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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 17 de julho de 2011

Wikileaks-Brasil: the inside story - Natalia Viana (Publica)

Como conheci Julian Assange – e como os documentos do WikiLeaks vieram parar no Brasil
Por Natalia Viana, da Pública (15/07/2011)
Tudo começou com um telefonema mais do que inesperado e misterioso, em novembro do ano passado; menos de duas semanas depois, o Brasil seria o primeiro país a ter acesso aos documentos diplomáticos da embaixada americana, além dos cinco jornais da Europa e dos EUA.

Só às vezes o meu celular pegava. Eu estava em um bangalô à beira do Rio Tapajós, no Pará, onde ia morar por um mês para fazer uma reportagem. O telefone, portanto, não tocou. Ouvi o recado horas depois. Em inglês britânico: “Alô Natalia, aqui é a Hale, trabalhamos juntas em Londres. Agora estou com uma organização muito influente, queria te passar um trabalho…”

Era 14 de novembro de 2010, quinze dias antes do estrondoso lançamento dos 250 mil telegramas das embaixadas americanas pelo WikiLeaks, e no silêncio da floresta o convite soou longínquo, mal explicado. Decidi entrar em contato com meu ex-chefe, Gavin MacFadyen, diretor do Cento de Jornalismo Investigativo de Londres, onde trabalhara com a tal inglesa, para pedir mais detalhes.

Gavin é um dos mais incríveis jornalistas que eu conheço. Adora as reportagens arriscadas, saboreia os resultados, ri sem parar quando lembra que algum ricaço corrupto foi pego com a boca na botija. E sempre me dá as melhores dicas. Pouco depois do contato, ela volta a me escrever, por email.

“Estamos trabalhando em um grande projeto, extremamente empolgante, que vai ter enorme repercussão no mundo todo. Não é seguro escrever os detalhes, mas tenho certeza que qualquer jornalista gostaria de estar envolvido”, explicava a inglesa. “Todos os meus telefones estão grampeados, mas posso te ligar”.

Ao telefone, a proposta, afinal: que eu estivesse em Londres nos próximos dias, num local indicado. Não saberia o que nem para quem. Numa rápida ligação, Gavin deu uma só dica, preciosa: o trabalho envolveria uma pessoa “recentemente famosa”. Como grande parte dos jornalistas investigativos, eu já conhecia a trajetória de Julian Assange e me entusiasmava pela sua cruzada por documentos secretos. Achei que era ele: “Estou dentro”.

Ora, de Santarém para Belém e de lá para o aeroporto de Cumbica, em São Paulo. Mil pequenos receios tomam conta quando tomei o táxi para o aeroporto, afinal. Medos prosaicos: de ser tudo mentira; de perder os parcos 4 mil reais que gastara com as passagens; de ser barrada no aeroporto de Londres como tantos brasileiros da minha idade, sem trabalho fixo nem uma boa explicação para dar. Caprichei no ar blasé quando falei com o oficial da imigração: “estou apenas de férias, vou aproveitar para fazer compras”. Deu certo.

Em Londres, devia ir a um endereço – era toda a indicação que eu tinha. Mas quando cheguei ao Frontline Club, em Paddington, um clube aconchegante que promove o jornalismo independente com debates, exibição de filmes e quartos mais em conta para repórteres e documentaristas que vivem de orçamento apertado – ninguém.

Hora e meia depois ela chega, esbaforida. Loira, rabo de cavalo e roupa mal ajambrada que pouco disfarçava a beleza de olhos azuis, boca carnuda e jeito de menina. Hale desabafou: “Sinto muitíssimo, querida, mas você viu o que aconteceu hoje né?”. Eu, não. “Emitiram um mandado de prisão contra ele”.

Ele, como eu imaginara, era Julian Assange, uma das figuras mais controversas do jornalismo mundial – acusado, inclusive, de não ser jornalista. Àquela altura, o WikiLeaks já era conhecido no mundo todo, e já incomodava muita gente. Em julho, havia publicado 75 mil diários sobre a guerra do Afeganistão que provaram assassinatos indiscriminados de civis; em outubro, mais 400 mil relatos secretos sobre o Iraque, provando tortura contra prisioneiros.

Hale parecia mais aborrecida com o atraso nos planos que com a acusação em si. Trava-se de uma queixa na Suécia, feita por duas mulheres, de crimes sexuais. “É uma armação, isso vai embora com o tempo. Mas precisamos ter cuidado”. Muito cuidado, explicou. Meses antes, o Pentágono havia emitido uma ameaça clara: o WikiLeaks deveria devolver todos os documentos secretos e apagá-los do seu site, ou então os EUA “buscariam alternativas de obrigá-los a fazer a coisa certa”. Não tínhamos nem ideia do que podia acontecer.

***

A poucas quadras dali, no andar superior de uma casinha insuspeita em uma alameda de paralelepípedos, estavam meus companheiros de viagem. Agora, era só guardarmos as malas e partirmos, disse Hale, sem explicar aonde. Foi assim que vi pela primeira vez o Julian Assange, com seu rosto fino e nariz marcante, pálido, loiríssimo. Falou pouco, mas sua voz forte chamou a atenção, talvez um pouco menos que a vodka que ele ofereceu assim que sentei à mesa. Islandesa, supreendentemente boa.

Do outro lado, o islandês Kristin Hraffnson sorria. Bonitão, grisalho (teria uns 50 anos?) e com seu ar sério, elogiou o produto de sua terra, enquanto ao meu lado outro rapaz, de óculos, também bebia sem culpa. “Não vou dirigir”. Era um rapaz jovem, magricelo, com um aprumado topete e um ar irônico que só os melhores ingleses conseguem ter (embora seja, na verdade, de uma ex-colônia africana). Seguiu-se então uma discussão, que me pareceu infinita, sobre quem afinal seria o motorista – a escolha era entre um islandês meio bêbado, um africano meio cego e uma inglesa que não dirigia há anos. “Como você pode ver, somos uma organização muito eficiente”, brincou Hale, ao se dar por vencida e assumir a direção.

Pouco antes de sair, Julian me chamou para perto. Me entregou um pedaço de papel rabiscado: “Não fale nada”. Lia-se, na sua letra miúda, 250.000 telegramas de embaixadas americanas de 1966 a 2010. 1/10 não valem nada, 1/50 importantes, 1/250 muito importantes.

Na saída, aproveitei para fumar um cigarro. Kristinn se aproximou: “Você está bem?”. “Estou. Queria poder fazer perguntas”. “Quando estivermos na estrada”, respondeu.

Hale pediu meu casaco, uma espalhafatosa peça de lã azul marinho salpicada de bolinhas verdes. Subiu correndo e desceu rindo uma gargalhada gostosa, que tentava abafar com as mãos. “Eu juro que não vou conseguir dirigir se ele vier vestido assim”. Quando Julian finalmente desceu, todos caímos na risada. Vestia um lenço estampado de cetim sobre a cabeça, meu casaco acinturado, óculos e enchimento nos peitos e nas costas, simulando uma bizarra corcova. Fizemos uma breve sessão de fotos, até ser interrompidos por ele: “vamos, vamos!”

***

Enfim pudemos conversar quando chegamos a um posto de beira de estrada. Enquanto os demais foram comprar comida, Julian ficou no carro por segurança.

Por que queriam uma brasileira?

- Porque o Brasil é um grande país, independente, assim como a Austrália. Não pode ser visto como América Latina, e também tem uma língua própria…

Ele abriu seu pequeno laptop, onde reluzia um gigantesco arquivo de texto, verde e preto. Digitou “Brazil”: 3 mil documentos. “Você vai ter muito trabalho”, disse.

A principal tarefa seria escrever matérias em português (“temos muitos apoiadores no Brasil”) e conseguir parceiros confiáveis na mídia brasileira. “Ah, uma coisa”, ele acrescentou. “Vamos lançar os documentos no dia 28”.

Trabalhar com o WikiLeaks, percebi, é quase sempre tentar realizar o impossível. Ler e processar milhares de documentos era humanamente impossível.

Mas ser do WikiLeaks é isso: idealistas, apaixonados, todos desdobram-se em cinco para concretizar as empreitadas inventadas por Julian ou pelo grupo que o rodeia a toda hora, todo instante. “Em tempos de mentira universal, dizer a verdade é um ato revolucionário”, diz o site da organização.

Uma organização que usa essa frase no seu site é ingênua, ou revolucionária. Ou os dois.

***

Voltando para a estrada, recebemos ordens de desligar computadores e celulares. Ordens mesmo. Entendi rápido que o WikiLeak não é Julian Assange: qualquer decisão será contestada, discutida e rediscutida por todos à sua volta, num exercício de possibilidades e impossibilidades que só vai terminar com o melhor argumento – ou a estratégia mais ousada. Mas, quando se trata de segurança digital, Julian manda, ponto final. No dia seguinte, ele iria pessoalmente “blindar” todo o equipamento.

Já larga madrugada, a rodovia deu lugar a estradinhas tortuosas, rodeadas por plantações rasteiras e grandes casarões, antigas casas de duques e duquesas. Do lado de fora o campado acolhia as plantações e criações: faisão, patos, pombos brancos. Estávamos em Norfolk, na fazenda de Vaughan Smith, o mesmo dono do Frontline Club.

A mansão dos Smith tem nome próprio, Ellingham Hall. E merece. O estilo é georgiano; e tudo parecia mesmo datar da época de um rei longínquo. Até o odor, e o ranger do piso de madeira, de madrugada.

O casarão guarda histórias de gerações e gerações, que Vaughan e a sua esposa Pramvera, uma inteligentíssima mulher do Kosovo, iam nos contando ao redor da enorme mesa de jantar diante da lareira. Nas paredes, retratos a óleo dos antepassados nos seus melhores trajes –para não ser esquecidos no tempo. Vaughan apontava: “essa era minha tia avó”, “esse meu tataravô era capitão de infantaria”, “meu pai era mensageiro real”. Todos haviam morado naquela casa.

Ellingham Hall tem 10 quartos, quatro andares ligados por uma escada em caracol. Eu dormia com uma advogada mexicana que chegaria dias depois para dividir comigo uma impressão, digamos, mais latina sobre aquilo tudo. No quarto, confidenciávamos estar com medo de chegar a polícia, o serviço secreto britânico, ou a CIA. “Qualquer coisa, somos apenas empregadas!”, brincava ela.

***

No dia seguinte, Julian já se debruçava sobre os nossos laptops. A coisa se mostrou um tanto complicada; a internet funcionava mal e lentamente. Somente à noite conseguimos fazer uma reunião para, finalmente, programar o trabalho.

Para nossa segurança, ficaríamos fechados em Ellingham Hall, evitando chamar a atenção. O local era seguro, isolado de qualquer estrada, e cravado no meio de um enorme terreno de 650 acres – muito difícil, portanto, de ter escutas. Teríamos jornalistas indo e vindo, de muitos países, para escrever sobre os telegramas. As viagens à cidade deveriam ser raras, feitas em pequenos grupos. E só quando muito necessário.

A conversa chegou enfim ao processo sueco, que despertava minha curiosidade e a ansiedade de todos. Tudo indicava que a Interpol iria emitir um mandado de prisão internacional, e Julian não iria mais poder viajar. Ele jamais pensara em se tornar um fugitivo. Mas fato é que se a ordem fosse dada, se tornaria do dia para a noite um homem procurado.

“Me arrependo muito de não ter feito o WikiLeaks como uma empresa” disse, abatido. “Se fôssemos uma empresa que desse lucro, podíamos vender conteúdo sobre os documentos, pronto, todo mundo nos respeitaria”. Raciocínio típico de Julian Assange, perspicaz, original e inesperado; e típico do WikiLeaks, contestado com vigor de manhã cedo até o jantar. Ora essa, uma empresa.

No dia seguinte, recebi enfim os documentos. Quem colocou tudo em tabelas de Excell foi um inglesinho de cerca de 25 anos, de olhos azuis e pouco queixo. James Ball, formado em Oxford, é um jovem jornalista excelente com tabelas, números, documentos, com um tremendo raciocínio lógico – e conservador. Sensato, talvez um pouco demais para o WikiLeaks, sempre batia de frente com Julian ao defender a imprensa britânica. Mas sim, era delicioso assistir ao eterno embate entre o jovem britânico e o hacker (quase) quarentão com tendências a esgarçar limites.

Meses depois, James integrou-se ao time investigativo do Guardian. Deu, em troca, horas de depoimentos sobre o WikiLeaks, recheando o livro sobre Julian que o jornal publicou a toque de caixa e que, meses depois, seria comprado por Steven Spielberg para um filme de Hollywood. Com seu estilo careta, o jovenzinho reclamaria do estilo “errático” da organização, das mudanças de ideia de Julian, e das poucas horas de sono. “Era um grupo de jovens ativistas sem qualquer treinamento profissional”, diria.

E são assim contadas as histórias que ficam.

***

Trabalhávamos na sala contígua à de jantar, diante da lareira; nos três sofás, cinco, seis pessoas mergulhadas nos seus laptops enquanto a arrumadeira trazia lenha para manter o fogo aceso de hora em hora, com um café bem aguado. Dormíamos mal, pouco, trocávamos o dia pela noite.

Assim que recebi as duas tabelas de Excell – uma, com os 1947 telegramas de Brasília, outra com 909 dos consulados – fiquei cinco dias sem pregar os olhos. Estava ali um relato inédito da nossa história recente, preciso, datado, delicioso. Afinal, era a conta de todos os anos do governo Lula aos olhos do governo americano, primeiro com Bush e depois Obama. A história de um império em decadência, e de uma nação que desponta. Com seus meandros e suas sacanagens, e seus deliciosos flagrantes.

Eram documentos com valor histórico, e não só noticioso. Através deles, aprenderíamos como se dá na prática a política externa: nomes, datas, detalhes. Organizá-los bem e elaborar uma boa estratégia de divulgação era, portanto, essencial. Queríamos que fossem lidos, repercutidos, abraçados pela mídia e pelos sem-mídia.

Nos telegramas desfilavam Serras, Lulas, FHCs, Amorins, Jobins. Aos poucos os furos iam se revelando e eu, pacientemente, os ia classificando, elencando segundo a urgência e importância. Assombrei-me com a colaboração entre a inteligência brasileira e os americanos nas operações anti-terror; com a ajuda do governo para liberar na justiça os pilotos acusados do acidente da Gol; com a transferência dos agentes da DEA expulsos da Bolívia por espionagem para o Brasil, em silêncio, na surdina – e com o apoio do Minsitério da Justiça e do govenro boliviano. Me surpreendi ao ver que o ministro da defesa, Nelson Jobim, era o “homem mais confiável” para o embaixador, enquanto falava mal do Itamaraty.

- Meu deus! – lembro de ter gritado. Jobim fofocou que Evo tinha um tumor! Que traição!

Silêncio na sala. A verdade é que ninguém entendia os vaivéns da nossa política regional e cabia a mim, avaliar o que era bombástico, o que não. Percebi logo que muitos documentos teriam mais impacto se lançados ainda em dezembro: que o governo de Lula ia acabar. Mas, para isso, o Julian teria que comprar uma enorme briga.

Todos concordávamos que deixar apenas cinco jornais – de países centrais, ocidentais – decidir o que é e o que não é notícia era injusto. Mas o acordo rezava que Guardian, New York Times, Le Monde, El Pais e Der Spiegel teriam exclusividade sobre todos os documentos até janeiro. O problema então era expandir a parceria sem irritá-los.

A solução foi uma verdadeira gambiarra. Eu enviaria à imprensa brasileira, todo dia, as matérias que iria publicar no dia seguinte no site do WikiLeaks. Faltava só achar um parceiro, um grande jornal. E, mais importante, um jornalista confiável.

Fernando Rodrigues, da Folha de São Paulo, tinha uma enorme vantagem: ele conhecia o Gavin, sabia que eu trabalhava com ele, e portanto iria levar a sério o único breve telefonema que eu podia dar com segurança, do isolamento do nosso casarão. Consegui contato afinal através do Facebook. “Fernando, preciso falar com vc urgente. Vc pode me dar seu celular?”, digitei.

Ao telefone, podia falar muito pouco. O WikiLeaks queria um parceiro brasileiro, pois tinha em mãos muitos documentos, inclusive do Brasil. A repercussão seria enorme, a Folha com certeza podia dar destaque. Mas eu só poderia abrir o conteúdo no domingo, dia 28 de novembro, pela manhã. Sem mais detalhes.

Claro que não seria fácil segurar um jornal do porte da Folha com a promessa de um enorme furo que não se sabe direito o que é. Fernando seguiu o faro, e fez muito bem; mas é claro que enviava dezenas de emails checando e rechecando a data, perguntando mais sobre o conteúdo. Consegui acalmá-lo, afinal.

***

Na Inglaterra, em pleno novembro, é quase sempre noite. Em volta do casarão, tudo cobriu-se de neve. A rotina seguia intensa. Alívio eram os jantares, com bom papo e bom vinho do porto, tradição que seguíamos todas as noites. Chegaram colaboradores de toda parte – franceses, suecos, israelenses, americanos, ingleses.

Na mesa, evitávamos os temas mais pesados. Ali não estávamos fazendo nada diferente do que as equipes do Guardian, Le Monde, El Pais, faziam nas suas redações. E, no entanto, sob forte ameaça do Pentágono, éramos somente nós que tínhamos o que temer. “Mas esses documentos valem muito mais do que a minha vida. Ou a vida de qualquer um nesta mesa”, disse Julian uma noite. Seguiu-se, claro, um silêncio sepulcral.

A seriedade da situação não impediu que ele, a poucos dias do lançamento, teimasse em ir a Londres para o casamento do Gavin. Isso mesmo: Gavin, beirando os 70, iria se casar com a namorada, e fizera questão de escolhê-lo como padrinho. Mas, àquela altura, com um mandato de prisão iminente, seu paradeiro já gerava especulações em toda a imprensa. Hale o apoiava: “É muito mais romântico!”. Eu argumentava: seria o primeiro lugar onde o procurariam se houvesse um mandado de prisão repentino, ou um processo secreto nos EUA.

Além disso, discutíamos no jantar o meu tópico principal: o nome do lançamento. Julian rejeitava a ideia de algo burocrático como “telegramas das embaixadas”.

Também não cabia – e nisso todos concordávamos – nada como “despachos do império”, que cheirasse a slogan de esquerda. Uma manhã mal dormida, Julian apareceu na sala radiante. “Achei um nome: Cablegate”. A maioria não gostou.

Mas ninguém achou nada melhor.

***

Dias depois a notícia do próximo vazamento do WikiLeaks se espalhou na imprensa, embora ninguém soubesse o que íamos publicar. O New York Times procurara o governo americano, e nos dias seguintes Hillary Clinton passou a ligar para governos do mundo todo, pedindo desculpas por antecipação. O Departamento de Estado nos chamava de irresponsáveis: “o material colocará vidas em risco”, anunciou o porta-voz. De nada adiantou a carta, enviada por um emissário em Londres, pedindo que Washington indicasse quais nomes deveriam ser retirados. Não houve resposta.

A internet trazia notícias em quase todas as línguas sobre o que estávamos fazendo ali, naquela sala fria. Julian e Hale já não falavam com ninguém: tudo era terminar os detalhes. Elaboraram um engenhoso esquema que obrigava cada veículo a efetivamente ler os documentos antes de publicá-los. Garantiam, assim, que todos os nomes sensíveis seriam retirados, sob responsabilidade concorrente de todos os parceiros.

Ela passava horas conversando com os programadores geeks, rapazes da minha idade, ingleses, franceses. Dava gritinhos de alegria: “eu te amo, você é fabuloso, você é uma lenda”.

No sábado, 27, o casamento do Gavin transcorreu sem maiores percalços. Dois jornalistas do grupo foram até Londres; o padrinho, embora ausente, foi assunto principal e ganhou um brinde dos noivos, com direito a longo discurso do entusiasmado jornalista setentão. A noiva, uma alegre senhora americana, não se importou.

Quanto a nós, em Ellinghan Hall, tínhamos que conter a tensão dos cinco jornais, que começavam a desconfiar um do outro. Quem levaria o “furo do século” ? Será que dava para confiar que segurariam suas reportagens para publicarem todos juntos?

Segurar o embargo para a publicação – domingo, às 21 horas, já parecia impossível. Hale, Julian e Kristinn falavam no chat com um, dois, três jornais ao mesmo tempo. Ninguém deveria furar, e todos torcíamos ferozmente para isso, porque, afinal, o site do WikiLeaks estava longe de ficar pronto.

Mas, no sábado à tarde, o Der Spiegel furou. Publicou, por alguns minutos, uma reportagem que mostrava em detalhes no que consistia o vazamento: 251,287 documentos das embaixadas dos EUA no mundo todo: 15, 652 secretos, 101,748 confidenciais. A redação alegou “erro” e retirou a matéria do ar pouco depois, mas a historia já havia sido reproduzida, pra desespero dos demais jornais.

Para nós, a verdade é que a tensão era boa. Pouco importava quem furaria quem – essa é uma lógica própria das empresas jornalísticas. Para o WikiLeaks, o que importa é espalhar. Que os documentos sejam mais lidos, mais visitados, mais reproduzidos, mais discutidos, que alimentem jornais, TVs, revistas, acadêmicos, ativistas, políticos, cidadãos, sejam de direita, esquerda, de centro, de onde for.

Assim que, quando finalmente liguei para o Fernando na manhã do dia 28, ele mal escondeu a decepção: “Mas é só isso? Não tem nada mais forte?”.

Eu abriria a série com uma matéria sobre operações de contra terrorismo no Brasil, dentro da estratégia de priorizar temas internacionais. A Folha receberia esta matéria, e trechos de telegramas.

Para o jornal, a história – que já havia ventilado pela imprensa – não era um “furo”. Fui firme. “É isso por hoje”. A Folha concordou.

E assim as histórias que eu havia colhido nas noites diante da lareira foram criando vida, repercutindo, pautando a mídia nacional: jornais, rádio, TVs. Enquanto comentaristas apostavam o que mais haveria no balaio do WikiLeaks, era só eu, jornalista independente – sem veículo, sem patrão – quem tinha a resposta.

Sinal do tempo em que vivemos, definitivo e sem volta.

Às 6 horas do domingo, três horas antes do previsto, não deu mais pra segurar. Hale digitava furiosamente no seu laptop: “O Guardian vai furar”, “O El País quer publicar”. Finalmente o El País soltou a notícia, seguida pelos demais como uma verdadeira enxurrada. Enfim: o maior vazamento da história do jornalismo.

Na cozinha, Pramvera acompanhava pelo twitter a frenesi mundial. As linhas subiam histericamente, centenas de entradas por segundo, “impossível de ler”, gritava ela.

Eu olhava para o campo lá fora: já não tinha a menor idéia do que seria da minha vida. Em algumas horas, meu nome estaria no site do WikiLeaks, duas palavrinhas que iam mudar tudo.

Já comia a madrugada quando conseguimos estourar a gigantesca champagne, dessas de cinco litros. Brindamos alto: “Ao WikiLeaks!”.

***

Depois do lançamento fiquei apenas três dias na mansão.

Os documentos, claro, trouxe comigo para o Brasil. Improvisei, com apoio da diligente Maria Luisa: enfiei o pendrive dentro de uma meia usada, na mochila de roupas sujas. A despedida foi rápida e intensa. “Vamos ficar com saudade”, disse Hale.

Parti, de trem, agarrada à mochila. Foram horas longas, contornadas pela neve que me seguiu até a capital. Em Londres, causou um caos enorme: os trens não saíam das estações, os ônibus fugiam da rota usual. Consegui um ônibus até o bairro periférico onde passaria a noite, mas ele me deixou a meia hora do meu destino final. Fui andando, arrastando a mala sobre os bocados de gelo que se formavam na calçada. A rua estava deserta. Então voltou a nevar, e o caminho me pareceu infinito. E belo.
* Alguns nomes foram trocados a pedido dos personagens.

Transicao do MobileMe para o iCloud...: o que vai ocorrer?

iCloud is Apple’s new cloud service, which stores your music, photos, apps, calendars, and documents and wirelessly pushes them to all your devices. iCloud integrates seamlessly with your apps, so everything happens automatically. iCloud will be free for iOS 5 and OS X Lion users. More information is available at www.apple.com/icloud.

MobileMe Services

What’s happening to MobileMe?
The core services provided by MobileMe have been rewritten to work seamlessly with iCloud. MobileMe will no longer be available as a paid sync service. If you had an active MobileMe account as of June 6, 2011, your service has been extended through June 30, 2012, at no additional charge. After that date, the MobileMe service will no longer be available.

Following is a list of MobileMe services and whether they will be available or not in iCloud this fall:

MobileMe Service Available in iCloud
Mail Available
Contacts Available
Calendar Available
Bookmarks Available
Find My iPhone Available
Back to My Mac Available
iWeb publishing Unavailable
Gallery Unavailable
iDisk unavailable

In addition, the following new services will be available in iCloud:
iTunes in the Cloud
Photo Stream
Documents in the Cloud
Automatic downloads and purchase history for apps and books
Backup and restore

Will I be able to keep my MobileMe email address when I move to iCloud?
Yes. If you have an active MobileMe account when you sign up for iCloud, you’ll be able to keep your me.com or mac.com email address and move your MobileMe mail, contacts, and calendars, as well as your bookmarks, to the new service. When iCloud becomes available this fall, Apple will provide details and instructions on how to make the move.

Will I be able to access iCloud services on the web?
Yes. Web access to iCloud Mail, Contacts, Calendar, and Find My iPhone will be available at icloud.com this fall.

What happens to the iWeb sites that I’ve published to MobileMe?
You will be able to continue publishing iWeb sites to MobileMe through June 30, 2012, even after moving to iCloud. With iWeb you can easily move a site published to MobileMe to another web hosting service and you should do so before that date. Please read this article for details.

What happens to the pictures that I’ve posted to my MobileMe Gallery?
You will be able to continue using MobileMe Gallery through June 30, 2012, even after moving to iCloud. You should save copies of all photos published to your Gallery before that date. If you have a Mac, it is likely that most of your Gallery photos are already in iPhoto. If not, you can sync the Gallery photos to your iPhoto library. You can also download your photos and movies from the web. Please read this article for details.

What happens to the files on my MobileMe iDisk?
You will be able to continue using MobileMe iDisk through June 30, 2012, even after moving to iCloud. You should save copies of all files stored on iDisk before that date. Please read this article for details.

What happens to the other sync services I use for my Mac?
Syncing of Mac Dashboard widgets, keychains, Dock items, and System Preferences will not be part of iCloud, but will continue to be available for you to use until you move to iCloud. After you move to iCloud or after June 30, 2012, whichever comes first, those sync services will no longer be available. Other MobileMe services that are not transitioning to iCloud (iWeb publishing, Gallery, and iDisk) will continue to be available through June 30, 2012, even after you move to iCloud.

MobileMe Accounts

If I use different accounts for iTunes and MobileMe, can I merge them into a single account and use it with iCloud?
No. You cannot merge two accounts into one. However, you will be able to move your MobileMe account (yourname@me.com) to iCloud and, if you choose, you can continue to use a different iTunes account for store purchases and iTunes in the Cloud.

I currently use more than 5GB of storage in MobileMe. Will I be able to buy more storage for iCloud?
Yes. iCloud includes 5GB of free storage for mail, documents, and backup, which should be enough for most users. Purchased music, apps, and books do not count against this 5GB of storage, nor do the photos in your Photo Stream. If you still need more storage, you will be able to buy it. Details will be provided when iCloud is available this fall.

Can I upgrade my MobileMe account to a Family Pack or buy more MobileMe storage?
You can no longer upgrade your individual account to a Family Pack account or buy additional MobileMe storage. However, if you already have a Family Pack subscription, you can still create new family member accounts.

Can Family Pack members move their MobileMe accounts separately to iCloud?
Yes. The master account holder and each family member can move their individual accounts whenever they like, as long as they do so before June 30, 2012.

I purchased a MobileMe box and have not used the activation code inside. How do I get a refund for it?
If you have an unused activation code from a MobileMe box, you can submit a refund request.

Can I cancel my MobileMe subscription and receive a refund?
You can cancel your service at any time and receive a prorated refund for the unused portion of your paid subscription. The free extension will not be included in the proration. When you cancel, all MobileMe services, including mail and syncing of contacts and calendars, will stop working, and your data will be removed from MobileMe.

O que os vizinhos pensam do Brasil - seminario iFHC (Sergio Fausto)

O que os vizinhos pensam do Brasil
Sergio Fausto
O Estado de S.Paulo, 17 de julho de 2011

O protagonismo do Brasil na América do Sul não é uma questão de escolha. Tornou-se um dado da realidade, com o declínio relativo da Argentina e a perda de influência dos Estados Unidos na região. Deve até aumentar no futuro previsível, dadas as tendências expansionistas da economia brasileira. A questão é saber se esse protagonismo se traduzirá em liderança e se ela será positiva para a região em seu conjunto.
Em síntese, essa foi a visão da maioria dos líderes políticos sul-americanos presentes em mesa-redonda organizada recentemente pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC) para discutir o papel do Brasil na América do Sul. Participaram da discussão o ex-presidente da Bolívia Carlos Mesa, o senador chileno e ex-chanceler Ignacio Walker, a senadora uruguaia Constanza Moreira, o ex-ministro da Justiça do Peru Fausto Alvarado, além de vários brasileiros, como os embaixadores Sergio Amaral e José Botafogo Gonçalves e o ex-chanceler Celso Lafer. Uma amostra representativa da centro-esquerda democrática sul-americana.
Apesar de uma percepção em geral positiva sobre o Brasil, detectam-se incerteza e mesmo inquietude em relação ao "gigante sul-americano".
Existe receio de que a expansão das exportações e dos investimentos brasileiros em outros países da América do Sul prejudique a capacidade de produção e geração de empregos de suas economias. E que isso leve mais água para o moinho de governos, partidos e/ou movimentos adeptos de um nacionalismo retrógrado com inclinações populistas e autoritárias. Em países menores, sobretudo naqueles onde há ressentimento histórico em relação ao Brasil, como a Bolívia e o Paraguai, é bem vivo o temor de que o extravasamento da economia brasileira acabe por levá-los a uma situação de subordinação política ao colossal vizinho. Mesmo no Uruguai, o mais desenvolvido dos pequenos países fronteiriços, observa-se um incipiente nacionalismo antibrasileiro, em reação à compra de terras em quantidade crescente por empresas brasileiras naquele país.
Algumas características do investimento brasileiro na região reforçam o sentimento descrito. O fato de grandes companhias brasileiras receberem apoio do BNDES para a aquisição de empresas locais acentua a percepção de que nosso país conta com um poder excessivo, derivado não apenas do porte e da eficiência de seus maiores grupos empresariais, mas também da estreita associação entre eles e o Estado brasileiro. A propósito, em entrevista recente ao jornal Valor Econômico, o presidente da União Industrial Argentina afirmou, com exagero característico: "Só quando tivermos um BNDES poderemos abaixar a guarda".
A reação à crescente presença brasileira na América do Sul poderia ser atenuada se fossem os investimentos feitos em parceria com grupos locais, mas as joint ventures são raras, predominando o controle do investidor brasileiro sobre o negócio. São raros também os fornecedores locais que se beneficiam dos empréstimos concedidos pelo BNDES a governos vizinhos, em financiamentos vinculados ao pagamento de obras e serviços realizados pelas grandes empreiteiras brasileiras nos países da região.
Em suma, à constatação de assimetria na relação com o Brasil soma-se o sentimento de que se está diante de uma competição desleal contra um poder cujo funcionamento parece opaco. De fato, não há nada similar na região à aliança entre grandes grupos empresariais privados, fundos de pensão públicos, empresas estatais e banco de desenvolvimento. Com frequência o investimento e o crédito chineses surgem como alternativas bem-vistas diante do temor de se tornar muito dependente do Brasil, apesar de as relações entre Estado e empresas serem na China muito mais opacas do que aqui.
Além de pouco transparente, o Brasil é visto como "soberanista", isto é, relutante em ceder parcelas de sua autonomia decisória em benefício do fortalecimento de instituições de governança coletiva da região. Desse "soberanismo" faria parte a resistência a pagar o custo financeiro, em favor da integração, correspondente ao tamanho de sua economia, como a Alemanha na Europa.
O Brasil é também considerado ambivalente quanto à importância que sua política externa atribui à região. Embora a centralidade da América do Sul esteja claramente definida no discurso, resta muita dúvida sobre se o Brasil de fato considera que o fortalecimento de sua liderança regional é mesmo necessário à realização de suas ambições como global player. Critica-se o governo brasileiro por supostamente não consultar os governos sul-americanos antes de tomar iniciativas no plano internacional, ao mesmo tempo que invoca a sua condição de líder regional quando lhe interessa fazê-lo nas negociações internacionais.
É nítido o contraste entre a percepção de que o Brasil é autocentrado e até certo ponto voraz em relação aos vizinhos e a opinião que no geral se tem aqui dentro a respeito da atitude do governo brasileiro em relação à região, normalmente percebida como muito generosa com as demandas de alguns países e tolerante com eventuais desmandos contra empresas brasileiras que operam na vizinhança.
Para o Brasil, não se trata, é claro, de moldar o figurino de sua política externa sul-americana à opinião média de seus vizinhos, que, aliás, varia de país a país. Trata-se, isso sim, de constatar que nos faz falta - na sociedade e no governo - um pensamento sobre a América do Sul que leve na devida conta a percepção dos outros países da região a nosso respeito, sem perder de vista os interesses brasileiros. Precisamos de uma visão abrangente e de longo prazo, que não se deixe levar por simpatias ideológicas episódicas nem por ilusões de que o peso econômico do Brasil se traduzirá automaticamente em maior liderança política. À medida que cresça a nossa presença na região, essa visão será cada vez mais indispensável.

DIRETOR EXECUTIVO DO iFHC, É MEMBRO DO GACINT-USP; E-MAIL: SFAUSTO40@HOTMAIL.COM

O que o chanceler pensa de sua propria politica externa - Entrevista Antonio Patriota

'Não existe país que esteja acima do bem e do mal', diz Patriota
Rui Nogueira e Lisandra Paraguassu
O Estado de S. Paulo, 16 de julho de 2011

Brasil, Índia e África do Sul estão negociando 'gestão diplomática' junto ao governo Sírio; se houver moção pró-independência palestina, o Brasil votará a favor

Em um mundo multipolar, com mais potências emergentes e em fase de realinhamento, não há países acima do bem e do mal. Os direitos humanos não podem ser tratados como uma política em que o grito maior é de quem tem mais força. Essas são sínteses da visão do mundo atual e da ação da diplomacia brasileira feitas pelo chanceler Antonio de Aguiar Patriota em entrevista ao Estado, na quinta-feira passada.
Ministro das Relações Exteriores dá entrevista exclusiva ao 'Estado'
O ministro, 57 anos, é formado em Filosofia, tem dois filhos e é casado com Tania Cooper Patriota, representante do Fundo de População das Nações Unidas (FNUAP) para a Colômbia e Venezuela. Desenhista e pianista fã de jazz, Patriota aceitou, antes de encerrar a entrevista, responder a mais cinco perguntas bem curtas e que abrem esta reportagem:
- Um pianista de jazz - Brad Mehldau.
- Um filósofo - Friedrich Nietzsche.
- Um filósofo do momento - Slavoj Zizek (se diverte com as performances dele).
- Um grande acerto diplomático - Acabei de ir a Buenos Aires para celebrar os 20 anos da Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle (Abacc). É um acerto diplomático extraordinário. Estava lá o diretor-geral da AIEA dizendo que é um exemplo para o mundo. Sedimentou a base de um entendimento com a Argentina que consolidou a relação que temos e o nosso projeto de integração sul-americana.
- Um grande erro diplomático - A invasão do Iraque. Mais que diplomático, um grande erro de política externa, porque de diplomacia não teve nada. Inclusive com implicações sistêmicas muito problemáticas porque passou por cima do Conselho de Segurança. A questão do Irã, em grande medida, tem a ver com isso. Uma das coisas que a invasão do Iraque mais fez foi fortalecer o Irã em um contexto regional delicado.

A seguir, a íntegra da entrevista:
O jornalista e também diplomata Antonio Patriota, hoje com 94 anos, aconselha os filhos a "não dizer tolices, porque a tolice complica". Quanto vale esse conselho?

O uso adequado das palavras, tanto oralmente quanto por escrito, é uma das atividades principais da diplomacia, um instrumento de trabalho.
O sr. nunca foi traído pelas palavras?
A gente vai adquirindo experiência com as palavras. E o diplomata tem de ter essa experiência em muitas línguas, atentar muito para a tradução correta de expressões. Um grande chanceler, talvez um dos maiores da diplomacia contemporânea, que é o Serguei Lavrov, da Rússia, quando faz seus discursos em russo, no Conselho de Segurança, fica com a tradução em inglês no ouvido. De vez em quando, ele para e corrige o tradutor. Isso demonstra bem a importância das palavras. A diplomacia trata de guerra e de paz (aponta para os painéis de Portinari no gabinete). Uma palavra que leve a uma interpretação equivocada é um problema diplomático.
O senhor diz que não vai promover nenhuma reviravolta na diplomacia, que haverá continuidade com ajustes em "nuances, ênfases e desafios". Só isso?
Para começar, é bom lembrar que o que este governo se propõe a fazer na área diplomática tem, em grande medida, a ver com a consolidação de um trabalho do que já vem sendo feito há mais tempo. Há um reconhecimento de uma elevação do perfil internacional do Brasil no mundo, foram abertas novas embaixadas, foram desenvolvidas novas coalizões, como o Ibas (Índia, Brasil, África do Sul), aprofundada a integração sul-americana. Essas linhas todas permanecem linhas de atuação. E meu trabalho aqui é assegurar que elas frutifiquem, se consolidem, se aprofundem. Existem as novas frentes de trabalho, onde se pode incluir a África, o Oriente Médio, um mundo em desenvolvimento que não era tão presente na diplomacia. Existe também um trabalho voltado para governança sistêmica, que envolve a promoção de mecanismos mais representativos, mais legítimos, mais em linha com a distribuição da configuração geopolítica contemporânea. Então, tudo isso permanece como linhas de atuação.
Sobre ênfases novas eu também tenho comentado, por exemplo, a busca de resultados em áreas que contribuirão para um novo estágio de desenvolvimento brasileiro. Sobretudo no relacionamento com países mais desenvolvidos que o Brasil, uma ênfase em ciência e tecnologia, inovação. A presidenta Dilma demonstrou interesse grande em aumentar o número de brasileiros que estudam fora, sobretudo em áreas de ciências exatas. Existe, também, uma preocupação com a diversificação da pauta comercial. Então essas são ênfases que têm sido manifestadas concretamente em comunicados conjuntos com, por exemplo, a China e os EUA.
É verdade que a presidente Dilma, em conversas com o senhor sobre as ações internacionais, tem perguntado: "Concretamente, o que vamos ganhar com isso"?
É, ela tem muito essa visão. Mas essa visão não resume tudo. Isso também não é inteiramente novo. Já era uma constatação interessante, que às vezes a imprensa questionava: por que essa ênfase, no governo Lula, no mundo em desenvolvimento? Depois, quando as economias desenvolvidas entraram em crise, ficou claro - principalmente depois da crise de 2008 - que a diversificação de parceiros foi uma estratégia muito inteligente do ponto de vista da manutenção de um bom padrão de intercâmbio comercial.
Mas eu também comentei outro dia as ênfases baseadas em valores, que têm a ver com a valorização da democracia, a diminuição da desigualdade, do pleno exercício dos direitos humanos de uma maneira não politizada, não seletiva, nas soluções diplomáticas e na resistência ao contemplar o uso da força quando a busca das soluções diplomáticas não esgotou seu curso.
Um bom exemplo de um novo desafio é a cúpula Rio+20. Um desafio que está inscrito no nosso calendário. Estamos nos reunindo de novo no Rio de Janeiro, 20 anos depois da Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - desta vez com foco na economia verde e no combate à pobreza. Outro foco é a governança ambiental global. E a partir de um estágio diferente do pensamento brasileiro sobre essas questões e uma evolução do pensamento brasileiro sobre essas questões. Adquirimos uma liderança importante nos biocombustíveis, um país com uma matriz energética limpa, mas, ao mesmo tempo, descobrimos petróleo em grande quantidade. Então temos a capacidade de olhar para os dois lados nessa equação. Fizemos avanços importantes no combate à pobreza e à desigualdade, e o desafio aqui, de certa maneira, é inscrever a variável ambiental nas conversas sobre desenvolvimento econômico e social. É um debate bem contemporâneo, que deve ser feito de maneira que aglutine os países da comunidade internacional, evitando que haja uma polarização entre mais e menos desenvolvidos, que haja um descuido em relação a aspirações legítimas e específicas, como as pequenas ilhas ou de países que sofrem com a desertificação. É um desafio conceitual, de certa forma filosófico, político, diplomático e logístico.
Na questão dos direitos humanos, o governo Lula era seletivo. A presidente Dilma criou uma demarcação nova nesse campo, não?
Eu acho que é um pouco mais complexo que isso. Em primeiro lugar, e aqui eu volto a defender que estamos construindo sobre uma base já estabelecida, os direitos humanos compreendem valores econômicos, sociais e culturais e os direitos civis e políticos. Os avanços do Brasil na política da diplomacia com relação aos direitos humanos têm muito a ver com a situação doméstica deste país. E os avanços do Brasil nos últimos anos foram muito significativos, mas ainda permanecem desafios importantes.
Eu me reúno frequentemente com minha colega Maria do Rosário (ministra-chefe da Secretaria de Direitos Humanos), a quem eu prezo muito, e pergunto a ela quais são os principais desafios. São muitos: situação carcerária, violência urbana, direito das mulheres, educação, etc. Mas o governo Lula operou alguns saltos importantes. E isso não sou eu que digo: há um reconhecimento, por exemplo, do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos de que o Brasil foi um dos países que melhor aproveitou - e isso vem de antes do governo Lula - a conferência de Durban (2001, África do Sul) sobre direitos humanos e racismo para se organizar no plano nacional e depois implementar algumas das ideias produzidas na conferência. A secretaria de Direitos Humanos foi elevada a nível ministerial, foi criada uma secretaria de Promoção da Igualdade Racial - um dos poucos países do mundo que tem um ministro para igualdade racial. Foi criada também uma secretaria de igualdade de gênero.
Há outro aspecto que eu acho que entra em Direitos Humanos: combateu-se a pobreza como nunca antes e num ritmo mais acelerado. Isso envolve direitos humanos, direito a uma vida digna, ao emprego, à educação, condições salubres de vida. A partir disso cria-se uma base muito positiva para se defender no plano internacional que, se nós conseguimos melhorar, outros conseguirão. E vamos usar o sistema Nações Unidas, que é universal, que é o que mais prezamos, para defender o acesso do maior número possível de pessoas aos seus direitos plenos.
Mas há problemas de outra natureza. Países onde se pode falar e onde não se pode falar nada.
Aí, às vezes, surgem dificuldades, porque existe uma polarização muito grande entre Norte e Sul nesses debates. Eu diria que não é aceitável a ideia de que violação de direitos humanos só acontece em país pobre. Porque, historicamente, nós sabemos que algumas das violações mais graves, e violações em escala assustadora, foram cometidas por países altamente desenvolvidos, altamente militarizados. Mas, na prática, em uma reunião do Conselho dos Direitos Humanos em Genebra, não se vê lá uma discussão sobre um país desenvolvido. Vai ser sobre um país africano, sobre um país latino-americano.
Às vezes, há uma distorção: a delegação de um país (em uma reunião do Conselho de Direitos Humanos, em Genebra) está preocupada com a opinião pública doméstica e quer mostrar que condenou certos acontecimento de maneira muito veemente. Mas essa condenação vai levar a uma melhora da situação de direitos humanos naquele país? Não necessariamente. A condenação em si mesma pode gerar uma indignação que, em decorrência, produza algum progresso. Mas também pode não gerar nada. Então, essa preocupação existia e continua a existir. Nós queremos que as manifestações do Conselho de Direitos Humanos e de outras agências da ONU produzam resultados que façam evoluir, produzam maior liberdade de expressão onde ela não existe. Aí, um pequeno passo já será um progresso.
Mas no governo Dilma essas posições ficaram menos dúbias, mais claras.
Se estiver mais clara eu fico satisfeito. Isso volta ao nosso ponto inicial da conversa sobre importância das palavras e da comunicação. Eu me esforço para comunicar da maneira clara. Já passei seis horas no Congresso Nacional abordando esses temas. Mas acho que é importante que a sociedade compreenda que não é através de uma manifestação em um voto em relação ao país A ou B que você contribui para uma melhora na situação dos direitos humanos no mundo. Não necessariamente.
Mas em países como Cuba e Irã a questão de poder falar é relevante.
Uma contribuição muito grande que se pode dar é o exemplo do Brasil. Nós, aqui, damos uma carta branca convite a todos os relatores especiais da esfera dos Direitos Humanos da ONU para visitar o Brasil. Não precisa ter convite. Agora está vindo o relator sobre a situação carcerária. Quando veio o relator sobre racismo, as conclusões foram incômodas para o Brasil em grande medida, apesar de nós termos a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial. Houve muita conclusão do tipo "existem formas de racismo encoberto". Nós, aqui no Itamaraty, estamos tentando atrair o maior número de afrodescendentes, mas um estrangeiro que chega aqui vai dizer: "Gente, este é um país que tem mais de 50% de afrodescendentes, onde eles estão?". Tem algum aqui nesta sala (no gabinete)? Não tem. Então nós queremos, através dessa abertura à crítica, e abertura ao sistema ONU de direitos humanos, demonstrar que ele pode funcionar como uma alavanca para o progresso.
Foi nesse sentido que, por exemplo, votamos a favor do relator especial para o Irã. Porque o Irã estava se recusando a receber os relatores temáticos. Então, na medida em que não haja uma disposição para receber o relator, é justificável que haja isso (o voto). Mas isso não é contra o Irã, é a favor do sistema ONU e a favor de um sistema que funcione de maneira equilibrada e para tratar de situações no mundo inteiro. E quando tratamos desse tema não existe país que esteja acima do bem e do mal. É muito importante haver uma vigilância internacional respeitada. E quanto mais equânime for (a vigilância), mais respeitada ela será.
Que visão o senhor tem do problema dos direitos humanos em Cuba?
Nós queremos para os outros países o que queremos para o Brasil. No Brasil estamos dando exemplo de avanços. E não acreditamos, em primeiro lugar, na condenação como objetivo da política de direitos humanos. Porque isso não produz, necessariamente, uma evolução. Em Cuba tem havido reformas, houve soltura de presos políticos, houve gestos importantes. No sentido também de reformas econômicas que representam maiores oportunidades para o povo cubano. Cuba vive também uma situação específica, de um embargo de um país poderoso, vizinho, onde residem inúmeros cubanos. Isso penaliza o desenvolvimento econômico da ilha. Aquilo gera uma dinâmica negativa para essa questão. Mas, em última análise, os cubanos terão que procurar o próprio caminho da realização.
Mas há aspectos em Cuba que inspiram outros países. Eu tinha um colega núncio apostólico, em Washington, que tinha servido em Cuba. E ele dizia que em poucos lugares do mundo havia presenciado uma superação tão visível do preconceito racial como em Cuba. Cuba tem muito menos afrodescendentes que o Brasil, algo em torno de 25%, mas tem muito mais embaixadores negros. Tem um nível de educação elevado, faz um papel extraordinário no plano internacional de assistência médica. Estamos cooperando no Haiti. E os haitianos mesmo dizem que, se não fossem os médicos cubanos, a epidemia de cólera teria sido devastadora.
No que o Brasil ajuda quando deixa de votar uma condenação no Conselho de Segurança?

São situações completamente diferentes. Vamos mudar de assunto então?
Estamos falando de deixar de votar tanto no Conselho de Segurança quanto no Conselho de Direitos Humanos.

São situações diferentes. Porque quando você está lidando com segurança coletiva, que é o que a ONU faz, é a decisão mais grave que um país pode tomar: o recurso à coerção ou não. E aí a gente tem que medir de maneira muito responsável em que medida a coerção contribuirá para a estabilização e para a paz. Às vezes isso pode não contribuir para a situação dos direitos humanos. Mas aí o que está implícito é saber quem é que a desestabilização em grande escala prejudica mais. Geralmente o mais pobre, o mais desatendido, aquele que é mais vulnerável e cuja situação dos direitos humanos piorará ainda mais. Então, eu costumo dizer: assim como o credo do médico é não piorar a doença do seu paciente, eu acho que a responsabilidade do diplomata em termos de paz e segurança é não piorar uma situação. Não torná-la mais grave, não torná-la mais instável.
Às vezes, a abstenção é uma maneira de sinalizar "olha, atenção". É um sinal amarelo. Nós não temos como impedir - o Brasil não tem poder de veto -, mas podemos dizer "esse caminho comporta dificuldades e pode...". Vamos pegar o exemplo da Resolução 1.973, da Líbia. Cinco países se abstiveram. Rússia e China se abstiveram. É interessante, pois eles poderiam ter vetado. A abstenção de um membro permanente e com poder de veto também significa "vamos deixar ir adiante". Porque nessas questões ninguém tem o monopólio da sabedoria. É uma avaliação que você faz com base na experiência, naquilo em que você acredita. No Brasil acreditamos muito na diplomacia, no poder de persuasão, em resolver as questões pela conversa, pela negociação e não pela força, necessariamente. A força pode agravar muito a situação. Três meses ou mais depois da Resolução 1.973 o nível de violência na Líbia diminuiu? Não. Ouvi do conselheiro nacional de segurança norte-americano, na quarta-feira, em Washington, que não há solução militar para a Líbia. Então vamos conversar mais, vamos procurar um cessar-fogo monitorado, pode ser pelas Nações Unidas, e com alguma parte de avanço político nas aspirações que, aliás, consideramos mais do que legítimas, tanto que votamos a favor da resolução anterior, que condenava explicitamente (a violência na Líbia).
A sua impressão é de que a situação Líbia está mais perto de uma solução?
Está. Está começando a convergir para um ambiente propício a um encaminhamento que terá que envolver um cessar-fogo, um monitoramento de um cessar-fogo e alguma resposta também às aspirações dos manifestantes. No caso da Líbia existe até essa conotação geográfica, existe uma preocupação com a fragmentação do país. E há entendimentos que levem a transição política, que levem a um processo eleitoral, quem sabe!.
Já a situação da Síria?
Já a Síria está em outro estágio. Ajuda contrastar um pouco com a Líbia porque são circunstâncias diferentes, dentro de um mesmo movimento que assolou o mundo árabe. No caso da Líbia havia um consenso dentro da Liga Árabe. A liga suspendeu a Líbia, votou a favor das resoluções dentro do Conselho de Direitos Humanos, votou a favor da Resolução 1.970 e apoiou a criação da zona de exclusão aérea. Depois, na implementação da Resolução 1.973, apareceram vozes dissonantes. Então o embaixador do Líbano -que é o país árabe que está nesse momento no Conselho de Segurança - teve um trabalho menos complexo para fazer porque refletia posições mais ou menos consensuais.
Agora, na Síria, não existe um consenso entre os árabes. Existe, por exemplo, a percepção, em alguns lugares, de que as alternativas ao governo Assad podem ser mais problemáticas em relação, por exemplo, a minorias. Diferentemente da Líbia, existem minorias significativas. Existem os alauitas, existem os cristãos. Aliás, quase todos os que têm dupla nacionalidade brasileiro-síria são cristãos. Então, essa é uma preocupação brasileira também.
O outro aspecto é que há uma polarização maior entre os membros permanentes do Conselho de Segurança. A gente pode discutir se considera legítimo ou não o poder de veto hoje, mas a verdade é que eles têm poder de veto. Então, numa situação de polarização, uma resolução, mesmo como a primeira que houve sobre a Líbia, não será possível porque a China e a Rússia já deram a entender que vetarão. Eles consideram que é um assunto que tem também potencial desestabilizador em uma região que é da mais alta volatilidade, muito grande. Muito maior que o da Líbia. A Líbia desestabiliza um pouco a Tunísia e o Egito, mas aquilo não vai alterar o quadro complexo de negociação para a situação Israel-Palestina. A Síria, sim. É mais complicado.
E o Brasil...
O Brasil conversa com todos os lados da situação. Mas nos coordenamos muito com Índia e África do Sul, que estão neste momento no Conselho de Segurança. Tentamos avançar na ideia de uma declaração presidencial, que é uma manifestação menos contundente que uma resolução, e que é sempre por consenso. Eu até tive luz verde da China e da Rússia para ir adiante (para tentar aprovar a declaração presidencial), o que me animou, mas depois o Líbano disse que não havia condições.
Agora estamos pensando em fazer uma gestão diplomática de Brasil, Índia e África do Sul em Damasco, junto às autoridades sírias, para reafirmar a inaceitabilidade desse elevado número de mortos e feridos e da violência. E da importância - talvez indo um pouco mais longe que os ocidentais iriam, de dar pleno curso àquilo que eles próprios anunciaram que queriam fazer. Dar um voto maior de confiança a esse desejo do governo Assad de promover reformas políticas, da reforma da lei eleitoral.
Os senhores estão só pensando?
Já está sendo articulada (a gestão). Os embaixadores em Nova York estão trabalhando, até mesmo em termos de referência ampla para uma gestão desse tipo.
Qual será a posição brasileira, se a Autoridade Palestina levar mesmo à abertura da Assembleia-Geral da ONU, em setembro, uma proposta de independência, a contragosto de Israel e EUA?
Voltando atrás um pouquinho, vocês acompanharam, no ano passado, o reconhecimento do Estado Palestino nas fronteiras de 1967. Mais de 100 países haviam tomado essa decisão. Aqui, na nossa região, nem tantos, mas a decisão do Brasil teve um efeito dominó e sucessivos apoios surgiram. O responsável pela propulsão do processo negociador é o quarteto, formado pelo secretário-geral da ONU, Estados Unidos, Rússia e União Europeia. No quarteto tem havido muito pouco avanço. Em uma reunião, há dois dias, em Washington, eles não chegaram sequer a um texto consensuado. O quarteto, por exemplo, também não conseguiu emitir manifestações mais contundentes em relação ao prosseguimento dos assentamentos israelenses em território palestino. Parece estar se esgotando a capacidade do quarteto de estimular movimentos nessa direção. Não nos surpreende que, nesse caso, as autoridades palestinas busquem se fortalecer perante a comunidade internacional. E é isso que representaria uma moção (de independência) na Assembleia-Geral.
Aqui tem um aspecto técnico: para um país se tornar membro da ONU ele apresenta um pedido ao Conselho de Segurança. O conselho recomenda à Assembleia Geral e aí tem que ser por maioria. Mas, historicamente, já houve diferentes situações. Bangladesh foi primeiro à Assembleia-Geral. Legitimou-se, e aí foi ao Conselho de Segurança. Podem surgir situações diferentes. Os palestinos ainda não decidiram exatamente o que vão fazer.
Mas é certo que farão?
Tudo indica que eles estão considerando seriamente em fazê-lo. Em qual a hipótese eles não o fariam? Em que houvesse uma sinalização de parte dos israelenses, do governo norte-americano, do quarteto, de que vão trabalhar para que haja avanços significativos na negociação. Na ausência de algum progresso, eles vão adiante. Um cenário é apresentarem à Assembleia-Geral uma resolução dizendo que, assim como Israel, reconhece-se que a Palestina é um Estado. O outro desenho é eles irem ao Conselho de Segurança, independentemente de um veto provável norte-americano ou não. Porque também há quem calcule que uma resolução com 14 votos a favor e um veto é uma vitória diplomática. São considerações que competem aos palestinos.
O que posso dizer é que o Brasil não terá dificuldades de votar a favor de uma moção na Assembleia-Geral ou no Conselho de Segurança, uma vez que já reconhecemos. Nós consideramos que é apenas o justo reconhecimento de algo que estava desde o início no projeto de criação de dois Estados no Oriente Médio.
Quando falamos em reforma da ONU o que é realmente essencial mudar?
O processo de reforma da ONU já vem acontecendo e já ocorreram várias mudanças, muito significativas, depois do fim da Guerra Fria. Por exemplo, foi criado o Conselho de Direitos Humanos. Antigamente era uma comissão que se reunia apenas uma vez por ano. É uma mudança que representa uma elevação do tratamento dos direitos humanos no sistema ONU. Outro exemplo: foi criada a Comissão de Consolidação da Paz. Essa é uma reivindicação brasileira. A ideia aí era a seguinte: às vezes, uma situação é levada ao Conselho de Segurança porque existe um problema de estabilidade que ameaça a paz internacional. Você estabiliza aquela situação e ela sai da agenda do Conselho de Segurança. Só que, frequentemente, você está lidando com países frágeis, vulneráveis, onde a guerra e a violência destroem toda a estrutura. Esse país cai numa espécie de limbo governamental e isso cria condições para que voltem a surgir situações de instabilidade crônica. Então, o que nós defendíamos (e foi criado) foi uma Comissão de Consolidação da Paz. A comissão meio que recebe os pacientes que saem da UTI para tentar reabilitá-los, e ela está funcionando. A comissão trata de Serra Leoa, de Libéria, de Guiné Bissau.
Mas se você me perguntar o que falta de essencial na reforma da ONU, eu diria que o que falta é reformar a composição do Conselho de Segurança. Porque isso é o que vai ter o maior impacto na dinâmica, no tratamento daquilo que é o que mais tem potencial desestabilizador, que é a guerra e a paz. Por que o G-8 pode passar para G-20? Por que a gente pode modificar as práticas na OMC, por exemplo, com o G-20 comercial contribuindo para que as conversas na Rodada de Doha deixassem de ser só negociação entre o Quad (União Europeia, Estados Unidos, Japão e Canadá) para incluir Brasil e Índia. Por que nós não conseguimos reformar o Conselho de Segurança.
A ONU, agora, passa a ter 193 membros. Quando esse conselho foi criado, a ONU não tinha nem 100 membros. Há um consenso internacional de que o mundo está mais multipolar, que há potências emergentes, que o poder está em fase de realinhamento. Ninguém questiona isso. Mas o Conselho está se tornando anacrônico. Isso é preocupante porque, se o conselho se tornar anacrônico durante muito tempo mais, os países, talvez regiões inteiras, podem deixar de respeitar suas decisões. Isso tem potencial para gerar uma crise política séria no ordenamento internacional.
Se o quadro é tão racional e claro, qual é o nó que amarra essa situação?
Na verdade são alguns nós. Mas o essencial, em um esforço de simplificação, eu diria que se houvesse um consenso entre os cinco membros permanentes (EUA, Rússia, China, frança e Reino Unido) é muito provável que a reforma fosse viável e resolvida dentro de um prazo curto.
O senhor não quer nominar o mais reticente dos cinco?
O mais reticente dos cinco neste momento é a China. Não há dificuldade em nominar porque isso é público. Mas até pouco tempo atrás os Estados Unidos eram muito reticentes. A China não é contra a reforma em si, mas resiste ao aumento do número de países com poder de veto. Os Estados Unidos sinalizam que estão preparados para contemplar seriamente uma reforma. E eu acredito que a China também evoluirá no seu pensamento, talvez quando se chegar mais próximo de uma decisão efetiva. De qualquer maneira, essa é uma condição importante mas não é o suficiente. É importante também encontrar apoio de dois terços da comunidade internacional. Estamos muito próximo do apoio de dois terços para fórmulas que envolvam a ampliação nas duas categorias de membros, permanentes e não permanentes. Isso é um trabalho que o G-4 (Brasil, Japão, Alemanha e Índia) faz de coordenação conjunta e, recentemente, escreveram uma carta ao presidente da Assembleia-Geral da ONU com uma lista de assinaturas de países que apoiam a ampliação nas duas categorias. E essa lista se aproxima muito de 100. Mas, verbalmente, mais uns tantos países indicaram que também apoiariam. Isso é significativo porque são necessários 128 votos na Assembleia-Geral para passar uma resolução que reforme o Conselho de Segurança. E, depois, precisa da ratificação de uma maioria de membros da ONU, inclusive os cinco membros permanentes. Mas se um membro permanente não ratificar, não entra em vigor. Então o nó é esse.
O Haiti ainda está no Conselho de Segurança, é um assunto preponderantemente militar. Até quando? O contingente militar da missão de paz da ONU vai diminuir?
Eu acabei de passar pelo Haiti. A operação da paz na ONU contribuiu de maneira muito significativa para reduzir o nível de violência. E isso foi feito graças a uma ação que é unanimemente elogiada das tropas brasileiras, que trabalham, claro, em conjunto com tropas de muitos outros países. De modo que houve uma inflexão benigna, que permitiu, inclusive, que o terremoto do ano passado não voltasse a desestabilizar tudo. Quando o terremoto ocorreu havia vozes que diziam, "ih, todo o trabalho da ONU vai por água abaixo porque prisões ruíram, criminosos perigosos saíram por aí". Não aconteceu isso. A população haitiana deu uma demonstração de civismo extraordinário.
Eu fui várias vezes ao Haiti durante o terremoto. Vocês sabem que minha mulher estava lá durante o terremoto. E o que nós presenciamos foi um comportamento digno, com consciência cívica, sem turbulências graves. De modo que o trabalho da Minustah já tinha servido para estabilizar o país em grande medida. Só que o terremoto praticamente destruiu o país. E aí foram autorizadas tropas adicionais pelo Conselho de Segurança. Mais batalhões de engenharia, porque há conexão entre você conseguir circular pela cidade e a capacidade da cidade sobreviver em condições mínimas de paz e estabilidade. Eu fiquei bem impressionado agora. As artérias principais estão todas desimpedidas, poucos prédios ruindo. Continuam várias praças tomadas por tendas de plástico, mas o número de desabrigados também está diminuindo. E um novo governo tomou posse.
Não foi simples essa transição democrática. Mas nós também temos que lembrar que na história do Haiti essa foi a primeira vez que há duas sucessivas transições democráticas. E, agora, de um partido de mais centro-esquerda para um governo mais de centro-direita. Então, ainda é uma situação que requer um monitoramento para vermos como ela evolui.
Mas a opinião predominante que eu colhi é de que sim, nesse atual estágio podemos contemplar uma redução gradual de efetivos militares. Eu recebi, inclusive, o antigo representante do secretário geral da ONU para o Haiti, Edmond Mulet. Depois que morreu o sucessor dele no terremoto, ele foi chamado de volta. E ele é da mesma opinião, acha que hoje em dia o fundamental é a presença da Minustah em Porto Príncipe e que, gradualmente, se poderá reduzir o número de tropas nas províncias. Talvez o teste derradeiro seja a próxima eleição, a próxima transição. Mas, já em outubro, quando se discutirá no Conselho de Segurança a renovação do mandato da Minustah, estará em pauta a questão no número de efetivos. E o mais provável é que contemple alguma redução.
O desafio, a partir daí, e nós defendemos muito isso no conselho, é implementar uma concepção de que paz e desenvolvimento interligados, contribuir para o soerguimento da economia haitiana, desenvolvimento social, geração de emprego. Não só ajuda, mas também que tipo de gestão pública. Aí também há a questão da reforma constitucional, que permita a dupla nacionalidade. Há uma diáspora haitiana muito bem sucedida no Canadá e nos Estados Unidos. Hoje em dias eles não podem ter (a dupla nacionalidade) e isso afugenta o investidor.
A polêmica sobre os arquivos, a Lei de Acesso à Informação brasileira, isso está superado da parte do Itamaraty? Sim ou não?
Acho que a sociedade precisa ser informada um pouco melhor sobre a lei e fico grato de ouvir você se referir a ela como a uma lei de acesso à informação, porque não é uma lei de sigilo. Isso é uma conquista importante.
A questão do acesso ao trabalho da diplomacia é objeto de tratamento diferenciado em qualquer democracia avançada do mundo. Reino Unido, Estados Unidos, Dinamarca, ou até em um país de nível de desenvolvimento mais comparável ao Brasil, como Índia, África do Sul ou Turquia. Na França tem sigilo de até 150 anos e há temas que não podem ser objeto de consulta, como coisas relacionadas a guerras coloniais. Na Inglaterra, informação confidencial oferecida por outro governo não pode ser objeto de acesso. Então, é normal que haja um tratamento diferenciado dessa matéria.
Nós aqui estamos em um contexto o mais benigno, que é o de convívio harmonioso, de cooperação com todos os vizinhos. O nível e o grau das nossas preocupações é comparativamente menor, mas seria uma irresponsabilidade não examinarmos com cuidado as implicações para a diplomacia neste debate. O que acontece é que o projeto de lei que está no Congresso satisfaz em linhas gerais. Agora, é importante a sociedade saber que é um tema tratado de forma diferenciada em todos os países. Ele envolve uma responsabilidade diferenciada do governo e do agente diplomático. Não é à toa que o soldado que está na origem dos WikiLeaks está sendo processado.
Na relação Brasil-EUA, a questão do Irã, quando o Brasil e a Turquia tentaram intermediar um acordo nuclear, que gerou um mal estar com os Estados Unidos, está superada?
Isso, hoje em dia, enseja uma reflexão interessante. Primeiro, os Estados Unidos foram sempre mantidos informados de tudo que estava ocorrendo. Eu próprio, como vice-ministro e ex-embaixador em Washington, me encarregava de conversar com o embaixador Bill Burns - agora promovido a número dois - sobre o que a gente estava fazendo. Nunca houve uma atitude de fazer uma coisa sigilosamente, foi tudo feito de maneira transparente. E foi feito com base, inclusive, em elementos de uma carta do presidente Obama. Aqueles elementos que fizeram parte do acordo bilateral. O que pode ter acontecido foi uma certa ousadia diplomática. No sentido de dois países que à época eram membros não permanentes do Conselho de Segurança - é bom lembrar, porque é uma maneira de atuar no Conselho de Segurança sem esperar que a iniciativa sempre parta do membro permanente. Isso muita gente aplaudiu, independentemente de achar (que a ação diplomática) foi bem fundamentada ou que deveria ter sido feita.
É bom lembrar o que a medida propunha. Não era solucionar a questão nuclear do Irã. Propunha-se contribuir para uma medida de criação de confiança. Porque aí sim o grau de desconfiança é elevadíssimo entre os iranianos e os norte-americanos. Em função de circunstâncias históricas que a gente conhece. Então, a proposta era essa: um pequeno passo na construção da confiança com base em elementos fornecidos pelos Estados Unidos. Agora, que envolveu uma ousadia, envolveu. E a ousadia pode desconcertar alguns. Mas eu diria que nos Estados Unidos houve muita compreensão também.
Mas o que eu ia dizer, e que enseja uma reflexão interessante, é que à época havia quem defendesse, algumas vozes críticas do acordo Brasil-Turquia com o Irã, que era uma coisa ingênua. Que o que iria levar o Irã a fazer concessões eram sanções adicionais. Bom, as sanções adicionais foram adotadas, inclusive com voto negativo do Brasil e da Turquia. Um ano depois, produziu alguma concessão? Não. O Irã hoje tem mais urânio levemente enriquecido que há um ano. Ou seja, se o acordo tivesse sido implementado teria pelo menos feito com que o Irã tivesse se desfeito de uma porção do seu urânio e o colocasse na Turquia sob inspeção internacional. Então, para mim, isso ilustra de uma maneira muito clara que a alternativa apresentada como mais realista e menos ingênua não produziu qualquer resultado.
Agora, mais uma vez, não era uma panaceia, não era o que iria resolver. A questão é mais complexa. Existe uma desconfiança e, até o Brasil reconhece, uma desconfiança justificada porque o governo iraniano não desfez todas as dúvidas da Agência Internacional de Energia Atômica sobre aspectos do seu programa nuclear. E isso requer uma atenção da comunidade internacional.
O Brasil elegeu José Graziano para a FAO, mas uma das principais preocupações da agência da ONU é com o aumento no preço dos alimentos, o que rende muito dinheiro para o Brasil. Falou-se, no G-20, de alguma forma de controle do preço dos alimentos, mas o Brasil se aliou aos Estados Unidos e não quer nem ouvir falar nisso. Não é uma contradição?
Primeiro temos que ver os mandatos de cada organismo. O que a FAO faz? Ela promove desenvolvimento rural e segurança alimentar. São dois temas em que o Brasil tem muito a contribuir. Essa é a plataforma em torno da qual a candidatura Graziano foi apresentada e foi vitoriosa. Acho que sensibilizou, embora houvesse cinco outras candidaturas. Foi realmente uma campanha que mobilizou o Itamaraty inteiro e eu fiquei muito satisfeito com o resultado porque eu me empenhei pessoalmente.
A outra questão é o comércio internacional agrícola, que é tratado na OMC. E flutuações de preços são indicadas por uma série de circunstâncias, de oferta, demanda, não está sob controle do Brasil. O que gostaríamos de ver, sim, é a eliminação de subsídios agrícolas que distorcem o comércio de uma maneira que prejudica o pequeno agricultor e os países mais vulneráveis. Por exemplo, os produtores de algodão da África Ocidental, que fazem parte da nossa plataforma de condições do nosso painel, que foi vitorioso na OMC, em crítica às práticas distorcidas dos Estados Unidos. E essa é uma injustiça que vai contra a filosofia que a OMC prega para o setor de bens industriais. Essa sim é uma contradição que é muito gritante e que penaliza o mais vulnerável. Agora, questão de flutuação de preços é uma questão que depende de circunstâncias do próprio mercado e da oferta. O que nós queremos é ver o mundo em desenvolvimento, que não tem condições de subsidiar sua agricultura, poder se beneficiar de melhores condições de produção, de desenvolvimento rural e de comércio internacional. Mas comércio internacional não é tratado na FAO.
Sim, o comércio internacional não é tratado na FAO, mas é uma questão que a FAO fala, da alta dos preços dos alimentos. E o Brasil hoje é um dos maiores produtores mundiais de alimentos.
Mas o Brasil também é hoje um importante doador, cada vez mais. Então, a gente quer também colocar os benefícios que auferimos da agricultura, até mesmo da elevação dos preços, a serviço de uma causa equânime.
Os senhores, no Itamaraty, foram surpreendidos pela Primavera Árabe?
A extensão dela é surpreendente. A surpresa não foi para nós, mas para toda a comunidade internacional. É como perguntar "a comunidade internacional foi surpreendida com o fim da União Soviética?" Naquele ritmo de acontecimentos, foi. É difícil encontrar alguém que tivesse previsto. De modo que a extensão do fenômeno foi surpreendente, é surpreendente e é importante. Talvez um dos fatos políticos mais significativos deste ano. E é um desafio diplomático importante também. Porque embora haja um denominador comum de busca por maior expressão da população jovem árabe, e reforma política, emprego e reforma econômica, há especificidades.

O mundo de ponta cabeca: PDVSA acha que Petrobras caiu na corrupcao...

Onde vamos parar?
Uma companhia proba, honesta, correta, transparente como a PDVSA não pode conviver com doses mínimas que sejam de corrupção nessa aliança importante que ela tem com outra companhia honesta, transparente, isenta de qualquer suspeita.
Assim não é possível: trabalhar com desconfiança, isso não...
Paulo Roberto de Almeida

A PDVSA e a Petrobrás
Editorial - O Estado de S.Paulo
16 de julho de 2011

Causa espécie a informação de que a estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA) propôs à Petrobrás a contratação de uma consultoria independente para auditar o custo da Refinaria Abreu e Lima, em construção no Porto de Suape (PE). Estaria a PDVSA desconfiando do custo real da obra ou teria indícios de irregularidades? Nessa hipótese, a opinião pública brasileira tem o direito de tomar conhecimento dos fatos que alimentam as suspeitas, cabendo à Petrobrás prestar esclarecimentos. Mas há uma outra hipótese. A PDVSA, que deveria ser responsável por 40% do valor dos investimentos totais na refinaria e que até agora não colocou um centavo na obra, poderia estar recorrendo a uma artimanha para se desvencilhar do compromisso, o que não seria uma atitude inusitada dados os embustes característicos do governo atrabiliário do coronel Hugo Chávez.

É verdade que o custo da Refinaria Abreu e Lima, estimado em 2008 em US$ 10 bilhões, não para de subir. De lá para cá, o orçamento da obra foi elevado sucessivamente para US$ 11,9 bilhões, US$ 12,6 bilhões e US$ 13,36 bilhões. E, recentemente, como informa reportagem do Estado de 12/7, a Petrobrás comunicou à estatal venezuelana que, pela última revisão, a obra poderá custar US$ 14,4 bilhões. Deve-se notar que a PDVSA não participa do planejamento orçamentário da obra, podendo advir desse fato a solicitação de uma consultoria independente.

O caso, porém, é mais complexo. Da parcela que caberia à estatal venezuelana, 40% deveriam ser financiados pelo BNDES, que por duas vezes recusou as garantias apresentadas pela empresa e agora examina uma terceira. Enquanto isso, a Petrobrás já desembolsou R$ 7 bilhões na construção da refinaria, estando 35% das obras concluídas. Se, até agosto, a PDVSA não cumprir seu compromisso, os técnicos da Petrobrás consideram inviável dar sequência ao projeto inicial, que previa o processamento de tipos diferentes de óleo originários dos campos de exploração do Brasil e da Venezuela. A refinaria processaria petróleo com alto teor de enxofre, sendo o valor dos equipamentos necessários para isso estimado em US$ 400 milhões, enquanto a PDVSA calcula que não custariam mais que US$ 200 milhões.

Questões técnicas à parte, analistas lançam dúvidas quanto ao interesse real do governo venezuelano pela Refinaria Abreu e Lima. Apesar da alta do petróleo, a economia da Venezuela ainda se ressente dos efeitos da crise internacional, que fez seu PIB ter uma retração de 3,3% em 2009 e de 2,5% em 2010. Para este ano, as estimativas são de um crescimento de 2,3%. A crise não afetou a ajuda a Cuba, que custa à Venezuela US$ 3,5 bilhões por ano em vendas de petróleo a preços subsidiados, e a conexão entre os dois países deve ampliar-se pelo menos enquanto Chávez detiver o poder. A Venezuela se comprometeu com pesados investimentos de infraestrutura em Cuba, os quais incluem a expansão de uma refinaria de petróleo em Cienfuegos. Grande parte do petróleo extraído pela PDVSA, por sinal, já é refinada na região do Caribe.

Além disso, o interesse maior da Venezuela está em desenvolver as riquíssimas jazidas de petróleo pesado da Bacia do Orinoco. Se as vantagens econômicas para a PDVSA da parceria com a Petrobrás na refinaria pernambucana são duvidosas, seriam nulos os dividendos políticos para Chávez, que não mantém hoje com o Brasil o mesmo tipo de relação que desfrutava durante o governo do ex-presidente Lula. Nas condições atuais, por exemplo, não seria levada a sério a ideia de Chávez de bancar a construção do mirabolante projeto do oleoduto do Mercosul, lançado há alguns anos, e que partiria de Puerto Ordaz, na Venezuela, e chegaria a Buenos Aires, passando pelo Brasil, numa extensão de 6.600 km.

Se a parceria da PDVSA na refinaria pernambucana não der certo, a Petrobrás tocará a obra sozinha. O Brasil precisa de novas refinarias para ser autossuficiente não só em petróleo bruto, mas também em derivados. Contudo, qualquer que seja a evolução dos acontecimentos, é obrigação da Petrobrás deixar tudo em pratos limpos.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Brasileiras e brasileiros: o segundo pronunciamento à Nação (furo inedito)

Brasileiras e brasileiros: meu segundo pronunciamento à Nação (numa hora grave)
Rascunho para pronunciamento em rede nacional
(sob revisão da própria)

(Explicação)
Estamos em condições de novamente antecipar, como já o fizemos anteriormente, teor de pronunciamento à Nação que a presidente pretende fazer a qualquer momento, tendo em vista os graves desenvolvimentos recentes ocorridos no plano do governo federal, em suas relações com a administração pública e com o Congresso Nacional. Com efeito, por ocasião do primeiro pronunciamento público da presidente – também captado pelas nossas redes de informação, como revelado nestes links: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/12375/6547 e http://www.viapolitica.com.br/noticia_view.php?id_noticia=409 – o tema era o da construção de um governo íntegro, eficiente e capaz de conduzir o Brasil por caminhos nunca antes tentados na história deste país, qual seja, o da moralidade na coisa pública e a mais perfeita retidão na condução dos negócios do Estado. Como acontecimentos recentes podem ter dado a impressão de que não se estava conseguindo trilhar esse caminho, a presidente resolver manifestar-se diretamente à Nação, através da qual ela também fala ao Congresso Nacional, aos partidos políticos e a todos os cidadãos de bem. O que segue abaixo, portanto, é uma versão inédita, ainda não pronunciada, de importante manifestação pública da principal autoridade política do país, e que pode sofrer pequenos ajustes no momento da gravação e alocução em rede nacional.

Brasileiras e brasileiros,
Resolvi dirigir-me novamente a vocês, depois do primeiro pronunciamento público feito no começo do meu governo, como uma forma de prestar-lhes contas do que venho fazendo, falar-lhes dos problemas que venho enfrentando, mas também para pedir o apoio de todos vocês, simples cidadãos, meus eleitores ou não, nesta hora grave que o país atravessa. Vou ser clara, direta e não pretendo esconder de ninguém, sobretudo daqueles diretamente envolvidos, a gravidade do momento que estamos vivendo.
Todos vocês sabem que no meu discurso de posse eu tinha prometido não ser, jamais, tolerante com a corrupção e com o desmazelo no trato da coisa pública. Pois bem, quero retomar esse mesmo tema para anunciar-lhes algumas decisões importantes que pretendo tomar e para as quais vou precisar da solidariedade de todos vocês, simples eleitores, homens e mulheres do povo, quer tenham votado em mim, ou não, quer partilhem de minha filosofia de governo ou não. Não se trata mais, agora, de um governo, mas sim da sobrevivência da Nação, enquanto entidade digna, respeitada, de uma comunidade da qual possamos nos orgulhar e não sentir vergonha como hoje sentimos, em função do acúmulo de tantos e tão repetidos gestos de corrupção que ocorrem continuamente em várias esferas do Estado e que parecem contaminar também o meu governo.
Não quero ser a presidente que vai assistir ao desenrolar de mais um “mar de lama”, como já se referiu ao cenário nacional de sua época um presidente que acabou se suicidando para não ter de conviver com a sujeira que se estendia em diversos poros do Estado e que já estava alcançando o palácio do governo. Vocês sabem que eu me refiro ao presidente Getúlio Vargas. Muito embora eu não queira me comparar a esse grande estadista – mas que também teve sua fase de ditador – eu preciso, sim, demarcar agora o terreno que separa um governo limpo do mar de lama que ameaça se espalhar por vários órgãos do Estado. Ninguém está cogitando, é óbvio, uma solução do tipo da de Getúlio Vargas para os problemas atuais do governo, nem vou pedir que alguém se suicide, mas em alguns momentos é preciso tomar medidas tão drásticas quanto, e é sobre isto, justamente, que eu quero agora lhes falar.
Todos vocês já sabem, por acompanharem os eventos, que eu tive de me desfazer de dois ministros – e trocar outros dois – por causa de assuntos que estavam ligados a denúncias de corrupção. Mesmo que devamos dar todo o direito de defesa a todo e qualquer cidadão acusado de algo que possa parece obscuro e mal explicado aos olhos do público, meu dever, como responsável política última por tudo o que se refere à administração federal, é o de manter a lisura e a correção na condução dos assuntos do Estado, de maneira a preservar a mais absoluta transparência na alta cúpula do governo.
Pois bem, quero anunciar a vocês, solenemente, que não tolerarei, de forma alguma, qualquer desvio de conduta em meu governo, e que pretendo, a partir de agora, reformular toda a administração, tendo por base não só a competência técnica e a preparação individual, mas, sobretudo, o critério da conduta ilibada e da mais absoluta probidade na carreira. Esta é uma decisão minha, só minha, mas vou precisar do apoio de todos vocês para implementar as duras medidas que sou obrigada a adotar nesta conjuntura.

Pois bem, meus caros concidadãos,
Como vocês vêm acompanhando nas últimas semanas, diferentes personagens políticos, do meu governo e do Congresso, se envolveram em atos reprováveis, sob qualquer ponto de vista: licitações viciadas, compras governamentais dirigidas, obras superfaturadas, revisão de contratos com aumentos abusivos de preços, roubo puro e simples de recursos públicos, sob o manto de “problemas administrativos”, ou simples “ajustes nos editais”. O TCU, a Polícia Federal e, mais do que tudo, a imprensa livre, não aquela que também se locupleta de verbas públicas, vem denunciando inúmeros caso, com fartas evidências documentais quanto ao mar de lama em que se transformou a administração do Estado no Brasil. Isso não é mais possível de tolerar, e eu não pretendo tolerar. Mesmo que tenhamos de deixar a última palavra à Justiça, a primeira palavra quando o assunto toca o governo é minha, e eu não quero mais suportar desconfianças e acusações contra funcionários e servidores que deveriam ser da minha mais total confiança.
Assim, ao menor sinal de incorreção e mesmo de dúvidas sobre a conduta deste ou daquele servidor, pode ser um ministro ou o mais humilde funcionário, vou determinar o afastamento dos envolvidos até o completo esclarecimento da questão. Não vou mais passar a mão na cabeça de ninguém, como muitas vezes ocorreu neste país. Agora não mais. Isso tem de terminar.
E vou começar reformulando todo o governo, da maneira mais radical que vocês já viram acontecer no Brasil. Como eu aprendi que não adianta colocar cadeado em porta arrombada, e também que, onde existe dinheiro público sempre vai ter um espertinho para querer dele se apossar, minha proposta é muito simples: reduzir radicalmente todos os condutos por onde passa o dinheiro público, o que começa, obviamente, pelo enxugamento significativo da máquina pública. Pois se é dela que saem as malversações, e que não se consegue combatê-las aumentando a fiscalização – pois a experiência demonstrou que tudo pode ser burlado, e mesmo a fiscalização corrompida – minha decisão vai no sentido de simplesmente cortar o mal pela raiz. A partir de agora, a palavra de ordem é reduzir tudo o que pode ser reduzido no Estado, e devolver o dinheiro aos cidadãos para que eles mesmos possam decidir como gastar o dinheiro que é deles.

Pensem bem, brasileiros e brasileiros,
O Estado no Brasil arranca cada ano, do bolso de vocês e do caixa das empresas, quase a metade do que vocês ganham ou do que as empresas faturam, a pretexto de prestar serviços públicos de qualidade. A qualidade desses serviços, como vocês sabem, é uma piada, a começar por escolas, hospitais, estradas e portos federais; nem preciso aqui lembrar qualquer caso, pois vocês sabem do que estou falando. Agentes do Estado conseguem, inclusive, roubar os recursos adicionais de solidariedade que vocês entregam a eles para remediar as tragédias e infelicidades que se abatem sobre populações mais humildes, como ainda agora ocorreu com as inundações na região serrana do Rio. Isso é simplesmente intolerável, além de ser um crime.
Eu cheguei à conclusão, caros cidadãos, que o Estado no Brasil está falido, e que não conseguiremos consertá-lo rapidamente, não com o sistema político que temos hoje. Daí minha decisão de começar a enxugar radicalmente a máquina do Estado e de começar a devolver o dinheiro que o Estado rouba, literalmente, de vocês, para gastar com o próprio Estado.
Sei que ao anunciar estas decisões, estou provocando a oposição, até a ira, de interesse poderosos, encastelados na própria máquina do Estado, no Executivo, no Congresso e talvez até no Judiciário. Vozes vão se levantar contra as minhas medidas e o coro dos descontentes, dos que sempre se aproveitaram do Estado, vai aumentar, até se tornar ensurdecedor. Vou precisar da ajuda de vocês nesta tarefa moralizadora e restauradora do verdadeiro sentido do Estado. Este só vai fazer aquilo que não puder ser feito diretamente pela cidadania, com regras de concorrência transparente, de oferta de serviços ao melhor preço, e vocês vão ter dinheiro para pagar por esses serviços, pois o Estado vai deixar de extorquir indevidamente os seus recursos. Eu quero que vocês assumam a responsabilidade pelas suas vidas, não que esperem que o Estado sempre atenda a tudo e a todos como se ele fosse um criador de riquezas, quando ele não é.

Não se iludam, brasileiras e brasileiros,
Não existe nada, repito e sublinho, NADA, que o Estado possa fazer, sem que antes ele tenha tirado os recursos de algum lugar, pois o Estado não cria nenhuma riqueza, ele simplesmente não produz renda do nada. Tudo o que ele faz é com a renda e a riqueza que vocês, e as empresas nas quais vocês trabalham, produziram, com o seu esforço, com o seu empenho, com a sua dedicação.
Pois eu quero agora dar um destino melhor ao dinheiro de vocês, evitando que ele se perca nos desvãos da burocracia estatal e acabe parando nos bolsos e nas contas bancárias de meliantes que vivem sugando o Estado, que vivem se locupletando do Estado, que vivem pedindo cargos públicos para melhor se apossarem desses recursos.
Isso tem de acabar meus caros concidadãos, e tem de acabar agora.
Mas eu só vou conseguir com a ajuda de vocês, com o apoio de cada um e de cada uma às medidas que vou anunciar prontamente. Conto com vocês, povo trabalhador, para mudar o Brasil para melhor, pois vocês são o que de melhor o Brasil já produziu como gente valorosa.
Vamos conseguir. Muito obrigado.
Boa noite a todos.

Com a ajuda eventual de Paulo Roberto de Almeida
(para algumas ideias mais corajosas...)
Brasília, 12 julho 2011.

Calote americano?: não seria a primeira vez - John S. Chamberlain (Mises Daily)

A Short History of US Credit Defaults
by John S. Chamberlain
Mises Daily, July 15, 2011

On July 13th, the president of the United States angrily walked out of ongoing negotiations over the raising of the debt ceiling from its legislated maximum of $14.294 trillion dollars. This prompted a new round of speculation over whether the United States might default on its financial obligations. In these circumstances, it is useful to recall the previous instances in which this has occurred and the effects of those defaults. By studying the defaults of the past, we can gain insights into what future defaults might portend.
The Continental-Currency Default

The first default of the United States was on its first issuance of debt: the currency emitted by the Continental Congress of 1775. In June of 1775 the Continental Congress of the United States of America, located in Philadelphia, representing the 13 states of the union, issued bills of credit amounting to 2 million Spanish milled dollars to be paid four years hence in four annual installments.

The next month an additional 1 million was issued. A third issue of 3 million followed. The next year they issued an additional 13 million dollars of notes. These were the first of the "Continental dollars," which were used to fund the war of revolution against Great Britain. The issues continued until an estimated 241 million dollars were outstanding, not including British forgeries.

Congress had no power of taxation, so it made each of the several states responsible for redeeming a proportion of the notes according to population. The administration of these notes was delegated to a "Board of the Treasury" in 1776. To refuse the notes or receive them below par was punishable by having your ears cut off and other horrible penalties.

The notes progressively depreciated as the public began to realize that neither the states nor their Congress had the will or capacity to redeem them. In November of 1779, Congress announced a devaluation of 38.5 to 1 on the Continentals, which amounted to an admission of default. In this year refusal to accept the notes became widespread, and trade was reduced to barter — causing sporadic famines and other privations.

Eventually, Congress agreed to redeem the notes at 1,000 to 1. At a rate of 0.82 troy ounces to the Spanish milled dollar, if we take the current (July 2011) price of silver, $36 to the troy ounce, this first default resulted in a cumulative loss of approximately $7 billion dollars to the American public.

Benjamin Franklin characterized the loss as a tax. Memory of the suffering and economic disruption caused by this "tax" and similar bills of credit issued by the states influenced the contract clause of the Constitution, which was adopted in 1789:

No State shall enter into any Treaty, Alliance, or Confederation; grant Letters of Marque and Reprisal; coin Money; emit Bills of Credit; make any Thing but gold and silver Coin a Tender in Payment of Debts; pass any Bill of Attainder, ex post facto Law, or Law impairing the Obligation of Contracts.

The Default on Continental Domestic Loans
In addition to its currency issuance, the Continental Congress borrowed money both domestically and abroad. The domestic debt totaled approximately $11 million Spanish dollars. The interest on this debt was paid primarily by money received from France and Holland as part of separate borrowings. When this source of funding dried up, Congress defaulted on its domestic debt, starting on March 1, 1782. Partial satisfaction of these debts was made later by accepting the notes for payments of taxes and other indirect considerations.

In an act of 1790, Congress repudiated these loans entirely, but offered to convert them to new ones with less favorable terms, thereby memorializing the default in the form of a Federal law.

The Greenback Default of 1862
After the Revolutionary War, the Congress of the United States made only limited issuance of debt and currency, leaving the problems of public finance largely to the states and private banks. (These entities defaulted on a regular basis up to the Panic of 1837, in which a crescendo of state defaults led to the invention of the term "repudiation of debts.")

In August of 1861, this balance between local and federal finance switched forever; the Civil War induced Congress to create a new currency, which became known as the "greenback" due to the green color of its ink. The original greenbacks were $60 million in demand notes in denominations of $5, $10, and $20. These were redeemable in specie at any time at a rate of 0.048375 troy ounces of gold per dollar. Less than five months later, in January of 1862, the US Treasury defaulted on these notes by failing to redeem them on demand.

After this failure, the Treasury made subsequent issues of greenbacks as "legal-tender" notes, which were not redeemable on demand, except through foreign exchange, and could not be used to pay customs duties. Depending on the fortunes of war, these notes traded for gold at a discount ranging from 20 percent to 40 percent. By the stratagem of monetizing this currency with bonds and paying only the interest on those bonds in gold acquired through customs fees, Lincoln's party financed the Civil War with no further defaults.

The Liberty Bond Default of 1934
The financing of the United States government stepped up to a whole new level upon its entry into the Great War, now known as World War I. The new enterprises of the government included merchant-fleet maintenance and operation, production of ammunition, feeding and equipping soldiers entirely at its own expense, and many other expensive things it had never done before or done only on a much smaller scale.

To finance these activities, Congress issued a series of debentures known as "Liberty Bonds" starting in 1917. The preliminary series were convertible into issues of later series at progressively more favorable terms until the debt was rolled into the fourth Liberty Bond, dated October 24, 1918, which was a $7 billion dollar, 20-year, 4.25 percent issue, payable in gold at a rate of $20.67 per troy ounce.

By the time Franklin Roosevelt entered office in 1933, the interest payments alone were draining the treasury of gold; and because the treasury had only $4.2 billion in gold it was obvious there would be no way to pay the principal when it became due in 1938, not to mention meet expenses and other debt obligations.

These other debt obligations were substantial. Ever since the 1890s the Treasury had been gold short and had financed this deficit by making new bond issues to attract gold for paying the interest of previous issues. The result was that by 1933 the total debt was $22 billion and the amount of gold needed to pay even the interest on it was soon going to be insufficient.

In this exigency, Roosevelt decided to default on the whole of the domestically held debt by refusing to redeem in gold to Americans and devaluing the dollar by 40 percent against foreign exchange. By taking these steps the Treasury was able to make a partial payment and maintain foreign exchange with the critical trade partners of the United States.

If we price gold at the present-day value of $1,550 per troy ounce, the total loss to investors by the devaluation was approximately $640 billion in 2011 dollars. The overall result of the default was to intensify the depression and trade reductions of the 1930s and to contribute to fomenting World War II.

The Momentary Default of 1979
The Treasury of the United States accidentally defaulted on a small number of bills during the 1979 debt-limit crisis. Due to administrative confusion, $120 million in bills coming due on April 26, May 3, and May 10 were not paid according to the stated terms. The Treasury eventually paid the face value of the bills, but nevertheless a class-action lawsuit, Claire G. Barton v. United States, was filed in the Federal court of the Central District of California over whether the treasury should pay additional interest for the delay.

The government decided to avoid any further publicity by giving the jilted investors what they wanted rather than ride the high horse of sovereign immunity. An economic study of the affair concluded that the net result was a tiny permanent increase in the interest rates of T-bills.

What Will Happen in August of 2011?
Many people are wondering about the possibility of a default by the Treasury on August 3, 2011, when, according to the Treasury's projections, it will no longer be able to meet all expenses without additional borrowing.

In this event, it is unlikely a default will occur. Historically, governments prioritize debt service above all other expenses. If the expansion of funds via debt becomes ipossible, the Treasury will cease paying other expenses first, starting with "nonessential" discretionary expenditures, and then it will move on to mandatory expenditures and entitlements as a last resort.

In extremis, what will happen is that all the losses will be foisted onto the Federal Reserve. The Fed holds something on the order of $1.6 trillion in debt issued by the Treasury of the United States. By having the Federal Reserve purchase blocks of Treasury debt and defaulting on these non-investor-held securities, the United States can postpone a default against real investors essentially forever.

John S. Chamberlain lives in Natick, Massachusetts, and works as a software engineer specializing in earth science and artificial intelligence. He has an A.B. in politics from Princeton University and an M.S. in computer science from Northeastern University. Send him mail. See John S. Chamberlain's article archives.

Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI (1/2011): Guerra e Paz de Portinari

Instituto Brasileiro de Relações Internacionais
Revista Brasileira de Política Internacional
Editorial da Edição Vol. 54 – No. 1 (1/2011) da RBPI
Guerra e Paz, traduções do nosso tempo
por Antônio Carlos Lessa
Publicação decana da área no Brasil, com mais de cinquenta anos de circulação, a Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI desde a sua fundação foi diagramada com capas padronizadas, que mudaram apenas duas ou três vezes ao longo da sua história. Desde 2004 temos empreendido um esforço de rejuvenescimento do padrão gráfico da Revista, com capas especialmente preparadas para cada uma das edições, de modo a emprestar-lhe leveza e modernidade. A idéia é a de singularizar a nossa publicação nas estantes dos nossos leitores, fazê-la ponto de referência visual e, para além do seu conteúdo, tornar a sua apresentação um ponto de observação e de nota.

Até o momento, não tivemos a oportunidade de ocupar o espaço nobre da capa das nossas edições com homenagens – talvez pela desconfiança de que uma revista científica não seria o espaço adequado para manifestações dessa natureza, ou porque não tenhamos tido até então um fato marcante o bastante, e de interesse geral, que o justificasse. A transferência dos painéis Guerra e Paz, de Cândido Portinari, para obras de restauro no Brasil, nos oferece essa primeira oportunidade e, por isso, as capas das duas edições do nosso volume 54, referente a 2011, estamparão as duas magníficas imagens.[1]

Os painéis foram doados pelo governo brasileiro à Organização das Nações Unidas, e inaugurados no hall dos Delegados da Assembléia Geral em setembro de 1957. No nosso ponto de vista, os painéis sugerem de modo dramático as circunstâncias do mundo em que vivemos, e são hoje, tanto quanto no momento em que foram concebidos, a expressão de crise internacional, e também a de seu remédio. São, portanto, uma expressão gráfica perfeita do nosso objeto, da agenda de pesquisa de todos quantos se dediquem ao estudo das Relações Internacionais, que de certo modo repercutimos nas edições da RBPI desde 1958.

A sua execução esgotou a saúde de Cândido Portinari, artista que fez do Brasil o seu grande tema, numa obra de caráter social e trágico, mas que se superou com a linda homenagem que o Brasil fez à ONU. Na inauguração dos painéis, o Embaixador Cyro de Freitas Valle, chefe da delegação brasileira à Assembléia Geral, resumiu com perfeição o significado dos painéis, e a importância de terem sido concebidos e executados por um dos maiores artistas brasileiros: “…o Brasil está oferecendo hoje às Nações Unidas o que acredita ser o melhor que tem para dar”.

Nós agradecemos à equipe do Projeto Portinari pelo suporte técnico para a reprodução das imagens e, especialmente, ao Professor João Cândido Portinari, filho do grande artista brasileiro, pelo apoio que nos deu. A permissão para a reprodução do trabalho de seu pai em nossa Revista viabilizou essa homenagem, que é nossa, e de todos os que acreditam que as inquietações expressadas em Guerra e Paz são também a tradução do nosso tempo.

[1] Mais informações sobre os trabalhos de restauração podem ser obtidas no site do projeto, acessível em http://www.guerraepaz.org.br.

Antônio Carlos Lessa é Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB, pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq e editor da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI.

Mulheres: o comercio quer o dinheiro de voces; Homens: estao gozando da nossa cara

Incrível Brasil, incrível mundo: os homens têm agora um dia, o seu dia.
Quero dizer os machos, os do gênero masculino (até onde se pode determinar).
Já tínhamos o "Dia da Mulher", aliás internacional, em 8 de março, se não estou enganado, para não apenas homenagear as ditas cujas, mas também para apoiá-las e sustentá-las em sua nobre luta contra um mundo machista e discriminatório. Nada mais justo.
Inventaram um tal de "Dia do Homem", que só pode ser para gozar da nossa cara. Para quê, exatamente? Precisamos de proteção, de programas especiais para defender a nossa macheza?
No kidding...
No mundo esse tal dia é em 19 de novembro, o que eu até acho bom, pois já tem um motivo a mais para comemorar algo no dia do meu aniversário.
Mas no Brasil não, é em outro dia, como não poderia deixar de ser, num país que se pretende diferente (aliás, tem muita gente diferente nessa coisa de gêneros, e não sei como acomodar todas essas diferenças em apenas dois gêneros; acho muito pouco, precisaria ser pelo menos quatro ou cinco).

Bem, o fato é que o dia do homem (com minúsculas) no Brasil é hoje, 15 de julho.
Pois bem, considerem-se comemorados os "homens" (as aspas valem pelos indecisos, que entram no rol por acaso ou distração), mas os homens não têm nada do que se orgulhar, olhando o mundo como ele é, cheio de injustiças, de crimes, de corrupção, e sobretudo de muita discriminação contra as mulheres.

Acredito que se o mundo tivesse uma presença e um poder femininos mais afirmados, mais fortes, seria um lugar melhor, mais justo, mais estável, com menos guerras e menos injustiças. Não tenho certeza de que seria melhor administrado, ou tão inventivo quanto (já sei, vão me acusar de "síndrome de Larry Summers", o ex-reitor de Harvard que disse que as mulheres não eram talhadas para carreiras científicas), mas creio que seria melhor, pelo menos suspeito e desejaria.

Os homens, por constituição biólogica (a não-maternidade) e por divisão sexual do trabalho (talvez por oportunismo e esperteza, também, mas geralmente por força bruta, mesmo) acabaram sendo guerreiros e sacerdotes, o que lhes deu um sobre-poder, inclusive o de discriminar e oprimir as mulheres. Isso pode ter sido muito ruim, ao provocar guerras desnecessárias, inclusive pela posse de mulheres (exemplo, Helena de Troia).

Mas, o fato da guerra também é um importante "impulsionador" de novas tecnologias. Se o mundo tivesse ficado com as mulheres no poder, talvez as artes e a gastronomia fossem mais desenvolvidas, e o mundo mais pacífico, mas também mais atrasado tecnologicamente.
É apenas uma teoria, não um argumento científico, mas ainda assim acho que teria sido preferível um mundo mais feminimo mais cedo e mais completo.

Enfim, no dia do homem, minha homenagem às mulheres...
Paulo Roberto de Almeida