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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 7 de março de 2024

O Holocausto é único na história da Humanidade - Caio Blinder, Jackikao

From: Caio Blinder:

“ Prezado Presidente Lula @LulaOficial, estou na saída do Yad Vashem (Memorial do Holocausto), em Jerusalém.

Não, não é a mesma coisa…mesmo. Não há comparação entre Gaza e o Holocausto.

Recomendo que o senhor visite novamente o Yad Vashem.”

From: Jackikao:

“Se Lula visitasse o Yad Vashem veria com os próprios olhos de que não há nada que se compare ao Holocausto 

Vamos lá, o holocausto se distingue de maneira singular na história da humanidade. O genocídio perpetrado pelos nazistas contra os judeus durante a 2a Guerra não foi apenas um ato de extermínio em massa, mas uma operação sistemática e industrializada com o objetivo específico de erradicar toda a população judaica da Europa.

Diferentemente de outros genocídios, em que a violência e o assassinato em massa podem ser motivados por conflitos territoriais, disputas étnicas ou políticas, o Holocausto foi marcado por uma obsessão ideológica com a "pureza racial" e a eliminação completa dos judeus. O regime nazista estabeleceu metas de morte, construiu campos de extermínio equipados com câmaras de gás e fornos crematórios, e orquestrou a logística para transportar milhões de pessoas de toda a Europa ocupada para esses locais de morte. A invasão de países era frequentemente acompanhada de um cálculo prévio de quantos judeus viviam lá, com o intuito de capturá-los e exterminá-los.”


terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Mudanca da Embaixada para Jerusalem - Rubens Barbosa (OESP)


 Mudança da Embaixada para Jerusalém
Consulado-geral na cidade poderia evitar mudança dramática na nossa política externa
Rubens Barbosa, presidente do Irice
O Estado de S. Paulo, 26 de fevereiro de 2019 | 04h30
Durante a campanha eleitoral, o candidato Jair Bolsonaro disse que, se eleito, iria transferir a Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém: “Israel é um Estado soberano, que decide qual é sua capital, e nós vamos segui-lo”. A promessa respondia à reivindicação da comunidade evangélica, que apoiava fortemente o candidato.
Depois de eleito, o presidente decidiu dar prioridade às relações com Israel e se comprometeu a concretizar a transferência a ninguém menos que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que em entrevista disse que a “questão não é se, mas quando”. Posteriormente, Bolsonaro recuou ao afirmar que “essa não é uma questão de honra” e “por ora” não haveria transferência, o que deve ter estimulado o vice-presidente Hamilton Mourão a receber duas delegações árabes e observar publicamente que “não haverá mudança da embaixada para Jerusalém”. O chanceler Ernesto Araújo qualificou declarações anteriores e notou que a decisão seria “parte de um processo de elevação do patamar da relação com Israel, isso, sim, uma determinação, independente da mudança ou não da embaixada”. A comunidade evangélica reagiu e deixou saber que vai cobrar a decisão presidencial para concretizar a transferência.
Como era previsível, a ideia causou reação em diversas frentes. Na área diplomática, porque representaria uma guinada radical na política externa brasileira, que desde 1947 se mantém coerente com o apoio da política de uma solução negociada para o conflito Israel-Palestina, com a implementação da política de dois Estados, com a criação também do Estado Palestino. Caso venha a concretizar-se, o Brasil ficará em Jerusalém ao lado apenas da Guatemala, que se alinhou automaticamente aos EUA. Por outro lado, a Liga Árabe e a União das Câmaras Árabes de comércio manifestaram preocupação com essa eventual decisão e uma comitiva ministerial brasileira teve visita ao Egito cancelada.
Na área econômica houve reação mais explícita, com menção à perspectiva de as exportações brasileiras de frango e carne bovina poderem vir a ser suspensas. O Ministério da Agricultura e associações de produtores manifestaram apreensão quanto às consequências negativas para as exportações brasileiras e a balança comercial.
Nas prioridades para os primeiros cem dias de governo, o Itamaraty incluiu a visita presidencial a Israel e o interesse em ampliar a colaboração nas áreas de defesa, segurança e tecnologia. E em pronunciamento recente nas Nações Unidas, o representante alterno brasileiro reafirmou a política do Itamaraty de dois Estados, indicando que nada havia mudado.
O governo brasileiro tem assim nas mãos uma questão delicada a resolver, procurando evitar ao mesmo tempo um desgaste desnecessário com Israel e uma perda significativa para o agronegócio. Qualquer que seja a decisão do governo, não está em questão o interesse em elevar o nível do relacionamento bilateral com Israel, mantendo a posição tradicional de excelente relação bilateral.
Nesse contexto, cabe mencionar um antecedente histórico que poderia ajudar na busca de uma solução de compromisso para essa questão. O Brasil tem uma relação histórica com Israel, desde que o então presidente da Assembleia-Geral da ONU, Oswaldo Aranha, coordenou pessoalmente a aprovação da resolução de 1947 que determinou a criação dos Estados e Israel e da Palestina.
No governo de Juscelino Kubitschek, com Macedo Soares como chanceler, foi instalada a representação diplomática com a criação da legação do Brasil na capital, Tel-Aviv. Em 27 de março de 1958, a legação foi elevada ao status de embaixada. Como medida de rotina diplomática, e a fim de evitar contrariar a política dos dois Estados, por decreto de 22 de abril do mesmo ano o governo brasileiro decidiu criar um consulado-geral em Jerusalém. Em 1993, com Itamar Franco e Celso Amorim, o decreto foi revogado. O posto, assim, nunca chegou a ser efetivamente aberto.
A exposição de motivos que justificava a criação do consulado-geral, publicada nos jornais na época, causou controvérsia por imprecisões diplomáticas sobre as peculiaridades da disputa regional. Na consulta realizada ao governo de Tel-Aviv sobre a abertura do consulado foi afirmado que não seria objetada a criação de “uma seção consular” da embaixada, o que contrariava a decisão anunciada pelo governo de Juscelino Kubitschek, que talvez tenha motivado a não designação de pessoal para o posto. Indagado sobre as razões que levaram o governo brasileiro a abrir o consulado-geral em Jerusalém, Macedo Soares disse que foi “por razões espirituais, políticas e diplomáticas”. Mencionou também que “a existência de uma repartição consular brasileira” significava “a presença de milhões de católicos brasileiros na Cidade Santa”, que “a principal missão dos consulados é a defesa e o amparo de brasileiros que se acham no exterior” e, no caso de Israel, “de peregrinos que se encontravam naquela cidade”.
A recriação do consulado-geral em Jerusalém poderia ser uma solução para evitar uma mudança dramática de diretriz de política externa de mais de 60 anos. Essa solução - amparada em precedente histórico - seria até melhor, do ponto de vista brasileiro, do que outras soluções, como a criação de um escritório comercial em Jerusalém, a exemplo do que fez a Austrália. Ao anunciar o estabelecimento do escritório, o primeiro-ministro australiano manteve a coerência de sua administração e confirmou sua posição favorável à política de dois Estados.
Apresentada de maneira apropriada, o governo israelense e a comunidade evangélica entenderiam a decisão do Brasil, coerente com sua tradicional atitude, compreendendo as dificuldades internas para alterar uma política tão consolidada e evitar o isolamento internacional.
*RUBENS BARBOSA É PRESIDENTE DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS E COMÉRCIO EXTERIOR (IRICE)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Jerusalem - Leandro Narloch (Crusoe)

O artigo é fraquinho, sem quaisquer argumentos diplomáticos ou de direito internacional, como deve ser o caso nesta questão. Em 2010, quem presidiu à decisão de reconhecer o Estado Palestino foi o presidente Lula, não o estupor da Madame Pasadena.
Sem pretender remontar a toda a questão histórica, desde os anos 1950, quando o Brasil já cogitava – tendo elevado a sua legação em Tel Aviv ao status de embaixada – de patrocinar um plano (apresentado em 1953) para a desmilitarização e neutralização (ela via da internacionalização) de Jerusalém, e de criar um Consulado brasileiro em Jerusalém (criado efetivamente em 1958 pelo presidente JK e pelo chanceler Macedo Soares), permito-me remeter a meu artigo mais sintético, escrito um ano atrás, já reproduzido aqui:

3249. “Um alerta sobre uma delicada questão diplomática: o caso de Israel”, Brasília, 23 fevereiro 2018, 3 p. Chamando a atenção para o apoio político dado por setores religiosos a Israel, como suscetíveis de influenciar a postura diplomática brasileira. Postado no blog Diplomatizzando (31/12/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/12/embaixada-em-jerusalem-alerta-precoce.html).
Paulo Roberto de Almeida

Eis o artigo de Leandro Narloch:

Israel, capital Jerusalém

Leandro Narloch,
Revista Crusoé, n. 41, 12 fevereiro 2019

Por que a embaixada brasileira na Itália está no centro de Roma? Porque os italianos consideram Roma sua capital. Por que temos uma embaixada em Washington? Porque Washington é a capital dos Estados Unidos. Mas então por que a embaixada brasileira em Israel fica em Tel Aviv e não em Jerusalém Ocidental?
O Brasil foi um dos primeiros países a reconhecer a existência do estado de Israel, em 1949. E desde então esse país que nós reconhecemos considera Jerusalém sua capital.
O mesmo vale para o escritório da representação brasileira na Palestina, que existe desde 2004, em Ramala. Em 2010, Dilma reconheceu a existência do estado Palestino segundo as fronteiras de 1967 (ou seja, Cisjordânia e Faixa de Gaza formando o estado Palestino; Jerusalém dividida entre os dois países).
Depois que Bolsonaro anunciou que seguiria Trump e mudaria o endereço da embaixada, o governo tem fraquejado nessa decisão. Não deveria. Israel é um oásis de liberdade, democracia e direitos humanos no Oriente Médio – é importante que o Brasil sinalize apoio a sua autonomia. A atitude não precisa soar como provocação aos árabes. Se algum dia houver um estado Palestino, a embaixada também pode ser em Jerusalém, na parte oriental.
Argumentos muito ruins costumam aparecer nesse debate. “Trata-se de um território em disputa”, me diz um amigo contrário à mudança da embaixada. Sim, territórios da região têm sua posse contestada. É o caso dos assentamentos judeus na Cisjordânia, uma controvérsia que divide até mesmo os israelenses. Estive lá em novembro: a tensão é evidente. Jornalistas e turistas que se aventuram a passear pela região de Eli, no norte da Cisjordânia, costumam usar ônibus blindados para se proteger de pedras e tiros disparados por palestinos. Ao volante, o motorista listava locais de atentados recentes; na porta de uma fábrica, faixa e flores lembravam o atentado contra dois israelenses duas semanas antes.
Mas esse não é o caso de Jerusalém Ocidental. Só o mais radical defensor dos árabes deve achar que os palestinos têm direito ao território onde está a sede do governo israelense desde 1950. O Parlamento, a Suprema Corte e os ministérios ficam em Jerusalém desde quando a cidade ainda era dividida entre Israel e a Jordânia. Ninguém sensato defende controle palestino na área do Museu do Holocausto, por exemplo. Só pensa assim quem reivindica a “Palestina Original”, sem nenhum estado judaico. Mas, para esses, a embaixada até mesmo em Tel Aviv é motivo de ofensa.
“Se mudarmos a embaixada, os países do Oriente Médio vão retaliar e boicotar produtos brasileiros”, diz outro argumento duvidoso. Aqui é preciso levar em conta a tal “soberania nacional”. Tenho calafrios com essas duas palavras – elas já serviram para Ernesto Geisel justificar a proibição de computadores importados no Brasil. Mas esse caso é, sim, questão de soberania. Ora, quem decide onde instalaremos representações diplomáticas somos nós, não a Turquia ou a Arábia Saudita. O Oriente Médio responde por 4% das exportações brasileiras – isso já é o suficiente para baixarmos a cabeça?

domingo, 10 de fevereiro de 2019

O caso da embaixada em Jerusalém - Sputinik

Embaixada em Jerusalém seria desastre econômico e diplomático

sputinik
Sputinik, 9/02/2019

Em consonância com promessa feita por Jair Bolsonaro durante o período de campanha antes da eleição presidencial, o chanceler brasileiro voltou a falar ontem da mudança da embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, sublinhando, no entanto, a possibilidade de isso acontecer sem atrapalhar as relações do país com o mundo muçulmano.
Questionado na última quinta-feira, 7, em Washington, sobre a anunciada mudança da missão diplomática brasileira na capital israelense, Ernesto Araújo afirmou que a manobra é algo que ainda está sendo considerado, mas que o desejo do governo brasileiro é o de que, se isso realmente ocorrer, seja positivo não apenas para os laços com os israelenses, mas com todo o mundo árabe e islâmico. Seria isso possível?
Para Tanguy Baghdadi, professor de Relações Internacionais da Universidade Veiga de Almeida, não. Segundo ele, o fato de o Brasil mudar sua embaixada para Jerusalém, cidade sagrada e disputada por judeus e muçulmanos, significaria que "o Brasil não acredita que deva ser criado, ou pelo menos que haja condições para ser criado, um Estado palestino dentro da região". Nesse sentindo, o especialista avalia que os impactos para Brasília seriam severos. Ele lembra, por exemplo, que os países árabes e muçulmanos são importantes compradores de carnes brasileiras, e que esse mal-estar poderia afetar de maneira significativa o setor da agropecuária brasileiro.
"Imagino que Bolsonaro esteja, que o governo esteja, de uma certa forma, adiando essa decisão, até para conseguir medir a temperatura, saber o que é melhor. Porque transferir a embaixada seria muito ruim para estados que votaram no Bolsonaro em peso, seria prejudicial também para a própria economia brasileira, e não transferir a embaixada seria quebrar uma promessa de campanha", disse o acadêmico em entrevista à Sputnik Brasil, dizendo acreditar que o Ministério das Relações Exteriores do Brasil esteja em vias de fazer essa transferência.
Baghdadi ressalta que, tradicionalmente, o Brasil sempre se destacou por um acentuado equilíbrio em suas relações internacionais, ao contrário do que vem sinalizando no atual governo. Hoje, entretanto, os passos da política externa brasileira estariam muito mais no sentido de despertar curiosidade do que de sinalizar alguma previsibilidade.
"Essa mudança da embaixada certamente geraria uma curiosidade, e até uma certa preocupação, dos demais países com relação a o que mais viria pela frente."
De acordo com Raquel Rocha, doutora em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo (USP), há uma grande dificuldade, por parte do atual governo do Brasil, do ponto de vista prático, em cumprir essa promessa de campanha de Bolsonaro, de reconhecer Jerusalém como capital do Estado de Israel.
"Eu confesso que eu acredito que essa seja uma promessa que vai ser alongada durante os anos de governo Bolsonaro. E vai ser sempre essa ideia de que o quando vai ser discutido e não necessariamente vai ser concretizado", disse ela à Sputnik.
Além das consequências comerciais óbvias, a especialista da USP acredita que o impacto político sobre essa provável mudança:
"Na pauta política, com certeza, a gente vai ter grandes críticas", afirmou, lembrando o caso dos Estados Unidos, país que gerou fortes reações internacionais ao realizar essa manobra. "É um pouco até contraditório em termos de alinhamento de política externa que o Brasil, agora, seja tão favorável a um desenho geográfico mais favorável a Israel. E ainda mais por ter esse favorecimento em cima de uma pauta religiosa", declarou Rocha.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

O chanceler paralelo: Eduardo Bolsonaro - Igor Gadelha (Crusoe)


Transcrevo, abaixo, trechos da entrevista de Eduardo Bolsonaro ao jornalista Igor Gadelha da revista Crusoé, exclusivamente sobre temas de política externa e diplomacia, à exclusão de todos os demais, sobre política interna, Congresso, etc.
Confirma-se o que já se sabia...
Paulo Roberto de Almeida


“Filho é indemissível’
Revista Crusoé, n. 41, 9/02/2019

(...)

O sr. acha que o Brasil deveria intervir ou apoiar uma intervenção militar na Venezuela?
Sou contra a ideia de que o Brasil venha a declarar uma guerra ou fazer uma intervenção na Venezuela. Até se nós quisermos aqui formar uma força humanitária e mandar um avião sobrevoar as áreas onde estão as pessoas mais ligadas ao Guaidó (Juan Guaidó, que se proclamou presidente interino do país), qual a garantia teremos de que esse avião não vai ser bombardeado na Venezuela? Nenhuma. Então, a Venezuela hoje não tem sequer uma estabilidade para você mandar uma ajuda humanitária desse porte. Além disso, mandando uma ajuda humanitária, certamente quem está lá embaixo está com armas nas mãos, que são os coletivos do Maduro, para os quais ele distribuiu vários fuzis, inclusive AK. Com apoio da Rússia, alguns anos atrás, o (Hugo) Chávez distribuiu mais de 100 mil (fuzis) para os seus coletivos, os cubanos, que são em torno de 50 mil, expectativa de 50 mil a 100 mil, mais ou menos, que estejam lá, Hezbollah, FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), ELN (Exército de Libertação Nacional). Esse pessoal é que vai pegar a ajuda humanitária e distribuir entre os deles. Então temos que ter a coragem de falar o seguinte: o Maduro só vai sair do poder através do uso da força. Não estou dizendo que o Brasil tem que ir lá, entrar com militares, com as Forças Armadas, para tirar o Maduro, não. Não é isso que estou dizendo. Estou tendo uma conclusão óbvia. Porque através de eleições ele já demonstrou que não vai sair. As últimas eleições tiveram mais de 80% de abstenções. Se levarmos em conta que não houve fraude, o que é uma piada imaginar que não houve fraude naquelas eleições, o Maduro foi reeleito com 17% dos votos.
De onde viria, então, essa força para tirar Maduro do poder? Dos Estados Unidos?
Os Estados Unidos têm grandes Forças Armadas. E não só os Estados Unidos, mas qualquer iniciativa que venha a ser feita na Venezuela, como ocorreu de maneira desorganizada com Oscar Pérez, que juntou um pequeno contingente de militares e policiais e conseguiu fazer uma força ali para tentar bater de frente com o Maduro, qualquer iniciativa dessas tem que ser apoiada. Porque, se ela não for apoiada, a cada dia que passa, mais pessoas estarão morrendo de fome, e o Maduro não está nem aí para isso.

Mas que solução o sr. vê, afinal?
Vejo que, de alguma maneira, alguém tem que se organizar. Principalmente militares venezuelanos que estão no exílio, de alguma maneira, se organizar para conseguir, pouco a pouco, entrar e ir libertando a Venezuela. Agora, entre o que eu acho que pode acontecer e o que vai acontecer, há uma distância bem grande. Estou te falando aqui como um deputado federal do Brasil o que eles podem fazer, o que estão fazendo etc. Agora, toda ditadura, quanto mais ela vai se enrijecendo, mais a oposição também vai tomando medidas contrárias. O povo venezuelano estará vendo que vai morrer de fome ou vai ter que se prostituir para ter umas migalhas do governo, mais e mais pessoas vão pensando que vale a pena tentar ir para o tudo ou nada.

Qual é a sua opinião sobre a transferência da embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém?
Acredito que o Brasil não pode errar porque, pelo tamanho que o Brasil tem, ele vai servir de exemplo para toda a região. Então, se o Brasil fizer uma transferência de maneira exitosa, se for um sucesso a transferência da embaixada, isso fará com que outros países possam vir a acompanhar o Brasil. Do mesmo modo que, se nós fizermos alguma coisa errada, isso vai servir de exemplo para que outros países não venham a seguir essa tentativa de transferência da embaixada para Jerusalém. O que as pessoas não atentam é que ocorreu já uma grande mudança no Oriente Médio, onde Israel não é mais visto como inimigo. Israel é cada vez mais visto como um aliado. O grande problema de toda aquela região é o Irã. O Irã é que financia o terrorismo, o Irã é que causa problemas, que dá suporte para grupos extremistas. Para você ver: Israel queria dar de graça a tecnologia de água para os fazendeiros no Irã. O governo do Irã não permitiu porque era uma ajuda de Israel. Ele prefere ver seu povo morrendo sem alimento e sem água a receber uma ajuda de Israel. E eu corroboro que aquelas relações ali mudaram quando você olha a mudança que os Estados Unidos fizeram de sua embaixada para Jerusalém. Vários países censuraram publicamente, mas não houve qualquer tipo de retaliação contra os Estados Unidos. Aí, já sei, você vai perguntar: poxa, mas olha o tamanho dos Estados Unidos. Tudo bem. Mas olha o tamanho da Guatemala. Será que, se os países árabes não quisessem destruir a Guatemala, fazer um embargo econômico, não poderiam fazer? Por que não fizeram? O Brasil é um meio termo. Não está em uma posição como a americana, nem como a guatemalteca. Mas é um meio termo, e acho, sim, que a gente tem que fazer essa mudança. Primeiro, por respeito aos eleitores, já que é uma promessa de campanha do Jair Bolsonaro. E, em conversa com o Benjamin Netanyahu, quando ele veio ao Brasil, Jair Bolsonaro se comprometeu a fazer a mudança.

Há uma pressão da bancada ruralista contra a transferência por receio de retaliações na compra de frango.
Muito frango… E carne. Do Brasil e da Austrália. E se os dois mudarem a embaixada, (os países árabes) vão fazer o quê?

O sr. concorda com o meio termo adotado pela Austrália de instalar a embaixada em Jerusalém Ocidental?
Não. Acho que tem que ser o compromisso de campanha. Você pode botar um gabinete avançado, depois pode fazer a mudança da embaixada. Tem que ver um prédio para isso. Isso pode ser que não saia de graça. Enfim. Mas são medidas que têm que ser tomadas. Outro ponto que a gente não passou, mas que é relevante, é que muitas pessoas têm medo de ataque terrorista. Ah, a gente vai estar trazendo para o Brasil a questão do terrorismo islâmico para cá. Meus caros, a Argentina já teve dois ataques terroristas nos anos 1990. Quem acha que no Brasil não tem operação de grupo extremista está redondamente enganado. O Hezbollah está aqui em cima junto com o Hamas, aqui na Venezuela. E reparem: quantas pessoas morreram de ataques terroristas em 10 anos na Europa? Não chegam a mil.

Mesmo assim é muita gente.
Eu sei. Mas calma lá. Estou querendo dizer o seguinte: e se eles começarem a fazer ataques terroristas reivindicando que as mulheres, sei lá, tenham determinado comportamento? E aí, a gente vai abaixar a cabeça para eles porque vão fazer ataques terroristas? Acho que, se eles radicalizarem com ataques terroristas, a gente poderia enrijecer as nossas leis, especificamente para esses casos. Banimento de passaporte, banimento do país, prisão perpétua. Começar a discutir aqui. Tenho certeza que, se você colocar para um plebiscito, aprova.

Mas é cláusula pétrea na Constituição a proibição da prisão perpétua, por exemplo. Como fazer?
O poder constituinte originário é do povo. O povo tem total poder para mudar. Quem vive no território brasileiro não é o povo brasileiro?

(...)

terça-feira, 6 de novembro de 2018

De Tel Aviv a Jerusalem: a mudança de vários bilhões de dólares - Paulo Roberto de Almeida

No início do ano, ao ler uma "interessante" matéria numa revista "progressista", redigi imediatamente uma nota, como sempre faço quando me deparo, ou tropeço, neste caso, com coisas inusitadas que irrompem em minha tela, ou nas folhas que leio. Fiz este texto:

3249. “Um alerta sobre uma delicada questão diplomática: o caso de Israel”, Brasília, 23 fevereiro 2018, 3 p. Chamando a atenção para o apoio político dado por setores religiosos a Israel, como suscetíveis de influenciar a postura diplomática brasileira.

Como o assunto voltou à pauta, permito-me transcrever novamente o que escrevi em fevereiro, sem sequer reler, para não ficar tentado a mudar alguma coisa...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 6 de novembro de 2018

Um alerta sobre uma delicada questão diplomática: o caso de Israel

Introdução
Recentemente, um órgão da imprensa brasileira (Revista Piauí, 19/02/2018), trouxe uma matéria sobre o crescente apoio político ao pré-candidato Jair Bolsonaro, vindo de meios simpáticos à causa de Israel entre círculos de empresários judeus de São Paulo: “Empresários paulistas contam porque apoiam Bolsonaro” (disponível neste link: http://piaui.folha.uol.com.br/empresarios-paulistas-contam-por-que-estimulam-bolsonaro/). A alegação para o apoio era a de que o candidato seria o único, dentre os já declarados, a ser “favorável a Israel”. A justificativa foi explícita: “É pessoalmente comprometido com o Estado de Israel”. Supõe-se que a mesma justificativa para o apoio a esse candidato possa vir, oportunamente,da já respeitável bancada evangélica no Congresso brasileiro, apoiadora incondicional de Israel, e que representa uma fração não desprezível, talvez até mais de 30%, do eleitorado brasileiro.
É importante chamar a atenção, e fazer um alerta preventivo, quanto ao caráter indesejável de se introduzir essa questão no debate político-eleitoral, por uma tripla preocupação a partir de minha posição como diplomata, mas também como eleitor, ou simples cidadão brasileiro: a inadequação de se introduzir um tema religioso no debate político; sua problemática dimensão diplomática, tendo em vista a posição tradicional do Brasil no tocante a Israel e à questão do status de Jerusalém; os possíveis efeitos desastrosos, no plano comercial-econômico, de uma tomada de posição deste candidato, ou de quaisquer outros, quanto a uma possível mudança de postura diplomática do Brasil, no seguimento da decisão da administração Trump de efetuar o deslocamento da embaixada dos EUA em Israel de Tel Aviv a Jerusalém.

A dimensão religiosa
A Constituição brasileira reconhece a validade, a legitimidade e a liberdade de todas as expressões religiosas no seio da sociedade, sem qualquer tipo de preferência ou discriminação. O Estado, porém, é laico, e não poderia deixar suas politicas públicas, mormente suas posturas diplomáticas, serem influenciadas por demandas específicas de um credo religioso qualquer, sob risco de ser acusado de introduzir a temática religiosa na esfera das grandes definições estatais, especialmente diplomáticas, que devem ficar necessariamente autônomas e independentes de preferências expressas no âmbito de um grupo religioso determinado, por mais influente ou majoritário que este possa ser. O antigo país católico romano que é o Brasil já traz uma crescente diversidade religiosa, e um crescimento visível das afiliações evangélicas, com poder suficiente para influenciar tomadas de decisão políticas na esfera do parlamento, sob a justificativa de que podem expressar correntes relevantes da opinião pública.
Esse parece ser o caso da bancada evangélica, comprometida com uma série de objetivos nos planos ético ou moral – casos do aborto, das opções de gênero, do chamado “casamento homossexual”, etc. –, no plano médico-científico – experimentos com células-tronco, por exemplo –, na esfera educacional – ensino de criacionismo ao lado da teoria da seleção natural – ou ainda, e mais importante para este argumento, a questão de Israel, não como Estado soberano, como qualquer outro, na comunidade internacional, mas como o representante legítimo da “palavra de Deus” na Terra. 
Seria conveniente que tal preferência religiosa não se traduzisse em qualquer pressão sobre o Estado brasileiro, especificamente sobre sua política externa, no caso concreto do reconhecimento de Jerusalém como “capital verdadeira” do Estado de Israel e na eventual transferência da embaixada do Brasil a essa cidade, considerada como “internacional” por ampla maioria dos países membros da ONU, e assim tem sido historicamente. O Brasil tem orgulho de ter sido um dos patrocinadores da criação do Estado de Israel, na famosa partilha da ONU de 1947, prevendo a criação de um estado palestino e a “neutralização” de Jerusalém como cidade comum a diversos credos. Uma interferência desse tipo sobre uma política pública seria, no limite, inconstitucional e extremamente controversa no plano diplomático, como agora argumentado.

A dimensão diplomática
Durante toda a história recente do Oriente Médio, e no acompanhamento dos dramáticos conflitos que ocorrem na região, a postura dos diferentes governos do Brasil desde o nascimento do Estado de Israel, tem sido a de apoio político e diplomático à sua existência, reconhecendo porém a necessidade de cumprimento escrupuloso de decisões da Organização das Nações Unidas, e de seu órgão de segurança, quanto ao equilíbrio necessário para se reconhecer os direitos do povo palestino a um Estado soberano, legalmente constituído. Jerusalém dispõe de um status especial, não sendo reconhecida como capital de Israel, a despeito de tentativas de parte do espectro político israelense e de grupos de apoio na esfera religiosa ao redor do mundo. Essa questão foi novamente trazida a exame pela comunidade internacional em face da decisão do presidente Trump de instalar sua embaixada naquela cidade, como “capital de Israel”, no que pode ser eventualmente seguido por iniciativas similares de um punhado de países. 
Não convém ao Brasil, país de tradicional acolhimento de imigrantes de todos os credos e origens raciais, e diplomaticamente um seguidor estrito do direito internacional em todas as vertentes de sua política externa, “importar” uma controvérsia de duvidosa legitimidade política ou diplomática, que não contribuiria em nada para consolidar o seu capital de parceiro imparcial de todos os atores e protagonistas dos dramas do Oriente Médio, quando sua postura tradicional tem sido, justamente, a de “exportar” apelos ao diálogo e à solução pacífica das controvérsias políticas e diplomáticas.
Qualquer pronunciamento de um dos candidatos à presidência do Brasil nessa questão teria o efeito de suscitar controvérsias internas e de colocar um problema no plano diplomático que atualmente inexiste, e deveria permanecer dessa forma. Não convém ao Brasil criar pontos de atrito ou fricções diplomáticas com Estados da região que possuem significativo contingente de expatriados, atualmente naturalizados e totalmente integrados à comunidade nacional, quando seu maior capital diplomático nos problemas do Oriente Médio é justamente a equidistância entre as partes em conflito.

A dimensão econômico-comercial
O Brasil é hoje um dos maiores fornecedores de grãos e carnes, dada a pujança de seu agronegócio, para diferentes mercados do mundo, destacando-se especialmente como um grande exportador de cortes avícolas no sistema “halal” para mercados árabes e muçulmanos em geral. Essa atividade representa bilhões de dólares em exportações, milhares de empregos no Brasil e um dos mais significativos nichos de competitividade nacional nos mercados externos, com perspectivas futuras ainda mais promissoras no comércio internacional do país. Disso deriva que qualquer tomada de posição do Brasil na questão de Jerusalém, ou mesmo de inflexão diplomática de sua postura equilibrada no sentido de maior apoio a Israel, poderia precipitar consequências políticas de grande impacto econômico e social nas regiões exportadoras de cortes especiais para mercados do Oriente Médio ou do mundo muçulmano. 
Cabe, assim, alertar preventivamente quanto à dimensão do problema em causa.

23 de fevereiro de 2018