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sábado, 4 de agosto de 2018

O Brasil na guerra comercial EUA-China - Marcos Jank

O Brasil na guerra comercial EUA-China

Jornal “Folha de São Paulo”, Caderno Mercado, 04/08/2018

Marcos Sawaya Jank (*)

Está oficialmente aberta a primeira guerra hegemônica do século 21. Até aqui os problemas tem sido bem maiores que as oportunidades.

A disputa EUA-China se agravou no mês de julho. Cada país decidiu impor sobre o outro tarifas adicionais sobre volumes de comércio da ordem de US$ 34 bilhões, acompanhadas de contenciosos na OMC e ameaças em outras áreas, como investimentos, alta tecnologia e propriedade intelectual.
Está oficialmente aberta a primeira guerra hegemônica do século 21. Resta saber em que mundo viveremos daqui para a frente e como o Brasil se sairá nessa confusão.
Sabemos que uma guerra comercial generalizada não terá vencedores. O problema não está no aumento das tarifas entre EUA e China, mas na ruptura potencial de várias cadeias de suprimento pelo mundo, que resultaria na quebra de confiança no processo de globalização que vem desde o pós-guerra.
O FMI já estima uma queda de 0,5 ponto percentual no PIB mundial em razão da guerra comercial. Bancos falam em até dois pontos, se a guerra se estender a outros países.
Para o Brasil o único ganho até aqui apontado, erroneamente, na minha opinião, seria o aumento das exportações de soja em grãos, produto que responde por incríveis 43% das nossas exportações totais para a China (US$ 21 bilhões em 2017). Se a China se fechar para os EUA, certamente ganharemos mercado naquele país, mas perderemos espaço em outros destinos. É por isso que Trump já colocou a soja no centro das conversas sobre os impasses dos Estados Unidos com a União Europeia.
Nossa pauta com a China ficaria ainda mais "primarizada" e dependente de apenas três produtos: soja, minério de ferro e petróleo.
Muito antes dessa guerra comercial, a China já impunha ao Brasil elevadas barreiras para a diversificação da nossa pauta no agro. Não conseguimos vender farelo e óleo, que são os principais derivados da soja em grãos. Enfrentamos barreiras sanitárias e burocráticas para exportar carnes de aves, suínos e bovinos —apenas 62 unidades industriais, num universo de 4.800 unidades, estão habilitadas a exportar para a China. Somem-se a isso restrições inadmissíveis para exportar genética animal, lácteos, milho, arroz, frutas, açúcar e etanol.
Pior, se o prêmio pago pela soja brasileira (Paranaguá) subir ainda mais em relação ao preço da Bolsa de Chicago, o Brasil ganhará mercado nos grãos, mas perderá competitividade nos derivados (farelo e óleo) e na exportação de carnes de aves e suínos. Não há nada de errado em ser fornecedor de matéria-prima para ração animal, mas não podemos aceitar que a estrutura tarifária dos países discrimine frontalmente contra a diversificação e a adição de valor das nossas exportações.
Em carnes e açúcar, já ficamos para trás dos nossos concorrentes —EUA, UE, Austrália, Canadá e Tailândia—, que negociaram dezenas de acordos que lhes garantem acesso privilegiado com tarifas mais baixas. Seria um erro deixar que a guerra comercial EUA-China gere ainda mais discriminação.
Para complicar, a China impôs uma salvaguarda sobre o açúcar em 2017 e direitos antidumping sobre a carne de frango do Brasil em junho último, processos que já dificultam bastante as nossas exportações. Por isso, a Camex agiu corretamente ao autorizar consultas à China na OMC em relação às medidas de defesa comercial impostas sobre frangos e açúcar. Os dois casos são fracos e não se sustentam sob as regras da OMC. Além disso, Michel Temer fez bem em colocar esses dois temas na reunião que teve com o Presidente Xi Jinping durante o encontro do Brics na África do Sul.
Nosso peso específico é pequeno diante do confronto aberto dos grandes. Mas em setores como o agronegócio tornamo-nos grandes e temos agora de lutar duramente para não perder o espaço conquistado.

(*) Marcos Sawaya Jank é especialista em questões globais do agronegócio. Escreve aos sábados, a cada duas semanas.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

O PT inventou a agricultura no Brasil (e todo o resto, claro) - Editorial Estadao

Comício do plano-safra

20 de maio de 2014 | 2h 06
Editorial O Estado de S.Paulo
Em mais um comício patrocinado pelo governo, a presidente Dilma Rousseff aproveitou o lançamento do Plano Agrícola e Pecuário 2014/2015 para falar da contribuição do PT à criação de uma agricultura eficiente e competitiva, como se nada ou quase nada tivesse ocorrido nos 30 anos anteriores à chegada dos petistas ao poder. A cômica versão dilmista do "nunca antes na história deste país" pode ter enganado algum cidadão patologicamente desinformado. Como outras patranhas petistas, é fácil de desmenti-la com dados oficiais de produção e produtividade. Se a intenção fosse apenas lançar mais um plano de apoio à produção, como se faz todo ano, a comparação com o governo tucano - de resto ingênua e inepta - teria sido dispensável. A referência foi obviamente mais um lance eleitoral, mas a oradora havia sido mal instruída sobre temas como produção e produtividade.
A presidente mencionou "dificuldades" no início da gestão petista para "fazer uma política de crédito adequada". Além disso, comparou a produção de grãos e oleaginosas no ano anterior à posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - 96,8 milhões de toneladas em 40,2 milhões de hectares - com a estimada para este ano, 191,2 milhões em 56,4 milhões de hectares. "Tamanho crescimento da produtividade somente é possível com muita pesquisa e muito trabalho qualificado", pontificou. Trabalho de quem: do governo petista?
Para falar sobre produção e eficiência a presidente deveria ter mobilizado mais informações. Isso teria servido para ilustrá-la um pouco mais e talvez poupá-la de algumas bobagens. Síntese dos fatos: a produção cresceu mais nos anos 90 que na década seguinte e mais neste segundo período que nas três safras de 2010/11 a 2013/14.
A transformação da agropecuária brasileira numa das mais eficientes e competitivas foi trabalho de décadas. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi fundada nos anos 70. Resultados de seu esforço começaram a tornar-se visíveis nos anos 80 e apareceram ainda mais claramente nos 90. Uma das consequências foi a redução do peso dos alimentos no orçamento familiar, fato logo registrado pelos institutos de pesquisa de preços.
Na safra 1990/91, o País colheu 57,9 milhões de toneladas em 37,89 milhões de hectares. Em 2000/01, a produção chegou a 100,27 milhões de toneladas, em 37,85 milhões de hectares. A produção cresceu, portanto, 73,17%, enquanto a terra cultivada diminuiu ligeiramente.
Entre as safras de 2000/01 e a de 2010/11, o total produzido aumentou 62,63%, para 162,8 milhões de toneladas, e a área ocupada cresceu 31,75%, para 49,87 milhões de hectares. A produção cresceu rapidamente, mas os ganhos de produtividade foram obviamente muito mais lentos. A safra 2013/2014 está estimada em 191,2 milhões de toneladas (mais 17,44%). A área usada passou a 56,4 milhões de hectares (aumento de 13,09%). A produção por hectare expandiu-se em média pouco menos que 1,2% ao ano nesse período. No decênio anterior, a taxa média havia sido de 2,1%.
Não cabe discutir agora se a presidente Dilma Rousseff distorceu os fatos intencionalmente ou, como ocorre com frequência, por mera ignorância. De toda forma, se ela de fato estivesse interessada em contar a história tal como se passou, teria de mencionar o esforço do presidente Lula para aparelhar a Embrapa para permitir a reorientação ideológica de seu programa de pesquisas. Teria citado o apoio a invasores de terras e a insegurança criada entre os produtores rurais por erros políticos dos governos petistas.
Teria lembrado também os longos anos sem investimento em logística (o PT está no poder desde 2003) e os enormes problemas dos exportadores, nos últimos anos, para embarcar seus produtos.
Era objetivo da presidente, sabia-se desde antes do discurso, conquistar o apoio eleitoral dos empresários do agronegócio. Por segurança, cuidou também dos interesses da indústria automobilística, anunciando a renovação de crédito especial para equipamentos. Esse tipo de apoio à modernização agrícola está longe de ser uma inovação petista, embora alguns jovens desprevenidos até possam acreditar nisso.

sábado, 30 de março de 2013

Agronegocio: o eixo dinâmico da economia brasileira

O artigo é bom, self-praise, mas deixa de identificar e de mensurar, claramente, os fatores positivos e negativos de produtividade e de competitividade do agronegócio nacional.
Paulo Roberto de Almeida

O eixo dinâmico da economia nacional
O Estado de S.Paulo, 30 de março de 2013
Luiz Carlos Corrêa Carvalho *

Alguns dias atrás, neste jornal, o ex-governador de São Paulo José Serra mostrou a sua preocupação com o processo de desindustrialização do País e questionou: "Nada contra a brilhante expansão da produção e da exportação de bens agrominerais. Mas alguém acredita, e demonstra, que, além do papel estratégico na geração de divisas, esse setor poderia tornar-se o eixo dinâmico de um país continental, de 200 milhões de habitantes?". É preciso avaliar isso com cuidado. Em época antecipada de disputa eleitoral, seus comentários foram, provavelmente, uma crítica à falta de políticas públicas nos níveis macroeconômico e industrial. Tais observações, no entanto, fixam em nossa mente a imagem do Brasil como mero exportador de commodities, como algo negativo.

Essa visão clássica, em texto de Evaristo Eduardo de Miranda, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em seu livro recém-lançado Agricultura no Brasil do Século XXI, é desconstruída, pois é atrasada, preconceituosa e revela desconhecimento sobre a importância do agronegócio para a economia nacional. "Para compreender a agricultura brasileira, não basta apresentar números recordes de produção, sempre crescentes. Propalar ideias como 'maior exportador do mundo', disso e aquilo, acaba por esconder a evolução das condições da produção, os impactos e a sustentabilidade. Mais do que quanto, é essencial entender como se produz no Brasil". Para a imensa população brasileira, que luta e vive os riscos no campo, fica a ideia de um setor menos importante.

Há, porém, um discurso comum: o Brasil é competitivo no agronegócio! É importante, no entanto, salientar a enorme evolução havida na tecnologia agroindustrial, graças à inovação, e o empreendedorismo de pequenos, médios e grandes agricultores e indústrias correlatas, nacionais e internacionais. A liderança do agronegócio tropical é brasileira e continuará sendo se depender da lógica das limitações físicas dos países e da competência das organizações de pesquisa atuantes no Brasil. A tecnologia e o nível de manejo contidos em um grão ou em um grama de produto acabado superam, e muito, produtos outros que fazem brilhar os olhos do consumidor desavisado.

A discussão global no século 21 gira em torno das inseguranças alimentar e energética. Ambas definem a paz ou a guerra. Até 2050, mais 2 bilhões de pessoas irão ao consumo, cobrando alimentos e energias produzidas de forma sustentável. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), juntamente com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), organização dos países desenvolvidos, convocou o Brasil a responder por 40% da oferta adicional de alimentos. Além do potencial do Brasil em produzir, salta aos olhos do mundo o fato que o País expande constantemente a sua oferta, mesmo retraindo, anualmente, nos últimos dois anos, 2 milhões de hectares. Isso é competitividade!

Há 20 anos, Ney Bittencourt de Araújo criou, com companheiros progressistas, a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), entidade do agronegócio que segue o conceito das cadeias produtivas, lançado em Harvard. Os elos da cadeia vão de bens de capital e insumos, passando pela produção agrícola e industrial, indo à distribuição, ao atacado e ao varejo, incluindo as exportações. Isso explica o peso e a importância da agroindústria, do agronegócio, hoje um quarto do produto interno bruto (PIB) brasileiro e responsável por cerca de 1,5 milhão de empregos formais no País.

Ignacy Sachs, cientista internacional e que conhece profundamente o Brasil, comentou na revista Estudos Avançados, da Universidade de São Paulo (USP), que "o País possui a maior biodiversidade do mundo, uma reserva confortável de solos agrícolas (mesmo que não se toque em uma só árvore da floresta amazônica), climas amenos, vantagens naturais do trópico na produção de biomassa, etc. Ao juntar todas essas coisas pode-se partir para a construção de uma nova civilização do trópico, baseada no trinômio biodiversidade, biomassas e biotecnologias".

O sucesso do agronegócio norte-americano ou europeu nos séculos passados já é o do Brasil neste e assim será nos séculos vindouros. E este é o grande diferencial que este século reserva ao Brasil: ser a flor da geopolítica de alimentos e de energia, pelo potencial de oferta; pelos extraordinários e positivos impactos na cadeia produtiva, estímulo às indústrias e agriculturas; pelos resultados da balança comercial; pela descentralização das ofertas e dos investimentos no interior do País; pelo processo contínuo de inovações tecnológicas, que gera competitividade de forma crescente e sustentável.

Nossos governantes separam os negócios em caixas. Privilegiam algumas caixas e há dezenas de anos não investem em logística e infraestrutura. Nosso PIB também vive o pesadelo do limite da tampa da sua caixa, fazendo sofrer a população brasileira, seus investidores e trabalhadores. Tudo isso são barreiras ao agronegócio.

As oportunidades para o Brasil no campo da agroindústria de alimentos são motivo de convocação das entidades globais. No da energia renovável somos liderança apreciada. Afinal, na lei norte-americana de energia, o etanol brasileiro da cana-de-açúcar é considerado avançado e apto para importação. Trata-se de um dos mais importantes convites que o Brasil já recebeu.

A nova fase do mundo, no século 21, mostrará as conquistas da ciência, em particular da biologia e da biotecnologia. Dessa forma, é cada vez mais difícil, mesmo para aqueles com a visão das cercanias das cidades, esconder o sucesso e o futuro do agronegócio brasileiro como um eixo dinâmico, competitivo e gerador de empregos e renda para um país de dimensões continentais.

* Luiz Carlos Corrêa Carvalho é presidente da Associação Brasileira do Agronegócio.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Se nao for ajudar, pelo menos nao atrapalhe... (sim, o governo...) - Editorial OESP

A agricultura do Brasil era um monstrengo atrasado até os anos 1970, quando Embrapa e novos recursos humanos se combinaram para dar um primeiro salto tecnológico.
Mas ela ainda continuou entravada durante uma decada mais, pelo menos, adivinhe por quem, caro leitor?
Sim, você acertou: pelo governo. Com sua política de preços de referência, estoques reguladores, planejamento de produção, direcionamento de créditos por critérios pouco claros, e um tabelamento geral dos preços dos produtos de base (para ajudar os pobres, claro), tudo isso fez com que sofressemos desabastecimentos, queda de produção, desequilíbrios na oferta, e outras pragas associadas ao intervencionismo governamental.
Ou seja, a praga da agricultura era o governo, e as saúvas eram os técnicos da Fazenda e do próprio ministério da Agricultura, que pretendiam "gerir" esse setor, tão estratégico, tão importante, tão relevante para a tal de segurança alimentar.
A consequência não foi outra: desabastecimento, penúria de produtos e outros problemas.
Só quando o Brasil exsangue de tanta inflação resolveu dar um choque de capitalismo -- não tanto por vontade, quanto por impossibilidade de atuar de outra maneira -- e liberalizar o setor, a agricultura deu um enorme salto produtivo e comercial, que junto com os progressos tecnológicos fizeram do Brasil essa potência agrícola que somos.
Agora, chegam os companheiros e ameaçam colocar tudo a perder outra vez, com essa mania -- atávica neles -- de controlar tudo, para "garantir abastecimento a preços razoáveis".
Idiotas, vão estragar tudo outra vez...
Paulo Roberto de Almeida

Ameaça à produção de comida

22 de fevereiro de 2013 | 2h 11
Edutorial O Estado de S.Paulo
 
Uma velha praga volta a ameaçar a agricultura brasileira, pondo em risco a eficiência, o poder de competição e a liderança internacional conquistados em décadas de muito investimento e intensa modernização tecnológica. É a praga do intervencionismo primário, demagógico e orientado por objetivos políticos de curto prazo.
Depois de comprometer a saúde financeira da Petrobrás e a produção de etanol com sua intromissão desastrada, o governo agora se prepara para mexer politicamente nos preços dos alimentos e desarranjar o agronegócio. O Conselho Interministerial de Estoques Públicos de Alimentos (Ciep), recém-criado por decreto presidencial, será o instrumento dessa lambança, a mais nova demonstração de voluntarismo da mal assessorada presidente Dilma Rousseff. O novo conselho usurpará funções até agora atribuídas à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e geralmente exercidas com eficiência quando subordinadas a critérios técnicos. Esses critérios serão obviamente postos em segundo ou terceiro plano, com a previsível politização das decisões.
Só a intenção de politizar a formação e a administração de estoques de alimentos pode explicar a instituição do Ciep. Se a presidente da República estivesse apenas descontente com a ação técnica dos atuais dirigentes da Conab, poderia simplesmente substituí-los. Nem precisaria buscar muito longe pessoal para assumir as funções. Antigos e competentes funcionários da Conab permanecem no governo. Outros foram para a vida acadêmica ou empresarial. Não falta, no mercado, gente capacitada para dirigir empresas públicas desse tipo, conhecidas em vários dos grandes países produtores.
Os preços agrícolas subiram no mercado internacional durante vários anos e essa tendência afetou também o mercado brasileiro. Apesar da elevação de preços, não houve nenhuma crise de suprimento no Brasil.
Crises desse tipo foram muito frequentes quando havia controles de preços, porque a ação oficial dificultava a modernização produtiva. A liberação gradual do mercado, a racionalização da política e o forte investimento em pesquisa permitiram uma ampla mudança do quadro. As crises sumiram e a alimentação passou a pesar menos no custo de vida, liberando recursos para o consumo de outros produtos. Mesmo com a alta de preços dos últimos anos, o custo da comida, no Brasil, continuou sendo um dos mais baixos do mundo.
Em países bem administrados, a variação de alguns custos, como o dos alimentos ou dos combustíveis, apenas altera a relação entre preços, sem pôr em movimento uma espiral inflacionária. No Brasil, a difusão dos aumentos foi favorecida por outros fatores, como a expansão do crédito, o estímulo ao consumo e a elevação dos salários bem acima dos ganhos de produtividade da economia. Mas o governo prefere desconhecer esses fatos evidentes, promover um corte de juros obviamente voluntarista e manter a gastança pública.
Em vez de combater a inflação, o governo tem procurado conter os índices, controlando preços de combustíveis, cortando alguns impostos para baratear produtos selecionados e tentando administrar o câmbio.
A Conab tem promovido frequentes vendas de estoques. Só de feijão, por exemplo, dez leilões foram programados entre 24 de janeiro e 22 de fevereiro. Alguns setores da indústria de alimentos poderão até apoiar maior intervencionismo, se isso resultar em maiores vendas de matérias-primas, como o milho. Mas isso será uma demonstração de visão curta.
Uma boa política de estoques serve para a sustentação de preços, por meio das compras oficiais, e para a moderação das altas, por meio das vendas. Mas é preciso balizar toda intervenção pelo bom senso. Mexer no mercado para derrubar alguns preços selecionados é um jogo perigoso, tentado no Brasil, em outros tempos, com péssimos resultados. Seria insanidade ressuscitar a velha Sunab, a desastrosa Superintendência Nacional do Abastecimento. A presidente Dilma Rousseff deveria se lembrar disso. Não é necessária muita cultura econômica para entender esses fatos.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Agricultura brasileira: boas notícias em todas as frentes...

Só podia ser: depois que o Brasil se convenceu (nem todos, ainda tem muitos stalinistas industriais) que é um país essencialmente agrícola, e terminou com as políticas insanas de controle de preços e de estoques (ou seja, anti mercado), ele se tornou a potência agrícola que é, e isso a despeito do MST, de ideólogos da reforma agrária e de um ministério do desenvolvimento agrário dominado por gente que se coloca muitas vezes contra o agronegócio, por puro preconceito político. Mesmo a dominação dos transgênicos é positiva, apesar do catastrofismo irresponsável dos novos malthusianos que são os ecologistas ingênuos.

LEVANTAMENTO. SAFRA DE GRÃOS EM 2012/2013
MAPA (08/02/2013)
SAFRA DE GRÃOS DEVE ATINGIR RECORDE DE 185 MILHÕES DE TONELADAS. A produção brasileira de grãos na safra 2012/13 deve ser de 185 milhões de toneladas. As medidas de apoio do Governo Federal ao setor produtivo contribuirão para o recorde previsto. Aumentou-se o crédito, reduziu-se as taxas de juros e os resultados colhidos não são surpreendentes. Não se espera outra coisa de um setor acostumado a superar seus próprios limites. O valor, se confirmado, será 11,3% superior ao da safra anterior, de 166,17 milhões de toneladas. O percentual representa a maior alta de uma temporada para a outra desde a elevação de 27,2% da safra 2001/02 (96,799 milhões de toneladas) para a de 2002/03 (123,168 milhões de toneladas). A soja será o principal produto em volume, com crescimento previsto de 25,7% e produção estimada em 83,42 milhões de toneladas. Outro destaque deve ser o milho 2ª safra, que também apresentou aumento de 4,6%, passando de 39,1 para 40,9 milhões de toneladas. Se confirmada, essa será a maior safra da cultura, superando a produção do milho 1ª safra – estimada em 35,1 milhões de toneladas.
ÁREA. As culturas de soja e milho também apresentaram os maiores crescimentos em relação à área plantada. No caso da soja, o aumento foi de 10,4%, passando de 25 milhões para 27,6 milhões de hectares. Já o milho 2ª safra teve uma ampliação de área de 8,5%, passando de 7,6 para 8,3 milhões de hectares. Outras culturas também devem ter acréscimos em relação à área, como o amendoim 1ª safra, aveia, canola, cevada e triticale. Como a área total prevista é de 52,98 milhões de hectares, a produtividade deve ser a maior já registrada na história, de 3,5 toneladas por hectare. Os estudos para o levantamento da safra foram realizados no período de 21 a 26 de janeiro. Mais de 60 técnicos da Conab estiveram em campo para atualizar as informações de área, produção e comportamento climático nos estados da região Centro-Sul, em Rondônia e Tocantins, e ainda no oeste da Bahia, sul do Piauí e Maranhão.
PRODUÇÃO NO RS AUMENTA 30% NA SAFRA DE GRÃOS ATUAL. AS REGIÕES NORDESTE E SUL APRESENTAM MAIOR PERCENTUAL DE CRESCIMENTO. O quinto levantamento da safra de grãos 2012/13 aponta crescimento na produção de grãos nas regiões Nordeste, Sul, Norte e Centro-Oeste. De acordo com a estimativa, as regiões Nordeste e Sul terão maior crescimento percentual dentre outras regiões do País. O Nordeste apresenta alta de 27,7% em relação à temporada anterior, sendo a Bahia o destaque da região, com produção prevista de 7,16 milhões de toneladas na safra 2012/13 (aumento de 13,2% sobre 2011/12). Já o Sul deve apresentar aumento de 20,9%. Estima-se que o Rio Grande do Sul terá a maior alta de produção da região, de 30% sobre a safra passada. O Centro-Oeste aparece nas pesquisas com acréscimo de 5,3%, alcançando a maior produção entre todas as regiões: cerca de 75 milhões de toneladas. A região Norte possui uma perspectiva de crescimento de 7,6%, cujo estado de Tocantins se destaca com alta de 11,6% na produção. A estimativa para o Sudeste permanece estável, com exceção para o estado do Espírito Santo, que aponta um aumento de 5,8% na safra de grãos. A previsão de crescimento anunciada pelo Mapa tem por base, principalmente, a recuperação na produção de culturas nas regiões Sul e Centro-Oeste – que foram prejudicadas na última safra pelas condições climáticas desfavoráveis – e ao acréscimo de 2,6 milhões de hectares na área de soja, e de 8,5% (647,8 mil hectares) no milho segunda safra.

EMBRAPA. FAO. CONSULTORIA CÉLERES. (08/02/2013) – PRODUÇÃO DE TRANSGÊNICOS NO BRASIL
MAPA. IBGE
PELA 1ª VEZ, TRANSGÊNICOS OCUPAM MAIS DA METADE DA ÁREA PLANTADA NO BRASIL. CULTIVOS GENETICAMENTE MODIFICADOS (GM) ATINGEM 54% DA SAFRA TOTAL A SER COLHIDA NO PAÍS EM 2013. Em 2013, pela primeira vez os cultivos geneticamente modificados devem ultrapassar, em área ocupada, os não transgênicos no Brasil. O total da área plantada com cultivos geneticamente modificadas neste ano chega a 37,1 milhões de hectares, o que representa um aumento de 14% em relação ao ano anterior (que por sua vez, já tinha registrado um aumento de mais de 21% em relação à safra de 2010/2011) - ou seja, 4,6 milhões de novos hectares dedicados a variedades transgênicas. O IBGE prevê, para 2013, uma área recorde dedicada à atividade agrícola no país de 67,7 milhões de hectares. Cruzando o dado do IBGE com o da consultoria Céleres, chega-se à conclusão de que os transgênicos responderão por 54,8% de toda a área cultivada na safra 2012/2013 no país. No ano passado, as lavouras transgênicas cobriram 31,8 milhões de hectares (segundo a Céleres) e a safra total (incluindo transgênicos e não transgênicos) atingiu 63,7 milhões de hectares (segundo o IBGE), ou seja, as lavouras não transgênicas ainda ocupavam uma área maior que as transgênicas. Esse avanço impressiona, ainda mais considerando-se que há cinco anos, segundo a Céleres, o cultivo total com transgênicos no país era de apenas 1,2 milhão de hectares.
SOJA É A GRANDE ESTRELA DOS CULTIVOS TRANGÊNICOS. A grande estrela nessa façanha é a soja modificada, tolerante a herbicidas - uma das cinco variantes aprovadas no país também é resistente a insetos. Seu cultivo foi autorizado pela CTNBio em 1998, mas liberado apenas em 2004, quando já vinha sendo plantada ilegalmente havia anos. Já em 2012 ela respondia por 85% de toda a soja plantada no país, ocupando mais de 21 milhões de hectares. A previsão para 2013 da Céleres é de que a proporção da soja transgênica suba para 88,8%, equivalente a uma área de 24,4 milhões de hectares, de longe, a maior dedicada a cultivares transgênicos no país. Nos Estados Unidos, 94% dos feijões de soja colhidos nos EUA em 2011 eram transgênicos, o mesmo pode ser dito de 88% do algodão - modificado para resistir a insetos - plantado no mesmo ano na Índia. A soja transgênica foi introduzida nos Estados Unidos - o grande pioneiro do cultivos de GMs - em 1996, e já em 2001 ela respondia por 68% de toda a soja plantada no país. O Brasil é hoje o segundo maior semeador de transgênicos do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos - onde, em 2011/2012, os transgênicos ocupavam 70 milhões de hectares. Nas suas estatísticas comparativas mais recentes - reunindo dados de 2010 - a FAO, a agência da ONU para Alimentos e Segurança Alimentar estima que 'quase 150 milhões de hectares no mundo' são plantados com cultivares geneticamente modificados. O grosso dessa área é dedicado a plantações de soja, milho, canola (usada em forragem/ração) e algodão nas Américas, e de algodão na Ásia e na África. Os maiores produtores entre os países em desenvolvimento são Brasil, Argentina, Índia e China. 'Variedades de algodão resistente a insetos são os cultivares transgênicos comercialmente mais importantes na Ásia e na África', diz a FAO. Na América Latina, 'são a soja resistente a herbicidas seguida pelo milho resistente a inseto'. A FAO reconhece que o cultivo de transgênicos cresceu 'principalmente por causa dos benefícios da redução de custos de trabalho e produção, da redução no uso de químicos e dos ganhos econômicos'.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Feijao capitalista (o MST nao gosta...) - Xico Graziano

Boa parte das imagens e representações que a comunidade acadêmica brasileira de ciências sociais mantém sobre a agricultura brasileira e sobre as chamadas "relações de producao" no campo é deformada pela abordagem simplista ou simplesmente falsa, derivada de concepções (marxistas ou não) equivocadas sobre o setor e seus principais atores sociais e agentes econômicos. 
Abaixo o artigo de um expecialista que também conhece a literatura a respeito. 
Paulo Roberto de Almeida

Feijão capitalista 
Xico Graziano (www.xicograziano.com.br)
O Estado de S. Paulo, terça-feira,  22 de janeiro de 2013

Boa parcela da opinião pública acredita que a comida do povo vem do agricultor familiar, enquanto o agronegócio capitalista serve ao comércio exterior. Ledo engano. O equívoco nasce de uma ideia antiga, superada. Hoje manda a integração produtiva no campo.

A começar do ciclo açucareiro colonial, no Nordeste, a historiografia consagrou distintas funções, e certa oposição, entre a grande propriedade rural, dominante, e a agricultura de subsistência, que vivia em suas beiradas. Existia, realmente, um dualismo. Escritores famosos, como Caio Prado Jr., sempre descreveram a grande lavoura - o latifúndio ou a plantation - como aquela destinada à exportação, de açúcar, cacau ou borracha. Produzir alimento básico era coisa de pobre.

Quando chegou o ciclo da mineração, no século 18, o deslocamento da população - a maioria escrava - rumo ao Sudeste, exigiu fortalecer a produção de alimentos. Desde os pampas gaúchos, dedicado à pecuária e ao seu valioso charque de carne, por todo o Centro-Sul surgiram novos agricultores, animados por atenderem o consumo interno criado nas atividades auríferas das Minas Gerais.

Mais tarde, na economia cafeeira de São Paulo, já livre da escravidão, o colonato favoreceu o cultivo de gêneros alimentícios, seja entre as ruas do cafezal novo, seja em áreas destacadas da fazenda. Caminhava a economia livre. Mas a crescente demanda nas cidades brasileiras trouxe à tona a questão do abastecimento urbano. Em 1901, relatava Alberto Passos Guimarães - A Crise Agrária, 1978 -, quase 43% das importações brasileiras, em valor, representavam produtos básicos, incluindo feijão, fava, milho, arroz, banha e manteiga. Com escassez os preços elevaram-se, estimulando os pequenos agricultores. Plantar comida passava a oferecer lucro.

A partir da grande crise mundial, dos anos 1930, a diversificação da economia brasileira, na cidade e no campo, aprofundou-se. Décadas depois, com o forte êxodo rural alargando as metrópoles, a necessidade do abastecimento nas periferias transformou definitivamente a agricultura de subsistência em próspero negócio. Além do tradicional arroz com feijão, os moradores do asfalto exigiam ovos, carnes, verduras e legumes, frutas, leite; aos roceiros bastava produzir e vender. Daí surgiram os Ceasas, sacolões, varejões e, claro, os supermercados. Mudou a distribuição no varejo dos alimentos.

Mudou também, e muito, o caráter da produção rural. Ela ganhou escala e tecnologia, cresceu em produtividade, integrou-se às agroindústrias, aprendeu a comercializar, buscou financiamento. O raciocínio guarda lógica: as cidades brasileiras jamais teriam sido abastecidas - e bem ou mal o foram - sem uma grande transformação ocorrida no campo. Que prossegue acelerada.

Nesse processo histórico, as análises dualistas sobre a agricultura perderam razão. Sim, existem ainda os tradicionais agricultores de subsistência, a maioria empobrecida no semiárido nordestino. Enfraqueceu-se, porém, com a modernização agrária a antiga oposição entre a grande e a pequena produção. Ambas, com tecnologia, passaram a ser regidas pela lucratividade do mercado, seja interno, seja externo. Assim, tornaram-se complementares, e muitas vezes se confundiram. Vejam alguns exemplos.

Típica da velha família rural, a banha de porco acabou substituída na cozinha pelos óleos vegetais. O mais barato, de consumo popular, origina-se do esmagamento do grão da soja. Pois bem, no Paraná e no Rio Grande do Sul, grandes plantadores da oleaginosa, 90% da produção advém de agricultores familiares, ligados às grandes cooperativas exportadoras. Ou seja, a mesma agricultura que gera divisas garante a fritura na mesa. Sem distinção.

No café, a maior parte da safra brota das lavouras mineiras, grandemente ligadas às cooperativas. A Cooxupé, a maior delas, aglutina 12 mil cafeicultores, sendo 80% pequenos produtores rurais. Do embarque total de grãos nos pátios da cooperativa (2011), perto de 15% se destinou às torrefadoras do mercado interno; a grande parte seguiu exportada. Pequenos, juntos, ficam grandes.

Em cada ramo da agropecuária nacional se pode verificar essa junção entre o agronegócio capitalista e a produção familiar, sendo difícil separar, no destino, o mercado interno do externo. Na cultura da cana, em que preponderam os grandes usineiros, cerca de 70% do açúcar se exporta, mas o etanol, que enche o tanque dos veículos, dos pobres principalmente, fica aqui dentro.

Quem produz frango, o agricultor familiar ou o agronegócio? Resposta fácil: ambos. As empresas frigoríficas representam grandes negócios, privados ou cooperativados; já os avicultores, a elas integrados, são familiares. 

E o feijão? A maioria da produção, é verdade, advém de pequenos produtores. Estes, entretanto, não se configuram mais como de subsistência, vendendo apenas o excedente. Que nada. Espelham agricultores altamente tecnificados.

Nos Estados Unidos, sabe-se, a mecanização da agricultura provocou, ao mesmo tempo, o aumento da escala de produção e o fortalecimento da gestão familiar, preponderante por lá. Tal processo se caracteriza, por aqui, especialmente em Mato Grosso, onde enormes fazendas produzem soja e milho, nas lavouras tocadas pelos próprios produtores e seus filhos. Negócios gigantes, familiares.

Essas histórias mostram que ser familiar não necessariamente significa ser pequeno. E comprovam que pequeno agricultor pode, perfeitamente, participar do agronegócio, quer contribuindo para a exportação, quer alimentando o povo.

Pode acreditar: inexiste oposição entre agricultura familiar e agronegócio. O feijão virou capitalista.

* XICO GRAZIANO É AGRÔNOMO, FOI SECRETÁRIO DE AGRICULTURA E SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. E-MAIL: XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O agronegocio brasileiro: relatorio oficial sobre comercio exterior

Governo publica estudo sobre comércio exterior do agronegócio brasileiro
 

 
Está disponível no portal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) a edição 2012 do estudo “Comércio Exterior da Agropecuária Brasileira: Principais Produtos e Mercados”. A publicação foi elaborada pelo Departamento de Promoção Internacional do Agronegócio (DPI) do Mapa. Dividido em seis capítulos, a pesquisa apresenta um panorama sucinto da produção agrícola no Brasil e das vendas externas do país. O comércio exterior é analisado por três focos: setorial, mercados e fornecedores. De acordo com o trabalho, o valor das exportações cresceu em média 17,1% entre 2006 e 2011. A produção anual de grãos aumentou 33% no mesmo período e a participação do agronegócio no PIB brasileiro foi de 22,7% em 2011. A produtividade média por hectare expandiu 27,5% entre as safras 2005/2006 e 2010/2011, enquanto a área plantada aumentou apenas 4,3%. O Brasil também permanece como maior exportador de açúcar, café, suco de laranja, soja em grão e carne de frango e o segundo lugar para carne bovina, óleo de soja e farelo de soja. São Paulo continua sendo o maior produtor agrícola do Brasil e a China se tornou o principal destino das exportações agrícolas brasileiras. A publicação está disponível na íntegra e pode ser baixada tanto nas versões em inglês quanto em português. Para a publicação em português, clique aqui. Para a publicação em inglês, clique aqui.       Fonte: agricultura.gov.br
Palavras chave: estudo comércio exterior

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A potencia agricola brasileira (3): Terras tem alta valorizacao

Terras brasileiras sobem 14,2% ao ano em uma décadaReuters, 28/11/2012

Os preços das terras agrícolas no Brasil tiveram valorização média de 14,22 por cento ao ano entre 2002 e 2011, bem acima da inflação, revela um estudo inédito da consultoria Informa Economics FNP, ao qual a Reuters teve acesso.

O aumento dos preços foi motivado, entre outros motivos, pela crescente demanda por alimentos no mundo, refletida pela alta nas principais commodities agrícolas, e pela entrada de investidores em busca de rentabilidade garantida, em meio à instabilidade da economia internacional, disse a consultoria.

Entre janeiro de 2002 e dezembro de 2011, período da análise, as terras acumularam ganhos de 278 por cento em média no Brasil, contra uma inflação (IPCA) de 87,7 por cento.

No mesmo período, o índice Bovespa, que mede o desempenho dos principais papéis na Bolsa de São Paulo, teve alta de cerca de 300 por cento, mas com muito mais volatilidade.

As chamadas "novas fronteiras agrícolas", nas áreas de Cerrado de Maranhão, Piauí, Tocantis e oeste da Bahia - conhecidas por Mapitoba - foram uma das que mais valorizaram.

Como exemplo, a FNP cita a região de Balsas (MA), onde uma área agrícola de baixa produtividade subiu de preço mais de 24 por cento ao ano, passando de menos de 1.000 reais por hectare para quase 5.000 reais.

"Mapitoba é a região que tem muita valorização. Talvez não seja possível repetir nos próximos dez anos a mesma performance desses últimos dez anos, mas ainda assim a gente acredita (num aumento de preços)", disse à Reuters José Vicente Ferraz, diretor-técnico da Informa Economics FNP.

Todas as regiões registraram elevação nos preços de forma semelhante.

O Centro-Oeste, principal região produtora de grãos e gado bovino, teve a maior valorização, de 16 por cento ao ano.

As terras das regiões Sul e Norte registraram ganho médio de 15 por cento ao ano, enquanto no Nordeste e no Sudeste o aumento foi de 14 por cento.

A FNP dividiu o país em 133 regiões e faz pesquisa com 300 colaboradores espalhados pelo território nacional, coletando a cada dois meses a cotação de terras com as mais variadas características.

As elevações de preço passam longe de ser homogêneas. Tudo depende da aptidão de cada área.

Um exemplo da diversidade foi o preço de um hectare em área de caatinga no Piauí (um dos Estados do Mapitoba), na região do município de Picos, onde a valorização acumulada foi de apenas 1 por cento em dez anos.

"São áreas sem potencialidade de produção", lembrou Ferraz.

INVESTIDORES

A valorização e a segurança do investimento em terras atraíram gente que não tem o perfil tradicional de fazendeiro, afirma Ferraz.

"Até 10 anos atrás, praticamente só existia o mercado de quem está com o pé na terra... Hoje não", disse ele, ressaltando que não há estatísticas confiáveis sobre a participação de investidores no mercado de terras. "Mas com certeza já é bastante relevante."

O diretor da FNP conta que a empresa prestou assessoria para diversos grupos de investidores, inclusive estrangeiros. Ele não pode citar nomes nem números.

Segundo ele, esse tipo de investimento é bastante seguro, embora não tenha muita liquidez.

"A crise internacional pode ter reflexo. Há o fato de que as taxas de juros no mundo todo são bastante baixas e que fundos, principalmente de pensão, têm uma necessidade de investir em ativos seguros. (Terra) não é papel, uma coisa que evapora."

Os ganhos podem ocorrer em três frentes, diz o especialista.

O primeiro, e mais óbvio, é o ganho sobre o preço de uma terra que pode ser vendida por um preço maior após alguns anos do negócio.

No entanto, há também os lucros com a produção e a venda dos produtos agrícolas. Nos últimos três anos, a soja acumula alta de quase 60 por cento na Bolsa de Chicago, por exemplo.

O terceiro ganho para quem investe em terras, diz Ferraz, é a transformação de terra bruta, que é barata, em terra própria para cultivo, que é cara.

"O ganho da transformação é muito maior que o investimento. Quando você compõe estes três lucros, você chega a ter taxas de retorno do capital de 15 a 18 por cento", diz o analista.

ESTRANGEIROS

Na percepção do diretor da FNP, houve uma entrada importante de capital externo em busca de terras nos últimos anos, mesmo após a decisão do governo federal em 2010, que restringiu a compra de terras no país por empresas estrangeiras.

"Uma das características deste investidor, até pela questão da lei dos estrangeiros, ele tem vindo associado a um brasileiro", disse Ferraz. "Esses fundos entendem que é importante estar associado a alguém que conheça o Brasil."

Segundo ele, na maior parte dos casos, empresas brasileiras que já são proprietárias de amplas fatias de terras recebem capitalização de fundos internacionais, para a aquisição de mais áreas e ampliação da produção. Em maio deste ano, a SLC Agrícola anunciou parceria com a britânica Valiance, em acordo que envolveu um aporte de 238,58 milhões de dólares.

Em todos os casos, segundo Ferraz, trata-se de um negócio difícil, já que é preciso aliar uma avaliação da capacidade agrícola das terras, sua regularização fundiária e as pressões de ambientalistas contra a conversão de áreas de vegetação em áreas de cultivo.

"Esse negócio é para profissionais."



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Brazilian farmland prices nearly quadruple in last decade-study

A potencia agricola brasileira (2): O Brasil se veste de soja

Brasil se veste de sojaRevista Globo Rural, 26/11/2012

Plantio recorde leva oleaginosa a roubar espaço do boi e invadir áreas antes destinadas a algodão, milho e feijão

A soja celeremente vai ocupando o espaço do algodão, milho de verão, feijão primeira safra, arroz e invadindo o pasto da boiada. Em seu rastro, crescem as vendas de plantadeiras, colheitadeiras e fertilizantes. Num cenário de demanda aquecida, os produtores já haviam negociado até o final de outubro quase 50% da megassafra que só começa a ser colhida em janeiro próximo. “Preços bons garantem margem maior em relação às outras culturas”, afirma Aedson Pereira, analista de grãos da Informa Economics FNP, consultoria especializada no agronegócio. “Anima ainda mais a perspectiva de a remuneração continuar robusta em 2013 por conta da demanda chinesa. O clima também está ajudando”, diz.

Até pelos tradicionalíssimos cenários de pecuária de corte e de arrozais, como os das cidades gaúchas de Pelotas e Don Pedrito, a soja se expande, e o temor de algumas entidades é que mais áreas de campo sejam destinadas ao cultivo e a lotação diminua, afetando a oferta de touros nas concorridas feiras e remates da primavera e verão. Previsões indicam que a área destinada ao plantio no Rio Grande do Sul pode ganhar 300.000 hectares nesta temporada, passando de 4,2 milhões de toneladas (2011/2012) para até 4,5 milhões de hectares. Já no Norte, em Tocantins, o retrato da transformação é mais nítido e a pecuária perde terreno para a oleaginosa.

“Na região de Araguaína, por exemplo, no norte do Estado, o que era pastagem degradada está virando um tapete verde”, afirma Pereira. O secretário de Agricultura de Tocantins, José Américo Vasconcelos, diz que a área plantada em todo o Estado deve ficar de 15% a 20% maior em relação à safra anterior. A previsão de colheita no Tocantins é de 1,5 milhão de toneladas – era 1,3 milhão em 2011/12.

Segundo Aedson Pereira, na região conhecida como Mapitoba, que é a confluência entre os Estados do Maranhâo, Piaui, Tocantins e Bahia, os grãos vão tomar entre15% e 25% das pastagens na atual temporada. Para o analista, os criadores de boi deverão investir em tecnologia e produtividade para permanecer na atividade. Caso contrário, a soja rentável invadirá mais pastos.

Os números divergem pouco, e todos eles confirmam que a soja será a vedete deste verão. Há cerca de dois meses, falava-se numa colheita próxima de 80 milhões de toneladas em 2012/2013, mas agora a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e consultarias como FNP e Agroconsult já arriscam um resultado de até 83 milhões de toneladas. Pela estimativa da Conab, a área plantada com a soja deve ultrapassar 27 milhões de hectares, 9% a mais que na safra anterior.

“Nessa invasão da soja, prevemos que o algodão cederá até 18% de área na Bahia e pelo menos 27% em Mato Grosso", adianta Pereira, da FNP. Por sua vez, a Conab aponta para uma redução entre 20% e 27,4% na área cultivada com algodão em todo o país devido a fatores como câmbio, queda nas cotações da pluma e maior rentabilidade da soja. No caso do milho, segundo a Conab, a área semeada na primeira safra deve cair entre 4% e 6,8%, mas a produção é prevista na faixa de 34,5 milhões a 35,8 milhões de toneladas, com variação positiva entre 1,9% e 5,9% em relação à safra passada.

No Paraná, o otimismo com a soja dá o tom. Na pequena Corbélia, vizinha a Cascavel, o gaúcho migrante Euclides Francisco Formigieri, que penou com a seca aguda na safra 2011/2012, está muito satisfeito agora. "O clima está bom na região oeste e os preços também", afirma o sojicultor de 43 anos de idade, que, confiante, chegou a comprar colheitadeira e negociava a aquisição de plantadeira e trator com a empresa Metropolitana, de Cascavel. Formigieri diz que não entabulou negócio futuro com a soja, pois aposta no incremento das cotações.

Em Mato Grosso, principal Estado produtor, praticamente não há máquinas agrícolas para entrega imediata. Tem de esperar dois meses. Foi o caso do produtor José Antonio Sapata, que recebeu no mês passado três máquinas adquiridas em julho por RS 1 milhão. Ele afirma que os preços bons da soja permanecerão nos próximos três anos pelo menos. Em todo Mato Grosso, segundo o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (IMEA), deverão ser semeados 7,89 milhões de hectares de soja nesta temporada, um salto de 11,6% na comparação com 2011/2012. A produção está estimada em 24,13 milhões de toneladas, 12% mais, enquanto a comercialização da soja que está sendo plantada atingiu 63,1% no final de outubro, movimento que traduz confiança na atividade.

Com dinheiro no bolso, os produtores compram máquinas agrícolas para substituição das antigas e também fertilizantes para melhora da produtividade das lavouras. Até setembro último, porta do plantio, as empresas tinham vendido 3.629 colheitadeiras, 11% mais que em igual período do ano passado, e a tendência era os negócios acelerarem. A comercialização de tratores, cujo panorama não era tão favorável no início deste ano, reagiu e as revendedoras contabilizaram 41.400 unidades de janeiro a setembro (foram 40.900 nos primeiros nove meses de 2011). "Otimistas, os agricultores querem se mecanizar. Devemos terminar 2012 em crescimento, diferentemente da estabilidade inicial prevista em relação ao ano passado", diz Milton Rego, diretor da empresa CNH.

Na área de fertilizantes, a expectativa é de um incremento de 5% em relação às vendas "explosivas" de 2011, que atingiram 28 milhões de toneladas — em 2010, o consumo nas lavouras foi de 24,5 milhões de toneladas. Em janeiro deste ano, a Associação dos Misturadores de Adubos do Brasil, sediada em São Paulo, havia previsto crescimento de 3% nas entregas para o ano de 2012.

Segundo Carlos Eduardo Florence, presidente da entidade, mais do que a soja — que consome menos adubo —, o gigantesco salto no cultivo de milho e os bons preços recebidos por essa cultura estão permitindo ao setor encerrar o ano exibindo outro recorde respeitável.

Na opinião de Pereira, da FNP, colaboram para o cenário promissor os estoques baixos dos EUA, ao redor de 4,6 milhões de toneladas, que balizam o mercado, e o apetite da China, que não deve arrefecer. Segundo ele, há produtor em Goiás e Mato Grosso "travando" cotação de até RS 60 pela saca, o que lhe garante um lucro expressivo de 35%.

Outubro morria quando chegaram as últimas notícias de Mato Grosso: em setembro, foram entregues 647.000 toneladas de fertilizantes no Estado, 39% mais que em igual mês de 2011. Carlos Florence diz que só neste ano haviam sido destinados 4,1milhões de toneladas para lá, 10% a mais em comparação a 2011. Ele chegou até a avisar sobre problemas pontuais de entrega.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Brasil: celeiro do mundo (nao gracas ao MST, certamente)

Se dependesse do MST, estaríamos importando alimentos, hoje...



Novo celeiro do mundo

Editorial O Estado de S.Paulo, 21 de julho de 2012 
Há tempo destacada, a participação do Brasil na produção mundial de alimentos deverá ser ainda maior nos próximos anos. O Brasil integra um pequeno grupo de países produtores agrícolas - do qual fazem parte Rússia, Ucrânia, China, Indonésia e Tailândia - que responderá pela maior parte da produção adicional necessária para alimentar a população mundial até 2050. Até lá, de acordo com projeções da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), para atender à demanda, a produção mundial terá de crescer 60%. Nos próximos anos, outros países em desenvolvimento deverão se integrar a esse grupo, mas será cada vez menor a contribuição dos países industrializados para prover o alimento adicional de que o mundo necessitará no futuro.
Para evitar a fome no mundo, na metade deste século, a produção anual de cereais deverá ser 1 bilhão de toneladas maior do que a registrada em 2007 e a de carne precisará aumentar 200 milhões de toneladas. O relatório das duas organizações internacionais, com as projeções para a produção agrícola entre 2012 e 2021 - e que estende algumas delas para 2050 -, leva em conta o crescimento da população mundial, do índice de urbanização e do nível médio de renda no período.
Um dado preocupante do estudo é a redução do ritmo do crescimento anual da produção agrícola mundial, que alcançou 2% nas últimas décadas, mas deverá cair para 1,7% nas próximas. Ainda assim, será um crescimento maior do que o previsto para a população mundial, razão pela qual a produção por habitante continuará crescendo ao ritmo de 0,7% ao ano, estimam a OCDE e a FAO.
Na próxima década, o Brasil deverá registrar o maior crescimento de produção agrícola em todo o planeta. Até 2019, segundo o estudo, a produção brasileira deverá crescer 40%, bem mais do que o aumento estimado para a produção da Rússia, da Ucrânia, da China e da Índia.
Embora com resultados inferiores aos do Brasil, outros países da América do Sul também aumentarão de maneira expressiva sua produção. Desse modo, como observou o diretor-geral da FAO, José Graziano da Silva, "a América do Sul está se convertendo em um grande celeiro" do mundo.
Estudo anterior da OCDE, divulgado no início do ano, mostrou com clareza a evolução da agricultura brasileira da segunda metade do século passado até hoje, destacando o expressivo aumento da produtividade, sobretudo a partir de 1970. Entre 1961 e 2007, enquanto a produtividade de países industrializados como França, Inglaterra e Estados Unidos aumentou menos do que a média mundial do período, de 1,48% ao ano, a do Brasil cresceu 3,6% ao ano, mais do que a média da América Latina, de 2,6%, e dos países em desenvolvimento, de 1,98%.
Na última década, os ganhos alcançados por alguns países, como Rússia e Ucrânia, foram maiores do que os do Brasil, mas esses países tinham um nível de produtividade muito baixo, daí seu crescimento mais rápido no período. Outros países conhecidos por sua forte presença no comércio mundial de produtos agrícolas, como Austrália, Canadá e México, além da Coreia do Sul, ao contrário, ficaram menos eficientes.
É reconhecido o papel fundamental de alguns fatores para o aumento veloz e contínuo da produtividade agrícola no Brasil. O avanço da pesquisa liderado pela Embrapa, com o desenvolvimento de variedades mais adequadas às condições brasileiras e o emprego de técnicas mais produtivas, é um deles. O aumento das exportações, que passou a exigir mais volume e mais qualidade, a preços competitivos, é outro. Os preços internacionais igualmente contribuíram para dar mais eficiência à agricultura do País. Por fim, a nova mentalidade do produtor rural permitiu a adoção de novos métodos de gestão e gerou um conhecimento mais acurado do mercado.
Melhor estaria o campo no Brasil, e poderia aumentar ainda mais rapidamente seus resultados, se dispusesse de infraestrutura e serviços logísticos que lhe garantissem custos competitivos para levar sua produção até o porto.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

E os agricultores que nao tem barba? - Roberto Rodrigues

Apenas uma maneira de dizer. O artigo do ex-ministro da Agricultura do primeiro governo Lula -- o único ministro decente, ou seja, docente, que se podia localizar naquele governo -- faz um retrato dos dilemas atuais do setor agrícola. Ele só não diz que os investimentos no setor, nos últimos anos, cresceram mais para quem não produz (sob a responsabilidade do ministério-inimigo do (Sub)Desenvolvimento Agrário), do que para os agricultores de mercado.
Vale conferir...
Paulo Roberto de Almeida

Barbas de molho


* Roberto Rodrigues
Folha de S.Paulo, 4/06/2012
Com o dólar a R$ 2 a agricultura ganha ou perde?
De maneira geral ganha, porque boa parte de nossa produção rural -a de exportação- tem seus preços estabelecidos em dólar. Ora, como o produtor brasileiro recebe em reais, quanto mais valorizado o dólar, tanto mais reais ele receberá por unidade produzida. Em outras palavras, ganha mais.
Mas há um risco embutido nessa questão: os agricultores estão, exatamente neste momento, comprando seus Link no Glossário insumos para o plantio da safra de verão.
Grande parte deles é importada, e os preços já subiram em dólar, como é o caso das matérias-primas para fertilizantes. Portanto, os custos de produção vão aumentar.
Qual é o risco? É comprar insumos com o dólar valorizado e vender a produção com o real valorizado: isso seria ruim, provocaria o descasamento da renda -como já aconteceu outras vezes no passado-, levando ao endividamento os produtores que estiverem muito alavancados.
Felizmente, a situação das dívidas rurais hoje é muito menor do que em anos anteriores, como em 2004, por exemplo, quando aconteceu um movimento parecido com esse. Os últimos três anos permitiram certa capitalização do campo, e os produtores estão usando mais capital próprio e menos crédito.
Mas mesmo que os preços em dólar não caiam muito e o dólar não desvalorize, a tendência para a safra 2012/2013 é de redução das margens em relação aos últimos anos.
A isso se soma outra incerteza: a crise europeia. Ela está durando mais do que se imaginava há alguns meses e se agravando em outros países além da Grécia. Com isso, especuladores caíram fora do mercado agrícola e trataram de procurar outros ativos de menor risco, como o próprio dólar. E este também se valoriza com isso.
Mas pior será se a crise atingir a economia de países emergentes, causando retração do comércio e queda da demanda por alimentos. Não é muito provável que isso aconteça, mas é possível. E, se acontecer, os preços das Link no Glossário commodities agrícolas cairão de verdade, em dólar, logicamente, e isso teria reflexos negativos na renda rural de produtores do mundo todo, inclusive aqui.
É bem verdade que os preços estão em patamares tão acima das médias históricas que precisam cair bastante para voltar a níveis que não cubram os custos de produção no Brasil.
Dessa forma, os riscos não são muito grandes. Mas o nível de incerteza é tanto neste mundo conturbado, a agricultura é por si mesma uma atividade tão arriscada que pode acontecer uma conjunção de fatores negativos, do tipo:
1) Os custos de produção sobem devido ao dólar valorizado;
2) O dólar desvaloriza na hora de vender a safra;
3) Os preços globais caem em dólar por causa da crise europeia aprofundada, reduzindo o consumo e a demanda por Link no Glossário commodities agrícolas em geral.
Seria muito azar se isso tudo acontecesse, de modo que a probabilidade dessa conjunção é pequena. E seguramente não teremos La Niña na próxima safra. E como o nível de endividamento não é mais o que foi no passado, o setor está bem mais capitalizado.
Juntando tudo, não há razão para ser pessimista, ainda.
Mas que as margens vão diminuir, vão. Então, também não há razão para nenhuma euforia.
É tempo de cautela e caldo de galinha, de não dar o passo maior que a perna, de não fazer muita onda.
Ou, como se fala na roça: é tempo de botar as barbas de molho.
Até porque, os vetos colocados no projeto da Câmara dos Deputados sobre o Link no Glossário Código Florestal -e mais a medida provisória editada para completar a legislação pertinente ao tema- criaram alguma incerteza a mais.
A medida provisória já está em vigor, mas poderá ser alterada ainda neste ano no Congresso, uma mecânica legislativa complexa.
Mas, eventualmente, a legislação definitiva pode até demorar um pouco mais, sem falar em outras possibilidades já aventadas, como Adin, mandado de segurança etc.
Mais molho para as barbas...
Roberto Rodrigues, 69, é embaixador especial da Link no Glossário FAO para o cooperativismo, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV e professor de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal. Escreve aos sábados, a cada 14 dias, nesta coluna. rr.ceres@uol.com.br

sexta-feira, 1 de junho de 2012

O Brasil vai alimentar o mundo? - artigo de Marcos S. Jank

Provavelmente, mas isso depende...
Depende de muita coisa: de melhorarmos nossa produtividade, de deixarmos de ser um país caro, de parar de tributar excessivamente as atividades produtivas e de muitas outras coisas mais, que dependem apenas de nós mesmos, e do governo, claro.
Nos últimos nove ou dez anos, o governo fez de tudo para proteger os bárbaros (no sentido propriamente gótico, ou visigodo, da palavra) do MST e outros movimentos neobolcheviques, que fingem que querem a reforma agrária, mas na verdade só querem aterrorizar o agronegócio e se opor à agricultura comercial de exportação; inacreditável que esses bárbaros (no sentido huno, desta vez) invadiram fazendas produtivas, negócios privados, instituições públicas e NUNCA foram reprimidos. Pode-se pensar que, dentro do governo, existem outros bárbaros (no sentido de mongois, desta vez, stricto et lato sensii) que só pensam em defendê-los.
O Brasil também deve ser o único país do mundo que tem DOIS ministérios da agricultura, com políticas perfeitamente contraditórias, opostas e até inimigas entre si; um se encarrega da agricultura normal, de mercado, o outro só subsidia agricultores inviáveis e patrocina loucuras agrícolas com o nosso dinheiro.
Tem muitas outras coisas erradas no setor primário, e como ele vem fazendo, ainda assim, sucesso, nos últimos tempos, produzindo renda e riqueza, liberando saldos de exportação, enfim, financiando os déficits de outros setores, pode ser que o governo, mais uma vez, queira transformar o setor, como no passado, em uma vaca a ordenhar, literalmente, ou seja, tirar o dinheiro que o setor produz para distribuí-lo entre seus beneficiários improdutivos.
Enfim, sou moderadamente pessimista quanto às chances do Brasil se tornar uma grande economia de mercado. Não com essa obsoleta concepção de mercado, como diria o Polanyi (mas com outro sentido).
Paulo Roberto de Almeida 



A hora e a vez da moderna agricultura tropical
Marcos Sawaya Jank (*)
O Estado de São Paulo, 30/05/2012, Opinião, A-2


Nas próximas décadas o mundo oferecerá uma oportunidade de ouro ao Brasil, que exige, acima de tudo, planejamento e organização. Entre 2000 e 2050, o consumo global de alimentos vai triplicar, pois a população crescerá uma vez e meia (de 6 bilhões para 9 bilhões de pessoas), ao mesmo tempo que cada habitante duplica o seu consumo individual, dado o aumento da renda. A agência americana Usaid estima que nesses 50 anos teremos de gerar um volume de alimentos semelhante ao que produzimos nos últimos 8 mil anos.

Commodities alimentares serão produtos valorizados e dinâmicos num mundo marcado pela urbanização acelerada, pelo crescimento da renda per capita nas economias emergentes e pela mudança dos hábitos alimentares, com a substituição de grãos e tubérculos por proteína animal. A desaceleração da economia chinesa pode até impactar momentaneamente esse movimento, mas ele continuará positivo e exponencial nas próximas décadas, pois tem natureza estrutural. Basta lembrar que a própria China está mudando o foco de seus investimentos de infraestrutura para consumo, o que se traduz por uma migração de commodities minerais para agrícolas e energéticas, com destaque para as carnes e os lácteos. Esse imenso país só tem 15% de terras aráveis e vai investir US$ 630 bilhões em programas de conservação de água nos próximos dez anos, uma questão que já se tornou de segurança nacional. A Índia vem atrás, com problemas semelhantes.

O fato é que em 2000, dos US$ 20 bilhões que exportamos no agronegócio, 60% se dirigiram à Europa e aos EUA, ante apenas 14% à Ásia. Em 2011 exportamos US$ 95 bilhões no agro, sendo 25% para a Europa e os EUA e 52% para a Ásia. Um crescimento de 15% ao ano, agora redirecionado para países emergentes - da Ásia, do Oriente Médio e da África -, que nos obriga a repensar toda a nossa política comercial. Estou convencido de que essa nova era "asiocêntrica" é muito mais uma oportunidade do que uma ameaça para o Brasil. Para entender isso é preciso despir-se dos preconceitos históricos contra "commodities" e verificar in loco o que está acontecendo no campo brasileiro: novas tecnologias adaptadas às condições tropicais, importantes ganhos de escala e especialização dos produtores com a migração do Sul para o Centro-Oeste e o Nordeste, novos modelos de gestão e comercialização de produtos, agricultores jovens e dinâmicos, sistemas agroindustriais sofisticados.

Não é por acaso que o mapa das cidades com IDH mais elevado bate exatamente com o mapa da agricultura empresarial mais moderna. Na última década a produtividade total da agricultura (terra, trabalho e capital) cresceu 3,6% ao ano, ante menos de 0,5% ao ano dos setores de serviços e da indústria não agrícola. A quantidade de indústria e tecnologia embarcada num simples grão de soja é grande e é nessa etapa da produção, junto com as soluções de logística, que se encontra o verdadeiro "valor adicionado" que acaba diferenciando produtores e países. As crescentes restrições na disponibilidade de terra e água fazem com que produzir commodities seja hoje mais relevante e complexo que processá-las. A China já percebeu isso, mas não tem saída.

Resta saber se conseguiremos aproveitar essa oportunidade. Primeiro, por causa das travas que tornaram nosso agronegócio um setor com imenso potencial, porém de alto custo. Travas clássicas são as ineficiências estruturais da nossa logística e os crescentes riscos regulatórios - legislação complexa e altamente instável no tempo, por exemplo, nas áreas ambiental e trabalhista, de registros de propriedade precários e restrições para aquisição de terras por empresas nacionais controladas por capital estrangeiro. Segundo, porque os concorrentes não estão parados: oferecem cada vez melhores condições para produzir, principalmente em termos de políticas de atração de investimentos, logística adequada e incorporação de novas tecnologias. No seminário “Perspectivas do Agronegócio 2011-2012” organizado pela BM&F na semana passada, empresários brasileiros declararam que estão considerando seriamente a possibilidade de investir em outras regiões (EUA, Leste Europeu, África), onde as condições para plantar seriam mais atrativas.

Precisamos urgentemente definir com clareza as metas e o papel que o Brasil deveria desempenhar na busca pela segurança alimentar e energética do planeta nas próximas décadas. Em seguida, precisamos definir como as cadeias de suprimento deveriam estruturar-se para atingir essas metas: políticas públicas que garantam segurança jurídica para investir, fortes ganhos de eficiência logística e incentivos à agricultura de alta produtividade e verdadeiramente sustentável, com eficiência econômica e responsabilidade socioambiental. A longo prazo, o que interessa não é o que um país produz, mas como ele produz em relação aos seus melhores concorrentes. O mundo claramente espera proatividade e liderança do Brasil nessa área.

Retornei de uma semana de eventos nos EUA convencido que esta é a hora e a vez da agricultura tropical moderna, não apenas no Brasil. Mas por aqui efetivamente saímos na frente, demos passos importantes nas últimas décadas e não podemos agora ficar parados contemplando nosso próprio umbigo. Não se trata de aproveitar uma oportunidade de mercado ou de ficar repetindo que temos recursos naturais abundantes. Isso não basta, e também não é mais verdade. Precisamos, sim, de muito planejamento e organização para enfrentar uma questão fundamental para o futuro do planeta: como criar cadeias de suprimento eficientes para alimentar 9 bilhões de pessoas, a grande maioria vivendo em cidades, com recursos naturais cada vez mais restritos.

* Especialista em Agronegócio e Agroenergia, foi presidente da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica). Email: marcos@jank.com.br

sexta-feira, 18 de maio de 2012

G8 e seguranca alimentar: o que o Brasil poderia fazer?

Abaixo, o editorial desta sexta-feira, 18 de maio de 2012, do Washington, saudando mais um (sim, mais um) plano de salvamento global dos miseráveis do mundo, majoritariamente concentrados na África.
Duas únicas observações.
Não uma linha sequer sobre o protecionismo e o subvencionismo agrícolas dos países desenvolvidos -- em primeiro lugar UE e EUA, que distorcem os mercados globais e dificultam, justamente, o potencial agrícola dos países africanos -- ou sobre a famosa "ajuda alimentar", um dos canais que também impedem esses países de se qualificarem nos mercados agrícolas globais.
Tampouco se vê, mas disso o editorial não tem culpa, como o Brasil, uma das maiores potências agrícolas do planeta, e que poderia estar associado a todo e qualquer esforço de qualificação tecnológica na agricultura tropical, poderia estar associado a essas iniciativas. Ele não só poderia, como DEVERIA estar vinculado a qualquer iniciativa que se faça nesse terreno.
Paulo Roberto de Almeida 

A worthy G-8 proposal aims to lift millions out of poverty

By Editorial Board

The Washington Post, May 18, 2012

OVER THE PAST decade, the world has made great strides in helping people lift themselves out of extreme poverty. But more than half of sub-Saharan Africa’s 740 million people still subsist on less than $1.25 a day. More than one-fourth suffer from chronic hunger. By 2050, the region’s total population will double. Without increased agricultural productivity, the region’s poverty and malnutrition will not only persist but worsen.
On Friday, in advance of the 2012 Group of Eight summit of industrialized nations at Camp David, President Obama is to announce a joint effort to lift 50 million people in the region out of extreme poverty within 10 years. The innovative strategy behind the New Alliance for Food Security and Nutrition is to foster political reform as a means of encouraging increased private investment in agriculture. The investment is not targeted at large-scale corporate production but aims to enable smaller-scale farmers to increase output, primarily for their own consumption but also for sale.
According to Rajiv Shah, administrator of the U.S. Agency for International Development (USAID), political barriers have doomed past agricultural development strategies in sub-Saharan Africa, the only region in the world to see no substantial agricultural growth in the past 40 years. Excessive government involvement and corruption have dissuaded investors and discouraged local farmers. Government restrictions on seed variety have inhibited local entrepreneurship and lowered sales. A lack of collateral registries has prevented farmers from obtaining loans or insurance.
The new effort is designed to lift those barriers to investment. “African governments are cutting red tape and making pro-market reforms,” Dr. Shah said. The affiliated African countries, a group that now includes Ethiopia, Tanzania and Ghana but is expected to expand to a majority of the region’s 47 nations, have each committed to 10 to 12 specific political reforms. For example, Tanzania has undertaken an effort to do away with its export ban on agricultural production. Ethiopia has agreed to launch a land-titling process, enabling microfinance by promoting land ownership.
In turn, more than 40 companies have committed to doubling their investment in agricultural development in Africa, with financial contributions of $3.5 billion. For example, Vodafone, the British telecommunications company, will provide technology to allow small-scale farmers to check market conditions and negotiate prices. Tanzania-based Tanseed International will offer farmers greater seed variety and aid them in harvesting more efficiently.
If the initiative meets its target, it will ameliorate hunger in 13 percent of the destitute population of sub-Saharan Africa. It is just one step, and it doesn’t lessen the need for development aid. But lifting barriers to farm productivity could end up helping many more than 50 million. It is a vital goal, and this initiative offers a novel and sensible approach.