquela parte do mundo, pela comida judaica daquela parte do mundo, pela música klezmer que os judeus criaram naquela parte do mundo, pelas estórias que meus avós judeus da Polônia contavam ao redor da mesa da sala nos incontáveis lanches nas tardes de domingo.

Sou um judeu da diáspora, com muito orgulho. Na verdade, questiono mesmo este conceito de “diáspora”. Como bem coloca o antropólogo norte-americano James Clifford, as culturas diaspóricas não necessitam de uma representação exclusiva e permanente de um “lar original”. Privilegia-se a multilocalidade dos laços sociais. Diz ele:

As conexões transnacionais que ligam as diásporas não precisam estar articuladas primariamente através de um lar ancestral real ou simbólico (...). Descentradas, as conexões laterais [transnacionais] podem ser tão importantes quanto aquelas formadas ao redor de uma teleologia da origem/retorno. E a história compartilhada de um deslocamento contínuo, do sofrimento, adaptação e resistência pode ser tão importante quanto a projeção de uma origem específica.

Há muita confusão quando se trata de definir o que é judaísmo, ou melhor, o que é a identidade judaica. A partir da criação do Estado de Israel, a identidade judaica em qualquer parte do mundo passou a associar-se, geográfica e simbolicamente, àquele território. A diversidade cultural interna ao judaísmo foi reduzida a um espaço físico que é possível percorrer em algumas horas. A submissão a um lugar físico é a subestimação da capacidade humana de produzir cultura; o mesmo ocorre, analogamente, aos que defendem a relação inexorável de negros fora do continente africano com este continente, como se a cultura passasse literalmente pelo sangue. O que, diga-se de passagem, só serve aos racialistas e, por tabela, racistas de plantão. Prefiro a lateralidade de que nos fala Clifford.

Ser judeu não é o mesmo que ser israelense, e nem todo israelense é judeu, a despeito da cidadania de segunda classe exercida por árabes-israelenses ou por judeus de pele negra discriminados por seus pares originários da Europa Central, de pele e olhos claros. Daí que o exercício da identidade judaica não implica, necessariamente, o exercício de defesa de toda e qualquer posição do Estado de Israel, seja em que campo for.
Muito desta falsa equivalência é culpa dos próprios judeus da “diáspora”, que se alinham imediatamente aos ditames das políticas interna e externa israelense, acríticos, crentes de que tudo que parta do Knesset (o parlamento israelense) é “bom para os judeus”, amém. Muitos judeus diaspóricos se interessam mais pelo que acontece no Oriente Médio do que no seu cotidiano. Veja-se, por exemplo, o número ínfimo de cartas de leitores judeus em jornais de grande circulação, como O Globo, quando o assunto tratado é a corrupção ou violência endêmica em nosso país, em comparação às indefectíveis cartas de leitores judeus em defesa das ações militaristas israelenses nos territórios ocupados. Seria o complexo de gueto falando mais alto?

Não preciso de Israel para ser judeu e não acredito que a existência no presente e no futuro de nós, judeus, dependa da existência de um Estado judeu, argumento utilizado por muitos que defendem a defesa militar israelense por quaisquer meios, que justificam o fim. Não aceito a justificativa de que o holocausto judaico na Segunda Guerra Mundial é o exemplo claro de que apenas um lar nacional única e exclusivamente judaico seja capaz de proteger a etnia da extinção.

A dor vivida pelos judeus, na visão etnocêntrica, reproduzida nas gerações futuras através de narrativas e monumentos, é incomensurável e acima de qualquer dor que outro grupo étnico possa ter sofrido, e justifica qualquer ação que sirva para protegê-los de uma nova tragédia. Certa vez, ouvi de um sobrevivente de campo de concentração que não há comparação entre o genocídio judaico e os genocídios praticados atualmente nos países africanos, por exemplo, em Ruanda, onde tutsis e hutus se digladiaram sob as vistas grossas das ex-potências coloniais. Como este senhor ousa qualificar o sofrimento alheio? Será pelo número mágico? Seis milhões? O genial Woody Allen coloca bem a questão, num diálogo de Desconstruindo Harry (tradução livre):

- Você se importa com o Holocausto ou acha que ele não existiu?

- Não, só eu sei que perdemos seis milhões, mas o mais apavorante é saber que recordes são feitos para serem quebrados.

O holocausto judaico não é inexplicável, e não é explicável pela maldade latente dos alemães. Sem dúvida, o componente antissemita estava presente, mas, conforme demonstrado por diversos pensadores contemporâneos, dentre os quais insuspeitos judeus (seriam judeus antissemitas Hannah Arendt, Raul Hilberg e Zygmunt Bauman?), uma série de características do massacre está relacionada à Modernidade, à burocratização do Estado e à “industrialização da morte”, sofrida também por dirigentes políticos, doentes mentais, ciganos, eslavos, “subversivos” de um modo geral. Práticas sociais genocidas, conforme descritas pelo sociólogo argentino Daniel Feierstein (outro judeu antissemita?), estão presentes tanto na Segunda Guerra Mundial quanto durante o Processo de Reorganização Nacional imposto pela ditadura argentina a partir de 1976. Genocídio é genocídio, e ponto final.

A sacralização do genocídio judaico permite ações que vemos atualmente na televisão, o esmagamento da população palestina em Gaza, transformada em campo de concentração, isolada do resto do mundo. Destruição da infraestrutura, de milhares de casas, a morte de centenas de civis, famílias destroçadas, crianças torturadas em interrogatórios ilegais conforme descrito por advogados israelenses. Não, não são a exceção, não são o efeito colateral de uma guerra suja. São vítimas, sim, de práticas sociais genocidas, que visam, no final do processo, ao aniquilamento físico do grupo.

Recuso-me a acumpliciar-me com esta agressão. O exército israelense não me representa, o governo ultranacionalista não me representa. Os assentados ilegalmente são meus inimigos.

Eu, judeu brasileiro, digo: ACABEM COM A OCUPAÇÃO!!!

(*) Marcelo Gruman é antropólogo.

Referências bibliográficas:
CLIFFORD, James. (1997). Diasporas, in Montserrat Guibernau and John Rex (Eds.) The Ethnicity Reader: Nationalism, Multiculturalism and Migration, Polity Press, Oxford

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Um Hitchcock para um terror mais que real: o nazista, das exterminacoes nos campos de concentracao

Cinema

Documentário esquecido de Hitchcock sobre Holocausto é restaurado

O cineasta Alfred Hitchcock
O cineasta Alfred Hitchcock (AP)
Um documentário de Alfred Hitchcock sobre os campos de concentração nazistas, rodado em 1945, será projetado pela primeira vez na íntegra, após ser restaurado pelo Imperial War Museum, de Londres.
O cineasta se envolveu no projeto em 1945, depois que seu amigo Sydney Bernstein pediu ajuda para editar um documentário sobre as atrocidades cometidas pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O conteúdo das imagens feitas por operadores de câmera da Unidade de Cinema do Exército Britânico, enquanto as tropas aliadas libertavam os judeus dos campos de concentração, "horrorizaram" e atraíram o criador de Vertigem e Os Pássaros. O diretor, reconhecido como o "mestre do suspense", ficou tão chocado com as gravações que se afastou dos estúdios Pinewood por uma semana.
Toby Haggith, curador do Departamento de Pesquisas do Imperial War Museum (Museu de Guerra Imperial, em tradução direta), afirmou ao jornal britânico The Independent que o documentário terminou deixado de lado devido ao choque sofrido por Hitchcock e à fragilidade da situação política de então. O desejo aliado de não irritar a Alemanha derrotada, que americanos, russos, ingleses e franceses passaram a controlar, levou ao esquecimento cinco dos seis rolos cinematográficos do filme, que terminaram nos arquivos do museu.
Nos anos 1980, as imagens foram descobertas por um pesquisador americano e, em 1984, uma versão incompleta do documentário foi projetada no Festival de Cinema de Berlim. Um ano depois, a mesma cópia foi exibida nos Estados Unidos sob o título Memória dos Campos, mas com má qualidade e sem incluir o sexto rolo.
Agora, há planos para que o filme seja projetado no final de 2014 em uma versão restaurada pelo museu londrino. A decisão de ressuscitar esse documentário deve provocar um debate, pois inclui imagens realmente impactantes dos campos, em particular de Belsen-Berger. 
(Com agência EFE)
Before Hollywood dubbed him the "Master of Suspense," Alfred Hitchcock made anti-Nazi propaganda films for the British Ministry of Information. Some of his work from that period, including "Foreign Correspondent" (1940) and "Saboteur" (1942), enjoyed wide release, but two of the films -- "Bon Voyage" (1944) and "Aventure Malgache" (1944) -- were deemed by ministry officials "too subversive" to serve the allied cause and remained in storage until the 1990s.
Now another of his long-forgotten propaganda films -- perhaps the most disturbing -- is set to make its worldwide debut. The Imperial War Museum announced Wednesday that it had digitally restored and re-edited a nearly 70-year-old Holocaust documentary that Hitchcock worked on with Sidney Bernstein, the film chief of Britain's Psychological Warfare Division. The film has never been publicly screened in its entirety.
Toby Haggith, a senior curator at the Imperial War Museum and one of the people responsible for reviving the film, told the Independent that "colleagues, experts, and film historians" who had pre-screened the movie were profoundly disturbed by it. "One of the common remarks was that it was both terrible and brilliant at the same time," he said.
The film consists of footage captured inside concentration camps by Army videographers at the end of World War II. As the story goes, Hitchcock found the footage so horrific, he refused to return to the studio for a week after first screening it. When he finally did come back, he worked with Bernstein to give the film a cinematic treatment that would set it apart from conventional newsreel documentaries from the period.
The project was meant to be a British-American collaboration and the film was to have three versions, according to documents drafted by Bernstein: one for Germans living in Germany, one for German prisoners of war, and one for Allied audiences. The German versions were intended to remind "the German people of their past acquiescence in the perpetration of [war] crimes" and encourage them to take responsibility for those crimes.
It's not clear how much Hitchcock contributed to the film. He certainly didn't oversee any of the filming -- but he helped Bernstein order and set the mood of the piece. One of his major contributions, according to Bernstein, was situating the atrocities of the Holocaust within a familiar, pastoral setting, the proximity of which would shock audiences. A 2011 article in the journalArcadia argued that the auteur's influence is "clear already in the beginning of the film when images of an idyllic countryside create, in light of the horror to come, a kind of vintage Hitchcockian suspense."
The project was abandoned for a number of reasons. The production ended up taking much longer than expected due to myriad logistical challenges. The U.S. Department of War and its collaborators, impatient to produce a short, to-the-point atrocity film, pulled out in light of these delays to make their own movie, "Death Mills." After hostilities ended in May 1945, the psychological warfare office was dissolved, leaving the film in the hands of the British Ministry of Information. By 1946, official demand for atrocity films had diminished in response to the changing political climate. A note (documentedhere) to Bernstein from an official at the Foreign Office highlighted some of the challenges to completing the film: "Policy at the moment in Germany is entirely in the direction of encouraging, stimulating, and interesting the Germans out of their apathy and there are people around the [regional commander] who will say 'No atrocity film.'"
Eventually, Bernstein, too, abandoned the film. Comprising six reels, the documentary lay forgotten in government archives until the 1980s, when they were discovered by a researcher. Shortly thereafter, PBS aired a version of the documentary made up of the first five reels and some additional Russian footage used in previous Holocaust films.
The digitally remastered version of the film to be released by Imperial War Museum next year will include all six reels, edited in a the way "that Hitchcock, Bernstein, and the other collaborators intended."
But will the footage leave contemporary audiences as traumatized as it left Hitchcock?

terça-feira, 25 de junho de 2013

Aristides Souza Mendes: o homem que salvou judeus e desobedeceu a Salazar

E pagou caro pela sua rebeldia, aliás, um gesto de dignidade moral, ao salvar judeus perseguidos pelo nazismo. Como no caso de Souza Dantas, o embaixador brasileiro em Paris que também desobedeceu ordens da Secretaria de Estado, Aristides Souza Mendes foi ostracizado e viveu seus últimos anos na miseria.
Leiam a matéria do Mundo Português, neste link:

http://www.mundoportugues.org/uploads/ed-digital/28jun/bra/mp/files/assets/downloads/publication.pdf

domingo, 3 de março de 2013

Holocausto nazista: bem mais extenso do que o conhecido (NYT)

News Analysis

The Holocaust Just Got More Shocking


United States Holocaust Memorial Museum/Collection of Eugenia Hochberg Lanceter
A group of Jewish women at the entrance to the Brody ghetto in Eastern Galicia, 1942. The sign is written in German, Ukrainian and Polish.




THIRTEEN years ago, researchers at the United States Holocaust Memorial Museum began the grim task of documenting all the ghettos, slave labor sites, concentration camps and killing factories that the Nazis set up throughout Europe.
Multimedia
What they have found so far has shocked even scholars steeped in the history of the Holocaust.
The researchers have cataloged some 42,500 Nazi ghettos and camps throughout Europe, spanning German-controlled areas from France to Russia and Germany itself, during Hitler’s reign of brutality from 1933 to 1945.
The figure is so staggering that even fellow Holocaust scholars had to make sure they had heard it correctly when the lead researchers previewed their findings at an academic forum in late January at the German Historical Institute in Washington.
“The numbers are so much higher than what we originally thought,” Hartmut Berghoff, director of the institute, said in an interview after learning of the new data.
“We knew before how horrible life in the camps and ghettos was,” he said, “but the numbers are unbelievable.”
The documented camps include not only “killing centers” but also thousands of forced labor camps, where prisoners manufactured war supplies; prisoner-of-war camps; sites euphemistically named “care” centers, where pregnant women were forced to have abortions or their babies were killed after birth; and brothels, where women were coerced into having sex with German military personnel.
Auschwitz and a handful of other concentration camps have come to symbolize the Nazi killing machine in the public consciousness. Likewise, the Nazi system for imprisoning Jewish families in hometown ghettos has become associated with a single site — the Warsaw Ghetto, famous for the 1943 uprising. But these sites, infamous though they are, represent only a minuscule fraction of the entire German network, the new research makes painfully clear.
The maps the researchers have created to identify the camps and ghettos turn wide sections of wartime Europe into black clusters of death, torture and slavery — centered in Germany and Poland, but reaching in all directions.
The lead editors on the project, Geoffrey Megargee and Martin Dean, estimate that 15 million to 20 million people died or were imprisoned in the sites that they have identified as part of a multivolume encyclopedia. (The Holocaust museum has published the first two, with five more planned by 2025.)
The existence of many individual camps and ghettos was previously known only on a fragmented, region-by-region basis. But the researchers, using data from some 400 contributors, have been documenting the entire scale for the first time, studying where they were located, how they were run, and what their purpose was.
The brutal experience of Henry Greenbaum, an 84-year-old Holocaust survivor who lives outside Washington, typifies the wide range of Nazi sites.
When Mr. Greenbaum, a volunteer at the Holocaust museum, tells visitors today about his wartime odyssey, listeners inevitably focus on his confinement of months at Auschwitz, the most notorious of all the camps.
But the images of the other camps where the Nazis imprisoned him are ingrained in his memory as deeply as the concentration camp number — A188991 — tattooed on his left forearm.
In an interview, he ticked off the locations in rapid fire, the details still vivid.
First came the Starachowice ghetto in his hometown in Poland, where the Germans herded his family and other local Jews in 1940, when he was just 12.
Next came a slave labor camp with six-foot-high fences outside the town, where he and a sister were moved while the rest of the family was sent to die at Treblinka. After his regular work shift at a factory, the Germans would force him and other prisoners to dig trenches that were used for dumping the bodies of victims. He was sent to Auschwitz, then removed to work at a chemical manufacturing plant in Poland known as Buna Monowitz, where he and some 50 other prisoners who had been held at the main camp at Auschwitz were taken to manufacture rubber and synthetic oil. And last was another slave labor camp at Flossenbürg, near the Czech border, where food was so scarce that the weight on his 5-foot-8-inch frame fell away to less than 100 pounds.
By the age of 17, Mr. Greenbaum had been enslaved in five camps in five years, and was on his way to a sixth, when American soldiers freed him in 1945. “Nobody even knows about these places,” Mr. Greenbaum said. “Everything should be documented. That’s very important. We try to tell the youngsters so that they know, and they’ll remember.”
The research could have legal implications as well by helping a small number of survivors document their continuing claims over unpaid insurance policies, looted property, seized land and other financial matters.
“HOW many claims have been rejected because the victims were in a camp that we didn’t even know about?” asked Sam Dubbin, a Florida lawyer who represents a group of survivors who are seeking to bring claims against European insurance companies.
Dr. Megargee, the lead researcher, said the project was changing the understanding among Holocaust scholars of how the camps and ghettos evolved.
As early as 1933, at the start of Hitler’s reign, the Third Reich established about 110 camps specifically designed to imprison some 10,000 political opponents and others, the researchers found. As Germany invaded and began occupying European neighbors, the use of camps and ghettos was expanded to confine and sometimes kill not only Jews but also homosexuals, Gypsies, Poles, Russians and many other ethnic groups in Eastern Europe. The camps and ghettos varied enormously in their mission, organization and size, depending on the Nazis’ needs, the researchers have found.
The biggest site identified is the infamous Warsaw Ghetto, which held about 500,000 people at its height. But as few as a dozen prisoners worked at one of the smallest camps, the München-Schwabing site in Germany. Small groups of prisoners were sent there from the Dachau concentration camp under armed guard. They were reportedly whipped and ordered to do manual labor at the home of a fervent Nazi patron known as “Sister Pia,” cleaning her house, tending her garden and even building children’s toys for her.
When the research began in 2000, Dr. Megargee said he expected to find perhaps 7,000 Nazi camps and ghettos, based on postwar estimates. But the numbers kept climbing — first to 11,500, then 20,000, then 30,000, and now 42,500.
The numbers astound: 30,000 slave labor camps; 1,150 Jewish ghettos; 980 concentration camps; 1,000 prisoner-of-war camps; 500 brothels filled with sex slaves; and thousands of other camps used for euthanizing the elderly and infirm, performing forced abortions, “Germanizing” prisoners or transporting victims to killing centers.
In Berlin alone, researchers have documented some 3,000 camps and so-called Jew houses, while Hamburg held 1,300 sites.
Dr. Dean, a co-researcher, said the findings left no doubt in his mind that many German citizens, despite the frequent claims of ignorance after the war, must have known about the widespread existence of the Nazi camps at the time.
“You literally could not go anywhere in Germany without running into forced labor camps, P.O.W. camps, concentration camps,” he said. “They were everywhere.”

Eric Lichtblau is a reporter for The New York Times in Washington and a visiting fellow at the United States Holocaust Memorial Museum.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Memoria das vitimas do Holocausto: defender a dignidade humana e a verdade por vezes custa caro...

Apenas um trecho de matéria da Confederação Israelita do Brasil (Conib), em parceria com a Associação Cultural Israelita de Brasília,  na cerimônia do Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto, no dia 30 de janeiro de 2013, em Brasília:

Na solenidade promovida (...) foi também prestada uma homenagem a Aracy Guimarães Rosa, funcionária do consulado em Hamburgo, e Luis Martins de Souza Dantas, embaixador brasileiro na França, que, nas décadas de 1930 e 1940, salvaram centenas de judeus, ao obter vistos para o Brasil contrariando ordens do governo Getúlio Vargas.

Pois é, às vezes é preciso contrariar ordens superiores para manter a dignidade...

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Negacionistas do Holocausto sao cegos voluntarios (alem de idiotas, claro)

Tem muita gente (bem não sei exatamente quantos, mas acredito que, independentemente de tendências pró-nazistas, sempre tem cegos voluntários) que prefere acreditar que não houve algo chamado Holocausto, e que tudo não passa de "propaganda judia", ou algo equivalente.
As informações são, no entanto abundantes, para comprovar a materialidade dos fatos, algo que nem precisava estar em linha de discussão, tamanhas são as evidências das barbáries nazistas.
Abaixo, duas fontes adicionais:

Foi publicada a segunda parte da Enciclopédia do Holocausto em português:
http://www.ushmm.org/museum/exhibit/focus/portuguese/

Um álbum sobre o extermínio de judeus em Auschwitz-Birkenau:
Um álbum memorializa a chegada de judeus húngaros em Auschwitz, em maio de 1944. É o único de sua espécie, e é somente devido a este álbum que nós, hoje em dia, temos uma história visual do que ocorreu nos campos de extermínio de Auschwitz-Birchenau. O álbum foi descoberto após a guerra por um sobrevivente de Auschwitz, Lily Jacob, que o doou, em 1980, ao Yad Vashem, o memorial oficial de Israel para lembrar as vítimas judaicas do Holocausto. Agora, com a ajuda da Internet, este álbum pode ser visto por milhões de pessoas, em qualquer lugar do mundo:
http://www1.yadvashem.org/exhibitions/album_Auschwitz/mutimedia/index.html

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Holocausto e os negacionistas: apenas mais algumas provas

Negacionistas são gente ou absolutamente odiosa -- pois que empenhada em negar o que sabem que ocorreu -- ou sumamente estúpidas -- que cultivam a ignorância ativamente.
Eles costumam dizer que os campos de concentração serviam para desinfecção de doentes (piolhos, tifo, etc.).

Os próprios alemães, como nesta matéria da revista Spiegel, podem testemunhar:
Tem uma galeria de fotos no link abaixo.

HISTORY OF THE HOLOCAUST
------------------------

Auschwitz Oven Factory Reopens as a Memorial
For years, the site was left to crumble and decay. But now, following
extensive renovation, the factory where the Auschwitz ovens were
designed and built has reopened as a memorial. It shows the intimate
involvement of German industry in the mass murder of the Holocaust.

http://www.spiegel.de/international/germany/0,1518,742013,00.html#ref=nlint

History of the Holocaust
Auschwitz Oven Factory Reopens as a Memorial
Photo Gallery: 5 Photos

For years, the site was left to crumble and decay. But now, following extensive renovation, the factory where the Auschwitz ovens were designed and built has reopened as a memorial. It shows the intimate involvement of German industry in the mass murder of the Holocaust.

For years, the site was little more than a typical industrial ruin -- the kind of modernist decay that became synonymous with Eastern Europe after the collapse of communism. The crumbling buildings just outside the city center of Erfurt were fenced off and left to the squatters who made the complex their home.

But ever since the company which owned the plant went bankrupt in 1994, historians have had their eyes on the location. Its history, after all, is intimately tied with the darkest chapter of Germany's past. The factory once belonged to Topf & Söhne, the company which supplied the Nazis with the ovens used at Auschwitz and other death camps to cremate Holocaust victims.
And on Thursday, after years of planning, a memorial exhibit in the former administration building opened its doors -- just in time for Jan. 27, Holocaust Remembrance Day.

"Nowhere else in Europe is the involvement of industry in the Nazis' machinery of death as visible as it is in the company in Erfurt," Rikola-Gunnar Lüttgenau told the German news agency DPA on Tuesday.

Systematic Mass Murder

The exhibit describes how Topf & Söhne, which began life in 1878 as a specialist for industrial ovens, brewing equipment and chimneys, soon became a leading manufacturer of crematoriums. The SS first commissioned crematorium ovens from the company in 1939 for concentration camps in Dachau, Buchenwald and Flossenbürg.

Once the Nazis embarked on the systematic mass murder of Jews, Gypsies and others, however, the SS needed much greater capacity. Soon, Topf & Söhne engineers set to work calculating the most efficient method to burn thousands of dead bodies. In 1942, company engineer Fritz Sander applied for a patent for a "continually operating corpse incinerator for mass use."

The company also designed ventilation systems to pump poison gas out of the gas chambers once the killing was complete -- and Topf & Söhne employees visited Auschwitz and other camps to help install their products. Ultimately, the company equipped Auschwitz with ovens capable of incinerating 8,000 bodies each day.

"The company was not a place where people were tortured or murdered," memorial head Annegret Schüle told DPA. "Rather it is a place where people thought and calculated how to incinerate as quickly and effectively as possible."

'Always Glad to Serve You'

Topf & Söhne's complicity with the Holocaust was largely ignored and then forgotten following World War II. CEO Ludwig Topf committed suicide once the war ended and several employees, including Sander, were arrested by the Soviets and sentenced to 25 years of hard labor. It was only in the mid-1990s that interest in the company's World War II activities began to gain momentum. Ultimately the state government of Thuringia and the federal government in Berlin provided €600,000 for the creation of a memorial on the site.

Documents now on display in the newly refurbished factory administration building clearly illustrate the pride the company took in the services it provided to the Nazi killing machine. Original drawings are part of the exhibition as are drafting tables where the ovens were designed.
Hundreds of urns made by Topf & Söhne to hold the ashes of deceased Buchenwald inmates are also presented. The urns were found in 1997 during work on the roof of the crematorium at the Buchenwald concentration camp memorial. Early in the Nazis' reign of terror, ashes of deceased concentration camp prisoners were sent back to their home towns for burial. Later, the ashes were stored on site. Once the Holocaust got under way in earnest, however, the ashes were simply dispersed or buried.

Visitors to the new exhibition are greeted with the sentence: "Always glad to serve you." It was taken from a letter from Topf & Söhne to the management of the Auschwitz death camp.

cgh -- with wire reports

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Idiotas existem: tento não falar deles, mas eles aparecem, assim de repente...

Algumas pessoas já reclamaram deste blog, ou deste blogueiro, por se referir ocasionalmente a certas pessoas como sendo "idiotas". Compreendo, embora não admita.
Ou seja, entendo que algumas almas sensíveis, algumas pessoas cordatas, se sintam chocadas ao lerem uma acusação assim brutal, embora eu sempre tenha dito que estou atacando as ideias defendidas por essas pessoas, não elas mesmas, a quem, diga-se, eu sequer conheço.
Pode até ser que para outras coisas, para as coisas normais da vida, digamos assim, elas não sejam idiotas, do contrário dificilmente teriam conseguido ter "ideias" repercutidas em meios mais vastos, terminando por me encontrar no vasto espaço cibernético.
Como eu leio um pouco de tudo, entre imprensa escrita, falada, visualizada e transmitida em redes, sou mais suscetível de tropeçar com "ideias idiotas", transmitidas por pessoas que eventualmente, na vida normal, não o são.
Prometi, portanto, aos mais sensíveis, não mais chamar os outros de idiotas, e de apenas referir-me às suas ideias, quando eles as têm...
Mas, o que posso fazer quando os idiotas cruzam, asi no más, na "sua" frente, como quem não quer nada, surgindo, justamente, do nada para oferecer ideias idiotas ao resto da humanidade?
Difícil não chamar um indivíduo assim de outra coisa que não um idiota.
É o caso, por exemplo, desse "historiador" -- nada justifica o título -- britânico, que tenta provar que o Holocausto não existiu.
Ademais do aspecto criminoso -- em alguns países -- em veicular tais "ideias", existe também o lado da idiotice mental, evidente numa pessoa com tais "argumentos".
Devo dizer, por sinal, que sou contra a criminalização de tipo de atitude: desde que a pessoa não incite à perseguição, à violência racial, à discriminação ativa, ao ódio entre etnias, desde que suas ideias não provoquem tumultos, vítimas, violência, creio que todo cidadão tem o direito de expressar toda e qualquer ideia, mesmo as mais idiotas.
Eles se expõem, assim, a serem ridicularizados, inclusive por mim, que tenho todo um programa de detecção e denúncia de ideias idiotas.
Com vocês a matéria do Le Monde sobre um idiota consumado.
Paulo Roberto de Almeida

Une association polonaise porte plainte contre le négationniste britannique David Irving
Le Monde, avec AFP, 21.09.2010

Entrée du camp de concentration d'Auschwitz

AFP/VALERY HACHE

Une association polonaise Otwarta Rzeczpospolita (République ouverte) a porté plainte contre l'historien négationniste britannique David Irving qui a annoncé sa visite en Pologne. Selon un communiqué publié sur le site Internet de l'association, l'historien a commis le "crime" [de négationnisme] en tentant de minimiser les atrocités nazies et d'exonérer Adolf Hitler de sa responsabilité dans les camps de la mort, dans son livre paru en 1977, intitulé Hitler's War (La guerre d'Hitler), et qui a été édité en Pologne l'an dernier.

"Je me trouve à présent à Varsovie et je ne suis pas libre de discuter de mon itinéraire pour des raisons de sécurité, comme vous le comprenez sûrement, a déclaré à l'AFP par téléphone M. Irving. Je serai en Pologne pendant les neuf prochains jours", a-t-il précisé, confirmant les informations affichées sur son site Internet annonçant un tour guidé d'une semaine en Pologne sur les lieux liés à la seconde guerre mondiale et à l'Holocauste, du 21 au 29 septembre. Dans une brochure publiée sur son site Focal point publications, M. Irving qualifie cette visite de neuf jours de "voyage inoubliable" et d'opportunité de voir "la vraie histoire".

Selon l'agence polonaise PAP, M. Irving se trouvait lundi à Cracovie, dans le sud du pays. "N'attendons pas le moment où David Irving commettra un nouveau crime sur le territoire de la République de Pologne. Les preuves indiquent clairement qu'il a déjà commis ce crime", écrit l'association dans une plainte en justice adressée à l'Institut de la mémoire nationale (IPN), chargé de poursuivre les crimes nazis et communistes contre les Polonais.

En Pologne, le négationnisme ainsi que la propagation du nazisme et de l'antisémitisme sont passibles d'une peine allant jusqu'à trois ans de prison. David Irving, qui a été condamné en Autriche en 2006 à trois ans de prison, puis expulsé vers la Grande-Bretagne pour avoir nié la réalité de l'Holocauste, a accusé la semaine dernière la Pologne d'avoir transformé le camp allemand nazi d'Auschwitz en un site touristique "ressemblant à Disneyland", devenu "une machine à faire de l'argent". L'historien a émis ces critiques alors qu'il faisait la promotion d'un voyage accompagné en Pologne. Ce voyage prévoit notamment une visite du bunker de l'état-major d'Hitler à Ketrzyn, du quartier-général du chef des SS Heinrich Himmler (Pozezdrze) et du camp de la mort de Treblinka.

terça-feira, 13 de abril de 2010

2094) Holocausto: nunca esquecer, jamais

Um conto de quem esteve no inferno, e miraculosamente, sobreviveu...

Eu nunca estive lá. Será?
Beyla Genauer*
Originalmente publicado no livro Galo de Chagall (1994)

O último vagão, um trem sem fim. Estávamos espremidos como sardinhas em lata. Uso esta expressão porque ela é universal. Não sei como descrever estes vagões sem janelas, sem portas, sem frestas, sem ar, carregados com homens-espantalhos de barbas brancas e compridas. Não eram vermelhas. Como, quer meu amigo. Eram brancas. Eu vi.

E aquelas mulheres vagas, com os lenços amarradas sob os queixos. Não, eles não eram multicoloridos como insiste o mesmo amigo. Eram negros. Eu vi. Não vi crianças. Onde estariam? E eu, como fui parar lá? Não sei. E meu pai? E minha mãe? E meus irmãos? Onde estariam? Não sei.

Os homens eram altos, muito altos. Magros, muito magros e todos iguais. Listas. Vestiam listas. Não, não eram como roupas de prisioneiros, que são listadas. Uma espécie de caftans com listas. Listas como as da túnica de seda de José, filho de Jacó. Sim aquele da Bíblia. Aquele que os irmãos venderam aos egípcios por puro ciúme. Aquele que perdeu a túnica nas mãos da mulher de Putifár ao fugir dos seus anseios sexuais.

As rodas do trem ecoavam listas, li-tas, li-tas, li-tas. Na cabeça os homens não tinham solidéus, o que seria próprio. Ostentavam algo entre sztreimel-casquete-capuz de Klu-Kux-Klan. E os olhos! Olhos de judeus, olhos de judias. Grandes, assustados, apavorados, enterrados na cabeça com olheiras negras que chegavam até as barbas, até os lenços.

Confinados em trens de gado. Gado pensa? Não sei. Mas eu, confinada, comecei a pensar. Penso, logo existo. Se existo, preciso agir. Fazer o que? Fazer o que? Fazer o que? As rodas do trem começaram a falar, registrar, registrar, registrar, re-re-re-gis-gis-gis, trar-trar-trar. Esta é, então, a minha tarefa?!

Comecei a me esgueirar de um vagão para o outro. Espremia-me por entre a massa de espantalhos e estendendo as mãos implorava: lápis e papel, lápis e papel. O trem continuou rolando e as rodas do trem ecoando, la-pis e pa-pel, la-pis e pa-pel.

Nenhuma presença da policia, mas o medo dela pairava na falta de ar do trem. Proibido escrever. Apagar a memória. Apagar. A-pa-gar, memória, memória, me-mo-ri-a, me-mo-ri-a, a-pa-gar, ga-gar-gar-me-me-mó-mó-mó-ria-a-ri-a ri-a!

Os trapos humanos iam estendendo-me, sorrateiramente, uns tocos de lápis, uns pedaços de carvão, uns pedaços de papeis sujos, pedaços de cartolinas sebentas, postais velhos e amassados, retratos amarfanhados, quem sabe de entes queridos. Testamentos. Testemunhas. Eu? As rodas ecoavam. Você, você, você, você, você.

- Guarda menina, esconde bem!

- Tudo em silêncio, sem som. Eu lia seus lábios descarnados.

- Prometo, prometo, escondo, escondo. Pro-me-to, es-con-do, pro-me-to.

Trêmula, eu prosseguia. Balançava a cabeça em sinal de agradecimento, enfiando tudo na minha roupa de baixo, mais imunda que os papeis que recebera. Os tocos de lápis me espetavam, arranhando os meus seios que mal começaram a desabrochar. Desvairada, continuava para o próximo vagão. Tudo se repetia. Tudo em silêncio. Consciente do perigo. Pe-ri-go. Si-i-len-cio. Sh-shu-sh-sh-sh-s-s-s.

Lentamente o rolar das rodas foi diminuendo. Parou. É agora! É agora que eles vão subir! Vão me revistar! Eu estava pronta para o sacrifício como o Isaac no Monte Moriah. Mas e os outros? E os meus papeis?!

Deus de Abraão, de Isaac e Jacó, não permita que eles sejam incriminados pelo meu desatino. A minha prece por Deus foi ouvida e o milagre do Moriah se repetiu. Nada. Ninguém subiu. Silêncio tumular. Ninguém sabe o que ainda pode acontecer, melhor é eu voltar para o meu vagão.

Comecei a arrastar-me de quatro para o último vagão. Outro milagre. Num canto, bem no fim do vagão, no meio de todas as barbas brancas, reconheci a barba branca do meu avô. E aqueles olhos meigos, amendoados, sorrindo para mim, exatamente como lá em Tarkov, quando me metia estouvadamente, intrometendo-me entre a sua barba branca e a Guemarah.

- Vovô me dá cinco groshen para comprar balas, dá?

- Claro sheifale claro.

Eu era a única neta que ousava perturba-lo, quando ele estava perdido em seus estudos talmúdicos. Minha mãe enrubescia, com o meu comportamento moleque.

Suja, estufada, agarrei-me a ele e comecei a soluçar.

- Zeide, zeide, zeide.

- Sh sheifale sh.

- Quando isto acabar, eu, tudo vou contar! .

- Sim carneirinho, sim.

- Eu te amo muito zeide.

- Silêncio carneirinho, silêncio.

Súbito, comecei a ouvir novamente as rodas do trem, mas não sentia o menor movimento, o barulho das rodas tornava-se cada vez menos audível. Lápis e pa-pel, lá-pis e pa-pel-mor-te-m-o-r-t-e, m-o-r-t-t-e-e-e-e-e.

- Zeide, desligaram nosso vagão.

- Shmá Israel Adonai eloheinu adonai Echad.

Dei um berro vindo do útero. O esforço me acordou, eu estava sozinha numa confortável cama, em um hotel de cinco estrelas, em Copacabana. Meu único filho estava cantando no coro de uma igreja, em Santana.
______________________________
*Beyla Genauer é atriz e escritora. Publicou os livros de contos curtos Levantar Voo, Galo de Chagal e O Lobo, todos esgotados. É casada com o jornalista Nahum Sirotsky.