Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
“ Prezado Presidente Lula @LulaOficial, estou na saída do Yad Vashem (Memorial do Holocausto), em Jerusalém.
Não, não é a mesma coisa…mesmo. Não há comparação entre Gaza e o Holocausto.
Recomendo que o senhor visite novamente o Yad Vashem.”
From: Jackikao:
“Se Lula visitasse o Yad Vashem veria com os próprios olhos de que não há nada que se compare ao Holocausto
Vamos lá, o holocausto se distingue de maneira singular na história da humanidade. O genocídio perpetrado pelos nazistas contra os judeus durante a 2a Guerra não foi apenas um ato de extermínio em massa, mas uma operação sistemática e industrializada com o objetivo específico de erradicar toda a população judaica da Europa.
Diferentemente de outros genocídios, em que a violência e o assassinato em massa podem ser motivados por conflitos territoriais, disputas étnicas ou políticas, o Holocausto foi marcado por uma obsessão ideológica com a "pureza racial" e a eliminação completa dos judeus. O regime nazista estabeleceu metas de morte, construiu campos de extermínio equipados com câmaras de gás e fornos crematórios, e orquestrou a logística para transportar milhões de pessoas de toda a Europa ocupada para esses locais de morte. A invasão de países era frequentemente acompanhada de um cálculo prévio de quantos judeus viviam lá, com o intuito de capturá-los e exterminá-los.”
Ao dizer que guerra de Israel contra os terroristas do Hamas equivale ao Holocausto, Lula avilta a História, a memória dos judeus assassinados pelos nazistas e os interesses do Brasil
Editorial Estadão
Por Notas & Informações
20/02/2024 | 03h00
O presidente Lula da Silva não precisou de mais do que um punhado de frases carregadas de ranço ideológico e antissemitismo para fazer do último domingo um dia infame na história da diplomacia brasileira. Ao dizer que a guerra de Israel contra os terroristas do Hamas se assemelha ao Holocausto, Lula, a um só tempo, vandalizou a História, a memória das vítimas da indústria da morte nazista e os interesses do Brasil. Nem os mais ferozes inimigos de Israel ousaram ir tão longe nas críticas à campanha militar conduzida pelos israelenses na Faixa de Gaza – uma campanha que decerto inclui atos que podem ser classificados como crimes de guerra, mas que nada tem a ver, nem sob licença poética, com o assassinato sistemático dos judeus europeus na 2.ª Guerra.
Durante uma entrevista coletiva na Etiópia, onde esteve para a Cúpula da União Africana, Lula afirmou que “o que está acontecendo em Gaza (as mortes de civis) não existiu em nenhum outro momento histórico”, a não ser, segundo o petista, “quando Hitler resolveu matar os judeus”. Das duas, uma: ou Lula é profundamente ignorante ou está de má-fé.
A hipótese benevolente, a da ignorância, é remota. Custa acreditar que Lula, que está no terceiro mandato presidencial, desconheça a natureza e a singularidade do Holocausto, talvez a maior tragédia humana do século 20. Por isso, a hipótese da má-fé é a mais plausível, sobretudo porque, é forçoso dizer, Lula mal escondeu que tinha lado nesse conflito ao relutar, por semanas, em reconhecer o ataque do Hamas como o ato de terrorismo que foi, além de subscrever a frágil acusação de “genocídio” contra Israel apresentada à Corte Internacional de Justiça pela África do Sul.
Fiel ao discurso esquerdista raivoso contra o Ocidente, Lula sempre dá um jeito de deslegitimar Israel. O estado da arte dessa tentativa de deslegitimação é atribuir a Israel – fundado sobre as cinzas dos milhões de judeus assassinados nas câmaras de gás – crimes semelhantes aos da Alemanha nazista.
Não haveria nenhum problema se Lula fosse líder estudantil e estivesse numa assembleia de centro acadêmico, que é o lugar ideal para esse tipo de discurso inconsequente. Mas Lula é o presidente da República, e suas falas são consideradas, por quem as ouve, como manifestação do Estado brasileiro. Assim, até prova em contrário, Lula alinhou o Brasil ao Hamas – que, não por acaso, elogiou a fala do presidente brasileiro.
O Hamas, convém lembrar, é um movimento que defende a eliminação física dos judeus – em outras palavras, genocídio. No dia 7 de outubro do ano passado, lançou um ataque covarde e particularmente cruel contra civis israelenses, que incluiu tortura, estupros e o sequestro de bebês. Para enfrentar o previsível contra-ataque israelense, os terroristas do Hamas se escondem entre a população civil palestina, usando hospitais como quartéis, com o objetivo evidente de provocar o maior número possível de mortes de inocentes e usá-las em sua campanha de propaganda contra Israel e os judeus.
Nada disso foi levado em conta por Lula. O presidente também não levou em conta o fato de que os judeus assassinados pelos nazistas na 2.ª Guerra não haviam atacado a Alemanha ou qualquer outro país, diferentemente do que fez o Hamas em outubro passado; não levou em conta que os nazistas mataram milhões de judeus não em bombardeios ou em tiroteios em zonas densamente povoadas, mas em campos de extermínio cuidadosamente projetados para otimizar esse processo, num deliberado projeto genocida, algo que nem remotamente está acontecendo em Gaza; e finalmente não levou em conta que o Brasil, tradicionalmente neutro nos conflitos no Oriente Médio, perderá qualquer capacidade de fomentar o diálogo ao comparar Israel à Alemanha nazista.
Isso ficou claro, aliás, quando o governo israelense chamou o embaixador brasileiro em Tel-Aviv para “uma conversa dura de repreensão”, além de declarar Lula uma persona non grata em Israel até que haja uma retratação formal do petista. De fato, Lula deveria se retratar, mas será surpreendente se o fizer. Não é do feitio de um demiurgo reconhecer que errou.
Atitudes de Lula em questões internacionais prejudicam Brasil na política externa, dizem especialistas
Presidente brasileiro se tornou 'persona non grata' para Israel após comparar ações de defesa israelense ao nazismo
R7
20/02/2024 06:38
Os gestos e as atitudes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm prejudicado o Brasil na área da política externa, avaliam especialistas consultados pelo R7. Os exemplos citados são as declarações sobre as ações de defesa de Israel, que o considerou “persona non grata”, do conflito entre Rússia e Ucrânia e a tentativa de relativizar o regime ditatorial de Nicolás Maduro na Venezuela. As informações são do R7, parceiro nacional do Portal Correio.
Desde o início do conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas, Lula tem buscado o papel de conciliador, visando um cessar-fogo permanente na região. A mesma atitude tem sido tomada em relação à guerra da Rússia na Ucrânia. Nas principais ocasiões, o petista enviou o assessor especial para assuntos internacionais, Celso Amorim, para se reunir com membros de ambos os governos na tentativa de se buscar uma solução.
Lula registrou diversas dificuldades para colocar em prática seu plano de o Brasil ser protagonista e pacificador nas questões internacionais voltadas para a área da segurança. O líder brasileiro criticou os Estados Unidos, por supostamente alimentar a guerra na Ucrânia, e recebeu uma repreenda da Casa Branca, que afirmou que o Brasil estava “papagueando” o discurso adotado pela Rússia para negar que tem culpa.
O episódio mais recente e polêmico ocorreu nessa segunda-feira (19), quando Israel classificou Lula como “persona non grata” no país até que haja uma retratação sobre as declarações feitas pelo presidente brasileiro.
No fim de semana, o petista comparou as ações de defesa israelense no conflito contra o grupo terrorista Hamas ao nazismo. “O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu. Quando Hitler decidiu matar os judeus”, afirmou o petista na ocasião.
Depois do mal-estar causado pela fala do presidente, o governo israelense tornou Lula “persona non grata” no país. O embaixador brasileiro em Tel Aviv, Frederico Meyer, foi chamado por Lula para consultas e embarca para o Brasil nesta terça (19).
“Cada vez que o presidente Lula viaja ao exterior, traz estragos e prejuízos em termos de política externa. E são episódios tristes para os brasileiros, que compõem tradicionalmente um povo pacífico, aberto e amigo com as demais nações. No caso de Israel, os gestos parecem fechar as portas aos israelenses e desrespeitam os judeus que em solo brasileiro estão. É uma tremenda ofensa”, avalia a professora de direito da Universidade de São Paulo (USP) Maristela Basso.
“Por outro lado, acirra também a polarização no país, uma vez que, aqueles que seguem o pensamento ideológico-partidário de Lula, se sentem autorizados à revanche antissemita. É extremamente prejudicial nas relações internacional e interna, porque serve de combustível para a eventual prática de crime”, acrescenta.
Para a professora de direito da USP, os gestos de Lula fazem com se que perca completamente o espaço de conciliador que o Brasil buscava ocupar entre países que estão em disputa, como Israel e Palestina e Rússia e Ucrânia.
“Perdeu a credibilidade. Essas manifestações são incompatíveis com o posto de líder, de conciliador. Qualquer pretensão que se tinha, de ser o protagonista, de ocupar espaço de liderança, acabou”, argumenta.
Outro episódio citado pelos especialistas trata-se do regime ditatorial de Nicolás Maduro na Venezuela. No ano passado, Lula disse que o ditador merece mais respeito, apesar de o governo dele ser conhecido por episódios de violação de direitos humanos, censura à imprensa e prisão a opositores. O petista evitou dizer se o país vizinho é uma democracia, mas destacou que a situação política do país não pode sofrer interferência de outras nações.
Para o diplomata e diretor de Relações Internacionais do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, Paulo Roberto de Almeida, as declarações do presidente podem prejudicar a política externa brasileira.
“A declaração de Lula é absolutamente equivocada nos planos histórico, diplomático e político. Não há equiparação possível ao Holocausto, que foi organizado por um Estado contra uma determinada população. Foi um massacre. Não há precedentes na história”, avalia.
“Temos duas questões que caracterizam o [mandato] Lula 3, que deveria ser mais maduro pelas experiências dos mandatos anteriores. O que a gente repara é que tem havido tensões internas e externas que derivam das posturas típicas do PT. No campo econômico, o intervencionismo que vimos em casos como a Vale e a Petrobras. No campo da política externa, o que se nota são posições mais próximas do partido [PT] que as da diplomacia brasileira,” explicou.
“Quando Lula cita o Holocausto, isso ultrapassa a linha do aceitável por ser um fato único na história da humanidade. O Holocausto é algo inimaginável até em relação a outros genocídios, por ter sido um projeto estatal do hitlerismo de eliminar todos os judeus. Isso é algo inédito na humanidade. Essa palavra ‘Holocausto’ o Lula pronunciou por ignorância histórica e causou um choque no povo judeu.”
O advogado especialista em direito internacional Bernardo Pablo Sukiennik argumenta que a classificação do brasileiro como ‘persona non grata’, como reação israelense, amplifica a crise gerada pelo petista.
“Isso quer dizer que essa pessoa, no caso o Lula, não é mais bem-vinda em Israel. Não há previsão de visita ao Estado, mas com essa nomenclatura estão deixando claro que, enquanto o governo for liderado por Isaac Herzog e Benjamin Netanyahu, ele não é bem-vindo lá”.
O diplomata Almeida avalia a reação israelense como grave, pois não há precedentes na histórica republicana brasileira deste tipo de movimento e, dessa forma, mostra a gravidade da situação.
“Após a ‘persona non grata’, a retaliação pode atingir acordos e tratados de cooperação entre os dois países. Não creio que chegue a muito, até porque perderiam muito comercialmente, mas pode ser que seja feita uma espécie de corretivo ao Brasil. Além de sinalizar aos demais líderes mundiais de que não vão aceitar manifestações com esse tipo de conteúdo.”
“Não necessariamente envolve romper acordos, porque não seria do interesse do governo nem de empresas israelenses que exportam ao Brasil, principalmente, na área de segurança, mas mostra um descontentamento para a manutenção, pelo menos temporária, de cooperação”, acrescenta Almeida.
Parlamentares evangélicos repudiaram as palavras de Lula
As Frentes Parlamentares Evangélicas (FPE) do Congresso Nacional e do Senado Federal repudiaram as palavras de Lula. Em nota, os parlamentares disseram que comparar os ataques de Israel ao Hamas com o nazismo, que vitimou seis milhões de judeus, é provocar um conflito ideológico desnecessário.
“Com a ressalva do respeito às pessoas que inocentemente morrem, Israel, ao contrário de Hitler, está exercendo o seu direito de sobreviver diante de um grupo com o objetivo de eliminar os judeus”, diz o documento.
Para a FPE, “não é justo exigir que uma nação se mantenha passiva diante de um ataque covarde que estupra e mata jovens, idosos e crianças das formas mais horríveis e continua com a política de se esconder atrás de reféns (civis inocentes)”.
Ainda de acordo com a nota, as verbalizações do presidente “não representam o pensamento da maioria dos brasileiros e comprometem a política internacional de forma desnecessária”.
Quando fala de improviso, Lula parece mais diretor de grêmio estudantil do que presidente da República
Hélio Schwartsman
FOLHA DE S. PAULO, 19/02/2924
"Ah, Luiz Inácio Lula da Silva...
Quando ele segue o roteiro preparado pelo Itamaraty, ainda é possível enxergar uma posição minimamente coerente com a tradição diplomática brasileira. Foi o caso do discurso que ele fez no sábado (17) na abertura da cúpula da União Africana em Adis Abeba. Ali, sem deixar de criticar Israel, também condenou os ataques do Hamas e pediu a libertação imediata de todos os reféns.
Basta, porém, que Lula comece a falar de improviso para comportar-se não como presidente da República mas como diretor de grêmio estudantil, desfiando os mais ignorantes chavões da esquerda. Foi o que ele fez no domingo (18), ao equiparar as operações de Israel em Gaza ao Holocausto nazista. É difícil até listar o número de instâncias em que a comparação é errada. Hitler, com base numa concepção essencialista de hierarquias raciais, se pôs a eliminar todos os judeus da Europa. Israel reage, ainda que desproporcionalmente, a um ataque terrorista.
Não estou sugerindo que Israel seja inimputável. Eu mesmo critico quase que semanalmente a mão pesada do governo Netanyahu. Penso que imperativos morais e legais exigiriam que as ações militares fossem muito mais cuidadosas, mesmo que isso implique retardar o objetivo legítimo de reduzir a capacidade do Hamas de atacar Israel.
Lula, ao dizer que Tel Aviv repete Hitler, desfere contra os israelenses um golpe abaixo da cintura. É algo que contradiz o argumento que o próprio presidente sempre invoca para justificar a mansidão com que trata violações cometidas por aliados seus, como Maduro e Putin: não se pode ser muito veemente nas declarações para não perder o poder de influenciar.
Na administração Bolsonaro padecíamos do problema oposto, que era a adesão automática às mais extremas posições do governo Netanyahu. Para quem olha de fora esse zigue-zague, a conclusão inescapável é que o Brasil não mantém uma política externa séria.
This is the third part of a grand trilogy. In the first two parts, Benjamin B. Ferencz presented collections of documents relating to the efforts to define aggression, the supreme international crime, and to proposals for the establishment of an international criminal court for the punishment of individuals guilty of international crimes. The new book is even more ambitious. Mr. Ferencz has attempted this time to trace, through important documents, the evolution of the idea of enforcing international law on States which have committed a gross violation of a basic principle of international law.
Many years have elapsed since Payson S. Wild wrote an excellent historical book on Sanctions and Treaty Enforcement (Cambridge, Mass.: Harvard Univ. Press, 1934). Ironically, the main international experiment with sanctions, the unsuccessful attempt of the League of Nations to stop Mussolini’s attack on Ethiopia, happened one year later, in 1935. Many books have been written since then, trying to explain why this effort to enforce international law has failed, and more recently there has been another series of books on sanctions against Rhodesia and South Africa.
Mr. Ferencz provides both a history of ideas about international enforcement since ancient times and a thorough documentation of proposals on the subject since the sixteenth century to the present. He points pout that already the first writers on international law have emphasized the importance of devising means for ensuring compliance by States with the rules of international law. He notes that in the nineteenth century international agreements were made which were designed to increase compliance with humanitarian rules of international law not only in times of peace but even in times of war. This lawmaking process culminated in the Hague Conventions of 1899 and 1907, and was followed by the Geneva Conventions of 1929 and 1949 and the Geneva Protocols of 1977.
In earlier centuries law enforcement depended very much on self-help, retaliation and reprisals, as well illustrated in Evelyn S. Colbert’s Retaliation in International Law (New York: Columbia Univ. Press, 1948). Between the seventeenth and nineteenth centuries reprisals were gradually transferred from private hands to public ones and privateers were replaced by naval vessels (see A.E. Hindmarsh, Force in Peace 52-56 (Cambridge, Mass.: Harvard Univ. Press, 1933). Another transfer occurred in the twentieth century, when an effort was made to substitute enforcement of international law by international organizations for enforcement by individual States or groups of States. As noted before, the League of Nations – though successful in some cases – was not able to stop aggression by Axis powers in the 1930’s, not only in Ethiopia, but also in China and Czechoslovakia.
The framers of the United Nations Charter were determined to avoid the mistakes of the League and the eminent French statesman, Joseph Paul-Boncour, reported with pride to the United Nations Conference at an Francisco in 1945 that “this flaw has been eliminated,” as an international force will be placed at the disposal of the Security Council to ensure respect for its decisions. He cited Pascal’s statement that “[s]trength without justice is tyrannical, and justice without strength is a mockery.” The forces to be provided by Member States under Article 43 of the Charter will give the UN “unquestionable superiority…over an aggressor rising alone in rebellion.” He concluded: “That is the great thing, the great historic act accomplished by the San Francisco conference, which gives to the world the hope, based on an oblivious reality, that henceforward it may live in peace.”
Unfortunately this prophecy was not fulfilled, as it was premised on the unity of the permanent members of the Security Council which disintegrated almost immediately after the Second World War was terminated. As Mr. Ferencz documents it in his book, one consequence of the disunity of the Big Powers was the inability to agree on the composition of the United Nations military force. Consequently, when the Korean crisis arose in 1950, the United Nations had to improvise and to rely on voluntary contributions by seventeen States in order to repel the North Korean and Chinese aggression. The United Nations article in other cases has been limited to peacekeeping forces, policing a truce or an armistice line, and to economic sanctions. In some cases, such as the war between Iran and Iraq, the United Nations has not been able to stop the hostilities, and was obliged to concentrate on mediation efforts.
Mr. Ferencz found it necessary to broaden the scope of his book to include documents relating not only to the enforcement of law and maintenance of peace, but also to international law-making, peaceful settlement of disputes and the achievement of economic and social justice. As he points out in his Afterward, there is a close connection between all these aspects of international order. To achieve peace, progress must be made in all areas. Without such progress, international law enforcement will not become a reality. One has to agree also with his statement that it is not rational to conclude that “humankind can invent the means of destroying the world yet lacks the intelligence to prevent it from happening.”
For all those who believe that pour globe is not doomed to destruction and that the combined efforts of people of good will can bring about a better future, this book is an indispensable tool. It documents clearly that, step by step, humanity has made considerable progress toward building the institutions needed to achieve peace and justice, and that only a few additional steps – suggested in several documents included in this book – have to be taken to reach that goal.
O negacionismo do Holocausto judaico, do genocídio armênio, do racismo estrutural que permeia a sociedade brasileira não é opinião, é uma iniquidade.
Celso Lafer, O Estado de S.Paulo
20 de fevereiro de 2022 | 03h00
“Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” é um dos objetivos do nosso país, contemplado na Constituição cidadã (artigo 3, IV).
É uma ideia a realizar que indica o caminho para dar plena efetividade ao Brasil como sociedade pluralista, diversificada e democrática, retificando múltiplas inadequações de nossa arquitetura imperfeita.
A intolerância de práticas discriminatórias é um obstáculo a esta ideia a realizar. Ela veio à tona com estridência em eventos recentes, como o brutal assassinato de Moïse Kabagambe, o refugiado do Congo que encontrou abrigo em nosso país para morrer a pauladas ao lado do quiosque onde trabalhava na orla carioca; a prepotência da prisão sem provas de Yago Corrêa de Souza no Jacarezinho, depois de comprar pão perto de sua casa; e o empenho discriminatório da apologia do racismo nazista veiculado pelo podcaster Monark (Bruno Aiub).
Os três eventos interligam-se. São constitutivos da abrangência de condutas impelidas pelas múltiplas práticas de racismo existentes na sociedade brasileira.
Afrontam e contestam a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental que inspira a Constituição.
A preservação da dignidade humana permeia a tutela dos direitos humanos, cuja positivação é a expressão do aprimoramento da convivência coletiva num regime democrático. O ponto de partida dos direitos humanos é o princípio da igualdade, e o seu corolário lógico, a não discriminação, que se aprofundaram com a especificação da tutela dos seres humanos em situação de vulnerabilidade (crianças, idosos, mulheres, etc.).
Nesta linha, a Constituição qualifica como crime a prática do racismo e a legislação infraconstitucional correspondente tipifica as modalidades com as quais se expressam. Estas modalidades são abrangentes e não circunscritas, como a interligação dos três eventos acima mencionados evidencia.
A Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Recorrentes de Intolerância de 2013, recém-promulgada no Brasil, esclarece que, explícita ou implicitamente, “a discriminação racial pode basear-se em raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica”.
Foi por conta da abrangência que o Supremo Tribunal Federal (STF), em 2003, no caso Ellwanger, subsumiu o antissemitismo e a sua apologia discriminatória como uma das modalidades de crime da prática do racismo.
A ilicitude da prática do racismo abarca a contenção da difusão e a propaganda de teorias e ideias que justificam ou incitam a discriminação, com destaque para as provenientes de explícitos discursos de ódio. Daí provêm parâmetros que esclarecem por que em nosso país e em muitos outros, com respaldo nas normas do Direito Internacional, a garantia constitucional da liberdade de expressão não se tem como absoluta. Não abriga na sua abrangência manifestações de ilicitude penal. É o caso da calúnia, da injúria e da difamação, e também do crime da prática do racismo e a sua incitação.
Explica Stuart Mill, ao tratar do exercício da liberdade, que ela contempla a distinção entre condutas “self-regarding” e “other-regarding”. Em relação às primeiras, não cabem limitações, pois “o indivíduo não responde perante a sociedade pelas ações que não digam respeito aos interesses de ninguém a não ser ele”. Em relação às segundas, o indivíduo é responsável por qualquer ação prejudicial aos interesses alheios. Daí a possibilidade de limites, se a sociedade julgar que a sua defesa a requer.
A punição legal do crime da prática do racismo e a sua apologia é o que prevê o direito brasileiro. O seu fundamento, como observa Mill, provém do fato de que “viver em sociedade torna indispensável que cada um seja obrigado a observar certa linha de conduta para com o resto”.
Machado de Assis observou: “Haverá coisa pior que mesclar o ódio às opiniões?”. Inspirado por Machado, concluo pontuando os vínculos entre negacionismo, discurso de ódio e a prática de condutas racistas. O negacionismo nega fatos apurados motivados pelo ímpeto discriminatório e pelo ódio “que não respeita coisa nenhuma”, como dizia Monteiro Lobato pela voz do Visconde de Sabugosa. Contrapõe-se, assim, ao bem público consagrado no artigo 3, IV. Por isso, a denegação do Holocausto é prática de conduta racista. A Convenção Interamericana reitera que não cabe tolerar a defesa e a justificação do genocídio. Trata-se, assim, da contenção do dano moral para a sociedade que provém do desrespeito à tutela de consagrados direitos humanos.
O negacionismo do Holocausto judaico, do genocídio armênio, do racismo estrutural que permeia a sociedade brasileira e que provém do passivo da escravidão tem um objetivo: impedir o reconhecimento do respeito que merecem ao direito à verdade e à memória das vítimas da prática do racismo que padecem uma pena sem culpa porque integram uma cor, uma religião, uma ascendência, uma origem nacional ou étnica. Por isso o negacionismo não é uma opinião. É uma iniquidade.
PROFESSOR EMÉRITO DA FACULDADE DE DIREITO DA USP, FOI MINISTRO DE RELAÇÕES EXTERIORES (1992 E 2001-2002)
A Newsletter da Conib – Confederação Israelita do Brasil – publicou recentemente (11/01/2022) uma resenha crítica da historiadora Maria Luiza Tucci Carneiro ao artigo dos historiadores Fabio Koifman e Rui Afonso, num livro publicado a propósito da controversa questão dos vistos concedidos no Consulado do Brasil em Hamburgo por uma funcionária, em 1939-41, que viria a casar-se com o escritor Guimarães Rosa, Aracy Moebius de Carvalho.
Nessa resenha Tucci Carneiro tece críticas aos dois historiadores que um dos organizadores do livro, o historiador Avraham Milgram, achou tremendamente injustas, mas não apenas isto, totalmente equivocados e indignas de uma resenhista séria. Avraham Milgram tentou que a CONIB publicasse suas observações a essa resenha distorcida, o que a CONIB recusou fazer, para não "aumentar a polêmica", justificaram-se os editores.
Em consequência Avraham Milgram resolveu divulgar suas respostas, que eu recebi, como abaixo. Em nome da honestidade intelectual, publico suas respostas ao artigo, uma vez que a Newsletter da CONIB, tendo feito o agravo, recusou-se a publicar estas respostas.
Paulo Roberto de Almeida
Resposta à historiadora Maria Luiza Tucci Carneiro na polêmica sobre a série lançada pela TV Globo, publicada no Newsletter da CONIB em 11 de janeiro de 2022.
Sou Avraham Milgram, historiador aposentado do Yad Vashem que supostamente não deveria me envolver na "polêmica sobre a série lançada na TV Globo", principalmente por ser um evento que ocorre no Brasil, enquanto eu vivo em Israel. Porém, querendo ou não, me encontro envolvido visto que publicamos, Anat Falbel, Fábio Koifman e eu, o livro Judeus no Brasil história e historiografia – ensaios em homenagem a Nachman Falbel (Rio de Janeiro: Garamond 2021), que inclui o artigo dos historiadores Fábio Koifman e Rui Afonso "Os vistos concedidos no consulado de Hamburgo 1938-1939" pp. 123-156
Neste estudo, excepcionalmente documentado, os autores demonstram que todos os vistos outorgados a judeus perseguidos através daquele consulado foram concedidos legalmente de acordo as diretrizes do Itamaraty, pelos cônsul-geral Souza Ribeiro, indubitavelmente antissemita, e pelo vice-cônsul, o prestigiado escritor João Guimarães Rosa que viria a casar com Aracy Moebius de Carvalho, funcionária e secretária do consulado. Um destes vistos concedido a Margarethe Levy, que testemunharia a favor de Aracy no dossiê do Yad Vashem, tinha seu passaporte carimbado com o "J" vermelho, detalhe importante, vejam p. 129, nota 13 e p. 135 do referido artigo. A documentação analisada pelos historiadores, mostra que os procedimentos legais que permitiram a saída de Margarethe Levy, bem como a de outros testemunhos era no entanto desconhecida pela comissão jurídica que reconheceu Aracy como Justa das Nações no início dos anos 1980. Não se trata de inculpar a dita comissão pelo desconhecimento do que hoje nos é revelado pelo artigo documentado em base ao arquivo do Itamaraty, que efetivamente, não se limita a homenagem concedida à Aracy de Carvalho. Diria até que este último é um mero detalhe, importante para a memória e menos para a história. O principal, para aqueles poucos que acompanham esta polêmica, se refere aos procedimentos do Itamaraty, ou seja, a implementação dos vários decretos leis e o emaranhado de diretrizes, ordens, circulares, telegramas que envolviam os cônsules no exterior e não apenas no consulado em Hamburgo no final da década de 1930. Esta complexidade foi destrinchada em grande parte, senão na sua totalidade, no artigo dos dois historiadores o brasileiro Koifman e o português Rui Afonso. Todavia, há questões não resolvidas, que provavelmente jamais serão. Por exemplo, quais foram os motivos que levaram beneficiários de vistos brasileiros legais outorgados em Hamburgo a solicitar o reconhecimento da Aracy de Carvalho como Justa das Nações? Estas e outras questões de teor histórico constituem o trabalho dos historiadores. Saber, conhecer, enriquecer o conhecimento, compreender o comportamento humano, desmistificar crenças e buscar a verdade são a raison d'être de cientistas sociais. É isto que aprenderam nas universidades: questionar, inquirir, escavar arquivos, ler toneladas de papéis velhos, num diálogo constante com o passado para decifrar o presente. Aqui chegamos ao âmago da questão, o confronto e desafio da história vis-à-vis da memória.
Considerando o estudo publicado de Fábio Koifman e Rui Afonso por um lado e minha expertise sobre o Holocausto por outro, faço os seguintes comentários à crítica da historiadora Tucci Carneiro:
1. "na mesma ocasião em que foi homenageado o embaixador brasileiro Luiz Martins de Souza Dantas. Ambos, Souza Dantas e Aracy, têm em comum o fato de 2 transgredirem as normas antissemitas das Circulares Secretas impostas pelo governo Vargas a partir de 1937".
Resposta: Aracy foi homenageada em 1982 e Souza Dantas em 2003, mas o que deve ser salientado é que este último sim transgrediu as normas do Itamaraty a ponto do embaixador ter sido repreendido e enfrentado um processo administrativo, enquanto Aracy nem foi repreendida, e não porque ela agiu na surdina, mas porque efetivamente não houve transgressão da sua parte no que diz respeito às diretrizes que restringiam a concessão de vistos a "semitas".
2. "Questionar “o heroísmo” de Aracy de Carvalho e a “verossimilhança da narrativa” com a realidade dos fatos, como foi feito em algumas das críticas, pode ainda abrir caminho para o discurso que nega o Holocausto".
Resposta: O trabalho de investigação dos historiadores não tem absolutamente nenhuma relação com a negação do Holocausto, pois a sua pesquisa está inserida na história do Nazismo e da perseguição aos judeus, da política de teor antissemita de restrição a sua entrada no Brasil, e na análise dos procedimentos de concessão de vistos do consulado brasileiro em Hamburgo. Onde exatamente se encontra a má fé e o antissemitismo que motivaria os negadores do holocausto? Seria o caso de verificar no google o que significa negação do Holocausto. Me admira a falta de compreensão de algo tão simples e evidente, além de constituir uma acusação difamatória contra os historiadores Fábio Koifman autor do livro sobre o embaixador Luís de Souza Dantas e Rui Afonso, autor de obras sobre o Justo português, o cônsul Aristides de Sousa Mendes (Um homem bom e Injustiça).
3. "A historiografia brasileira tem comprovado com base em documentos pesquisados junto ao Arquivo Histórico do Itamaraty que, ao facilitarem os vistos de imigração aos judeus perseguidos pelos nazistas, os diplomatas e funcionários brasileiros em missão no exterior corriam risco de vida, de prisão e, até mesmo, de perderem seus cargos sob pena de sofrerem um processo administrativo como ocorreu com Souza Dantas".
Resposta: Absolutamente errado. Nenhum diplomata brasileiro correu perigo, seja porque usufruíam de imunidade diplomática, seja por conta da Judenpolitik da Alemanha Nazista que visava escorraçar os judeus do território alemão. Nenhum diplomata estrangeiro correu perigo por auxiliar os judeus perseguidos. O cônsul chinês em Viena, Feng Shan Ho, concedeu centenas de vistos para judeus que lhes possibilitaram entrar em Shanghai ao mesmo tempo em que Eichmann se empenhava dia e noite para expulsá-los da Áustria. Eichmann certamente ficou feliz com o procedimento do cônsul chinês, bem como do cônsul-geral dos EUA, John Wiley, que ao testemunhar a brusca e violenta perseguição contra os judeus nas ruas de Viena buscou explorar ao máximo as possibilidades de ajuda humanitária aos requerentes de vistos, empenhando-se em agilizar e facilitar o processo de aprovação desses vistos sem infringir as normas estabelecidas pelo State Department. Algum deles sofreu por isto? Nenhum, com exceção do cônsul português Aristides de Sousa Mendes e o embaixador brasileiro Luís de Souza Dantas, porém não pelos nazistas, foram justiçados por Oliveira Salazar e Getúlio Vargas.
4. "E, se até o presente momento, conhecemos apenas alguns nomes daqueles que conseguiram os “vistos de salvação” com a ajuda de Aracy, é pelo fato dela não ter autorização para assinar os documentos diplomáticos por ser funcionária da sessão de passaportes do Consulado Geral do Brasil em Hamburgo".
Resposta: É claro que Aracy não estava autorizada a assinar passaportes, visto que era secretária. No entanto, com os resultados da pesquisa de Koifman e Afonso, conhecemos um número grande de nomes, as circunstâncias e o modus operandi da concessão de vistos brasileiros, todos legais, (vejam pp. 154-156), procedimentos que Aracy não esteve envolvida.
5. "Aracy, além dos vistos, conseguia forjar passaportes sem o “J” vermelho que, se mantidos, denunciariam a identidade judaica do seu portador às autoridades consulares e nazistas".
Resposta: Absolutamente errado. Mesmo aqueles judeus que testemunharam alegando que Aracy "forjava passaportes sem o 'J' vermelho", entraram no Brasil com o 'J' vermelho nos seus passaportes, inclusive aqueles poucos que solicitaram seu reconhecimento no Yad Vashem. Aracy forjava passaportes sem o 'J' vermelho? Efetivamente, nas toneladas de livros de história sobre o Holocausto jamais foi mencionado ou reconhecido algo do gênero. E os nomes "Sara" e "Israel" apostos nos passaportes com o mesmo objetivo de identificar a origem judaica dos seus portadores? Pergunto, Aracy também fazia-os desaparecer dos passaportes dos judeus? Se assim fosse, seria porque haviam filo-semitas, corruptos ou antinazistas no ministério do Interior do 3o. Reich...! Nem um e nem outro. Não tenho outro termo para definir este argumento senão fake news.
6. "No entanto, se contabilizarmos as assinaturas do cônsul Guimarães Rosa nas Fichas Consulares de Imigração emitidas entre 1938 e 1942, certamente teremos uma dimensão aproximada dos judeus salvos pelo casal. Algumas destas fichas estão disponíveis na Base de Dados Arqshoah: www.arqshoah.com."
Resposta: O fato das assinaturas de Guimarães Rosa constarem nos passaportes não atesta que estes vistos foram outorgados ilegalmente contra as diretrizes do Itamaraty, para um melhor entendimento, é necessário ler o artigo dos dois historiadores acima mencionado.
7. "Pergunto: os críticos negam (ou desconhecem?) a veracidade dos testemunhos sob a guarda do Yad Vashem, assim como as gravações realizadas pelo projeto coordenado por Steven Spielberg junto a Shoah Foundation, as pesquisas da historiadora Mônica Raisa Schpun (autora do livro “Justa”) e as entrevistas gravadas pela equipe Arqshoah/Leer-USP?"
Resposta: Muito pelo contrário. Os historiadores não só não negam os testemunhos como estes últimos corroboram e comprovam o que Koifman e Afonso alegam sobre a legalidade dos vistos concedidos aos autores dos testemunhos. Por exemplo, na p. 135 (idem nas pp. 146-147): "Não por acaso, no depoimento de Margarethe Levy, que se encontra no dossiê do Yad Vashem, ela mencionou o depósito que o casal realizou em troca da concessão de um visto, como também a transferência de valores de outros judeus alemães que obtiveram visto naquela oportunidade, exatamente os que o cônsul informou e solicitou instruções ao MRE. Mais do que isso, Souza Ribeiro ainda anotou nos passaportes do casal Levy, conforme as ordens que recebeu: Temporário—Visado conforme o que dispõe o artigo 280 do decreto no. 3.010, de 10 de agosto de 1938. Temporário para ser regularizado no Brasil. Foi efetuado o depósito de 98:860$000 (noventa e oito contos, oitocentos e sessenta mil reis) no Banco do Brasil em S. Paulo, dinheiro proveniente do Estrangeiro, conforme carta de 26-9-1938 desse Banco, arquivado neste Consulado Geral. (Ass.) S. Ribeiro".
Quem não conhece e nega os conteúdos dos testemunhos do dossiê do Yad Vashem é Tucci Carneiro. Mas nunca é tarde para conhecer e estudar este dossiê, assim como a documentação do Itamaraty! E não seria demasiado a Tucci Carneiro ler (e aprender) com o artigo mencionado, nem que fosse para tomar conhecimento da seriedade, profundidade e densidade documental que há nele, e jamais julgar às cegas.
8. "Ressalto aqui o valor pedagógico da série Passaporte para a Liberdade que, certamente, serve de alerta para os perigos do antissemitismo assumido como política do Estado alemão entre 1933-1945, e reforça a importância da solidariedade em tempos sombrios."
Resposta: Este é um ponto a favor de Tucci Carneiro que ela soube pontuar. Como ultimamente a Globo afirmou, se trata de uma série de ficção, e neste contexto, como Tucci Carneiro, eu também estimo o valor educativo da minissérie televisiva para informação e formação ética e civil das gerações de hoje e futuras. O que incomoda a autora da crítica à crítica é a desmistificação da concessão ilegal de vistos referida à Aracy, que enfraquece o teor historiográfico - ideológico e denunciativo - de Tucci Carneiro que etiquetou a predominância absoluta do antissemitismo nas elites políticas do Estado Novo. Todavia, se o leitor quiser compreender como foi possível a presença do discurso oficial sigiloso antissemita (ideologia) no milieu do Itamaraty e consulados no exterior, paralelamente a predominância de muitas ambiguidades e da permissividade relativa na concessão de vistos (práxis), o artigo de Fabio Koifman e Rui Afonso é um prato cheio. Exemplo de historiografia inteligente e honesta.
Avraham Milgram
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Historiadora Maria Luiza Tucci Carneiro critica polêmica sobre série lançada pela TV Globo
A historiadora da USP Maria Luiza Tucci Carneiro, autora de obras como “O Antissemitismo na Era Vargas” e “Os Dez Mitos sobre os Judeus”, em que analisa os mitos mais populares sobre os judeus e o que chama de “proliferação do antissemitismo” no mundo atual, criticou a polêmica sobre a série “Passaporte para Liberdade”, lançada pela TV Globo em 20 de dezembro de 2021. Em artigo encaminhado à CONIB, ela afirma:
A recente polêmica sobre a série Passaporte para Liberdade, lançada pela TV Globo em 20 de dezembro de 2021, coloca em dúvida as ações salvacionistas de Aracy Moëbius de Carvalho reconhecida como “Justa entre as Nações”. Este título lhe foi concedido pelo Yad Vashem em Jerusalém, em 8 de julho de 1982, na mesma ocasião em que foi homenageado o embaixador brasileiro Luiz Martins de Souza Dantas. Ambos, Souza Dantas e Aracy, têm em comum o fato de transgredirem as normas antissemitas das Circulares Secretas impostas pelo governo Vargas a partir de 1937. Questionar “o heroísmo” de Aracy de Carvalho e a “verossimilhança da narrativa” com a realidade dos fatos, como foi feito em algumas das críticas, pode ainda abrir caminho para o discurso que nega o Holocausto. A historiografia brasileira tem comprovado com base em documentos pesquisados junto ao Arquivo Histórico do Itamaraty que, ao facilitarem os vistos de imigração aos judeus perseguidos pelos nazistas, os diplomatas e funcionários brasileiros em missão no exterior corriam risco de vida, de prisão e, até mesmo, de perderem seus cargos sob pena de sofrerem um processo administrativo como ocorreu com Souza Dantas. E, se até o presente momento, conhecemos apenas alguns nomes daqueles que conseguiram os “vistos de salvação” com a ajuda de Aracy, é pelo fato dela não ter autorização para assinar os documentos diplomáticos por ser funcionária da sessão de passaportes do Consulado Geral do Brasil em Hamburgo. Na documentação do Arquivo Histórico do Itamaraty no Rio de Janeiro, não há indícios do envolvimento direto de Guimarães Rosa com as ações salvacionistas de Aracy, pois certamente, os devidos cuidados foram tomados pelo casal, tendo em vista as restrições impostas pelo Itamaraty. Aracy, além dos vistos, conseguia forjar passaportes sem o “J” vermelho que, se mantidos, denunciariam a identidade judaica do seu portador às autoridades consulares e nazistas. No entanto, se contabilizarmos as assinaturas do cônsul Guimarães Rosa nas Fichas Consulares de Imigração emitidas entre 1938 e 1942, certamente teremos uma dimensão aproximada dos judeus salvos pelo casal. Algumas destas fichas estão disponíveis na Base de Dados Arqshoah: www.arqshoah.com. Aliás, este é o contexto histórico que dá sustentação à construção da narrativa da série Passaporte para Liberdade criada por Mario Teixeira com a colaboração da inglesa Rachel Anthony e a direção de Jayme Monjardim. Ainda que baseada em fatos reais registrados pelo Yad Vashem, uma novela ou filme tem a permissão de adentrar ao campo da ficção, desde que não abra caminhos para o negacionismo e não fragilize o valor dos testemunhos dos sobreviventes do Holocausto. Sabemos que a narrativa da série Passaporte para Liberdade baseou-se nos testemunhos registrados no Yad Vashem e em documentos pesquisados no acervo da família Tess para reconstituir a história de Aracy e de Guimarães Rosa em Hamburgo, Além destes registros, recorreram também à assessoria de historiadores e sobreviventes do Holocausto com o objetivo de evitar a distorção dos fatos e favorecer os discursos negacionistas que atentam contra a veracidade do Holocausto. Ao colocarem em dúvida as ações salvacionistas de Aracy (tratadas como “mito” por falta de comprovação), extrapola-se o campo da crítica historiográfica, investindo contra o valor dos testemunhos daqueles que foram salvos graças aos vistos concedidos (e assinados) por Guimarães Rosa durante o período em que ele esteve à frente do Consulado Brasileiro de Hamburgo: 1938-1942. Pergunto: os críticos negam (ou desconhecem?) a veracidade dos testemunhos sob a guarda do Yad Vashem, assim como as gravações realizadas pelo projeto coordenado por Steven Spielberg junto a Shoah Foundation, as pesquisas da historiadora Mônica Raisa Schpun (autora do livro “Justa”) e as entrevistas gravadas pela equipe Arqshoah/Leer-USP? Como já escrevi, “os caminhos de liberdade abertos por Aracy e Guimarães Rosa garantiram a preservação da vida de milhares de cidadãos que, naquele momento, emergiam como vítimas da ignorância nazista. Pelas trilhas dos excluídos transitaram grupos heterogêneos que, segundo a classificação totalitária, não eram dignos de continuar vivendo na sociedade alemã. As intermináveis filas de refugiados nos oferecem uma verdadeira tipologia da exclusão, delineada pelo emprego da violência, do terror, da pseudociência, da censura e da mentira, entre tantos outros artifícios totalitários.” Ressalto aqui o valor pedagógico da série Passaporte para a Liberdade que, certamente, serve de alerta para os perigos do antissemitismo assumido como política do Estado alemão entre 1933-1945, e reforça a importância da solidariedade em tempos sombrios.
Longe de ser um grande parceiro comercial ou diplomático do Brasil historicamente, o Estado de Israel aceitou com satisfação as tentativas de aproximação do presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que desde antes de ser eleito já fazia acenos àquele país como forma de agradar ao eleitorado evangélico no Brasil. A relação entre as duas nações se fortaleceu desde então e as autoridades israelenses resistiram muito a reclamar oficialmente de uma espécie de banalização de citações ao nazismo promovida por membros do governo brasileiro.
A estrada até o fim da paciência diplomática, porém, teve outros trechos marcantes.
O nazismo “de esquerda”
As polêmicas foram inauguradas pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e por causa da fixação bolsonarista pela esquerda, que é sempre apontada como o pior dos inimigos.
Antes de entrar no governo, o chanceler já havia escrito um texto dizendo que o nazismo era um movimento de esquerda, contrariando o consenso histórico sobre o tema: o movimento nasceu da direita radical alemã.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, que é cristão, mas tem família de origem judaica, entrou no governo em abril do ano passado e, em outubro, fez uma postagem comparando o terror nazista a uma agressão ocorrida na Universidade de São Paulo. O titular da Educação também aproveitou para relacionar o ditador nazista Adolf Hitler ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Tenho NOJO de nazistas! A USP é de TODOS, sendo paga com o ICMS dos Paulistas! Esse episódio me lembra a lista que fizeram para marcar os calouros judeus, evangélicos e liberais! Dado que a bandeira deles já é vermelha, coloquem logo uma suástica e gritem: SIEG HEIL! HEIL LULA! https://twitter.com/DouglasGarcia/status/1183901277446705154 …
Em janeiro deste ano, o então secretário de Cultura do governo, Roberto Alvim, saiu confiante de uma das lives semanais do presidente Jair Bolsonaro, na qual foi muito elogiado, e gravou um vídeo que acabou com sua trajetória no órgão e manchou a imagem brasileira mundo afora.
Alvim ainda tentou se segurar garantindo que a citação não havia sido proposital, mas a enorme pressão o derrubou no mesmo dia, em 17 de janeiro de 2020.
A repercussão foi tão ruim que obrigou o presidente, que no dia anterior havia prestigiado Alvim, a fazer uma declaração de desculpas. “Reitero nosso repúdio às ideologias totalitárias e genocidas, bem como qualquer tipo de ilação às mesmas. Manifestamos também nosso total e irrestrito apoio à comunidade judaica, da qual somos amigos e compartilhamos valores em comum”, disse Bolsonaro na época, em nota.
Outro fato que causa incômodo em porta-vozes de entidades judaicas é o uso da bandeira de Israel em manifestações que também têm pautas antidemocráticas, como o fechamento do Congresso.
No dia 4 de maio, após o presidente Jair Bolsonaro aparecer ao lado de bandeiras de Israel e dos Estados Unidos em um desses atos (imagem em destaque desta reportagem), Fernando Lottenberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib), divulgou uma nota dura em nome da entidade: “Lamentamos o uso da bandeira de Israel, uma democracia vibrante, em atos antidemocráticos. Isso pode passar uma mensagem errada sobre a comunidade, que é plural, com judeus e judias em todo espectro político”, dizia o texto.
Bandeira dos EUA também costuma marcar presença em atos de bolsonaristasHugo Barreto/Metrópoles
Bandeira dos EUA também costuma marcar presença em atos de bolsonaristasHugo Barreto/Metrópoles
Ato pró-BolsonaroHugo Barreto/Metrópoles
Bandeira de Israel tem aparecido em atos pró-BolsonaroHugo Barreto/Metrópoles
Bandeira dos EUA também costuma marcar presença em atos de bolsonaristasHugo Barreto/Metrópoles
Bandeira dos EUA também costuma marcar presença em atos de bolsonaristasHugo Barreto/Metrópoles
Após o ministro brasileiro usar suas redes sociais para comparar a ação policial ordenada pelo STF contra suspeitos de integrar um sistema de distribuição de fake news a um dos eventos mais dramáticos da perseguição nazista aos judeus europeus, houve críticas oficiais de Israel.
O cônsul geral do país em São Paulo, Alon Lavi, foi o mais contundente. Ele fez cinco postagens divulgando o repúdio de entidades como o Museu do Holocausto do Brasil, o Comitê Judaico Norte-Americano e a Confederação Israelita do Brasil, acompanhadas de uma frase sua dizendo que o assassinato de 6 milhões de judeus não tem comparação com “qualquer realidade politica no mundo”.
Já a Embaixada de Israel no Brasil divulgou comunicado oficial sem citar o ministro Weintraub ou outros membros do governo, mas reclamando que “houve um aumento da frequência de uso do Holocausto no discurso público, que de forma não intencional banaliza sua memória e também a tragédia do povo judeu”.
A instituição faz então um pedido ao governo e ao povo brasileiros: “Em nome da amizade forte entre nossos países, que cresce cada vez mais há 72 anos, requisitamos que a questão do Holocausto como também o povo judeu ou judaísmo fiquem à margem do diálogo político cotidiano e das disputas entre os lados no jogo ideológico”.
Diante das duras cobranças, Weintraub voltou ao Twitter na noite de quinta. E não foi para pedir desculpas.
Não falem em nome de todos os cristãos ou judeus do mundo. FALO POR MIM! Tive avós católicos e avós sobreviventes dos campos de concentração nazistas (foto). Todos eram brasileiros. TENHO DIREITO DE FALAR DO HOLOCAUSTO! Não preciso de mais gente atentando contra MINHA LIBERDADE!