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quarta-feira, 28 de julho de 2010

As FARC e o governo do Brasil: efeitos do conflito Colombia-Venezuela?

Para os que se interrogam, no próprio PT, sobre a natureza e a extensão das boas relações entre o grupo narcoterrorista colombiano conhecido como FARC e o Partido dos Trabalhadores, atualmente no poder no Brasil, este artigo, de um analista das questões de defesa no Brasil, fornece mais alguns elementos probatórios. Os que discordam podem apresentar outros fatos, ou outra realidade...

Crisis Colombia – Venezuela: um desafio a UNASUR
Marcelo Rech
27/07/2010

El presidente colombiano Álvaro Uribe deja el poder el 7 de agosto luego de ocho años de gobierno.

Si no ha transformado social y económicamente al país, Uribe seguramente ha trabado una lucha sin treguas contra las guerrillas, especialmente las Farc, reduciendo su letalidad a niveles históricos.

Durante eso período, muchos han los altibajos con el vecino Hugo Chávez, lo que puso la región bajo tensión.

Los dos divergen en casi todo.

Uno es aliado de los Estados Unidos que en los últimos diez años, ha destinado US$ 8 mil millones para la lucha contra el narcoterrorismo en Colombia.

El otro llego al poder al final de los 90 luego de un intento fracasado de golpe de Estado y nadie tiene idea de hasta cuando quedará.

En la última década, no faltaron denuncias y elementos para uno creer que las guerrillas colombianas actuaban extraterritorialmente.

En Brasil, las Farc mantienen al menos cinco de sus miembros entre Brasília, la región Sudeste y las áreas fronterizas.

Durante las tres ediciones del Foro Social Mundial, realizadas en Porto Alegre (RS), bajo la financiación del Partido de los Trabajadores (PT), han ocupado espacios, realizados debates y firmado alianzas.

Los gobiernos – estadual y municipal – de Olívio Dutra y Tarso Genro recibieron los voceros de las Farc con el status diplomático en la capital gaucha.

En Manaos (AM), la guerrilla es vieja conocida. Hasta apartamentos ocupan en la ciudad.

Campamientos de la guerrilla en Brasil, no se tiene noticia, pero su presencia es explícita.

Olivério Medina, antiguo cura católico y uno de los más importantes enlaces de la guerrilla en América del Sur, recibió de actual gobierno, status de refugiado lo que le da el derecho a tener un salario mensual bajo los auspicios del contribuyente brasileño.

Colombia ha luchado para obtener su extradición, pero varios partidos políticos de izquierda pagaron abogados y ejercieron influencia en la decisión del Comité Nacional para los Refugiados (Conare), subordinado al ministerio de Justicia a la época comandado por Tarso Genro.

Medina ha casado con una brasileña integrante del PT que del estado de Paraná ha sido llamada a trabajar en Brasília en la Secretaría Nacional de Pesca, órgano comandado por el partido.

El mismo gobierno que ha sido incapaz de impedir el ingreso de la guerrilla en Brasil y así dar el ejemplo contundente contra el narcoterrorismo, habla en mediar la crisis que tiene las Farc como centro, involucrando Colombia y Venezuela.

En muchos aspectos, la política exterior del actual gobierno emite señales contradictorios.

Usa la Constitución para reafirmar el respecto a la autodeterminación de los pueblos y de la no injerencia, para en seguida, escoger cirurgicamente dónde y cómo meterse.

De todas formas, importante mismo es el papel que desarrollará la Unión de Naciones Sudamericanas (UNASUR).

Una reunión extraordinaria de cancilleres está marcada para el jueves, 29, en Quito.

Brasil no acepta que la crisis sea solucionada con la participación de actores externos lo que le exigirá llamar la responsabilidad por ver Colombia y Venezuela normalizaren sus relaciones.

Venezuela sabe que las pruebas presentadas ante la Organización de Estados Americanos (OEA), son fuertes. Hay poca margen de maniobra.

Chávez tendrá de aceptar los hechos y mostrar habilidad para convencer la región que los 80 campamientos y 1.500 guerrilleros en su país, no cuentan con su apoyo ni financiación.

La tendencia es que tanto Colombia como Venezuela disminuyan el tono hasta que Uribe entregue el poder al ex ministro de Defensa, Juan Manuel Santos, que tendrá la difícil tarea de restablecer las relaciones con Chávez.

El hecho concreto es que las Farc representan un problema regional que como tal debe de ser atacado.

Ponerlo en la mesa en un mecanismo regional que todavía no ha mostrado la razón de ser, es fundamental para su propia supervivencia y para la credibilidad de América del Sur.

Marcelo Rech es periodista, editor de InfoRel y especialista en Relaciones Internacionales, Estrategias y Políticas de Defensa y Terrorismo y contrainsurgencia. Correo electrónico: inforel@inforel.org

A agricultura e o Brasil - Senadora Katia Abreu

Na sequencia da postagem anterior, a íntegra do artigo da Senadora Katia Abreu, que merece comentários mais elaborados (o que procurarei fazer tão pronto possível).
Paulo Roberto de Almeida

O que houve de novo com o Brasil
Kátia Abreu
O Estado de S.Paulo, 26 de julho de 2010

O Brasil orgulha-se hoje de ser uma economia estável e forte, que consegue crescer de modo sustentável a taxas elevadas e ao mesmo tempo distribuir renda, incorporando largos contingentes de população ao mercado de consumo e a padrões mais civilizados de bem-estar material. Olhando para trás, para tantas décadas de instabilidade, de surtos breves e logo frustrados de crescimento, temos de reconhecer que vivemos uma grande transformação.

O que tornou possível essa transformação? Tivemos vários momentos de crescimento, que não duravam muito. Após poucos anos, o crescimento provocava inflação, pois a oferta interna, especialmente de alimentos, não era capaz de acompanhar o aumento da demanda induzida pelo crescimento da renda. Mais grave era o outro problema, o cambial.

Diante da inflação sem controle e do desequilíbrio cambial, a única política possível era conter o processo de crescimento, para aliviar as pressões sobre os preços e sobre o déficit externo. Assim, voltávamos à estagnação econômica, embora a população continuasse crescendo e a imensa maioria vivesse na pobreza.

Para crescer sem interrupções seria necessário superar o limite de nossa capacidade para importar. Financiar indefinidamente o déficit cambial com financiamento externo não seria sustentável. Por termos tentado este caminho, incorremos em várias crises de endividamento e chegamos à moratória. Era preciso encontrar um meio realista de elevar a receita cambial.

Como sabemos hoje, no Brasil só a agricultura e a pecuária podiam realizar essa tarefa. Mas ninguém pensava nisso seriamente. Afinal, a produção rural brasileira crescia pouco e não éramos, de fato, até 1970, sequer capazes de atender ao abastecimento interno. Além do mais, a sabedoria convencional de então ditava que o desenvolvimento econômico significava o aumento da produção industrial e o encolhimento relativo da produção rural.

Apesar disso, a partir dos anos 70, teve início uma silenciosa revolução no campo brasileiro. Novas gerações de produtores rurais começaram a emergir, muitos deles abrindo novas fronteiras agrícolas ou transformando os modos de produzir nas fronteiras já estabelecidas. Esses novos agricultores romperam com as formas tradicionais de produção, apropriaram-se do conhecimento acumulado nas universidades rurais e na nova Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e trouxeram para a produção rural a disposição de assumir riscos e a compulsão do crescimento.

A ação destes novos empreendedores transformou em pouco tempo a produção rural brasileira, tornando-a em poucas décadas a segunda maior do mundo em escala e diversidade de produção e a primeira e única grande agricultura em área tropical.

Os números dessa revolução são impressionantes. Em 1965, antes do início desse processo, a produção brasileira de grãos era de 20 milhões de toneladas, para uma população de 80 milhões de habitantes, portanto, uma produção de 250 kg de grãos por habitante. Em 2008 a produção de grãos chegou a 144 milhões de toneladas, para uma população de 190 milhões de habitantes, o que representa uma produção per capita de 758 kg. A produção total cresceu 7 vezes, mas a área de plantio, que era de 21 milhões de hectares em 1965, passou para apenas 48 milhões de hectares em 2008, apenas 2,5 vezes mais. A produção de carnes, em 1965, era de 2,1 milhões de toneladas, o equivalente a 25 kg por habitante por ano. Em 2006 a produção alcançou 20 milhões de toneladas, o equivalente a algo como 100 kg por habitante/ano. A produção total aumentou dez vezes, mas as áreas de pastagens cresceram apenas 15%.

Esses gigantescos aumentos de produção e de produtividade mudaram a história da economia brasileira. Essa agricultura altamente produtiva e de grande escala conquistou os mercados externos e passou a gerar grandes superávits no balanço de pagamentos, dada a sua pequena dependência de importações. Entre 1994 e 2009, o agronegócio acumulou um saldo comercial com o exterior de US$ 453 bilhões. No mesmo período, o saldo comercial total do Brasil foi de US$ 255 bilhões. Significa que, sem a contribuição das exportações do agronegócio, o Brasil teria incorrido num déficit comercial de US$ 198 bilhões, praticamente o valor das reservas cambiais do País no final do ano passado. Não fora a contribuição do agronegócio, o País estaria vivendo gravíssima crise cambial e a história do nosso crescimento recente teria sido muito diferente.

Outro efeito dessa revolução no campo foi a persistente queda no custo da alimentação no mercado interno. Os professores José Roberto Mendonça de Barros e Juarez Rizzieri mostraram, em pesquisa, que o custo no varejo de uma ampla cesta de alimentos na cidade de São Paulo caiu pouco mais de 5% ao ano, em termos reais, entre 1975 e 2005. Uma queda dessa dimensão só foi possível pelos aumentos impressionantes da produção e da produtividade no campo. E, em decorrência, as classes de renda média e baixa não apenas puderam consumir mais e melhores alimentos, como elevaram seu poder de compra de produtos industriais. Assim, o efeito da queda dos preços agrícolas é mais importante que as transferências de renda para explicar a melhoria do padrão de vida das populações mais pobres.

O Brasil que se desenvolve hoje e se projeta no mundo como uma economia dinâmica e moderna é um País construído a partir da agricultura e da pecuária. E continuará sendo, no futuro, sem estar por isso condenado ao atraso e à pobreza, como vaticinavam no passado. Mas para isso é necessário que o Brasil valorize o agricultor e o pecuarista, que foram os agentes dessas transformações, dando-lhes o realce merecido e poupando-os dos preconceitos que sobrevivem às evidências da realidade.

SENADORA DA REPÚBLICA (DEM-TO), É PRESIDENTE DA CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL (CNA)

terça-feira, 27 de julho de 2010

Economia brasileira: agravamento das contas externas

Não concordo com o jornalista, sobretudo com o seu título, mas abordarei a questão mais adiante. No momento, limito-me a transcrever o material, pela importância do tema.

Falta de política desenvolvimentista produz problemas terríveis nas contas externas
Políbio Braga, 27.07.2010

Em artigo que assinou no jornal O Estado de S. Paulo desta segunda-feira, a senadora Katia Abreu, presidente da CNA, demonstra de que modo as exportações brasileiras dependem, neste momento, do chamado complexo agribusiness, sobretudo das commodities agrícolas.

. O artigo vai em link, a seguir, na íntegra.

. O editor trata deste tema porque saiu atrás de mais informações sobre o enorme saldo negativo da balança de pagamentos brasileira, que fechou o primeiro semestre com número intolerável de US$ 23,7 bilhões. O Banco Central acha que no ano o valor chegará a Us$ 49 bilhões.

. São os piores números desde 1947. Um terror econômico para o futuro.

. A FGV mandou dizer ao editor, nesta terça, que o déficit crescente não está sendo atacado pelo governo federal, porque não existe uma estratégia de desenvolvimento bem definida. Faltam estradas, energia - e até uma solução para o déficit público global, já no limite da LRF. O professor Evaldo Alves, da FGV, também aponta para a importação crescente de bens industriais:

- Temos que produzir volume maior de bens e serviços ao invés de importá-los.

. As declarações da FGV confirmam Kátia Abreu: o Brasil exporta matérias-primas agrícolas e minerais como nunca.

. Aliás, também nesta terça-feira, o editor conversou com a Abimaq, que confirma a análise da FGV:

- As exportações do setor de bens de capital mecânicos cresceram 6,5% no semestre, chegando a US$ 4 bi. Em compensação, a importação foi a US$ 10,6 bilhões, com crescimento de 14,6%.

. A Abimaq acha que a política de juros do governo federal compromete todo o esforço da indústria brasileira de bens de capital, sem contar o câmbio defasado, que favorece as importações.

CLIQUE AQUI
para ler o artigo de Kátia Abreu.

Diplomacia brasileira: julgamento severo do Estadao

Entre o erro e a omissão
Editorial - O Estado de S.Paulo
27 de julho de 2010

A coincidência não poderia ser mais simbólica. Enquanto na vizinhança do Brasil arde a crise deflagrada com o rompimento de relações entre a Venezuela e a Colômbia -- depois de o governo de Bogotá denunciar que 1.500 narcoterroristas das Farc vivem no país vizinho sob a proteção de Hugo Chávez --, eis que o chanceler Celso Amorim dá o ar de sua presença em Istambul, participando de uma reunião com os seus colegas da Turquia e do Irã.

A diplomacia brasileira sofreu há pouco um desmoralizante revés na região, ao se associar a um esquema de enriquecimento de urânio iraniano no exterior que corroboraria os alegados fins pacíficos do programa nuclear de Teerã. Concluído durante a visita do presidente Lula ao Irã, o acordo foi apresentado como gesto de boa vontade do país e saudado pelo Itamaraty como evidência de que o contencioso entre o Ocidente e a República Islâmica pode ser resolvido pela negociação, sem ameaças.

Isso justificaria o envolvimento do Brasil no Oriente Médio, contrastando com o silêncio ensurdecedor do governo diante dos problemas bilaterais no seu entorno, como entre Colômbia e Venezuela, ou em relação à sina dos presos políticos em Cuba. Mas a euforia durou pouco. Logo em seguida, com o apoio até da China e a solitária oposição do Brasil e da Turquia, o Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas aprovou nova rodada de sanções contra o Irã.

Em favor do endurecimento, os Estados Unidos invocaram fatos que deixaram o Itamaraty sem respostas convincentes. Em primeiro lugar, os 1.200 quilos de urânio a serem beneficiados no exterior passaram a representar metade dos estoques iranianos, ante os 3/4 que seriam despachados caso Teerã não tivesse renegado o acerto de outubro de 2009 com a AIEA, a agência nuclear da ONU.

Além disso, expondo ao mundo a ingênua sofreguidão brasileira para tomar pelo valor de face a palavra de um governo destituído de credibilidade nessa esfera -- tantas as suas tentativas de iludir os inspetores internacionais sobre as suas atividades --, imediatamente após a assinatura da chamada Declaração de Teerã o chefe do programa nuclear iraniano anunciou que o país continuaria a enriquecer urânio à taxa de 20%, cerca de seis vezes mais do que o necessário para um reator destinado à produção de energia elétrica. É mais fácil passar de 20% para os 95% usados numa bomba atômica do que completar a etapa anterior.

Por fim, a Declaração silenciou sobre a origem da crise -- a recusa iraniana a abrir as suas instalações e programas à inspeção da AIEA, bem como a permitir entrevistas com os cientistas envolvidos. Consumada a decisão do Conselho de Segurança da ONU, reforçada pelo pacote de punições unilaterais dos Estados Unidos, e às vésperas da aprovação, prevista para ontem, de outra série de medidas, desta vez pela União Europeia, o Irã tornou a fazer o seu número -- e o Brasil tornou a entrar no seu jogo.

O fato é que a coleção de sanções impostas a Teerã já começou a fazer efeito. O ponto crítico é o acesso aos derivados de petróleo. Embora detenha a terceira maior reserva mundial do combustível (e a segunda maior de gás), o país importa quase a metade da gasolina que consome. Grandes transportadoras estão pensando duas vezes antes de carregar gasolina para o Irã e as grandes seguradoras hesitam em atender à frota iraniana -- praticamente bloqueando a entrada dos seus navios em portos estrangeiros.

Que o Irã, diante disso, faça expressão corporal de voltar "imediatamente" à mesa de conversações não deve surpreender. Mas a reincidência brasileira no erro só pode ter uma explicação: o fracasso da ambição de promover o País a potência mundial subiu à cabeça do Itamaraty. Para mal dos pecados, a diplomacia lulista, ainda que o queira, não tem como assumir agora o papel que poderia desempenhar na América Latina, como mediador credenciado pela equidistância entre as partes desavindas.

Não se vê, por exemplo, como Bogotá poderia aceitar a intermediação brasileira depois de Lula dizer que "as Farc são um problema da Colômbia, e os problemas da Venezuela são da Venezuela". Se vestisse uma camiseta com a efígie de Chávez não deixaria mais claro de que lado está.

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Addendum (agradeço a meu leitor Rubens, por chamar-me a atenção para este artigo, abaixo reproduzido) de um jornalista que se pretende de esquerda:

Falta o "algo mais"

Blog do Alon, terça-feira, 13 de julho de 2010
(Alon Feuerwerker, Observações Políticas)

Têm faltado sofisticação e inteligência à nossa política externa. Ela pode ser “de direita” ou “de esquerda”. Só não deve ser incompetente

Talvez esteja na hora de a diplomacia brasileira tentar reencontrar o eixo perdido. As últimas semanas não foram boas para o Itamaraty. Nem para o presidente da República, no front externo. Um ponto de derrapagem foi a condução final do tema nuclear iraniano. De lá para cá as coisas parecem meio fora de lugar.

Ao ponto de o G20 reunir-se para debater as estratégias econômico-financeiras globais e o Brasil passar em branco. Lula sempre defendeu a necessidade imperiosa de ampliar o debate para além do G8, para fora dos estreitos limites do mundo desenvolvido. Quando a ampliação começa a acontecer, o Brasil parece meio à margem.

Tem sido notável o investimento político brasileiro nos Brics, o grupo das nações emergentes mais importantes, como polo alternativo aos Estados Unidos e à Europa. Mas as últimas semanas registram não apenas o nosso isolamento no âmbito dos Brics — como se viu na aprovação das sanções contra o Irã pelo Conselho de Segurança da ONU. Há uma inédita coordenação entre os Estados Unidos, a China e a Rússia.

Passou meio despercebido aqui, encoberto pela reta final da Copa do Mundo e pelo horrendo “Caso Bruno”, mas americanos e russos fizeram uma troca-relâmpago de espiões semana passada que é um sintoma das excelentes relações bilaterais. E nos últimos dias apareceram conexões de separatistas islâmicos chineses uigures com a Al Qaeda, quando se desbaratou uma conspiração terrorista na Noruega.

Em Cuba, finalmente o Partido Comunista começa a se mover, pressionado pela exigência internacional de mais respeito aos direitos humanos. De um jeito meio torto, é verdade, pois propõe banir do país os oposicionistas presos, em vez de simplesmente libertá-los. A ditadura brasileira fazia isso nos anos 1960 e 1970.

O Itamaraty correu para dizer que o Brasil tem um papel no avanço obtido, mas nossa capacidade de capitalizar politicamente é zero. Aqui menos por culpa dos diplomatas e mais por causa do incrivelmente desastroso paralelismo que Lula fez lá atrás entre os presos políticos cubanos e bandidos brasileiros condenados por crimes comuns. E tem mais: custava aos amigos de Lula em Havana avisarem da nova disposição para o diálogo? Teria evitado a saia justa.

Outro desconforto é acabarmos empurrados para o incômodo papel de aliados de Mahmoud Ahmadinejad. Tem gente no governo brasileiro achando que uma bomba iraniana ajuda o Brasil, mas a ideia inicial não era essa, era credenciarmo-nos como interlocutores.

Lula em Teerã deu uma de Asamoah Gyan. No último minuto da prorrogação perdeu o pênalti. Achou antes da hora que o sucesso estava consumado. Deu-se mal.

Em vez de entrar na História como o construtor do canal de negociação entre o Irã e as grandes potências, acabou por enquanto confinado a “marcar posição” contra americanos, russos, chineses, franceses e britânicos. Está emparedado.

Nada porém é definitivo. O peso do Brasil no jogo das relações políticas planetárias deve-se menos a aspectos subjetivos da ação dos governantes e mais ao nosso tamanho econômico, populacional, territorial. Só que talvez esteja faltando o “algo mais” para gerir esse capital.

O Itamaraty tem sua culpa. Por aceitar a relativização e o enfraquecimento do profissionalismo. Uma chancelaria subserviente é ruim para o país.

Falta também à diplomacia adaptar-se adequadamente às novas realidades. O sinal de alerta veio em Honduras, quando não tivemos inteligência (informação) sobre a real força política de Manuel Zelaya. Em Teerã, ninguém disse a Lula que talvez o acordo obtido por ele não fosse suficiente para brecar o expresso das sanções. E que era preciso trabalhar um pouco mais antes de ir para o palco.

Foi evidente ali que o Itamaraty e o Palácio do Planalto não tinham a mínima ideia do estágio das negociações entre as potências no Conselho de Segurança.

Ninguém avisou Lula que era uma má estratégia colocar todas as fichas na possibilidade de Barack Obama destravar as negociações da Rodada Doha?

Tem faltado sofisticação e inteligência à nossa política externa. Ela pode ser “de direita” ou “de esquerda”. Só não deve ser incompetente.

É um bom tema para quem vier a ocupar a cadeira presidencial em janeiro.

Contradicoes do capitalismo: bancos americanos possuem muito dinheiro

Ironia da história: com a crise, os bancos não estão encontrando muitas oportunidades para investir. Dentro em pouco vão recusar depósitos de clientes...

In Cash Glut, Banks Try to Discourage New Deposits
From the Editors of American Banker, July 27, 2010

With attractive lending opportunities hard to come by, bankers are finding themselves doing what would have been unthinkable just two years ago: discouraging deposits.
Most large and regional banking companies are drowning in deposits, raising concern that excess liquidity could be a drag on earnings in coming quarters.
Though interest rates on deposit accounts are manageable, due in part to historically low rates, costs remain associated with handling those relationships. Banks have also seen their ability to charge certain fees, on overdrafts, for example, constrained by the recent wave of financial reforms.

O racismo em construcao no Brasil: muito parecido com o nazismo

Tenho colocado muitos posts sobre o Estatudo da (Des)Igualdade Racial recentemente aprovado no Brasil. Em resposta tenho recebido diversos comentários raivosos de partidários desse instrumento racista, vários deles ofensivos.
Essas pessoas estão manifestamente descontentes, senão com ódio de minha posição, expressamente contrária ao espírito, à letra e aos efeitos de curto, médio e longo prazo desse veículo de construção do Apartheid no Brasil.
Seus defensores acham que ele vai resgatar o povo negro-africano, fazendo um amálgama indevido entre os negros e mulatos brasileiros e os africanos da época da escravidão.
Eles não se dão conta de que estão estimulando um sistema que pertence ao mesmo universo filosófico que o racismo hitlerista, ele também baseado numa concepção de diferença racial.
O fato de que o nazismo proclamava a superioridade da "raça ariana" e que os afro-descendentes atuais pretendam à "igualdade racial", mas distinguindo os "negros" brasileiros, não impede que os dois instrumentos sejam aparentados, em suas intenções respectivas de separar raças e de tratá-las de maneira diversa.
Isso é aparteísmo, ou Apartheid.
Isso é racismo, da pior espécie.
O povo brasileiro é diverso e misturado.
Os racistas negros pretendem transformá-lo em uma nação de etnias separadas.
Paulo Roberto de Almeida

Estatuto da (Des)Igualdade RaciaL: o mito da divida do Brasil com a Africa

O presidente extrapola. Não existe dívida do Brasil atual, dos cidadãos do Brasil atual, para com a África atual, com os africanos da atualidade. Essa interpretação é historicamente errada, economicamente equivocada e politicamente demagógica.
Falar em dívida do Brasil implicaria em que todos os cidadãos brasileiros, mesmo aqueles que nunca tiveram nada a ver com o ato da escravidão em si -- o que compreende tanto os afro-descendentes atuais e os descendentes de imigrantes europeus ou asiáticos -- sejam obrigados a desviar uma parte de sua renda e de seu patrimônio para africanos atuais, que tampouco estiveram envolvidos no comércio de escravos e que não foram minimamente afetados pelo tráfico, em qualquer sentido.
O presidente também é profundamente contraditório nesta afirmação:
"Lula afirmou que o Estatuto da Igualdade Racial garante que, 'a partir de agora, não exista nenhuma diferença entre negros e brancos'."
Ora, o Estatuto se destina, precisamente, a criar um desigualdade, a afirmar a ideia de uma raça negra, diferente e especial, pois que beneficiária de políticas das quais todas as demais "raças" estão excluídas.
O Estatuto é um instrumento racista que cria o Apartheid no Brasil.
Seus defensores acreditam que o povo africano -- que na verdade não existe -- será resgatado em sua atual condição subalterna. Os que assim pensam, acreditam numa via rápida para a promoção de certas categorias de pessoas, com a exclusão de todas as outras.
Toda a sociedade vai sofrer com esse tipo de política.
Paulo Roberto de Almeida

Lula: não dá para pagar dívida com negros em dinheiro
Renata Camargo
Congresso em Foco, 26/07/2010

O presidente Lula disse hoje (26), em seu programa Café com o presidente, que a dívida do Brasil com os negros não pode ser paga em dinheiro, mas com "solidariedade". Ao comentar a sanção do Estatuto da Igualdade Racial, ocorrida na semana passada, Lula relembrou a dívida histórica que o país tem com os negros e afirmou que esse débito tem que ser pago com ajuda aos países africanos.

"O Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravidão. Acho que nós temos uma dívida enorme com o continente africano, com o povo africano. É uma dívida que a gente nunca vai poder pagar em dinheiro. A gente vai poder pagar em solidariedade, em ajuda humanitária, em ajuda ao desenvolvimento, em ajuda no conhecimento científico e tecnológico que o Brasil tem a ajudar o povo da África", afirmou.

Entre as formas de pagamento, o presidente citou a criação da Universidade Federal de Integração Luso-Afro-Brasileira (Unilab). A lei que cria a instituição foi sancionada também na semana passada. "É o Brasil assumindo a sua grandeza, assumindo a condição de um país que, a vida inteira, foi receptor e, agora, é um país doador. Nós queremos ajudar os outros a se desenvolverem", disse.

No programa semanal, Lula afirmou que o Estatuto da Igualdade Racial garante que, "a partir de agora, não exista nenhuma diferença entre negros e brancos". "Na verdade, a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, transformado em lei, vem reforçar aquilo que a gente já tinha previsto na Constituição de 1988: fazer do Brasil uma República efetivamente democrática em que todos, sem distinção, sejam tratados em igualdade de condições", considerou.

O estatuto prevê garantias e políticas públicas de valorização da raça negra e propõe uma nova ordem de direitos para os brasileiros negros, que hoje são cerca de 90 milhões de pessoas. O documento, formado por 65 artigos, tem como objetivo "a correção de desigualdades históricas no que se refere às oportunidades e aos direitos dos descendentes de escravos do país".

Ouça aqui o programa Café com o Presidente

Jerry D'Avila e a politica africana do Brasil

Matéria do Estadão sobre o livro recentemente lançado de meu amigo brasilianista Jerry D'Avila. Falarei mais dele em breve.

''Como Jânio e Geisel, diplomacia de Lula vê África imaginária''
Jerry Dávila, historiador especializado em Brasil
Roberto Simon
O Estado de S.Paulo, 25 de julho de 2010

Em nome do elo "Sul-Sul", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é, de longe, o líder brasileiro que mais países africanos visitou - 25 de 53, ao todo. Mas para Jerry Dávila, historiador da Universidade da Carolina do Norte e especialista na relação Brasil-África, esse esforço de aproximação está longe de ser inédito. Na retórica de Lula, existiriam ecos de dois momentos históricos do Itamaraty: a "política externa independente", iniciada por Jânio Quadros, e o "pragmatismo responsável", de Ernesto Geisel.

"Em ascensão, o Brasil vê novamente a África como um lugar onde pode exercer sua influência, impulsionado por uma afinidade cultural e racial", diz ao Estado Dávila, que lançará esta semana nos EUA um dos primeiros estudos amplos sobre a diplomacia do Brasil para a África, intitulado Hotel Trópico: Brazil and the challenge of African decolonization (Hotel Trópico: Brasil e o desafio da descolonização na África). O livro sai no Brasil em 2011 pela editora Paz e Terra.

O sr. diz que essa "nova" política Sul-Sul do Brasil para a África tem raízes visíveis em governos anteriores - sobretudo de Jânio e Geisel. Por quê?
O teor e a linguagem da abertura de Lula na África são legados diretos das políticas de Jânio e Geisel. A aproximação atual é notável, mas faz parte de um ciclo que oscila entre o estreitamento com EUA e a Europa Ocidental, e momentos de abertura para países em desenvolvimento, numa procura por maior "autonomia".

A própria cultura do Itamaraty evoluiu por meio desse movimento pendular: foram jovens diplomatas da era janista que tomaram a liderança na articulação da política externa chamada de "pragmatismo responsável" de Geisel - como o ex-chanceler Mário Gibson Barbosa. E, agora, jovens diplomatas da época Geisel, como Celso Amorim e Samuel Pinheiro Guimarães, conduzem o barco.

A imagem que a diplomacia brasileira tem da África também foi "herdada" desses governos?
A percepção de uma África imaginária, como um lugar onde o Brasil pode exercer sua influência, impulsionado por uma afinidade racial, ainda é forte no Itamaraty. Aos olhos da diplomacia brasileira, países africanos - diferentemente dos latino-americanos - seriam uma nova fronteira, cujas potencialidades seguem quase inexploradas.

Em seu livro, o sr. defende que a política para a África, em sua "idade de ouro", apoiava-se em três preceitos. Primeiro, que a ascensão do Brasil era inevitável. Segundo, que a África, recém-libertada do jugo colonial, era um lugar ideal para exercer a influência brasileira. Terceiro, que o fato de o Brasil ser uma "democracia racial", como teorizado por Gilberto Freyre, criava uma afinidade especial entre africanos e diplomatas brasileiros - mesmo que entre estes praticamente inexistissem negros. É isso?
Sim. Diplomatas brasileiros nem percebiam a contradição que você aponta por um motivo importante: no contexto, presumiam que a mestiçagem ente africanos e europeus no Brasil foi um processo tanto cultural quanto biológico - essa é uma das lições fundamentais de Freyre.

Com essa miscigenação cultural, acreditavam e projetavam a ideia de que o Brasil era uma democracia racial - um país de "africanos de todas as cores", como dizia uma propaganda do Itamaraty na Costa do Marfim, nos anos 70. Para esses diplomatas, a cor da pele importava menos do que a atitude de ser miscigenado.

Mas é claro que interlocutores africanos notavam a cor da pele. Em horas de tensão, especialmente sobre a questão da descolonização nos territórios portugueses, quando o Brasil geralmente apoiou Portugal, africanos "desmascaravam" os brasileiros.

Esse "tripé" ainda existe? O sr. aponta que Fernando Henrique Cardoso e Lula, embora brancos, reivindicaram uma herança simbólica negra.
Para o estrangeiro, a elasticidade e multiplicidade de identidades da cultura brasileira é fascinante. Um brasileiro se define como africano, português ou japonês segundo o contexto.

Essa elasticidade serve como uma base de articulação poderosa: seleciona-se essas identidades de maneira estratégica. Por exemplo, quando FHC disse ter "um pé na cozinha", ao abrir um discurso sobre a desigualdade racial, estava ao lado do presidente sul-africano Thabo Mbeki. Acho também muito interessante quando Lula diz ser "o primeiro presidente negro do Brasil". Diz algo sobre a relação entre raça e classe social.

Por que o projeto de aproximação Brasil-África fracassou?
Encalhou na crise econômica dos anos 80, que abalou tanto a América Latina quanto a África. O intercâmbio comercial com países africanos culminou em 1984, quando 8% das exportações brasileiras foram consumidas na África. Mas não era uma presença com base segura. Deste lado do Atlântico, dependia de uma imensa intervenção do governo, que foi insustentável - por exemplo, a tentativa da Petrobrás de vender eletrodomésticos de companhias brasileiras sob a marca Tama, na Nigéria.

PONTOS-CHAVE
Lusotropicalismo
A convite de Lisboa, Gilberto Freyre faz em 1950 visita às colônias portuguesas na África, onde vê uma "bastante avançada democracia étnica e social". Freyre advogará, no Brasil, o colonialismo de Portugal

Diplomacia "independente"
Jânio Quadros promete em 1961 romper apoio a Portugal e apoiar a descolonização. Abre 3 embaixadas na África e nomeia 1º embaixador negro do País, Souza Dantas (foto)

Pragmatismo e recuo
Geisel aproxima-se de africanos e Brasil é 1º país a reconhecer independência de Angola. Nos anos 80, crise econômica inviabiliza relação

Comentários para este post:

2 Alberto Martinet
25 de julho de 2010 | 8h 17
A África está longe de ser a «terra virginalis» que imagina a diplomacia brasileira. Desde o século XIX, está sob a cúpula das potências europeias que a colonizaram. Pelos anos sessenta, foi declarada a independência de dezenas de novos países. Mas essa independência deve ser relativizada.

A França, por exemplo, entretém relações carnais com suas numerosas ex-colônias, incluindo tratados de cooperação militar e relações comerciais intensas. O Reino Unido não fica muito atrás no trato com suas antigas possessões. Até o pequenino Portugal não desgrudou por completo de seus antigos territórios africanos.

É por isso que, nossa diplomacia indigente e monomaníaca tem de se contentar em tratar com os párias do continente, rejeitados pelas potências europeias. Exemplo mais recente: a Guiné Equatorial.

E tem mais: enquanto o Brasil se especializa no trato com ditadores e déspotas africanos, a China, sorrateiramente, solapa a influência das antigas potências coloniais, e vai-se implantando no continente, valendo-se da via expressa que o comércio lhe abre.

1 roberto teixeira da silva
25 de julho de 2010 | 6h 19
Na diplomacia internacional o Sr LULA é um pé atolado no escuro!!!

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domingo, 25 de julho de 2010

Crimes politicos no Brasil: tolerancia ou conivencia do governo

O Brasil é um país no qual autoridades supremas se permitem violar a lei em toda a impunidade. Crimes políticos, crimes eleitorais, crimes comuns são cometidos todos os dias por aqueles mesmos que são responsáveis pela prevenção, apuração ou punição desses crimes.
Existe tolerância, conivência, eu até diria cumplicidade com esses crimes, por parte dessas autoridades.
O crime cometido no âmbito da Receita Federal é o mais recente, certamente não o último, que essa tropa de meliantes que se apoderaram do poder perpetrou na certeza da impunidade. Eu até chegaria a dizer que eles estão certos: todos os criminosos acobertados pelo poder vão escapar ilesos desse e de outros crimes. Tenho quase certeza disse e seria até capaz de apostar.
Como não está em meu poder fazer algo em relação a isso, utilizo-me da única arma à minha disposição: a divulgação ampla desses crimes, e a expressão de meu horror, ojeriza, asco por esse tipo de gente.
Fica o registro.
Paulo Roberto de Almeida

Sobre violação de sigilo e democracia
Everardo Maciel
O Globo, 25 de julho de 2010

O Estado pode, quando indispensável ao exercício de suas responsabilidades, ter acesso a informações que revelem a intimidade do cidadão ou da empresa. Essa excepcionalidade se exerce nos estritos limites da lei, sempre tendo em conta que a intimidade é um bem jurídico tutelado pela Constituição e que a esse poder corresponde a obrigação de guardar sigilo das informações obtidas.

Nesse contexto, causam perplexidade os seguidos vazamentos, no âmbito da Receita Federal, de informações protegidas por sigilo fiscal, em desfavor da reputação do órgão, conquistada arduamente com competência e trabalho.

De fato, nos últimos doze meses, foram veiculadas informações sigilosas relativas à Ford, ao Banco Santander, à Petrobras, à BMF&BOVESPA (com repercussões no movimento diário dessa instituição) e às empresas de Guilherme Leal, candidato à Vice-Presidência da República na chapa da Senadora Marina Silva. Por último, constatou-se que vazaram informações fiscais de Eduardo Jorge, dirigente do PSDB, com o objetivo de alimentar um suposto dossiê a ser utilizado, de forma criminosa, como arma na próxima campanha presidencial.

A apuração desses vazamentos, lamentavelmente, está encoberta por mistificações e mal-entendidos conceituais, além de aparentes manobras diversionistas e exercícios de contra-informação.

A competência do servidor fiscal para acessar informações sigilosas é definida pela natureza do cargo por ele exercido e dela resultam senhas e perfis de acesso individuais.

Os acessos são registrados em uma fita específica, em que se identificam o CPF do servidor, bem como o local e a data em que foram realizados. Por essa razão, constitui operação simples, ainda que relativamente morosa, proceder ao levantamento de acessos a um determinado CPF ou CNPJ.

Para ter acesso, entretanto, não basta ter competência funcional, é indispensável também que haja motivação. Em outras palavras, o funcionário fiscal deve ter uma justificativa plausível, associada à sua atividade profissional, para buscar informações protegidas por sigilo. Se o faz de forma imotivada, está sujeito a penalidades administrativas, que vão da advertência à suspensão.

O repasse dessas informações para terceiros, obtidas com ou sem motivação, configura crime de violação de sigilo, capitulado no art. 325 do Código Penal, cuja pena, a depender das circunstâncias, é de seis meses de detenção a seis anos de reclusão. Há, portanto, uma distinção conceitual entre motivação para acessar e violação de sigilo.

Como o levantamento dos acessos ao CPF de Eduardo Jorge já foi concluído, a Receita instituiu comissão para apurar as respectivas motivações. Estranhamente, contudo, na lista de pessoas que tiveram acesso, divulgou-se o nome de uma servidora, ferindo claramente a exigência legal de sigilo no procedimento administrativo disciplinar. Presumiu-se que seu ato foi imotivado tão somente porque, até o momento, ela não ofereceu justificação para o acesso. Mais grave, insinuou-se que a presumida falta de motivação a tornava suspeita do vazamento. É ilação falsa entender que um ato imotivado resulta inevitavelmente em violação de sigilo. Esse crime pode estar associado a um ato motivado ou não.

A investigação deve ser firme, imparcial e competente, sem descurar, entretanto, a observância dos princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal, sob pena de o processo converter-se em pena, como bem lembrou o Professor Joaquim Arruda Falcão. De mais a mais, a simples possibilidade de que venha a ser cometida uma injustiça, na suposição aventada quanto à quebra de sigilo, é uma temeridade que pode tornar-se leviandade.

Da mesma forma que a Corregedoria da Receita está apta para apurar a motivação dos acessos, parece claro que a investigação do vazamento, por sua natureza criminal, guarda mais afinidade com a missão da Polícia Federal. Essa divisão de trabalhos, não dispensa, contudo, cooperação interinstitucional, pautada pelo interesse público.

A reputação da Receita não deve ser confundida com a ação deletéria de pessoas movidas por ânimo político ou pessoal. É indispensável, portanto, que os fatos sejam apurados com rigor e os infratores sejam punidos. Os mecanismos de controle no acesso a informações sigilosas devem permitir apurações mais ágeis e precisas, com registro da motivação. A propósito, como noticiado, um funcionário da Receita, em um curto período, acessou dados de aproximadamente 13 mil pessoas físicas e jurídicas. Feita a sindicância, chegou-se à impressionante conclusão de que todos os atos foram motivados, o que constitui um escárnio merecedor de catalogação no Guiness Book of Records, como a maior bisbilhotice fiscal da história.

De tudo, resta uma grave reflexão: o uso indevido do sigilo tutelado pelo Estado é um caminho por onde passam todas as formas autoritárias de governo. Isso não pode passar despercebido pelos que têm compromisso com o Estado Democrático de Direito, independentemente de suas opções políticas ou partidárias.

Everardo Maciel é ex-secretário da Receita Federal

Formacao da Diplomacia Economica no Brasil: faltam o segundo e o terceiro volumes...

Minha pesquisa histórica sobre a diplomacia econômica no Brasil foi concebida em três volumes. O primeiro já saiu, teve segunda edição e seu sumário figura abaixo. Estou tentando concluir o segundo volume, cobrindo o período 1889-1945, antes de lançar-me à redação do terceiro e último volume, sobre o período contemporâneo.
Alguns textos do primeiro volume estão disponíveis, como linkado abaixo.

Formação da Diplomacia Econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império
(2ª edição; São Paulo: Editora Senac; Brasília: Funag, 2005; 680 p. ISBN: 85-7359-210-9)

Sumário resumido:

Apresentação à segunda edição (2005)
Prefácio(Embaixador Alberto da Costa e Silva)

1. Fundamentos da diplomacia econômica brasileira

Parte I: Diplomacia econômica e relações internacionais do Brasil
2. A diplomacia econômica do Brasil como objeto de estudo
3. As relações econômicas internacionais do Brasil no século XIX

Parte II: Diplomacia comercial: dos tratados desiguais ao protecionismo
4. Fim do pacto colonial e abertura dos portos
5. O tratado de comércio com a Inglaterra e o livre cambismo
6. Os primeiros tratados de comércio do Brasil independente
7. Diplomacia comercial: revisão conceitual
8. Evolução da política comercial no Império

Parte III: Diplomacia financeira: a hegemonia britânica
9. Diplomacia da dívida: o financiamento externo do Estado
10. A diplomacia dos patacões: o Brasil como credor
11. A diplomacia da libra esterlina: o Brasil como devedor

Parte IV: Diplomacia dos investimentos: precocidade e abertura
12. A diplomacia das exposições: as vitrines do capitalismo
13. A diplomacia das patentes: o comércio de tecnologia
14. A diplomacia dos investimentos: ainda o predomínio britânico

Parte V: Diplomacia da força de trabalho: escravidão e imigração
15. A diplomacia do tráfico e as convenções com a Inglaterra
16. A diplomacia da colonização e os obstáculos à imigração
17. A diplomacia da escravidão e o contencioso com a Grã-Bretanha
18. A diplomacia da imigração e a competição estrangeira

Parte VI: Diplomacia econômica: a emergência do multilateralismo
19. Emergência da diplomacia econômica multilateral
20. Diplomacia regional: da teoria política à prática econômica
21. A diplomacia econômica em transição: mudança de hegemonia

Parte VII: A diplomacia econômica do Brasil: o quadro institucional
22. Estrutura política da diplomacia econômica
23. Estrutura funcional da diplomacia brasileira

Parte VIII: A diplomacia econômica do Brasil em perspectiva histórica
24. A experiência do passado: o progresso da ordem escravocrata
25. As exigências do presente: a ordem do progresso republicano
26. A economia política da diplomacia brasileira

Apêndice: Cronologia do processo econômico colonial, 1415-1822.
Anexo: Tabelas estatísticas e quadros analíticos; Bibliografia; Índice remissivo.

Compras junto à Editora SENAC-São Paulo ou em livrarias online.

Ver Indice Geral da Obra

Ver Resenha desta obra pelo Prof. Paulo-Edgar Resende

A tensao Venezuela-Colombia e a diplomacia brasileira

Sem comentários, duas matérias sobre o assunto do momento. Leitores inteligentes sabem tirar suas conclusões...

A nova bravata de Chávez
Editorial - O Estado de S.Paulo
24 de julho de 2010

Diante das evidências contundentes sobre a presença de 1.500 guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) em território venezuelano, apresentadas à Organização dos Estados Americanos (OEA), o presidente Hugo Chávez reagiu na sua típica maneira destemperada: invocando a "dignidade" nacional, rompeu relações diplomáticas com o governo de Bogotá e ordenou às Forças Armadas que entrassem em "alerta máximo" na fronteira entre os dois países.

A dignidade da Venezuela estaria mais bem servida se, em primeiro lugar, tivesse um dirigente que não se comportasse como um histrião. Mas Chávez armou o cenário para o anúncio da ruptura com a participação, que acabou sendo ridícula, de seu "correligionário" argentino Diego Maradona, que com ar estuporado ouviu a catadupa de impropérios que dirigiu ao presidente colombiano Álvaro Uribe. Essa foi a resposta às provas exibidas na OEA de que continua dando guarida ao bando de narcotraficantes em que se transformaram as antigas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, que desgraçaram a nação vizinha antes de serem acuadas pela tenaz política de segurança adotada por Uribe.

"A Venezuela deveria romper relações com as gangues que sequestram, matam e traficam drogas, e não com um governo legalmente constituído", comentou o embaixador colombiano na OEA, Luis Alfonso Hoyos. Foi na sede da OEA, em Washington, que os representantes colombianos exibiram vídeos, mapas e fotos aéreas indicando a localização dos acampamentos das Farc e do Exército de Libertação Nacional (ELN).

"São ao menos 87 estruturas completamente armadas em território venezuelano", descreveu Hoyos. Os acampamentos "continuam se consolidando". Nas regiões do país onde se instalaram, geralmente em locais fronteiriços, os farquistas não se conduzem como se estivessem batendo em retirada ou apenas se reagrupando. Controlam com mão de ferro as desafortunadas populações, a ponto de lhes impor o toque de recolher a cada dia.

Foi essa realidade que a Colômbia buscou descortinar na reunião de emergência da OEA, convocada a seu pedido. Além disso, representantes de Bogotá exortaram Chávez a permitir que observadores estrangeiros visitassem as áreas onde se situam os santuários das Farc. Para surpresa de ninguém, a Venezuela se recusou a fazê-lo, o que dá a devida dimensão a suas tentativas de desmentir fatos que constituem uma clara violação das normas da Carta da OEA sobre a convivência pacífica dos países do Hemisfério.

A bravata do rompimento vem sendo, em geral, interpretada como a reencenação do velho truque da transmutação do agressor em vítima. A plateia a que o caudilho se dirige é a população venezuelana. Já se apontou neste espaço a urgência de Chávez em fabricar inimigos internos (a imprensa, a Igreja, o empresariado) e externos (o "Império" e a Colômbia) para mascarar o estado pré-falimentar a que as suas políticas "bolivarianas" reduziram a economia nacional, em recessão pelo segundo ano consecutivo. Ele teme o troco do povo nas eleições legislativas de setembro.

Se os motivos de Chávez são claros, os de Uribe suscitam controvérsias. Segundo uma versão, ele teria resolvido levar o venezuelano ao pelourinho a duas semanas da transmissão do poder ao sucessor Juan Manoel Santos, o ex-ministro a quem apoiou na campanha, para sabotar a sua anunciada política de distensão com a Venezuela. Mais convincente, talvez, parece ser a hipótese de que, tendo só agora reunido as condições para denunciar a proteção chavista às Farc, Uribe quis fechar um ciclo no contencioso bilateral e deixar o campo livre para Santos fazer nova política na matéria.

De seu lado, o governo brasileiro, que até há pouco preferia se envolver nos conflitos do Oriente Médio em vez de se voltar para tensões na vizinhança, mais do que depressa anunciou a intenção de agir como mediador entre Colômbia e Venezuela. Antes tarde do que nunca, seria o caso de dizer, se a oferta já não estivesse contaminada pelas manifestas simpatias do presidente Lula e do seu entorno pelo autocrata venezuelano.

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Lula diz 'estranhar' denúncia de Uribe contra a Venezuela
BBC Brasil, 24 de julho de 2010

Presidente afirma que denúncia feita a poucos dias de fim de mandato causou estranhamento.

Em suas primeiras declarações públicas a respeito da crise entre Venezuela e Colômbia desde que os dois países romperam relações diplomáticas, na última quinta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou "estranhar" o fato de o governo colombiano ter apresentado as denúncias contra Caracas a poucos dias do fim do mandato de Álvaro Uribe.

"O que eu, na verdade, estranhei é que faltam poucos dias para o companheiro Uribe deixar a Presidência da República. (...) Os sinais estavam andando tudo bem, até que o presidente Uribe resolve fazer uma denúncia na OEA (Organização dos Estados Americanos) contra a Venezuela", disse Lula durante uma entrevista coletiva em Caetés, Pernambuco, nesta sexta-feira.

Uribe deixa a Presidência da Colômbia no próximo dia 7 de agosto. Na última quinta-feira, no entanto, seu governo apresentou à OEA uma denúncia de que haveria membros de grupos guerrilheiros colombianos abrigados na Venezuela, o que fez com que presidente venezuelano, Hugo Chávez, anunciasse o rompimento das relações entre os dois países.

Durante a coletiva desta sexta-feira, Lula afirmou que pretende discutir a crise na região com os líderes de Colômbia e Venezuela durante visitas a Caracas, no próximo dia 6, e a Bogotá, no dia 7.

"São dois países que dependem um do outro(...), dois países (que) poderão ir para frente com muito mais facilidade se eles estabelecerem uma programação de construir a paz definitiva entre eles", disse.

Negociações
O Brasil tem trabalhado para que a crise entre os dois países seja solucionada no âmbito da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) e gestões neste sentido já estão sendo feitas pelo organismo.

Segundo uma fonte do Palácio do Planalto ouvida pela BBC Brasil, a avaliação é de que o grupo, criado por uma iniciativa do Brasil, "está mais próximo à realidade regional" do que outros fóruns, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), que inclui ainda América Central, além de México, Estados Unidos e Canadá.

A estratégia do governo brasileiro tem sido a de atuar nos bastidores, evitando assim qualquer comentário mais contundente sobre a disputa diplomática.

O objetivo é ganhar tempo até que o presidente Lula fale pessoalmente com Chávez e com Uribe.

sábado, 24 de julho de 2010

A inocuidade das sancoes contra a Guarda Revolucionaria Iraniana

Muitas vezes, sanções acabam enriquecendo aqueles mesmos aos quais elas são tidas como fator de enfraquecimento. É o que siz, em síntese, o texto abaixo...

Smugglers for the State
Sanctions can’t touch the Revolutionary Guards’ black-market empire.
by Babak Dehghanpisheh
Newsweek, July 10, 2010

The grizzled Iranian skipper strides barefoot along his wooden ship’s bulwarks, taking inventory of his cargo. There are crates of blankets and canned pineapple slices, Chinese tires, even a stack of water-purification machines waiting to be loaded, all bound for the Iranian port of Bandar Genaveh, roughly 500 miles away near the north end of the Gulf. His dhow is hauling other goods, too, but they’re best kept out of sight, whether they’re taxed or forbidden under Iranian law or banned under U.N. sanctions. The skipper doesn’t worry either way. “We can take almost anything to Iran,” he says with a grin. Cell phones and other electronics are his most profitable contraband these days, he adds. What happens if the Revolutionary Guards catch him? “They charge a ‘fee,’ ” he says—about $3,000 or $4,000—but they won’t confiscate his goods. They just want their cut.
He’s hardly an isolated case: dozens of wooden ships like his are bobbing in Dubai Creek’s waters, just across the Gulf from Iran. Thanks to the dwindling traffic of big container ships from Dubai to the Islamic Republic, business is booming for the Iranian skipper and a whole fleet of smugglers like him—as well as for the group that dominates Iran’s black market: the Islamic Revolutionary Guard Corps. The latest U.N. sanctions were designed to punish the Revolutionary Guards for running Tehran’s covert nuclear program. But the trouble with sanctions is that they squeeze out legitimate businesses and leave the field wide open for the IRGC, which has spent decades mastering the art of sanctions-busting. “You’re using pinpoint sanctions against the very entity that’s best positioned to evade those sanctions,” says Matthew Levitt, a counterterrorism expert at the Washington Institute for Near East Policy. An Iranian businessman in Dubai, asking not to be named because of the subject’s sensitivity, puts it succinctly: “You’re enriching the people the sanctions are trying to target.”

The size of Iran’s smuggling industry has been estimated at $12 billion a year, and the IRGC is believed to control much, if not all, of it. The charge is impossible to confirm, of course, but only the Revolutionary Guards have the resources to run such a massive operation—and the influence to keep it from being shut down. Analysts say the organization has the structure of a mafia network, with dozens of seemingly legitimate front businesses that mask illicit enterprises or serve as money laundries. “[They’re] extremely creative [with] front organizations, which they’ll open and shut regularly,” says Levitt. The IRGC’s business operations began more than 20 years ago, at the end of the Iran-Iraq War. Fearful of potential unrest among newly unemployed young men flooding back from the front lines, then president Ali Akbar Hashemi Rafsanjani approved a plan for the IRGC to open companies and bid on government contracts.
The IRGC’s involvement in smuggling began about the same time, when Rafsanjani established free-trade areas in Kish and Qeshm, two islands across the Gulf from Dubai. On paper, the islands’ duty-free goods were tightly controlled; to thwart profiteers, a national ID was required for each purchase. But the IRGC gamed the system using a list of its members’ ID numbers to import scarce household appliances and resell them on the black market. The IRGC had its own private jetties, recalls Mohsen Sazegara, one of the group’s founders, who now lives in exile in Virginia: “I saw the Qeshm one personally. The Customs officer wouldn’t dare go near them. All the years [when] importing household goods—like radios, TVs, refrigerators—was prohibited, the shops in [Tehran’s] Jomhouri Street were stocked full. [Shop owners] would say that travelers had brought the items in from duty-free, but in reality the Revolutionary Guards were bringing it all in from Qeshm.”

Traffic only expanded from there. In 2002 Parliament Speaker Mehdi Karrubi revealed the existence of illegal ports in southern Iran. One of his aides later estimated that more than half the country’s black-market trade passedthrough some 60 “invisible jetties,” as they came to be known. He also claimed that 25 gates at Tehran’s airport were handled by the Guards, outside of Customs’ control. “They have their hands in everything,” says Sazegara. “There were Kurds who helped them smuggle things from Iraq. They even used to buy Saddam’s oil during the days of sanctions.” (The New York Times reported last week that tanker trucks are hauling huge quantities of oil into Iran from Iraqi Kurdistan.)

The IRGC’s smuggling infuriates legitimate traders, who say they’re being punished while the sanctions’ real targets easily sidestep the obstacles. “Sanctions have affected us in a profound way,” says shipping-company owner Morteza Masoumzadeh,the deputy president of the Iranian Business Council in Dubai. “In the past two years we’ve lost almost 70 percent of our commercial business.” He estimates that nearly 400 legitimate Iranian businesses have closed down in Dubai since Washington imposed unilateral sanctions in 2007.

German businessman John Schneider-Merck, 70, is likewise frustrated. He’s done business in Iran for 30 years, and his company still makes upward of $20 million a year there, but he fears it may not last much longer. One of his regular exports to Iran was a synthetic rubber O-ring used in Mercedes and Volvo cars. But it could also be used in military rockets so now it’s listed as a dual-use item, and the German government demands an end-user certificate for every one he sells. “How can I ask some bazaari in Tehran for an end-user certificate?” he asks. “Even toilet paper can be classified as dual-use if it’s headed for the Army.”
That’s an exaggeration,but not by much. And as Schneider-Merck points out, shady IRGC companies can easily fake the paperwork they need. One Iranian in Dubai, who asked for anonymity because he ships Xboxes and other supposedly banned goods to Iran, pulls out a cargo manifest listing a woman in Iran as his official importer. She lives in a small coastal town, he says with a chuckle, “and before her we used another lady for about six months.”

As Western firms pull out in disgust, even the IRGC’s legitimate companies are benefiting. Royal Dutch Shell and Spain’s Repsol withdrew from negotiations to develop the giant South Pars gas field in May, after nearly a decade of talks. The Iranian government then handed $21 billion worth of development contracts to a consortium of local firms, including the Guards’ construction wing.

Iran’s neighbors are worried that the standoff could ultimately spin out of control. In response to the latest U.N. sanctions, which call for the boarding and inspection of ships in the Gulf, the IRGC’s naval chief threatened to block its mouth, the Strait of Hormuz. “The Persian Gulf is the center and the most sensitive place in the world,” Adm. Ali Fadavi warned. “And we can, at any time, and as much as we want, squeeze this strait.” There’s one consolation: that would probably hurt Iran even worse than it would the United States.

O Brasil a caminho do Apartheid - Texto do Estatuto da (Des)Igualdade Racial

Um instrumento lamentável, racista, destruidor das boas relações raciais no Brasil, criador de um novo racismo e de políticas deploráveis de Apartheid racial, etnico, social, cultural, mental.
O Brasil se degrada mais um pouco.
Paulo Roberto de Almeida

LEI Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010.
Institui o Estatuto da Igualdade Racial; altera as Leis nos 7.716, de 5 de janeiro de 1989, 9.029, de 13 de abril de 1995, 7.347, de 24 de julho de 1985, e 10.778, de 24 de novembro de 2003.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1o Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

Parágrafo único. Para efeito deste Estatuto, considera-se:
I - discriminação racial ou étnico-racial: toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada;
II - desigualdade racial: toda situação injustificada de diferenciação de acesso e fruição de bens, serviços e oportunidades, nas esferas pública e privada, em virtude de raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica;
III - desigualdade de gênero e raça: assimetria existente no âmbito da sociedade que acentua a distância social entre mulheres negras e os demais segmentos sociais;
IV - população negra: o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou que adotam autodefinição análoga;
V - políticas públicas: as ações, iniciativas e programas adotados pelo Estado no cumprimento de suas atribuições institucionais;
VI - ações afirmativas: os programas e medidas especiais adotados pelo Estado e pela iniciativa privada para a correção das desigualdades raciais e para a promoção da igualdade de oportunidades.

Art. 2o É dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades, reconhecendo a todo cidadão brasileiro, independentemente da etnia ou da cor da pele, o direito à participação na comunidade, especialmente nas atividades políticas, econômicas, empresariais, educacionais, culturais e esportivas, defendendo sua dignidade e seus valores religiosos e culturais.

Art. 3o Além das normas constitucionais relativas aos princípios fundamentais, aos direitos e garantias fundamentais e aos direitos sociais, econômicos e culturais, o Estatuto da Igualdade Racial adota como diretriz político-jurídica a inclusão das vítimas de desigualdade étnico-racial, a valorização da igualdade étnica e o fortalecimento da identidade nacional brasileira.

Art. 4o A participação da população negra, em condição de igualdade de oportunidade, na vida econômica, social, política e cultural do País será promovida, prioritariamente, por meio de:
I - inclusão nas políticas públicas de desenvolvimento econômico e social;
II - adoção de medidas, programas e políticas de ação afirmativa;
III - modificação das estruturas institucionais do Estado para o adequado enfrentamento e a superação das desigualdades étnicas decorrentes do preconceito e da discriminação étnica;
IV - promoção de ajustes normativos para aperfeiçoar o combate à discriminação étnica e às desigualdades étnicas em todas as suas manifestações individuais, institucionais e estruturais;
V - eliminação dos obstáculos históricos, socioculturais e institucionais que impedem a representação da diversidade étnica nas esferas pública e privada;
VI - estímulo, apoio e fortalecimento de iniciativas oriundas da sociedade civil direcionadas à promoção da igualdade de oportunidades e ao combate às desigualdades étnicas, inclusive mediante a implementação de incentivos e critérios de condicionamento e prioridade no acesso aos recursos públicos;
VII - implementação de programas de ação afirmativa destinados ao enfrentamento das desigualdades étnicas no tocante à educação, cultura, esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de comunicação de massa, financiamentos públicos, acesso à terra, à Justiça, e outros.

Parágrafo único. Os programas de ação afirmativa constituir-se-ão em políticas públicas destinadas a reparar as distorções e desigualdades sociais e demais práticas discriminatórias adotadas, nas esferas pública e privada, durante o processo de formação social do País.

Art. 5o Para a consecução dos objetivos desta Lei, é instituído o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), conforme estabelecido no Título III.

TÍTULO II
DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO I
DO DIREITO À SAÚDE
Art. 6o O direito à saúde da população negra será garantido pelo poder público mediante políticas universais, sociais e econômicas destinadas à redução do risco de doenças e de outros agravos.
§ 1o O acesso universal e igualitário ao Sistema Único de Saúde (SUS) para promoção, proteção e recuperação da saúde da população negra será de responsabilidade dos órgãos e instituições públicas federais, estaduais, distritais e municipais, da administração direta e indireta.
§ 2o O poder público garantirá que o segmento da população negra vinculado aos seguros privados de saúde seja tratado sem discriminação.

Art. 7o O conjunto de ações de saúde voltadas à população negra constitui a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, organizada de acordo com as diretrizes abaixo especificadas:
I - ampliação e fortalecimento da participação de lideranças dos movimentos sociais em defesa da saúde da população negra nas instâncias de participação e controle social do SUS;
II - produção de conhecimento científico e tecnológico em saúde da população negra;
III - desenvolvimento de processos de informação, comunicação e educação para contribuir com a redução das vulnerabilidades da população negra.

Art. 8o Constituem objetivos da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra:
I - a promoção da saúde integral da população negra, priorizando a redução das desigualdades étnicas e o combate à discriminação nas instituições e serviços do SUS;
II - a melhoria da qualidade dos sistemas de informação do SUS no que tange à coleta, ao processamento e à análise dos dados desagregados por cor, etnia e gênero;
III - o fomento à realização de estudos e pesquisas sobre racismo e saúde da população negra;
IV - a inclusão do conteúdo da saúde da população negra nos processos de formação e educação permanente dos trabalhadores da saúde;
V - a inclusão da temática saúde da população negra nos processos de formação política das lideranças de movimentos sociais para o exercício da participação e controle social no SUS.
Parágrafo único. Os moradores das comunidades de remanescentes de quilombos serão beneficiários de incentivos específicos para a garantia do direito à saúde, incluindo melhorias nas condições ambientais, no saneamento básico, na segurança alimentar e nutricional e na atenção integral à saúde.

CAPÍTULO II
DO DIREITO À EDUCAÇÃO, À CULTURA, AO ESPORTE E AO LAZER
Seção I
Disposições Gerais
Art. 9o A população negra tem direito a participar de atividades educacionais, culturais, esportivas e de lazer adequadas a seus interesses e condições, de modo a contribuir para o patrimônio cultural de sua comunidade e da sociedade brasileira.

Art. 10. Para o cumprimento do disposto no art. 9o, os governos federal, estaduais, distrital e municipais adotarão as seguintes providências:
I - promoção de ações para viabilizar e ampliar o acesso da população negra ao ensino gratuito e às atividades esportivas e de lazer;
II - apoio à iniciativa de entidades que mantenham espaço para promoção social e cultural da população negra;
III - desenvolvimento de campanhas educativas, inclusive nas escolas, para que a solidariedade aos membros da população negra faça parte da cultura de toda a sociedade;
IV - implementação de políticas públicas para o fortalecimento da juventude negra brasileira.

Seção II
Da Educação
Art. 11. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, é obrigatório o estudo da história geral da África e da história da população negra no Brasil, observado o disposto na Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
§ 1o Os conteúdos referentes à história da população negra no Brasil serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, resgatando sua contribuição decisiva para o desenvolvimento social, econômico, político e cultural do País.
§ 2o O órgão competente do Poder Executivo fomentará a formação inicial e continuada de professores e a elaboração de material didático específico para o cumprimento do disposto no caput deste artigo.
§ 3o Nas datas comemorativas de caráter cívico, os órgãos responsáveis pela educação incentivarão a participação de intelectuais e representantes do movimento negro para debater com os estudantes suas vivências relativas ao tema em comemoração.

Art. 12. Os órgãos federais, distritais e estaduais de fomento à pesquisa e à pós-graduação poderão criar incentivos a pesquisas e a programas de estudo voltados para temas referentes às relações étnicas, aos quilombos e às questões pertinentes à população negra.

Art. 13. O Poder Executivo federal, por meio dos órgãos competentes, incentivará as instituições de ensino superior públicas e privadas, sem prejuízo da legislação em vigor, a:
I - resguardar os princípios da ética em pesquisa e apoiar grupos, núcleos e centros de pesquisa, nos diversos programas de pós-graduação que desenvolvam temáticas de interesse da população negra;
II - incorporar nas matrizes curriculares dos cursos de formação de professores temas que incluam valores concernentes à pluralidade étnica e cultural da sociedade brasileira;
III - desenvolver programas de extensão universitária destinados a aproximar jovens negros de tecnologias avançadas, assegurado o princípio da proporcionalidade de gênero entre os beneficiários;
IV - estabelecer programas de cooperação técnica, nos estabelecimentos de ensino públicos, privados e comunitários, com as escolas de educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e ensino técnico, para a formação docente baseada em princípios de equidade, de tolerância e de respeito às diferenças étnicas.

Art. 14. O poder público estimulará e apoiará ações socioeducacionais realizadas por entidades do movimento negro que desenvolvam atividades voltadas para a inclusão social, mediante cooperação técnica, intercâmbios, convênios e incentivos, entre outros mecanismos.

Art. 15. O poder público adotará programas de ação afirmativa.

Art. 16. O Poder Executivo federal, por meio dos órgãos responsáveis pelas políticas de promoção da igualdade e de educação, acompanhará e avaliará os programas de que trata esta Seção.

Seção III
Da Cultura
Art. 17. O poder público garantirá o reconhecimento das sociedades negras, clubes e outras formas de manifestação coletiva da população negra, com trajetória histórica comprovada, como patrimônio histórico e cultural, nos termos dos arts. 215 e 216 da Constituição Federal.

Art. 18. É assegurado aos remanescentes das comunidades dos quilombos o direito à preservação de seus usos, costumes, tradições e manifestos religiosos, sob a proteção do Estado.
Parágrafo único. A preservação dos documentos e dos sítios detentores de reminiscências históricas dos antigos quilombos, tombados nos termos do § 5o do art. 216 da Constituição Federal, receberá especial atenção do poder público.

Art. 19. O poder público incentivará a celebração das personalidades e das datas comemorativas relacionadas à trajetória do samba e de outras manifestações culturais matriz africana, bem como sua comemoração nas instituições de ensino públicas e privadas.

Art. 20. O poder público garantirá o registro e a proteção da capoeira, em todas as suas modalidades, como bem de natureza imaterial e de formação da identidade cultural brasileira, nos termos do art. 216 da Constituição Federal.
Parágrafo único. O poder público buscará garantir, por meio dos atos normativos necessários, a preservação dos elementos formadores tradicionais da capoeira nas suas relações internacionais.

Seção IV
Do Esporte e Lazer
Art. 21. O poder público fomentará o pleno acesso da população negra às práticas desportivas, consolidando o esporte e o lazer como direitos sociais.

Art. 22. A capoeira é reconhecida como desporto de criação nacional, nos termos do art. 217 da Constituição Federal.
§ 1o A atividade de capoeirista será reconhecida em todas as modalidades em que a capoeira se manifesta, seja como esporte, luta, dança ou música, sendo livre o exercício em todo o território nacional.
§ 2o É facultado o ensino da capoeira nas instituições públicas e privadas pelos capoeiristas e mestres tradicionais, pública e formalmente reconhecidos.

CAPÍTULO III
DO DIREITO À LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA E DE CRENÇA E AO LIVRE EXERCÍCIO DOS CULTOS RELIGIOSOS
Art. 23. É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.

Art. 24. O direito à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos de matriz africana compreende:
I - a prática de cultos, a celebração de reuniões relacionadas à religiosidade e a fundação e manutenção, por iniciativa privada, de lugares reservados para tais fins;
II - a celebração de festividades e cerimônias de acordo com preceitos das respectivas religiões;
III - a fundação e a manutenção, por iniciativa privada, de instituições beneficentes ligadas às respectivas convicções religiosas;
IV - a produção, a comercialização, a aquisição e o uso de artigos e materiais religiosos adequados aos costumes e às práticas fundadas na respectiva religiosidade, ressalvadas as condutas vedadas por legislação específica;
V - a produção e a divulgação de publicações relacionadas ao exercício e à difusão das religiões de matriz africana;
VI - a coleta de contribuições financeiras de pessoas naturais e jurídicas de natureza privada para a manutenção das atividades religiosas e sociais das respectivas religiões;
VII - o acesso aos órgãos e aos meios de comunicação para divulgação das respectivas religiões;
VIII - a comunicação ao Ministério Público para abertura de ação penal em face de atitudes e práticas de intolerância religiosa nos meios de comunicação e em quaisquer outros locais.

Art. 25. É assegurada a assistência religiosa aos praticantes de religiões de matrizes africanas internados em hospitais ou em outras instituições de internação coletiva, inclusive àqueles submetidos a pena privativa de liberdade.

Art. 26. O poder público adotará as medidas necessárias para o combate à intolerância com as religiões de matrizes africanas e à discriminação de seus seguidores, especialmente com o objetivo de:
I - coibir a utilização dos meios de comunicação social para a difusão de proposições, imagens ou abordagens que exponham pessoa ou grupo ao ódio ou ao desprezo por motivos fundados na religiosidade de matrizes africanas;
II - inventariar, restaurar e proteger os documentos, obras e outros bens de valor artístico e cultural, os monumentos, mananciais, flora e sítios arqueológicos vinculados às religiões de matrizes africanas;
III - assegurar a participação proporcional de representantes das religiões de matrizes africanas, ao lado da representação das demais religiões, em comissões, conselhos, órgãos e outras instâncias de deliberação vinculadas ao poder público.

CAPÍTULO IV
DO ACESSO À TERRA E À MORADIA ADEQUADA
Seção I
Do Acesso à Terra
Art. 27. O poder público elaborará e implementará políticas públicas capazes de promover o acesso da população negra à terra e às atividades produtivas no campo.

Art. 28. Para incentivar o desenvolvimento das atividades produtivas da população negra no campo, o poder público promoverá ações para viabilizar e ampliar o seu acesso ao financiamento agrícola.

Art. 29. Serão assegurados à população negra a assistência técnica rural, a simplificação do acesso ao crédito agrícola e o fortalecimento da infraestrutura de logística para a comercialização da produção.

Art. 30. O poder público promoverá a educação e a orientação profissional agrícola para os trabalhadores negros e as comunidades negras rurais.

Art. 31. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.

Art. 32. O Poder Executivo federal elaborará e desenvolverá políticas públicas especiais voltadas para o desenvolvimento sustentável dos remanescentes das comunidades dos quilombos, respeitando as tradições de proteção ambiental das comunidades.

Art. 33. Para fins de política agrícola, os remanescentes das comunidades dos quilombos receberão dos órgãos competentes tratamento especial diferenciado, assistência técnica e linhas especiais de financiamento público, destinados à realização de suas atividades produtivas e de infraestrutura.

Art. 34. Os remanescentes das comunidades dos quilombos se beneficiarão de todas as iniciativas previstas nesta e em outras leis para a promoção da igualdade étnica.

Seção II
Da Moradia
Art. 35. O poder público garantirá a implementação de políticas públicas para assegurar o direito à moradia adequada da população negra que vive em favelas, cortiços, áreas urbanas subutilizadas, degradadas ou em processo de degradação, a fim de reintegrá-las à dinâmica urbana e promover melhorias no ambiente e na qualidade de vida.
Parágrafo único. O direito à moradia adequada, para os efeitos desta Lei, inclui não apenas o provimento habitacional, mas também a garantia da infraestrutura urbana e dos equipamentos comunitários associados à função habitacional, bem como a assistência técnica e jurídica para a construção, a reforma ou a regularização fundiária da habitação em área urbana.

Art. 36. Os programas, projetos e outras ações governamentais realizadas no âmbito do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), regulado pela Lei no 11.124, de 16 de junho de 2005, devem considerar as peculiaridades sociais, econômicas e culturais da população negra.
Parágrafo único. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estimularão e facilitarão a participação de organizações e movimentos representativos da população negra na composição dos conselhos constituídos para fins de aplicação do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS).

Art. 37. Os agentes financeiros, públicos ou privados, promoverão ações para viabilizar o acesso da população negra aos financiamentos habitacionais.

CAPÍTULO V
DO TRABALHO
Art. 38. A implementação de políticas voltadas para a inclusão da população negra no mercado de trabalho será de responsabilidade do poder público, observando-se:
I - o instituído neste Estatuto;
II - os compromissos assumidos pelo Brasil ao ratificar a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1965;
III - os compromissos assumidos pelo Brasil ao ratificar a Convenção no 111, de 1958, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da discriminação no emprego e na profissão;
IV - os demais compromissos formalmente assumidos pelo Brasil perante a comunidade internacional.

Art. 39. O poder público promoverá ações que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra, inclusive mediante a implementação de medidas visando à promoção da igualdade nas contratações do setor público e o incentivo à adoção de medidas similares nas empresas e organizações privadas.
§ 1o A igualdade de oportunidades será lograda mediante a adoção de políticas e programas de formação profissional, de emprego e de geração de renda voltados para a população negra.
§ 2o As ações visando a promover a igualdade de oportunidades na esfera da administração pública far-se-ão por meio de normas estabelecidas ou a serem estabelecidas em legislação específica e em seus regulamentos.
§ 3o O poder público estimulará, por meio de incentivos, a adoção de iguais medidas pelo setor privado.
§ 4o As ações de que trata o caput deste artigo assegurarão o princípio da proporcionalidade de gênero entre os beneficiários.
§ 5o Será assegurado o acesso ao crédito para a pequena produção, nos meios rural e urbano, com ações afirmativas para mulheres negras.
§ 6o O poder público promoverá campanhas de sensibilização contra a marginalização da mulher negra no trabalho artístico e cultural.
§ 7o O poder público promoverá ações com o objetivo de elevar a escolaridade e a qualificação profissional nos setores da economia que contem com alto índice de ocupação por trabalhadores negros de baixa escolarização.

Art. 40. O Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) formulará políticas, programas e projetos voltados para a inclusão da população negra no mercado de trabalho e orientará a destinação de recursos para seu financiamento.

Art. 41. As ações de emprego e renda, promovidas por meio de financiamento para constituição e ampliação de pequenas e médias empresas e de programas de geração de renda, contemplarão o estímulo à promoção de empresários negros.
Parágrafo único. O poder público estimulará as atividades voltadas ao turismo étnico com enfoque nos locais, monumentos e cidades que retratem a cultura, os usos e os costumes da população negra.

Art. 42. O Poder Executivo federal poderá implementar critérios para provimento de cargos em comissão e funções de confiança destinados a ampliar a participação de negros, buscando reproduzir a estrutura da distribuição étnica nacional ou, quando for o caso, estadual, observados os dados demográficos oficiais.

CAPÍTULO VI
DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO
Art. 43. A produção veiculada pelos órgãos de comunicação valorizará a herança cultural e a participação da população negra na história do País.

Art. 44. Na produção de filmes e programas destinados à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas, deverá ser adotada a prática de conferir oportunidades de emprego para atores, figurantes e técnicos negros, sendo vedada toda e qualquer discriminação de natureza política, ideológica, étnica ou artística.
Parágrafo único. A exigência disposta no caput não se aplica aos filmes e programas que abordem especificidades de grupos étnicos determinados.

Art. 45. Aplica-se à produção de peças publicitárias destinadas à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas o disposto no art. 44.

Art. 46. Os órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica ou fundacional, as empresas públicas e as sociedades de economia mista federais deverão incluir cláusulas de participação de artistas negros nos contratos de realização de filmes, programas ou quaisquer outras peças de caráter publicitário.
§ 1o Os órgãos e entidades de que trata este artigo incluirão, nas especificações para contratação de serviços de consultoria, conceituação, produção e realização de filmes, programas ou peças publicitárias, a obrigatoriedade da prática de iguais oportunidades de emprego para as pessoas relacionadas com o projeto ou serviço contratado.
§ 2o Entende-se por prática de iguais oportunidades de emprego o conjunto de medidas sistemáticas executadas com a finalidade de garantir a diversidade étnica, de sexo e de idade na equipe vinculada ao projeto ou serviço contratado.
§ 3o A autoridade contratante poderá, se considerar necessário para garantir a prática de iguais oportunidades de emprego, requerer auditoria por órgão do poder público federal.
§ 4o A exigência disposta no caput não se aplica às produções publicitárias quando abordarem especificidades de grupos étnicos determinados.

TÍTULO III
Do Sistema NACIONAL DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL
(SINAPIR)
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÃO PRELIMINAR
Art. 47. É instituído o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir) como forma de organização e de articulação voltadas à implementação do conjunto de políticas e serviços destinados a superar as desigualdades étnicas existentes no País, prestados pelo poder público federal.
§ 1o Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão participar do Sinapir mediante adesão.
§ 2o O poder público federal incentivará a sociedade e a iniciativa privada a participar do Sinapir.

CAPÍTULO II
DOS OBJETIVOS
Art. 48. São objetivos do Sinapir:
I - promover a igualdade étnica e o combate às desigualdades sociais resultantes do racismo, inclusive mediante adoção de ações afirmativas;
II - formular políticas destinadas a combater os fatores de marginalização e a promover a integração social da população negra;
III - descentralizar a implementação de ações afirmativas pelos governos estaduais, distrital e municipais;
IV - articular planos, ações e mecanismos voltados à promoção da igualdade étnica;
V - garantir a eficácia dos meios e dos instrumentos criados para a implementação das ações afirmativas e o cumprimento das metas a serem estabelecidas.

CAPÍTULO III
DA ORGANIZAÇÃO E COMPETÊNCIA
Art. 49. O Poder Executivo federal elaborará plano nacional de promoção da igualdade racial contendo as metas, princípios e diretrizes para a implementação da Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PNPIR).
§ 1o A elaboração, implementação, coordenação, avaliação e acompanhamento da PNPIR, bem como a organização, articulação e coordenação do Sinapir, serão efetivados pelo órgão responsável pela política de promoção da igualdade étnica em âmbito nacional.
§ 2o É o Poder Executivo federal autorizado a instituir fórum intergovernamental de promoção da igualdade étnica, a ser coordenado pelo órgão responsável pelas políticas de promoção da igualdade étnica, com o objetivo de implementar estratégias que visem à incorporação da política nacional de promoção da igualdade étnica nas ações governamentais de Estados e Municípios.
§ 3o As diretrizes das políticas nacional e regional de promoção da igualdade étnica serão elaboradas por órgão colegiado que assegure a participação da sociedade civil.

Art. 50. Os Poderes Executivos estaduais, distrital e municipais, no âmbito das respectivas esferas de competência, poderão instituir conselhos de promoção da igualdade étnica, de caráter permanente e consultivo, compostos por igual número de representantes de órgãos e entidades públicas e de organizações da sociedade civil representativas da população negra.
Parágrafo único. O Poder Executivo priorizará o repasse dos recursos referentes aos programas e atividades previstos nesta Lei aos Estados, Distrito Federal e Municípios que tenham criado conselhos de promoção da igualdade étnica.

CAPÍTULO IV
Das Ouvidorias Permanentes E DO ACESSO À JUSTIÇA E À SEGURANÇA
Art. 51. O poder público federal instituirá, na forma da lei e no âmbito dos Poderes Legislativo e Executivo, Ouvidorias Permanentes em Defesa da Igualdade Racial, para receber e encaminhar denúncias de preconceito e discriminação com base em etnia ou cor e acompanhar a implementação de medidas para a promoção da igualdade.

Art. 52. É assegurado às vítimas de discriminação étnica o acesso aos órgãos de Ouvidoria Permanente, à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, em todas as suas instâncias, para a garantia do cumprimento de seus direitos.
Parágrafo único. O Estado assegurará atenção às mulheres negras em situação de violência, garantida a assistência física, psíquica, social e jurídica.

Art. 53. O Estado adotará medidas especiais para coibir a violência policial incidente sobre a população negra.
Parágrafo único. O Estado implementará ações de ressocialização e proteção da juventude negra em conflito com a lei e exposta a experiências de exclusão social.

Art. 54. O Estado adotará medidas para coibir atos de discriminação e preconceito praticados por servidores públicos em detrimento da população negra, observado, no que couber, o disposto na Lei no 7.716, de 5 de janeiro de 1989.

Art. 55. Para a apreciação judicial das lesões e das ameaças de lesão aos interesses da população negra decorrentes de situações de desigualdade étnica, recorrer-se-á, entre outros instrumentos, à ação civil pública, disciplinada na Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985.

CAPÍTULO V
DO FINANCIAMENTO DAS INICIATIVAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL
Art. 56. Na implementação dos programas e das ações constantes dos planos plurianuais e dos orçamentos anuais da União, deverão ser observadas as políticas de ação afirmativa a que se refere o inciso VII do art. 4o desta Lei e outras políticas públicas que tenham como objetivo promover a igualdade de oportunidades e a inclusão social da população negra, especialmente no que tange a:
I - promoção da igualdade de oportunidades em educação, emprego e moradia;
II - financiamento de pesquisas, nas áreas de educação, saúde e emprego, voltadas para a melhoria da qualidade de vida da população negra;
III - incentivo à criação de programas e veículos de comunicação destinados à divulgação de matérias relacionadas aos interesses da população negra;
IV - incentivo à criação e à manutenção de microempresas administradas por pessoas autodeclaradas negras;
V - iniciativas que incrementem o acesso e a permanência das pessoas negras na educação fundamental, média, técnica e superior;
VI - apoio a programas e projetos dos governos estaduais, distrital e municipais e de entidades da sociedade civil voltados para a promoção da igualdade de oportunidades para a população negra;
VII - apoio a iniciativas em defesa da cultura, da memória e das tradições africanas e brasileiras.
§ 1o O Poder Executivo federal é autorizado a adotar medidas que garantam, em cada exercício, a transparência na alocação e na execução dos recursos necessários ao financiamento das ações previstas neste Estatuto, explicitando, entre outros, a proporção dos recursos orçamentários destinados aos programas de promoção da igualdade, especialmente nas áreas de educação, saúde, emprego e renda, desenvolvimento agrário, habitação popular, desenvolvimento regional, cultura, esporte e lazer.
§ 2o Durante os 5 (cinco) primeiros anos, a contar do exercício subsequente à publicação deste Estatuto, os órgãos do Poder Executivo federal que desenvolvem políticas e programas nas áreas referidas no § 1o deste artigo discriminarão em seus orçamentos anuais a participação nos programas de ação afirmativa referidos no inciso VII do art. 4o desta Lei.
§ 3o O Poder Executivo é autorizado a adotar as medidas necessárias para a adequada implementação do disposto neste artigo, podendo estabelecer patamares de participação crescente dos programas de ação afirmativa nos orçamentos anuais a que se refere o § 2o deste artigo.
§ 4o O órgão colegiado do Poder Executivo federal responsável pela promoção da igualdade racial acompanhará e avaliará a programação das ações referidas neste artigo nas propostas orçamentárias da União.

Art. 57. Sem prejuízo da destinação de recursos ordinários, poderão ser consignados nos orçamentos fiscal e da seguridade social para financiamento das ações de que trata o art. 56:
I - transferências voluntárias dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
II - doações voluntárias de particulares;
III - doações de empresas privadas e organizações não governamentais, nacionais ou internacionais;
IV - doações voluntárias de fundos nacionais ou internacionais;
V - doações de Estados estrangeiros, por meio de convênios, tratados e acordos internacionais.

TÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 58. As medidas instituídas nesta Lei não excluem outras em prol da população negra que tenham sido ou venham a ser adotadas no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.

Art. 59. O Poder Executivo federal criará instrumentos para aferir a eficácia social das medidas previstas nesta Lei e efetuará seu monitoramento constante, com a emissão e a divulgação de relatórios periódicos, inclusive pela rede mundial de computadores.

Art. 60. Os arts. 3o e 4o da Lei no 7.716, de 1989, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 3o .......
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, obstar a promoção funcional.” (NR)
“Art. 4o ........
§ 1o Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça ou de cor ou práticas resultantes do preconceito de descendência ou origem nacional ou étnica:
I - deixar de conceder os equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições com os demais trabalhadores;
II - impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício profissional;
III - proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho, especialmente quanto ao salário.
§ 2o Ficará sujeito às penas de multa e de prestação de serviços à comunidade, incluindo atividades de promoção da igualdade racial, quem, em anúncios ou qualquer outra forma de recrutamento de trabalhadores, exigir aspectos de aparência próprios de raça ou etnia para emprego cujas atividades não justifiquem essas exigências.” (NR)

Art. 61. Os arts. 3o e 4o da Lei no 9.029, de 13 de abril de 1995, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 3o Sem prejuízo do prescrito no art. 2o e nos dispositivos legais que tipificam os crimes resultantes de preconceito de etnia, raça ou cor, as infrações do disposto nesta Lei são passíveis das seguintes cominações:
...............” (NR)
“Art. 4o O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre:
..................” (NR)
Art. 62. O art. 13 da Lei no 7.347, de 1985, passa a vigorar acrescido do seguinte § 2o, renumerando-se o atual parágrafo único como § 1o:
“Art. 13. ...............
§ 1o .............
§ 2o Havendo acordo ou condenação com fundamento em dano causado por ato de discriminação étnica nos termos do disposto no art. 1o desta Lei, a prestação em dinheiro reverterá diretamente ao fundo de que trata o caput e será utilizada para ações de promoção da igualdade étnica, conforme definição do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, na hipótese de extensão nacional, ou dos Conselhos de Promoção de Igualdade Racial estaduais ou locais, nas hipóteses de danos com extensão regional ou local, respectivamente.” (NR)

Art. 63. O § 1o do art. 1o da Lei no 10.778, de 24 de novembro de 2003, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1o ..........
§ 1o Para os efeitos desta Lei, entende-se por violência contra a mulher qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, inclusive decorrente de discriminação ou desigualdade étnica, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público quanto no privado.
................” (NR)

Art. 64. O § 3o do art. 20 da Lei no 7.716, de 1989, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso III:
“Art. 20. ..........
§ 3o ...............
III - a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede mundial de computadores.
..........” (NR)

Art. 65. Esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a data de sua publicação.

Brasília, 20 de julho de 2010; 189o da Independência e 122o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Eloi Ferreira de Araújo