A soja celeremente vai ocupando o espaço do algodão, milho de verão, feijão primeira safra, arroz e invadindo o pasto da boiada. Em seu rastro, crescem as vendas de plantadeiras, colheitadeiras e fertilizantes. Num cenário de demanda aquecida, os produtores já haviam negociado até o final de outubro quase 50% da megassafra que só começa a ser colhida em janeiro próximo. “Preços bons garantem margem maior em relação às outras culturas”, afirma Aedson Pereira, analista de grãos da Informa Economics FNP, consultoria especializada no agronegócio. “Anima ainda mais a perspectiva de a remuneração continuar robusta em 2013 por conta da demanda chinesa. O clima também está ajudando”, diz.
Até pelos tradicionalíssimos cenários de pecuária de corte e de arrozais, como os das cidades gaúchas de Pelotas e Don Pedrito, a soja se expande, e o temor de algumas entidades é que mais áreas de campo sejam destinadas ao cultivo e a lotação diminua, afetando a oferta de touros nas concorridas feiras e remates da primavera e verão. Previsões indicam que a área destinada ao plantio no Rio Grande do Sul pode ganhar 300.000 hectares nesta temporada, passando de 4,2 milhões de toneladas (2011/2012) para até 4,5 milhões de hectares. Já no Norte, em Tocantins, o retrato da transformação é mais nítido e a pecuária perde terreno para a oleaginosa.
“Na região de Araguaína, por exemplo, no norte do Estado, o que era pastagem degradada está virando um tapete verde”, afirma Pereira. O secretário de Agricultura de Tocantins, José Américo Vasconcelos, diz que a área plantada em todo o Estado deve ficar de 15% a 20% maior em relação à safra anterior. A previsão de colheita no Tocantins é de 1,5 milhão de toneladas – era 1,3 milhão em 2011/12.
Segundo Aedson Pereira, na região conhecida como Mapitoba, que é a confluência entre os Estados do Maranhâo, Piaui, Tocantins e Bahia, os grãos vão tomar entre15% e 25% das pastagens na atual temporada. Para o analista, os criadores de boi deverão investir em tecnologia e produtividade para permanecer na atividade. Caso contrário, a soja rentável invadirá mais pastos.
Os números divergem pouco, e todos eles confirmam que a soja será a vedete deste verão. Há cerca de dois meses, falava-se numa colheita próxima de 80 milhões de toneladas em 2012/2013, mas agora a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e consultarias como FNP e Agroconsult já arriscam um resultado de até 83 milhões de toneladas. Pela estimativa da Conab, a área plantada com a soja deve ultrapassar 27 milhões de hectares, 9% a mais que na safra anterior.
“Nessa invasão da soja, prevemos que o algodão cederá até 18% de área na Bahia e pelo menos 27% em Mato Grosso", adianta Pereira, da FNP. Por sua vez, a Conab aponta para uma redução entre 20% e 27,4% na área cultivada com algodão em todo o país devido a fatores como câmbio, queda nas cotações da pluma e maior rentabilidade da soja. No caso do milho, segundo a Conab, a área semeada na primeira safra deve cair entre 4% e 6,8%, mas a produção é prevista na faixa de 34,5 milhões a 35,8 milhões de toneladas, com variação positiva entre 1,9% e 5,9% em relação à safra passada.
No Paraná, o otimismo com a soja dá o tom. Na pequena Corbélia, vizinha a Cascavel, o gaúcho migrante Euclides Francisco Formigieri, que penou com a seca aguda na safra 2011/2012, está muito satisfeito agora. "O clima está bom na região oeste e os preços também", afirma o sojicultor de 43 anos de idade, que, confiante, chegou a comprar colheitadeira e negociava a aquisição de plantadeira e trator com a empresa Metropolitana, de Cascavel. Formigieri diz que não entabulou negócio futuro com a soja, pois aposta no incremento das cotações.
Em Mato Grosso, principal Estado produtor, praticamente não há máquinas agrícolas para entrega imediata. Tem de esperar dois meses. Foi o caso do produtor José Antonio Sapata, que recebeu no mês passado três máquinas adquiridas em julho por RS 1 milhão. Ele afirma que os preços bons da soja permanecerão nos próximos três anos pelo menos. Em todo Mato Grosso, segundo o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (IMEA), deverão ser semeados 7,89 milhões de hectares de soja nesta temporada, um salto de 11,6% na comparação com 2011/2012. A produção está estimada em 24,13 milhões de toneladas, 12% mais, enquanto a comercialização da soja que está sendo plantada atingiu 63,1% no final de outubro, movimento que traduz confiança na atividade.
Com dinheiro no bolso, os produtores compram máquinas agrícolas para substituição das antigas e também fertilizantes para melhora da produtividade das lavouras. Até setembro último, porta do plantio, as empresas tinham vendido 3.629 colheitadeiras, 11% mais que em igual período do ano passado, e a tendência era os negócios acelerarem. A comercialização de tratores, cujo panorama não era tão favorável no início deste ano, reagiu e as revendedoras contabilizaram 41.400 unidades de janeiro a setembro (foram 40.900 nos primeiros nove meses de 2011). "Otimistas, os agricultores querem se mecanizar. Devemos terminar 2012 em crescimento, diferentemente da estabilidade inicial prevista em relação ao ano passado", diz Milton Rego, diretor da empresa CNH.
Na área de fertilizantes, a expectativa é de um incremento de 5% em relação às vendas "explosivas" de 2011, que atingiram 28 milhões de toneladas — em 2010, o consumo nas lavouras foi de 24,5 milhões de toneladas. Em janeiro deste ano, a Associação dos Misturadores de Adubos do Brasil, sediada em São Paulo, havia previsto crescimento de 3% nas entregas para o ano de 2012.
Segundo Carlos Eduardo Florence, presidente da entidade, mais do que a soja — que consome menos adubo —, o gigantesco salto no cultivo de milho e os bons preços recebidos por essa cultura estão permitindo ao setor encerrar o ano exibindo outro recorde respeitável.
Na opinião de Pereira, da FNP, colaboram para o cenário promissor os estoques baixos dos EUA, ao redor de 4,6 milhões de toneladas, que balizam o mercado, e o apetite da China, que não deve arrefecer. Segundo ele, há produtor em Goiás e Mato Grosso "travando" cotação de até RS 60 pela saca, o que lhe garante um lucro expressivo de 35%.
Outubro morria quando chegaram as últimas notícias de Mato Grosso: em setembro, foram entregues 647.000 toneladas de fertilizantes no Estado, 39% mais que em igual mês de 2011. Carlos Florence diz que só neste ano haviam sido destinados 4,1milhões de toneladas para lá, 10% a mais em comparação a 2011. Ele chegou até a avisar sobre problemas pontuais de entrega.