O Caderno de Fim de Semana do jornal Valor Econômico publicou, nesta sexta-feira 18 de outubro, uma reportagem especial sobre petróleo do pré-sal e suas implicações para o Brasil, tanto do ponto de vista econômico, como de seu possível impacto geopolítico nas relações internacionais.
Fui contatado por jornalista para responder algumas perguntas, o que fiz de modo obviamente bem mais completo do que o que é possível acomodar numa simples matéria de jornal. Sempre é assim e isso faz parte das regras do jogo do trabalho dos jornalistas.
Acontece que sempre aproveito essas oportunidades para ver mais claro no panorama proposto e acabo escrevendo mais do que o esperado. Mas se trata de meu próprio esclarecimento, e acredito que possa servir aos curiosos na matéria e aos estudantes de forma geral.
Por isso transcrevo aqui tudo o que redigi em torno dos pontos focados pela matéria.
Paulo Roberto de Almeida
A questão energética no Brasil:
petróleo, Petrobras e políticas de governo
Paulo Roberto de Almeida
Respostas a questões colocadas pela jornalista Marcia Pinheiro
Princeton, 7-8/10/2013
Publicada apenas uma frase na matéria:
"Trunfos petrolíferos", por Cyro Andrade e Marcia Pinheiro,
Valor Econômico, Caderno EU & Fim de Semana, Sexta-feira e fim de semana, 18, 19 e 20 de outubro de 2013, ano 14, n. 675, p. 9-11.
Questão inicial: Como FHC conseguiu flexibilizar o
mercado de petróleo, com tanta campanha contra?
PRA: FHC NÃO flexibilizou o mercado do
petróleo, pois isso seria impossível, não só a ele, como a qualquer governo,
socialista ou neoliberal. O que FHC fez, em meio a um processo inteligente – mas
incompleto – de correção das muitas estupidezes econômicas da Constituição de
1988, foi adequar o Brasil a algumas realidades dos mercados mundiais. Os
mercados do e para o petróleo – existem vários, não um único mercado global,
alguns deles dominados por carteis, outros teoricamente livres, outros
influenciados por ditaduras petrolíferas, e várias outras modalidades
intermediárias – são gigantescos, e o Brasil participa de uma pequena parte
deles, antes importando 80% do que consumia, atualmente em situação de
equilíbrio instável, mais ainda exportando muito cru, e importando também muito
cru e derivados, o que é irracional, mas é fruto das políticas erradas mais
recentes.
FHC se
aproveitou de um momento único na história do Brasil, que provavelmente vai
demorar para voltar: uma coalizão reformista no bojo de uma enorme crise
inflacionária e que permitiu fazer algumas reformas absolutamente necessárias
para a economia e para a política do País: a crise permitiu aprovar diversas
medidas – constitucionais e infra – que não tiveram, infelizmente continuidade.
Os esquerdistas atrasados – concentrados no PT e nos outros partidos de
esquerda, ainda que alguns sejam propriamente fascistas – estiveram
momentaneamente na defensiva, embora todo governo constituído sempre possa
contar com a boa disposição fisiológica da maior parte dos políticos em apoiar
o governo em vigor, qualquer governo. Uma liderança dotada de visão de futuro
pode, assim, reformar as regras constitucionais e a legislação do setor do
petróleo a essa abertura ao capital estrangeiro, combinada a um tratamento
puramente comercial da Petrobras, que teve liberdade para se desenvolver como
companhia, não como cabide de emprego de políticos, o que ela era antes e
voltou a ser depois. Infelizmente, não se avançou na abertura total do setor e
na privatização da Petrobras, o que teria sido excelente para o Brasil e para a
própria companhia, que assim poderia crescer mais ainda sem interferências dos
governos e sem essa promiscuidade gerada por políticos rentistas.
Lamentavelmente, o setor retrocedeu absoluta e relativamente depois que
terminou o governo FHC, com várias distorções se acumulando ao longo do tempo,
num verdadeiro trabalho de destruição da Petrobras, processo conduzido pelos
governos posteriores.
Mas a campanha contra a mudança de
regime foi e é relevante, tanto que se conseguiu convencer os brasileiros que a
Petrobras é um “patrimônio do povo brasileiro”, quando ela é apenas uma empresa
estatal, importante, certo, mas manipulada antes e atualmente por interesses
políticos que não tem nada a ver com a atividade-fim. Os brasileiros – como
ocorria antes no caso da Vale, uma empresa na origem estrangeira, privatizada
pelo governo Vargas, e que vale imensamente mais agora, privatizada, do que
durante o meio século que permaneceu em mãos do governo – estão convencidos de
que o petróleo é um bem estratégico, o que ele é, mas muito mais é a educação,
inclusive para compreender que o petróleo deve ser tratado como mercadoria, não
como a salvação do Brasil. Salvação só existe com povo educado, não com
petróleo. O Japão quase não tem petróleo, e não deixou de alcançar a riqueza
mesmo sem muita energia. Educação é a chave, não mercadorias.
1. O petróleo sempre
desempenhou papel geopolítico de primeira importância na história moderna,
interligando produtores e compradores numa rede de interesses ora comuns, ora
conflitantes.
PRA: Como qualquer mercado sempre existe
oposição de princípio entre compradores e vendedores, cada um querendo
maximizar os seus ganhos. Mas não existe um mercado para o petróleo e sim
muitos, múltiplos mercados, muito diversos, com características muito
diferenciadas dos demais mercados, pois no caso do petróleo cru não se trata de
uma commodity como qualquer outra, mas sim de um produto natural, não
renovável, relativamente concentrado em pontos determinados do planeta –
variáveis em função das tecnologias de exploração – mas que é absolutamente
estratégico, central, determinando, absolutamente indispensável à moderna
civilização industrial. Para uma informação mais detalhada sobre as
características desse produto, e de seus diversos mercados, recomendo uma
leitura dos dois livros indispensáveis de Daniel Yergin sobre a economia
política do petróleo, já traduzidos e publicados no Brasil: são, provavelmente,
mais de 1.600 páginas, no conjunto, mas
vale a pena o esforço. Uma consulta a seu site de consultoria em energia,
baseado em Cambridge, Massachussetts, também seria recomendável.
2. Grandes produtores
(países do Oriente Médio e do Norte da África), de um lado, e grandes
consumidores (países centrais, em sentido amplo), estabeleceram-se há muito
tempo como protagonistas no xadrez geopolítico global.
PRA: Essa realidade já mudou muito e
está mudando cada vez mais. A China já é uma grande consumidora global – embora
não per capita – de petróleo, e há muito tempo deixou de ser uma produtora
autossuficiente: para ela, ter acesso a fontes seguras de petróleo é
absolutamente vital, mais até do que para os países ocidentais, que podem
contar com diversas fontes relativamente seguras, inclusive porque dominam
amplamente tecnologias e os mercados de futuros e o mercado spot de petróleo.
Ou seja, o mundo ocidental ainda tem algum controle – não sobre fontes, mas –
sobre comercialização e industrialização desse produto estratégico. Mas,
grandes países periféricos vem igualmente adquirindo certa preeminência em
alguns dos mercados, inclusive de derivados, e no consumo.
A geopolítica do petróleo também
mudou bastante: até o segundo choque do petróleo (1979), a OPEP (e dentro dela
a OPAEP, árabes) eram responsáveis por parte substancial da oferta mundial e
quase 70% das reservas declaradas. Já não é mais o caso, e o cartel da OPEP já
não tem condições de ditar as regras dos diversos mercados de petróleo cru,
inclusive porque os próprios países membros não cumprem suas decisões por
inteiro. Hoje mais da metade das reservas e da oferta de petróleo é não-OPEP.
Se trata de uma diferença importante em relação ao passado. Ver Yergin para
essas mudanças.
3. Graças a avanços
técnicos que possibilitam a descoberta de grandes reservas e, sobretudo, a
exploração e produção de petróleo e gás de fontes não convencionais, Estados
Unidos, Canadá, Brasil e Venezuela podem levar o continente americano a uma
posição de menor ou nenhuma dependência energética em relação às regiões
fornecedoras tradicionais.
PRA: O continente americano não pode ser
tomado no plano hemisférico. A América do Norte é tanto produtora quanto
consumidora, e este aspecto domina no caso do Canadá e EUA, que vem se tornando
novamente um grande produtor de energia, em suas diversas formas. A América
Latina, por sua vez, é excedentária em energia, em suas diversas formas, e é
uma consumidora moderada, mas isso deve crescer. Mas ela ainda detém tecnologia
restrita – com algumas exceções, entre elas o Brasil – e não controla mercados
de comercialização. Dependência energética todos os países têm, dependendo das
fontes disponíveis, da tecnologia mobilizada, do ritmo de exploração e da
intensidade de consumo (hoje, por exemplo, os países avançados consomem muito
menos petróleo por unidade de produção do que nos anos 1970, enquanto a China
ainda “desperdiça” petróleo no seu setor industrial). Na América Latina, a
despeito de existirem grandes produtores, os países também são dependentes, e
mesmo o Brasil, com o pré-sal, não deve se tornar um grande protagonista nos
mercados ofertantes, pois seu consumo também deve crescer (isso se o pré-sal se
revelar realmente produtivo). O Brasil deve continuar a ser relativamente
marginal na geopolítica mundial do petróleo, ainda que venha a se tornar um
grande produtor: ele não reúne as condições para se tornar um grande
protagonista nos diversos cenários que podem ser traçados para seu futuro
energético, embora venha a assumir algum papel relevante, mas isso deve ocorrer
nas energias renováveis, não nas fósseis, provavelmente, e mesmo assim, muito
depende das políticas do governo, que nos últimos dez anos errou tremendamente
nas diversas vertentes da política energética.
4. Essa condição de
agrupamento geográfico não uniformiza, porém, os interesses correntes e
estratégicos de cada um desses países no cenário internacional. Bem ao
contrário (com exceção, talvez, em certo grau, de Estados Unidos e Canadá.
PRA: Não existe, no cenário previsível,
possibilidade de unificar interesses estratégicos dos grandes, médios e
pequenos atores nos diversos mercados energéticos, e mesmo nos mercados do
petróleo. Os interesses nacionais são extremamente diversos, embora possa
existir alguma coordenação e diálogo entre os grandes atores. A OPEP é um
cartel, que como todo cartel, pretende apenas extrair renda dos seus clientes e
consumidores. Os países da OCDE estão mais ou menos coordenados na Agência Internacional
de Energia, que funciona na OCDE, em Paris, justamente, mas se trata mais de um
fórum para intercambiar opiniões, trocar informações, desenvolver estatísticas
e estudos técnicos de grande sofisticação, que não pode ter a pretensão de
coordenar realmente as políticas nacionais dos países. Ou seja, se trata de
cada um por si, pois a energia é absolutamente estratégica, vital para o nosso
modo de vida, mas assume tantas formas e características que seria totalmente
impossível esperar uniformização de interesses nesses mercados. Não se trata
mais, como no passado, de uma luta entre impérios para controle das fontes, mas
de uma concorrência entre grandes companhias, num mercado fortemente desigual e
altamente competitivo, colocando em face, uns dos outros, governos, companhias
privadas, estatais, ditadores e especuladores, o que torna difícil coordenar
interesses. Ou seja, o mundo deve continuar na relativa anarquia que hoje o
caracteriza, sendo porém de se excluir grandes guerras globais para acesso às
fontes, o que não exclui escaramuças e guerras localizadas entre países e
dentro dos países.
Existe, como
se sabe, uma “maldição do petróleo”, com muitos livros a respeito. Recomendo ler
Peter Maass, Crude World: the violent
twilight of oil.
5. Nessa rede de
interesses geopolíticos internacionais em transformação, o Brasil tem presença
que variou de patamar ao longo do tempo, com narrativas políticas que se
desenrolaram, ora na frente doméstica, ora na frente externa, mas quase sempre
exprimindo alguma forma de conjugação de iniciativas, nos dois campos, em
termos de ação governamental consequente. Com o Pré-Sal, quais perspectivas se
abrem para o Brasil na arena geopolítica global?
PRA: Discordo da expressão “ação
governamental consequente”. O Brasil, na verdade, nunca teve uma
política coerente para o petróleo, terreno muito submetido a paixões
“nacionalisteiras” as mais nefastas e deprimentes do ponto de vista da
racionalidade estrita do setor, embora tenha tido políticas energéticas
razoáveis, ao longo do tempo. Nos atrasamos na revolução industrial, em parte
pela falta de fontes seguras de energia, carvão e petróleo, justamente, o que
veio mais tarde, mas com grandes dificuldades e com interferências políticas
nefastas em diversas áreas. Mas, por outro lado, soubemos explorar, com algum
grau de racionalidade, as fontes naturais, ou seja hídricas. Nesse terreno, as
possibilidades ainda existentes vêm sendo sabotadas pelos novos malthusianos da
era contemporânea, que são os ecologistas não científicos, essa horda de
ambientalistas românticos, que poderiam nos fazer retroceder ao neolítico, se
por acaso comandassem governos e políticas públicas (e não só em energia, mas
ele alimentos também).
A matriz
energética brasileira é relativamente positiva, com muitos recursos renováveis,
e deveríamos continuar assim. Infelizmente (no sentido alegórico da palavra),
estamos caminhando para sujar um pouco essa matriz, com a aparente abundância
de petróleo do pré-sal, que também pode ser uma “maldição”, dependendo de como
seja explorado. O fato é que o pré-sal determinou grandes mudanças nas
políticas públicas de energia no Brasil, todas elas nefastas até o momento,
pois despertou os instintos rentistas dos políticos e tende a deformar as
outras políticas setoriais, inclusive no próprio petróleo.
Respondo à esta
questão – Com
o Pré-Sal, quais perspectivas se abrem para o Brasil na arena geopolítica
global? – pela negativa, por
fatores puramente objetivos, e não com base nas minhas opiniões negativas
quanto à “baixa política” governamental em relação ao pré-sal. O pré-sal NÃO
vai transformar o Brasil em ator geopolítico relevante no terreno do petróleo,
simplesmente porque existem muitas outras fontes mais baratas e acessíveis de
petróleo e outros combustíveis fósseis, assim como de renováveis (inclusive no
próprio Brasil, se as políticas corretas forem aplicadas, o que ainda não é o
caso). Em primeiro lugar, seria preciso ver se o pré-sal é de fato real, o que
depende não apenas da tecnologia – que existe mas pode ser difícil – mas
basicamente dos mercados ofertantes de energia e de petróleo em particular: a
AIE calcula que a extração do petróleo do pré-sal pode estar em torno de 80
dólares o barril (comparando: a média no Oriente Médio deve andar em torno de
12 a 15 dólares, sendo que em alguns lugares pode estar abaixo de 5; se
fossemos extrair petróleo no Ártico, não seria possível a menos de 150
dólares). Ou seja, se o barril cair muito nos mercados internacionais, melhor
deixar o petróleo do pré-sal onde está, dar até logo e esperar que o preço
supere 100 dólares (será sorte do Brasil se ele se mantiver nessa faixa, o que
é bastante provável, pois outros produtores, basicamente ditaduras petrolíferas
e rentistas do petróleo, têm interesse que seja assim).
Mesmo que tudo dê certo, haverá muito
pouco petróleo para fazer com que o Brasil altere radicalmente a balança
mundial; o que houver de excedentário ao seu próprio consumo (que deve crescer
bastante), será comercializado marginalmente nos mercados globais, pelas
companhias que o estão explorando e pela Petrobras. Nada que altere a balança
mundial energética, ou a “simples” geopolítica do petróleo. Aquela visão do
Lula, do Brasil grande produtor, como sempre é megalomaníaca e não corresponde
à realidade.
6. Como variaram, no
tempo, as políticas externas brasileiras sob relações de interseção com as
posições alcançadas pelo país em termos de suficiência energética? Que peso
tiveram, em momentos mais expressivos dessa conexão, as peculiaridades do
momento político doméstico vivido pelo país? (Vamos fazer uma linha do tempo
com os dados assim levantados).
PRA: O Brasil teve políticas erráticas em
relação ao petróleo, um pouco menos erráticas nas outras vertentes energéticas.
No petróleo, perdemos muito tempo com bravatas nacionalistas que só nos
atrasaram, na produção, na exploração, na comercialização, e sobretudo na
distribuição interna, pois a Petrobras sempre foi politizada e usada pelos
governos, seja num sentido econômico (como na era militar), seja num sentido
baixamente fisiológico, como ocorre desde o início da gestão Lula. Quanto ela
começou a funcionar corretamente, na gestão FHC – e sobretudo depois da
aprovação da lei do petróleo e da ANP, em 1997 – e prometia grandes avanços nos
dois terrenos (exploração e produção, ou seja, prospecção, extração e
transformação em derivados, mas menos na comercialização, onde se manteve,
infelizmente, o monopólio de fato da Petrobras), veio a nova gestão dos
companheiros, que praticamente dinamitou, não apenas a Petrobras, mas boa parte
da política energética, ambas submetidas a critérios políticos nefastos e
indefensáveis.
Além da
politização da Petrobras, e sua utilização por máfias sindicais, ocorreu um
desvio fundamental das políticas corretas anteriormente colocadas em vigor pelo
governo FHC, ou seja, tratar a Petrobras – que nunca se cogitou de privatizar –
como uma empresa comercial, e deixa-la aplicar critérios técnicos e comerciais
em todos os aspectos de suas atividades. A gestão Lula foi negativa, chegando a
cometer crimes econômicos, sob certos aspectos, contra Petrobras, contra a
matriz energética do Brasil, contra os acionistas e contra o próprio Brasil. Um
desastre completo, que está longe de ser corrigido, pois a nova lei aplicada ao
pré-sal, de 2010 (ainda não totalmente em vigor, pois além de tudo também
destruiu a federação, com o acirramento dos comportamentos rentistas em todos
os governos estaduais e em todos os políticos), simplesmente desequilibra
completamente uma estratégia racional para o petróleo e para outros
combustíveis.
Um dia vai
se poder avaliar, racionalmente, todos os desastres e crimes econômicos
cometidos pela gestão lulista nessa área. O Brasil ainda está muito dominado
pela euforia nefasta do pré-sal, para que os dirigentes façam uma análise
isenta dos equívocos cometidos. Alguns economistas, mas muito poucos, vêm
apontando os erros perpetrados pelo governo, em praticamente todas as frentes
(renováveis e fósseis), e continuam a ser praticados, sem que se tome
consciência da má direção tomada pelo país. Se o Brasil tivesse continuado na
lei de 1997 (que permanece, mas os leilões pararam, praticamente), teria
conseguido royalties para o governo, sem riscos para a Petrobras, e sobretudo
sem o caos legislativo e judiciário criado com a estatização do pré-sal pelo
governo irresponsável do presidente Lula. Ou seja, os equívocos no tratamento
do petróleo são gigantescos e talvez não sejam mais reversíveis, pois o
governo, criminosamente, incitou no mais alto grau os instintos rentistas dos
políticos, praticamente “distribuindo” royalties do pré-sal que talvez nem
venham a existir, e criando um conflito distributivo entre os estados que não
se resolverá sequer no Judiciário (STF). Um caos completo.
No terreno
dos renováveis, os erros não são menores, tanto em relação ao etanol (“afogado”
pelo controle de preços criminoso aplicado aos derivados de petróleo), como em
relação ao biodiesel. Aqui, o governo foi absolutamente estúpido, ao misturar
matriz energética com problemas sociais, criando um programa de biodiesel de
mamona a ser fornecido por “agricultura familiar”. Um outro desastre incomensurável,
que eliminou o Brasil do mapa dos biocombustíveis, aparentemente tão promissor
antes dos desastres cometidos pelo governo Lula. Neste terreno, como em
diversos outros, ainda falta fazer a história real, verdadeira, dos equívocos
cometidos pelo governo Lula em diversas frentes: na produção, na
comercialização, nos estímulos setoriais, no tratamento do capital privado e
dos investimentos estrangeiros: ele não acertou uma única vez, errou em
todas...
7. O Brasil tem hoje um
governo que se pode chamar de esquerda e democrático (como já era com
Lula). É um governo que se relaciona bem, no continente, com governos
radicais de esquerda, esquerdistas progressistas, e de centro-direita. É
considerado pelos Estados Unidos uma potência sub-regional e um aliado de
primeira importância. É membro do G-20. Com o Pré-Sal, o Brasil caminha para
tornar-se um exportador líquido de energia, e poderá ganhar níveis invejáveis
em matéria de segurança energética. Que importância essa posição de
quase-independência tem hoje, em termos geopolíticos? Que importância poderá
ter, no futuro, a possível independência plena?
PRA: O governo é de esquerda, certamente,
mas de uma esquerda atrasada, estatizante, centralizadora, populista e
demagógica, quando existem outros governos de esquerda, no mundo, abertos,
reformistas, racionais em economia e dotados de uma visão econômica moderna,
receptiva a investimentos estrangeiros e sem muita demagogia populista (no
Chile, por exemplo, ou no Uruguai, e em vários países europeus). O governo
certamente não é democrático, ainda que não possa implantar um regime
autoritário, mas é dominado por um partido neobolchevique que faz de tudo para
eliminar as oposições, controlar a imprensa e impor o controle do Estado sobre
praticamente todos os setores da vida pública. A bem da verdade, o partido
hegemônico e seu governo possuem tendências fascistas, que se revela justamente
nessa tentativa de colocar sob o controle do Estado a vida de todas as empresas
e de todos cidadãos, e que trata os mais pobres como massa de manobra.
Quanto ao
ambiente externo, se pode dizer que o governo tem tendência a apoiar todas as
ditaduras supostamente esquerdistas, como governos autoritários de modo geral,
e age com uma grande motivação contra o que ele chama de países hegemônicos, ou
seja, as grandes democracia de mercado. Não se deve tomar discursos
diplomáticos – como essa expressão usada e abusada de “parceiros estratégicos”
– pelo seu valor face, pois existe muita hipocrisia nessas proclamações; se
formos julgar pelos discursos, o Brasil tem “parceiros estratégicos” em todos
os continentes, e eles são tão mais estratégicos quanto menos “hegemônicos”
forem, ou seja, antiocidentais e anti-Estados Unidos. Esta é uma realidade
fática, que pode ser comprovada por diversas iniciativas e proclamações do
governo atual, não se trata de uma opinião. Basta ler nas entrelinhas e ver as
ações reais.
Quanto às
perguntas, respondo topicamente:
(a) Com o Pré-Sal, o
Brasil caminha para tornar-se um exportador líquido de energia, e poderá ganhar
níveis invejáveis em matéria de segurança energética.
PRA: Não é seguro que o
Brasil se torne um exportador líquido de petróleo, e se isso se confirmar, será
marginal no mercado mundial, ainda que possa trazer divisas para o Brasil.
Creio que haverá um equilíbrio entre consumo e produção com o pré-sal, e os
movimentos de comércio exterior nessa área vão depender da capacidade
industrial de refino e novas explorações.
(b) Que importância essa posição de quase-independência tem
hoje, em termos geopolíticos?
PRA: Quase nenhuma no plano mundial, apenas tornar o Brasil
menos dependente de petróleo importado, mas isso não é em si relevante, pois o
petróleo é uma commodity amplamente comercializável nos mercados livres, sem
qualquer problema de acesso aos demandantes. Basta ter renda, e renda se
consegue exportando quaisquer outros produtos.
(c) Que importância poderá ter, no futuro, a possível
independência plena?
PRA: Não existe independência plena no campo da energia. Nenhum
país e totalmente independente, e isso se aplica inclusive e principalmente ao
petróleo. Mesmo os países produtores e exportadores de petróleo são em geral
dependentes da importação de derivados e, como se disse, o petróleo é, e pode
ser, fonte de problemas enormes, como a distorção da economia, e algumas
“maldições” não desejadas. Não é seguro que o Brasil (pelo menos no governo
atual) consiga desenvolver um modelo “norueguês” de exploração racional do
petróleo e de utilização de seus royalties. O que é seguro, até aqui, é que o
governo Lula conseguiu piorar amplamente o ambiente geral do Brasil para a
exploração racional desse produto estratégico, deteriorando amplamente o quadro
institucional e as relações federativas. Em relação à Petrobras, os desastres
são visíveis.
8. Talvez essa
independência coincida com a dos Estados Unidos, a julgar pelo otimismo com que
vem sendo saudada a descoberta de importantes jazidas de óleo e gás de xisto naquele
país e possibilidades de sua extração. Quais efeitos poderia ter essa
coincidência (se ocorrer) para o fator ‘energia’ na equação geopolítica
brasileira?
PRA: Qualquer que seja a evolução
energética, pelos seus vetores, nos EUA, parece que o país está motivado para
diminuir sua dependência de fontes externas, fósseis e renováveis, e pode
conseguir, parcialmente. Isso significa que o Brasil perdeu e está perdendo
oportunidades, por cegueira econômica e miopia ideológica, de desenvolver
políticas de cooperação com esse gigante econômico, sobretudo em razão da
estatização irracional, demagógica, totalmente política, desse setor. O Brasil,
como já dizia Roberto Campos, é um país que não perde oportunidade de perder
oportunidades. Pois perdeu também no petróleo e nos renováveis, com os EUA, e
com os investidores estrangeiros de modo geral. Só estamos tendo relacionamento
com estatais de países autoritários, que não tem o critério do lucro como
básico, como é o caso de alguns investidores no campo de Libra.
9. A independência
americana pode ser mais difícil de ocorrer do que a brasileira: a extração de
óleo e gás de xisto ainda apresenta dificuldades técnicas e traria acréscimos
apenas graduais à produção, e as jazidas em águas profundas também não seriam facilmente
alcançáveis. Quais as possibilidades de o Brasil ganhar essa corrida e com
quais consequências geopolíticas, no continente, nas relações com os Estados
Unidos e no plano global?
PRA: O conceito de corrida é totalmente
inadequado neste terreno, só se for uma corrida contra si mesmo, pois cada país
tem recursos naturais e dotações tecnológicas (e sobretudo humanas) muito
diferentes, que precisam ser mobilizadas para obter o melhor retorno possível
das oportunidades existentes dentro e FORA do país. No que concerne uma corrida
para melhorar ainda mais nossa matriz energética, o Brasil, infelizmente, está
perdendo a corrida contra consigo mesmo: temos um governo sem condições
financeiras, técnicas, de gestão e sem visão para impulsionar as diversas vertentes
da matriz; o governo tem aversão ao capital privado, sobretudo estrangeiro, e
com isso perde enormes chances de desenvolver as diversas frentes; o Brasil é
errático nas suas políticas de preços (na verdade, ele é controlador, o que é
mortal para qualquer setor econômico), nas tecnologias, no equilíbrio das
diversas fontes, e se mostra refém dos malthusianos ecológico-românticos; o
governo é estúpido na gestão dos renováveis, pois mistura problemas sociais
(camponeses pobres, que supostamente cultivariam mamona) com a matriz
energética; o governo foi criminoso na condução do assunto do pré-sal, pois
criou uma querela monumental entre os estados, que não vai ser resolvida sequer
no STF. Ou seja, o governo, até aqui, só errou, e está perdendo a corrida
consigo mesmo, e de todos os demais países.
10. Como a China entraria
na equação geopolítica brasileira? (o governo brasileiro considera diferentes
hipóteses para as relações com a China na área de energia; no caso do Pré-Sal,
as estatais chinesas poderão entrar com força relevante para a Petrobras
financiar sua participação na exploração, em troca de fornecimento de
petróleo).
PRA: Um governo estatizante como o atual
governo brasileiro pode se dar muito bem com a China, em detrimento de uma
política mais inteligente de exploração de seus recursos. A China precisa,
necessita absolutamente de segurança energética, basicamente petróleo, pois
ainda tem muito carvão e está desenvolvendo energias renováveis e nuclear. O
Brasil entra como fornecedor, e a China como financiador, ou seja, uma relação
desequilibrada e que só convém aos chineses. Como a China tem muitos recursos
financeiros, a Petrobras vai ser mantida nessa relação esquizofrênica criada
pelo próprio governo.
11. O modelo brasileiro de
regras para a exploração das jazidas do Pré-Sal tem forte viés estatal. Como se
deve interpretar essa opção -- a escolha, em si mesma e no contexto de
perspectivas atuais e futuras de interinfluências geopolíticas do Brasil com as
principais economias do mundo, de um lado, e outras economias
latino-americanas? (as ‘bolivarianas’ do Sul e o México, ao norte) É um modelo
que veio para ficar, ou poderá ser modificado no futuro, caso se constatem
falhas de eficácia?
PRA: As políticas atuais brasileiras para
o pré-sal são totalmente irracionais, e já criaram prejuízos irreparáveis, além
de um enorme custo para o país. Um governo racional, se por acaso tiver futuro
no país, deveria simplesmente eliminar toda a legislação do pré-sal e retornar
ao regime de 1997. Parece que algumas decisões já tomadas vão continuar criando
problemas, mesmo se um retorno como esse viesse ocorrer. Infelizmente, o
governo Lula fez um enorme mal ao Brasil em todas as áreas energéticas em que
tocou: foi um Midas ao contrário. A ineficácia da política já foi colocada:
estão “leiloando” royalties entre políticos muitos anos antes de existir
qualquer rótulo. Uma das piores maldições que pode ocorrer numa política desse
tipo são os mais baixos instintos rentistas entre os políticos, além de uma
deformação da área energética do país, sem falar da própria indústria, desviada
para essa maldição concentradora de recursos. O Brasil estaria muito melhor sem
o pré-sal, e isso por razões políticas mas também econômicas.
12. O modelo brasileiro de
abertura da exploração do petróleo à participação estrangeira parece voltado
mais para a garantia de fornecimento do que para a oferta de atrativos de
retorno (lucratividade), como no caso das estatais chinesas que manifestaram
interesse pelo leilão de Libra. Considerando-se também os termos regulatórios
dessa participação, tem-se um modelo marcadamente ‘estatal’. Que importância
terão os resultados (bons ou maus) da adoção desse viés, digamos, menos
‘privatista’ para a afirmação da presença política brasileira no G-20?
PRA: A tendência é a consolidação do ogro
estatal no setor energético, concentrando recursos, benefícios, favores, enfim,
distorcendo um pouco mais a economia brasileira, em geral, e o setor de
petróleo em particular. Isso não tem absolutamente nada a ver com o G20, a não
ser muito indiretamente. O G20 é um grupo informal de diálogo sobre questões
financeiras e monetárias – e por extensão de outras questões econômicas também,
embora pretenda se meter um pouco em todos os assuntos – mas ele não tem
qualquer poder sobre as políticas nacionais dos seus integrantes. A imagem que
o Brasil consolida no G20, em todo caso, é a de um país estatizante, refratário
à abertura econômica, pouco propenso a uma política de acolhimento de
investimentos privados estrangeiros e praticando um tipo de nacionalismo
econômico ultrapassado nas condições de interdependência mundial atual.
13. Em que medida as
grandes empresas de energia de capital privado, elas mesmas, têm poder de
influenciar, com suas decisões estratégicas (e probabilíssimos lobbies, os
movimentos de governos no xadrez geopolítico? E as grandes estatais asiáticas,
especialmente as chinesas?
PRA: Pergunta impossível de ser respondida
em geral e no abstrato. Companhias de energia podem ser mais ou menos
influenciáveis pelos governos, mas nem sempre. Por exemplo: se o governo
americano desejasse, realmente, estrangular o governo de Hugo Chávez (e do seu
sucessor), há muito tempo teria decretado o final da importação de petróleo
venezuelano, e sua substituição por outras fontes. Por que não o fez, por que
não o faz? Por que o governo americano não é ditatorial e não pode determinar
sozinho as políticas de importação de petróleo. A despeito de controlar uma
enorme reserva estratégica de petróleo, o governo americano não possui nenhuma
companhia estatal de petróleo, e são as companhias privadas que exploram,
produzem derivados, importam, comercializam todo o setor. Companhias estatais
de petróleo podem ter uma gestão mais comercial – em alguns emirados e
monarquias árabes, por exemplo – ou ser inteiramente submetidas à gestão
política do governo, como parece ser o caso com as chinesas e outras estatais
em petro-ditaduras. Outros países podem ser ditaduras petrolíferas mesmo sem
ter companhias estatais, como alguns da ex-URSS. Ou seja, o cenário é muito
diverso para se ter um retrato uniforme de como são tomadas certas decisões nos
diferentes atores relevantes.
14.
Com a entrada no mercado de outras fontes de energia
abundante, como o óleo e o gás de xisto americanos, o petróleo vai
perdendo importância estratégica, o que também ajudaria a explicar a perda de
atratividade do Pré-Sal. Mas o Brasil pode se tornar bastante “forte” na
produção de biocombustíveis. Em que medida essa possível vantagem estratégica
específica pesaria na balança, a favor da preservação, ou mesmo aumento, da
presença geopolítica brasileira no cenário internacional?
PRA: Não existem cenários fiáveis em
nenhum terreno – mesmo nas teorias fantasiosas do “pico do petróleo”, jamais
alcançado e ninguém sabe onde está – e mesmo nos renováveis o futuro é muito
incerto, pois muito depende de políticas de governo, que costumam ser erráticas,
quando não prejudiciais ao próprio país, quando preconceitos e ideologia tomam
conta do espaço que deveria estar reservado a análises técnicas por
especialistas. Por exemplo, o pré-sal brasileiro pode ser considerado um
desastre completo pelas políticas erradas do governo, mas também o setor de
renováveis foi submetido a políticas da mesma forma equivocadas. A decisão
alemã de excluir completamente o vetor nuclear pode ser considerada igualmente
uma decisão irracional e de alto custo para o país.
O Brasil, de
fato, poderia se tornar, em 500 anos de história econômica concentrada na
produção de produtos de “sobremesa”: açúcar, café, cacau, etc. – um país
relevante no futuro mercado de renováveis, não tanto pela oferta de bens, mas
de tecnologia, e de know-how do setor, para produção na América Latina, na
África e em outros países de perfil similar ao Brasil. Mas até aqui as
políticas foram também equivocadas. Pode ser que no futuro, um governo menos
irracional venha a colocar um pouco de ordem e de critérios exclusivamente
técnicos e econômicos num setor importante.
15. As relações
internacionais guiam-se, em grande medida, por expectativas. A quais alturas a
soma de potencialidades em petróleo e em biocombustíveis poderá elevar a
influência brasileira no cenário global e com quais efeitos sobre a capacidade
de o país formular políticas públicas (para uso doméstico) com acréscimos de
autonomia decisória?
PRA: O Brasil é um país que frustra
expectativas, não apenas do seu próprio povo, mas também de parceiros
estrangeiros, que certamente gostariam de vender tecnologia, comprar produtos
brasileiros (renováveis, por exemplo), se associar a investimentos produtivos
neste país de imensos recursos naturais hoje escassamente explorados. Tudo
depende de políticas corretas de governo, o que até agora se revelou totalmente
frustrante. Não acredito que o Brasil tenha grandes perspectivas na geopolítica
mundial do petróleo; no máximo terá uma grande fonte para seu próprio consumo,
e interagirá com os investidores estrangeiros nessa área de prospecção,
exploração e produção interna de derivados (se o monopólio de fato da Petrobras
for rompido, o que é um enorme problema para nós mesmos). Mas sua participação
nos mercados mundiais de petróleo continuará marginal, ainda que possa ter
grande expressão numérica: grandes negócios, certamente, mas nenhuma revolução
geopolítica nessa área.
Onde o
Brasil poderia fazer diferença seria nos renováveis, mas até aqui, as políticas
foram erráticas, e até retrocedemos nesse terreno. Importar etanol de milho
subsidiado dos EUA é um exemplo perfeito da estupidez econômica do governo Lula
no terreno dos renováveis. Fazer biodiesel com mamona de camponês pobre é outra
estupidez econômica que não tem tamanho. Enfim, o governo Lula colecionou
diversas estupidezes econômicas ao longo dos dez últimos anos, e infelizmente
as mesmas bobagens continuam a ser cometidas no governo sucessor. Além dos
vários crimes econômicos, a estatização ampliada do setor é a outra grande
estupidez que continua ser praticada pelos governos petistas. Não se sabe
quando, e se, essas estupidezes serão corrigidas. Mas enquanto não forem o
Brasil continuará patinando, senão retrocedendo, no petróleo e nos renováveis.
Uma
sub-retranca
Em quais detalhes as
condições brasileiras (dadas nos leilões) diferem das condições de parceria
oferecidas por outros grandes produtores a investidores estrangeiros (privados
ou estatais)? Ou seja: como estão definidas as políticas para a abertura do
setor de petróleo à participação estrangeira? Por quais razões foram definidas
com estes ou aqueles principais traços? Com quais eventuais influências de
condições ditadas por possíveis investidores e/ou práticas consagradas de
mercado? Com quais efeitos sobre o ânimo dos investidores e suas decisões?
PRA: O modelo brasileiro é um híbrido,
mas registre-se que no setor do petróleo existem muitos regimes diferentes,
pois cada governo tem suas possibilidades e preferências. De maneira geral,
quanto mais democrático e avançado for o país, mais livres, mais abertos, mais
comercialmente orientados, mais tecnicamente fundamentados e mais amigáveis aos
investimentos privados são e serão os regimes aplicados ao petróleo; quanto
mais ditatorial for o governo, ou mais “subdesenvolvido”, mais irracional, mais
rentista, prejudicial ao país e ao povo será o setor, com as diversas “maldições”
do petróleo se acumulando. O Brasil fica entre os dois extremos: não é uma
ditadura (mas o governo atual gostaria de ter uma no setor do petróleo,
confirmando as piores expectativas rentistas dos políticos em geral e desses
políticos em particular), e tampouco é uma perfeita democracia avançada, pois
existe um enorme predomínio do Executivo na determinação das políticas do
setor, uma vez que o congresso ou é inerme, ou desenvolve, justamente, os
comportamentos rentistas mais deploráveis já vistos na história econômica do
país.
Uma pA questão energética no Brasil:
petróleo, Petrobras e políticas de governo
Paulo Roberto de Almeida
Respostas a questões colocadas pela jornalista Marcia Pinheiro
Princeton, 7-8/10/2013
Respondo topicamente às
questões, mas faço comentários intercalados ao texto, uma vez que detecto
algumas imprecisões ou pontos ainda obscuros quanto à substância.
Questão inicial: Como FHC conseguiu flexibilizar o
mercado de petróleo, com tanta campanha contra?
PRA: FHC NÃO flexibilizou o mercado do
petróleo, pois isso seria impossível, não só a ele, como a qualquer governo,
socialista ou neoliberal. O que FHC fez, em meio a um processo inteligente – mas
incompleto – de correção das muitas estupidezes econômicas da Constituição de
1988, foi adequar o Brasil a algumas realidades dos mercados mundiais. Os
mercados do e para o petróleo – existem vários, não um único mercado global,
alguns deles dominados por carteis, outros teoricamente livres, outros
influenciados por ditaduras petrolíferas, e várias outras modalidades
intermediárias – são gigantescos, e o Brasil participa de uma pequena parte
deles, antes importando 80% do que consumia, atualmente em situação de
equilíbrio instável, mais ainda exportando muito cru, e importando também muito
cru e derivados, o que é irracional, mas é fruto das políticas erradas mais
recentes.
FHC se
aproveitou de um momento único na história do Brasil, que provavelmente vai
demorar para voltar: uma coalizão reformista no bojo de uma enorme crise
inflacionária e que permitiu fazer algumas reformas absolutamente necessárias
para a economia e para a política do País: a crise permitiu aprovar diversas
medidas – constitucionais e infra – que não tiveram, infelizmente continuidade.
Os esquerdistas atrasados – concentrados no PT e nos outros partidos de
esquerda, ainda que alguns sejam propriamente fascistas – estiveram
momentaneamente na defensiva, embora todo governo constituído sempre possa
contar com a boa disposição fisiológica da maior parte dos políticos em apoiar
o governo em vigor, qualquer governo. Uma liderança dotada de visão de futuro
pode, assim, reformar as regras constitucionais e a legislação do setor do
petróleo a essa abertura ao capital estrangeiro, combinada a um tratamento
puramente comercial da Petrobras, que teve liberdade para se desenvolver como
companhia, não como cabide de emprego de políticos, o que ela era antes e
voltou a ser depois. Infelizmente, não se avançou na abertura total do setor e
na privatização da Petrobras, o que teria sido excelente para o Brasil e para a
própria companhia, que assim poderia crescer mais ainda sem interferências dos
governos e sem essa promiscuidade gerada por políticos rentistas.
Lamentavelmente, o setor retrocedeu absoluta e relativamente depois que
terminou o governo FHC, com várias distorções se acumulando ao longo do tempo,
num verdadeiro trabalho de destruição da Petrobras, processo conduzido pelos
governos posteriores.
Mas a campanha contra a mudança de
regime foi e é relevante, tanto que se conseguiu convencer os brasileiros que a
Petrobras é um “patrimônio do povo brasileiro”, quando ela é apenas uma empresa
estatal, importante, certo, mas manipulada antes e atualmente por interesses
políticos que não tem nada a ver com a atividade-fim. Os brasileiros – como
ocorria antes no caso da Vale, uma empresa na origem estrangeira, privatizada
pelo governo Vargas, e que vale imensamente mais agora, privatizada, do que
durante o meio século que permaneceu em mãos do governo – estão convencidos de
que o petróleo é um bem estratégico, o que ele é, mas muito mais é a educação,
inclusive para compreender que o petróleo deve ser tratado como mercadoria, não
como a salvação do Brasil. Salvação só existe com povo educado, não com
petróleo. O Japão quase não tem petróleo, e não deixou de alcançar a riqueza
mesmo sem muita energia. Educação é a chave, não mercadorias.
1. O petróleo sempre
desempenhou papel geopolítico de primeira importância na história moderna,
interligando produtores e compradores numa rede de interesses ora comuns, ora
conflitantes.
PRA: Como qualquer mercado sempre existe
oposição de princípio entre compradores e vendedores, cada um querendo
maximizar os seus ganhos. Mas não existe um mercado para o petróleo e sim
muitos, múltiplos mercados, muito diversos, com características muito
diferenciadas dos demais mercados, pois no caso do petróleo cru não se trata de
uma commodity como qualquer outra, mas sim de um produto natural, não
renovável, relativamente concentrado em pontos determinados do planeta –
variáveis em função das tecnologias de exploração – mas que é absolutamente
estratégico, central, determinando, absolutamente indispensável à moderna
civilização industrial. Para uma informação mais detalhada sobre as
características desse produto, e de seus diversos mercados, recomendo uma
leitura dos dois livros indispensáveis de Daniel Yergin sobre a economia
política do petróleo, já traduzidos e publicados no Brasil: são, provavelmente,
mais de 1.600 páginas, no conjunto, mas
vale a pena o esforço. Uma consulta a seu site de consultoria em energia,
baseado em Cambridge, Massachussetts, também seria recomendável.
2. Grandes produtores
(países do Oriente Médio e do Norte da África), de um lado, e grandes
consumidores (países centrais, em sentido amplo), estabeleceram-se há muito
tempo como protagonistas no xadrez geopolítico global.
PRA: Essa realidade já mudou muito e
está mudando cada vez mais. A China já é uma grande consumidora global – embora
não per capita – de petróleo, e há muito tempo deixou de ser uma produtora
autossuficiente: para ela, ter acesso a fontes seguras de petróleo é
absolutamente vital, mais até do que para os países ocidentais, que podem
contar com diversas fontes relativamente seguras, inclusive porque dominam
amplamente tecnologias e os mercados de futuros e o mercado spot de petróleo.
Ou seja, o mundo ocidental ainda tem algum controle – não sobre fontes, mas –
sobre comercialização e industrialização desse produto estratégico. Mas,
grandes países periféricos vem igualmente adquirindo certa preeminência em
alguns dos mercados, inclusive de derivados, e no consumo.
A geopolítica do petróleo também
mudou bastante: até o segundo choque do petróleo (1979), a OPEP (e dentro dela
a OPAEP, árabes) eram responsáveis por parte substancial da oferta mundial e
quase 70% das reservas declaradas. Já não é mais o caso, e o cartel da OPEP já
não tem condições de ditar as regras dos diversos mercados de petróleo cru,
inclusive porque os próprios países membros não cumprem suas decisões por
inteiro. Hoje mais da metade das reservas e da oferta de petróleo é não-OPEP.
Se trata de uma diferença importante em relação ao passado. Ver Yergin para
essas mudanças.
3. Graças a avanços
técnicos que possibilitam a descoberta de grandes reservas e, sobretudo, a
exploração e produção de petróleo e gás de fontes não convencionais, Estados
Unidos, Canadá, Brasil e Venezuela podem levar o continente americano a uma
posição de menor ou nenhuma dependência energética em relação às regiões
fornecedoras tradicionais.
PRA: O continente americano não pode ser
tomado no plano hemisférico. A América do Norte é tanto produtora quanto
consumidora, e este aspecto domina no caso do Canadá e EUA, que vem se tornando
novamente um grande produtor de energia, em suas diversas formas. A América
Latina, por sua vez, é excedentária em energia, em suas diversas formas, e é
uma consumidora moderada, mas isso deve crescer. Mas ela ainda detém tecnologia
restrita – com algumas exceções, entre elas o Brasil – e não controla mercados
de comercialização. Dependência energética todos os países têm, dependendo das
fontes disponíveis, da tecnologia mobilizada, do ritmo de exploração e da
intensidade de consumo (hoje, por exemplo, os países avançados consomem muito
menos petróleo por unidade de produção do que nos anos 1970, enquanto a China
ainda “desperdiça” petróleo no seu setor industrial). Na América Latina, a
despeito de existirem grandes produtores, os países também são dependentes, e
mesmo o Brasil, com o pré-sal, não deve se tornar um grande protagonista nos
mercados ofertantes, pois seu consumo também deve crescer (isso se o pré-sal se
revelar realmente produtivo). O Brasil deve continuar a ser relativamente
marginal na geopolítica mundial do petróleo, ainda que venha a se tornar um
grande produtor: ele não reúne as condições para se tornar um grande
protagonista nos diversos cenários que podem ser traçados para seu futuro
energético, embora venha a assumir algum papel relevante, mas isso deve ocorrer
nas energias renováveis, não nas fósseis, provavelmente, e mesmo assim, muito
depende das políticas do governo, que nos últimos dez anos errou tremendamente
nas diversas vertentes da política energética.
4. Essa condição de
agrupamento geográfico não uniformiza, porém, os interesses correntes e
estratégicos de cada um desses países no cenário internacional. Bem ao
contrário (com exceção, talvez, em certo grau, de Estados Unidos e Canadá.
PRA: Não existe, no cenário previsível,
possibilidade de unificar interesses estratégicos dos grandes, médios e
pequenos atores nos diversos mercados energéticos, e mesmo nos mercados do
petróleo. Os interesses nacionais são extremamente diversos, embora possa
existir alguma coordenação e diálogo entre os grandes atores. A OPEP é um
cartel, que como todo cartel, pretende apenas extrair renda dos seus clientes e
consumidores. Os países da OCDE estão mais ou menos coordenados na Agência Internacional
de Energia, que funciona na OCDE, em Paris, justamente, mas se trata mais de um
fórum para intercambiar opiniões, trocar informações, desenvolver estatísticas
e estudos técnicos de grande sofisticação, que não pode ter a pretensão de
coordenar realmente as políticas nacionais dos países. Ou seja, se trata de
cada um por si, pois a energia é absolutamente estratégica, vital para o nosso
modo de vida, mas assume tantas formas e características que seria totalmente
impossível esperar uniformização de interesses nesses mercados. Não se trata
mais, como no passado, de uma luta entre impérios para controle das fontes, mas
de uma concorrência entre grandes companhias, num mercado fortemente desigual e
altamente competitivo, colocando em face, uns dos outros, governos, companhias
privadas, estatais, ditadores e especuladores, o que torna difícil coordenar
interesses. Ou seja, o mundo deve continuar na relativa anarquia que hoje o
caracteriza, sendo porém de se excluir grandes guerras globais para acesso às
fontes, o que não exclui escaramuças e guerras localizadas entre países e
dentro dos países.
Existe, como
se sabe, uma “maldição do petróleo”, com muitos livros a respeito. Recomendo ler
Peter Maass, Crude World: the violent
twilight of oil.
5. Nessa rede de
interesses geopolíticos internacionais em transformação, o Brasil tem presença
que variou de patamar ao longo do tempo, com narrativas políticas que se
desenrolaram, ora na frente doméstica, ora na frente externa, mas quase sempre
exprimindo alguma forma de conjugação de iniciativas, nos dois campos, em
termos de ação governamental consequente. Com o Pré-Sal, quais perspectivas se
abrem para o Brasil na arena geopolítica global?
PRA: Discordo da expressão “ação
governamental consequente”. O Brasil, na verdade, nunca teve uma
política coerente para o petróleo, terreno muito submetido a paixões
“nacionalisteiras” as mais nefastas e deprimentes do ponto de vista da
racionalidade estrita do setor, embora tenha tido políticas energéticas
razoáveis, ao longo do tempo. Nos atrasamos na revolução industrial, em parte
pela falta de fontes seguras de energia, carvão e petróleo, justamente, o que
veio mais tarde, mas com grandes dificuldades e com interferências políticas
nefastas em diversas áreas. Mas, por outro lado, soubemos explorar, com algum
grau de racionalidade, as fontes naturais, ou seja hídricas. Nesse terreno, as
possibilidades ainda existentes vêm sendo sabotadas pelos novos malthusianos da
era contemporânea, que são os ecologistas não científicos, essa horda de
ambientalistas românticos, que poderiam nos fazer retroceder ao neolítico, se
por acaso comandassem governos e políticas públicas (e não só em energia, mas
ele alimentos também).
A matriz
energética brasileira é relativamente positiva, com muitos recursos renováveis,
e deveríamos continuar assim. Infelizmente (no sentido alegórico da palavra),
estamos caminhando para sujar um pouco essa matriz, com a aparente abundância
de petróleo do pré-sal, que também pode ser uma “maldição”, dependendo de como
seja explorado. O fato é que o pré-sal determinou grandes mudanças nas
políticas públicas de energia no Brasil, todas elas nefastas até o momento,
pois despertou os instintos rentistas dos políticos e tende a deformar as
outras políticas setoriais, inclusive no próprio petróleo.
Respondo à esta
questão – Com
o Pré-Sal, quais perspectivas se abrem para o Brasil na arena geopolítica
global? – pela negativa, por
fatores puramente objetivos, e não com base nas minhas opiniões negativas
quanto à “baixa política” governamental em relação ao pré-sal. O pré-sal NÃO
vai transformar o Brasil em ator geopolítico relevante no terreno do petróleo,
simplesmente porque existem muitas outras fontes mais baratas e acessíveis de
petróleo e outros combustíveis fósseis, assim como de renováveis (inclusive no
próprio Brasil, se as políticas corretas forem aplicadas, o que ainda não é o
caso). Em primeiro lugar, seria preciso ver se o pré-sal é de fato real, o que
depende não apenas da tecnologia – que existe mas pode ser difícil – mas
basicamente dos mercados ofertantes de energia e de petróleo em particular: a
AIE calcula que a extração do petróleo do pré-sal pode estar em torno de 80
dólares o barril (comparando: a média no Oriente Médio deve andar em torno de
12 a 15 dólares, sendo que em alguns lugares pode estar abaixo de 5; se
fossemos extrair petróleo no Ártico, não seria possível a menos de 150
dólares). Ou seja, se o barril cair muito nos mercados internacionais, melhor
deixar o petróleo do pré-sal onde está, dar até logo e esperar que o preço
supere 100 dólares (será sorte do Brasil se ele se mantiver nessa faixa, o que
é bastante provável, pois outros produtores, basicamente ditaduras petrolíferas
e rentistas do petróleo, têm interesse que seja assim).
Mesmo que tudo dê certo, haverá muito
pouco petróleo para fazer com que o Brasil altere radicalmente a balança
mundial; o que houver de excedentário ao seu próprio consumo (que deve crescer
bastante), será comercializado marginalmente nos mercados globais, pelas
companhias que o estão explorando e pela Petrobras. Nada que altere a balança
mundial energética, ou a “simples” geopolítica do petróleo. Aquela visão do
Lula, do Brasil grande produtor, como sempre é megalomaníaca e não corresponde
à realidade.
6. Como variaram, no
tempo, as políticas externas brasileiras sob relações de interseção com as
posições alcançadas pelo país em termos de suficiência energética? Que peso
tiveram, em momentos mais expressivos dessa conexão, as peculiaridades do
momento político doméstico vivido pelo país? (Vamos fazer uma linha do tempo
com os dados assim levantados).
PRA: O Brasil teve políticas erráticas em
relação ao petróleo, um pouco menos erráticas nas outras vertentes energéticas.
No petróleo, perdemos muito tempo com bravatas nacionalistas que só nos
atrasaram, na produção, na exploração, na comercialização, e sobretudo na
distribuição interna, pois a Petrobras sempre foi politizada e usada pelos
governos, seja num sentido econômico (como na era militar), seja num sentido
baixamente fisiológico, como ocorre desde o início da gestão Lula. Quanto ela
começou a funcionar corretamente, na gestão FHC – e sobretudo depois da
aprovação da lei do petróleo e da ANP, em 1997 – e prometia grandes avanços nos
dois terrenos (exploração e produção, ou seja, prospecção, extração e
transformação em derivados, mas menos na comercialização, onde se manteve,
infelizmente, o monopólio de fato da Petrobras), veio a nova gestão dos
companheiros, que praticamente dinamitou, não apenas a Petrobras, mas boa parte
da política energética, ambas submetidas a critérios políticos nefastos e
indefensáveis.
Além da
politização da Petrobras, e sua utilização por máfias sindicais, ocorreu um
desvio fundamental das políticas corretas anteriormente colocadas em vigor pelo
governo FHC, ou seja, tratar a Petrobras – que nunca se cogitou de privatizar –
como uma empresa comercial, e deixa-la aplicar critérios técnicos e comerciais
em todos os aspectos de suas atividades. A gestão Lula foi negativa, chegando a
cometer crimes econômicos, sob certos aspectos, contra Petrobras, contra a
matriz energética do Brasil, contra os acionistas e contra o próprio Brasil. Um
desastre completo, que está longe de ser corrigido, pois a nova lei aplicada ao
pré-sal, de 2010 (ainda não totalmente em vigor, pois além de tudo também
destruiu a federação, com o acirramento dos comportamentos rentistas em todos
os governos estaduais e em todos os políticos), simplesmente desequilibra
completamente uma estratégia racional para o petróleo e para outros
combustíveis.
Um dia vai
se poder avaliar, racionalmente, todos os desastres e crimes econômicos
cometidos pela gestão lulista nessa área. O Brasil ainda está muito dominado
pela euforia nefasta do pré-sal, para que os dirigentes façam uma análise
isenta dos equívocos cometidos. Alguns economistas, mas muito poucos, vêm
apontando os erros perpetrados pelo governo, em praticamente todas as frentes
(renováveis e fósseis), e continuam a ser praticados, sem que se tome
consciência da má direção tomada pelo país. Se o Brasil tivesse continuado na
lei de 1997 (que permanece, mas os leilões pararam, praticamente), teria
conseguido royalties para o governo, sem riscos para a Petrobras, e sobretudo
sem o caos legislativo e judiciário criado com a estatização do pré-sal pelo
governo irresponsável do presidente Lula. Ou seja, os equívocos no tratamento
do petróleo são gigantescos e talvez não sejam mais reversíveis, pois o
governo, criminosamente, incitou no mais alto grau os instintos rentistas dos
políticos, praticamente “distribuindo” royalties do pré-sal que talvez nem
venham a existir, e criando um conflito distributivo entre os estados que não
se resolverá sequer no Judiciário (STF). Um caos completo.
No terreno
dos renováveis, os erros não são menores, tanto em relação ao etanol (“afogado”
pelo controle de preços criminoso aplicado aos derivados de petróleo), como em
relação ao biodiesel. Aqui, o governo foi absolutamente estúpido, ao misturar
matriz energética com problemas sociais, criando um programa de biodiesel de
mamona a ser fornecido por “agricultura familiar”. Um outro desastre incomensurável,
que eliminou o Brasil do mapa dos biocombustíveis, aparentemente tão promissor
antes dos desastres cometidos pelo governo Lula. Neste terreno, como em
diversos outros, ainda falta fazer a história real, verdadeira, dos equívocos
cometidos pelo governo Lula em diversas frentes: na produção, na
comercialização, nos estímulos setoriais, no tratamento do capital privado e
dos investimentos estrangeiros: ele não acertou uma única vez, errou em
todas...
7. O Brasil tem hoje um
governo que se pode chamar de esquerda e democrático (como já era com
Lula). É um governo que se relaciona bem, no continente, com governos
radicais de esquerda, esquerdistas progressistas, e de centro-direita. É
considerado pelos Estados Unidos uma potência sub-regional e um aliado de
primeira importância. É membro do G-20. Com o Pré-Sal, o Brasil caminha para
tornar-se um exportador líquido de energia, e poderá ganhar níveis invejáveis
em matéria de segurança energética. Que importância essa posição de
quase-independência tem hoje, em termos geopolíticos? Que importância poderá
ter, no futuro, a possível independência plena?
PRA: O governo é de esquerda, certamente,
mas de uma esquerda atrasada, estatizante, centralizadora, populista e
demagógica, quando existem outros governos de esquerda, no mundo, abertos,
reformistas, racionais em economia e dotados de uma visão econômica moderna,
receptiva a investimentos estrangeiros e sem muita demagogia populista (no
Chile, por exemplo, ou no Uruguai, e em vários países europeus). O governo
certamente não é democrático, ainda que não possa implantar um regime
autoritário, mas é dominado por um partido neobolchevique que faz de tudo para
eliminar as oposições, controlar a imprensa e impor o controle do Estado sobre
praticamente todos os setores da vida pública. A bem da verdade, o partido
hegemônico e seu governo possuem tendências fascistas, que se revela justamente
nessa tentativa de colocar sob o controle do Estado a vida de todas as empresas
e de todos cidadãos, e que trata os mais pobres como massa de manobra.
Quanto ao
ambiente externo, se pode dizer que o governo tem tendência a apoiar todas as
ditaduras supostamente esquerdistas, como governos autoritários de modo geral,
e age com uma grande motivação contra o que ele chama de países hegemônicos, ou
seja, as grandes democracia de mercado. Não se deve tomar discursos
diplomáticos – como essa expressão usada e abusada de “parceiros estratégicos”
– pelo seu valor face, pois existe muita hipocrisia nessas proclamações; se
formos julgar pelos discursos, o Brasil tem “parceiros estratégicos” em todos
os continentes, e eles são tão mais estratégicos quanto menos “hegemônicos”
forem, ou seja, antiocidentais e anti-Estados Unidos. Esta é uma realidade
fática, que pode ser comprovada por diversas iniciativas e proclamações do
governo atual, não se trata de uma opinião. Basta ler nas entrelinhas e ver as
ações reais.
Quanto às
perguntas, respondo topicamente:
(a) Com o Pré-Sal, o
Brasil caminha para tornar-se um exportador líquido de energia, e poderá ganhar
níveis invejáveis em matéria de segurança energética.
PRA: Não é seguro que o
Brasil se torne um exportador líquido de petróleo, e se isso se confirmar, será
marginal no mercado mundial, ainda que possa trazer divisas para o Brasil.
Creio que haverá um equilíbrio entre consumo e produção com o pré-sal, e os
movimentos de comércio exterior nessa área vão depender da capacidade
industrial de refino e novas explorações.
(b) Que importância essa posição de quase-independência tem
hoje, em termos geopolíticos?
PRA: Quase nenhuma no plano mundial, apenas tornar o Brasil
menos dependente de petróleo importado, mas isso não é em si relevante, pois o
petróleo é uma commodity amplamente comercializável nos mercados livres, sem
qualquer problema de acesso aos demandantes. Basta ter renda, e renda se
consegue exportando quaisquer outros produtos.
(c) Que importância poderá ter, no futuro, a possível
independência plena?
PRA: Não existe independência plena no campo da energia. Nenhum
país e totalmente independente, e isso se aplica inclusive e principalmente ao
petróleo. Mesmo os países produtores e exportadores de petróleo são em geral
dependentes da importação de derivados e, como se disse, o petróleo é, e pode
ser, fonte de problemas enormes, como a distorção da economia, e algumas
“maldições” não desejadas. Não é seguro que o Brasil (pelo menos no governo
atual) consiga desenvolver um modelo “norueguês” de exploração racional do
petróleo e de utilização de seus royalties. O que é seguro, até aqui, é que o
governo Lula conseguiu piorar amplamente o ambiente geral do Brasil para a
exploração racional desse produto estratégico, deteriorando amplamente o quadro
institucional e as relações federativas. Em relação à Petrobras, os desastres
são visíveis.
8. Talvez essa
independência coincida com a dos Estados Unidos, a julgar pelo otimismo com que
vem sendo saudada a descoberta de importantes jazidas de óleo e gás de xisto naquele
país e possibilidades de sua extração. Quais efeitos poderia ter essa
coincidência (se ocorrer) para o fator ‘energia’ na equação geopolítica
brasileira?
PRA: Qualquer que seja a evolução
energética, pelos seus vetores, nos EUA, parece que o país está motivado para
diminuir sua dependência de fontes externas, fósseis e renováveis, e pode
conseguir, parcialmente. Isso significa que o Brasil perdeu e está perdendo
oportunidades, por cegueira econômica e miopia ideológica, de desenvolver
políticas de cooperação com esse gigante econômico, sobretudo em razão da
estatização irracional, demagógica, totalmente política, desse setor. O Brasil,
como já dizia Roberto Campos, é um país que não perde oportunidade de perder
oportunidades. Pois perdeu também no petróleo e nos renováveis, com os EUA, e
com os investidores estrangeiros de modo geral. Só estamos tendo relacionamento
com estatais de países autoritários, que não tem o critério do lucro como
básico, como é o caso de alguns investidores no campo de Libra.
9. A independência
americana pode ser mais difícil de ocorrer do que a brasileira: a extração de
óleo e gás de xisto ainda apresenta dificuldades técnicas e traria acréscimos
apenas graduais à produção, e as jazidas em águas profundas também não seriam facilmente
alcançáveis. Quais as possibilidades de o Brasil ganhar essa corrida e com
quais consequências geopolíticas, no continente, nas relações com os Estados
Unidos e no plano global?
PRA: O conceito de corrida é totalmente
inadequado neste terreno, só se for uma corrida contra si mesmo, pois cada país
tem recursos naturais e dotações tecnológicas (e sobretudo humanas) muito
diferentes, que precisam ser mobilizadas para obter o melhor retorno possível
das oportunidades existentes dentro e FORA do país. No que concerne uma corrida
para melhorar ainda mais nossa matriz energética, o Brasil, infelizmente, está
perdendo a corrida contra consigo mesmo: temos um governo sem condições
financeiras, técnicas, de gestão e sem visão para impulsionar as diversas vertentes
da matriz; o governo tem aversão ao capital privado, sobretudo estrangeiro, e
com isso perde enormes chances de desenvolver as diversas frentes; o Brasil é
errático nas suas políticas de preços (na verdade, ele é controlador, o que é
mortal para qualquer setor econômico), nas tecnologias, no equilíbrio das
diversas fontes, e se mostra refém dos malthusianos ecológico-românticos; o
governo é estúpido na gestão dos renováveis, pois mistura problemas sociais
(camponeses pobres, que supostamente cultivariam mamona) com a matriz
energética; o governo foi criminoso na condução do assunto do pré-sal, pois
criou uma querela monumental entre os estados, que não vai ser resolvida sequer
no STF. Ou seja, o governo, até aqui, só errou, e está perdendo a corrida
consigo mesmo, e de todos os demais países.
10. Como a China entraria
na equação geopolítica brasileira? (o governo brasileiro considera diferentes
hipóteses para as relações com a China na área de energia; no caso do Pré-Sal,
as estatais chinesas poderão entrar com força relevante para a Petrobras
financiar sua participação na exploração, em troca de fornecimento de
petróleo).
PRA: Um governo estatizante como o atual
governo brasileiro pode se dar muito bem com a China, em detrimento de uma
política mais inteligente de exploração de seus recursos. A China precisa,
necessita absolutamente de segurança energética, basicamente petróleo, pois
ainda tem muito carvão e está desenvolvendo energias renováveis e nuclear. O
Brasil entra como fornecedor, e a China como financiador, ou seja, uma relação
desequilibrada e que só convém aos chineses. Como a China tem muitos recursos
financeiros, a Petrobras vai ser mantida nessa relação esquizofrênica criada
pelo próprio governo.
11. O modelo brasileiro de
regras para a exploração das jazidas do Pré-Sal tem forte viés estatal. Como se
deve interpretar essa opção -- a escolha, em si mesma e no contexto de
perspectivas atuais e futuras de interinfluências geopolíticas do Brasil com as
principais economias do mundo, de um lado, e outras economias
latino-americanas? (as ‘bolivarianas’ do Sul e o México, ao norte) É um modelo
que veio para ficar, ou poderá ser modificado no futuro, caso se constatem
falhas de eficácia?
PRA: As políticas atuais brasileiras para
o pré-sal são totalmente irracionais, e já criaram prejuízos irreparáveis, além
de um enorme custo para o país. Um governo racional, se por acaso tiver futuro
no país, deveria simplesmente eliminar toda a legislação do pré-sal e retornar
ao regime de 1997. Parece que algumas decisões já tomadas vão continuar criando
problemas, mesmo se um retorno como esse viesse ocorrer. Infelizmente, o
governo Lula fez um enorme mal ao Brasil em todas as áreas energéticas em que
tocou: foi um Midas ao contrário. A ineficácia da política já foi colocada:
estão “leiloando” royalties entre políticos muitos anos antes de existir
qualquer rótulo. Uma das piores maldições que pode ocorrer numa política desse
tipo são os mais baixos instintos rentistas entre os políticos, além de uma
deformação da área energética do país, sem falar da própria indústria, desviada
para essa maldição concentradora de recursos. O Brasil estaria muito melhor sem
o pré-sal, e isso por razões políticas mas também econômicas.
12. O modelo brasileiro de
abertura da exploração do petróleo à participação estrangeira parece voltado
mais para a garantia de fornecimento do que para a oferta de atrativos de
retorno (lucratividade), como no caso das estatais chinesas que manifestaram
interesse pelo leilão de Libra. Considerando-se também os termos regulatórios
dessa participação, tem-se um modelo marcadamente ‘estatal’. Que importância
terão os resultados (bons ou maus) da adoção desse viés, digamos, menos
‘privatista’ para a afirmação da presença política brasileira no G-20?
PRA: A tendência é a consolidação do ogro
estatal no setor energético, concentrando recursos, benefícios, favores, enfim,
distorcendo um pouco mais a economia brasileira, em geral, e o setor de
petróleo em particular. Isso não tem absolutamente nada a ver com o G20, a não
ser muito indiretamente. O G20 é um grupo informal de diálogo sobre questões
financeiras e monetárias – e por extensão de outras questões econômicas também,
embora pretenda se meter um pouco em todos os assuntos – mas ele não tem
qualquer poder sobre as políticas nacionais dos seus integrantes. A imagem que
o Brasil consolida no G20, em todo caso, é a de um país estatizante, refratário
à abertura econômica, pouco propenso a uma política de acolhimento de
investimentos privados estrangeiros e praticando um tipo de nacionalismo
econômico ultrapassado nas condições de interdependência mundial atual.
13. Em que medida as
grandes empresas de energia de capital privado, elas mesmas, têm poder de
influenciar, com suas decisões estratégicas (e probabilíssimos lobbies, os
movimentos de governos no xadrez geopolítico? E as grandes estatais asiáticas,
especialmente as chinesas?
PRA: Pergunta impossível de ser respondida
em geral e no abstrato. Companhias de energia podem ser mais ou menos
influenciáveis pelos governos, mas nem sempre. Por exemplo: se o governo
americano desejasse, realmente, estrangular o governo de Hugo Chávez (e do seu
sucessor), há muito tempo teria decretado o final da importação de petróleo
venezuelano, e sua substituição por outras fontes. Por que não o fez, por que
não o faz? Por que o governo americano não é ditatorial e não pode determinar
sozinho as políticas de importação de petróleo. A despeito de controlar uma
enorme reserva estratégica de petróleo, o governo americano não possui nenhuma
companhia estatal de petróleo, e são as companhias privadas que exploram,
produzem derivados, importam, comercializam todo o setor. Companhias estatais
de petróleo podem ter uma gestão mais comercial – em alguns emirados e
monarquias árabes, por exemplo – ou ser inteiramente submetidas à gestão
política do governo, como parece ser o caso com as chinesas e outras estatais
em petro-ditaduras. Outros países podem ser ditaduras petrolíferas mesmo sem
ter companhias estatais, como alguns da ex-URSS. Ou seja, o cenário é muito
diverso para se ter um retrato uniforme de como são tomadas certas decisões nos
diferentes atores relevantes.
14.
Com a entrada no mercado de outras fontes de energia
abundante, como o óleo e o gás de xisto americanos, o petróleo vai
perdendo importância estratégica, o que também ajudaria a explicar a perda de
atratividade do Pré-Sal. Mas o Brasil pode se tornar bastante “forte” na
produção de biocombustíveis. Em que medida essa possível vantagem estratégica
específica pesaria na balança, a favor da preservação, ou mesmo aumento, da
presença geopolítica brasileira no cenário internacional?
PRA: Não existem cenários fiáveis em
nenhum terreno – mesmo nas teorias fantasiosas do “pico do petróleo”, jamais
alcançado e ninguém sabe onde está – e mesmo nos renováveis o futuro é muito
incerto, pois muito depende de políticas de governo, que costumam ser erráticas,
quando não prejudiciais ao próprio país, quando preconceitos e ideologia tomam
conta do espaço que deveria estar reservado a análises técnicas por
especialistas. Por exemplo, o pré-sal brasileiro pode ser considerado um
desastre completo pelas políticas erradas do governo, mas também o setor de
renováveis foi submetido a políticas da mesma forma equivocadas. A decisão
alemã de excluir completamente o vetor nuclear pode ser considerada igualmente
uma decisão irracional e de alto custo para o país.
O Brasil, de
fato, poderia se tornar, em 500 anos de história econômica concentrada na
produção de produtos de “sobremesa”: açúcar, café, cacau, etc. – um país
relevante no futuro mercado de renováveis, não tanto pela oferta de bens, mas
de tecnologia, e de know-how do setor, para produção na América Latina, na
África e em outros países de perfil similar ao Brasil. Mas até aqui as
políticas foram também equivocadas. Pode ser que no futuro, um governo menos
irracional venha a colocar um pouco de ordem e de critérios exclusivamente
técnicos e econômicos num setor importante.
15. As relações
internacionais guiam-se, em grande medida, por expectativas. A quais alturas a
soma de potencialidades em petróleo e em biocombustíveis poderá elevar a
influência brasileira no cenário global e com quais efeitos sobre a capacidade
de o país formular políticas públicas (para uso doméstico) com acréscimos de
autonomia decisória?
PRA: O Brasil é um país que frustra
expectativas, não apenas do seu próprio povo, mas também de parceiros
estrangeiros, que certamente gostariam de vender tecnologia, comprar produtos
brasileiros (renováveis, por exemplo), se associar a investimentos produtivos
neste país de imensos recursos naturais hoje escassamente explorados. Tudo
depende de políticas corretas de governo, o que até agora se revelou totalmente
frustrante. Não acredito que o Brasil tenha grandes perspectivas na geopolítica
mundial do petróleo; no máximo terá uma grande fonte para seu próprio consumo,
e interagirá com os investidores estrangeiros nessa área de prospecção,
exploração e produção interna de derivados (se o monopólio de fato da Petrobras
for rompido, o que é um enorme problema para nós mesmos). Mas sua participação
nos mercados mundiais de petróleo continuará marginal, ainda que possa ter
grande expressão numérica: grandes negócios, certamente, mas nenhuma revolução
geopolítica nessa área.
Onde o
Brasil poderia fazer diferença seria nos renováveis, mas até aqui, as políticas
foram erráticas, e até retrocedemos nesse terreno. Importar etanol de milho
subsidiado dos EUA é um exemplo perfeito da estupidez econômica do governo Lula
no terreno dos renováveis. Fazer biodiesel com mamona de camponês pobre é outra
estupidez econômica que não tem tamanho. Enfim, o governo Lula colecionou
diversas estupidezes econômicas ao longo dos dez últimos anos, e infelizmente
as mesmas bobagens continuam a ser cometidas no governo sucessor. Além dos
vários crimes econômicos, a estatização ampliada do setor é a outra grande
estupidez que continua ser praticada pelos governos petistas. Não se sabe
quando, e se, essas estupidezes serão corrigidas. Mas enquanto não forem o
Brasil continuará patinando, senão retrocedendo, no petróleo e nos renováveis.
Uma
sub-retranca
Em quais detalhes as
condições brasileiras (dadas nos leilões) diferem das condições de parceria
oferecidas por outros grandes produtores a investidores estrangeiros (privados
ou estatais)? Ou seja: como estão definidas as políticas para a abertura do
setor de petróleo à participação estrangeira? Por quais razões foram definidas
com estes ou aqueles principais traços? Com quais eventuais influências de
condições ditadas por possíveis investidores e/ou práticas consagradas de
mercado? Com quais efeitos sobre o ânimo dos investidores e suas decisões?
PRA: O modelo brasileiro é um híbrido,
mas registre-se que no setor do petróleo existem muitos regimes diferentes,
pois cada governo tem suas possibilidades e preferências. De maneira geral,
quanto mais democrático e avançado for o país, mais livres, mais abertos, mais
comercialmente orientados, mais tecnicamente fundamentados e mais amigáveis aos
investimentos privados são e serão os regimes aplicados ao petróleo; quanto
mais ditatorial for o governo, ou mais “subdesenvolvido”, mais irracional, mais
rentista, prejudicial ao país e ao povo será o setor, com as diversas “maldições”
do petróleo se acumulando. O Brasil fica entre os dois extremos: não é uma
ditadura (mas o governo atual gostaria de ter uma no setor do petróleo,
confirmando as piores expectativas rentistas dos políticos em geral e desses
políticos em particular), e tampouco é uma perfeita democracia avançada, pois
existe um enorme predomínio do Executivo na determinação das políticas do
setor, uma vez que o congresso ou é inerme, ou desenvolve, justamente, os
comportamentos rentistas mais deploráveis já vistos na história econômica do
país.
Uma prova de
quão errado está o governo foi dado pelo leilão de Libra: poucas grandes
empresas sérias se apresentaram, tal a confusão criada pelo governo quanto às
condições reais de exploração. Reina no setor uma completa insegurança
jurídica, além das incertezas tecnológicas e quanto à própria “rentabilidade”
do petróleo do pré-sal. Como se suspeita: se o preço internacional não for
muito alto, melhor deixar o petróleo no fundo do mar e esquecer.
Seria bem melhor para o Brasil se seus
dirigentes se ocupassem de questões reais, como o estado deplorável da
educação, por exemplo. Essa é a verdadeira “mercadoria” estratégica: educação
de qualidade. O Brasil só precisa disso para ser grande. E, claro, precisaria dispor
de elites mais esclarecidas, para que se possa ter governos minimamente
racionais, o que parece não ser o caso atualmente.
Paulo Roberto de Almeida
Princeton, New Jersey, 8 de outubro
de 2013.