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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Chineses na Africa: democracia e mercados - Stephan Richter


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China na África: mercado x democracia


As formas e meios pelos quais os chineses estão penetrando no continente africano são tema de debates acalorados em todo o mundo - e em nenhum lugar mais do que nos EUA. A visita de 10 dias de Hillary Clinton, secretária de Estado dos EUA, a toda a África colocou o debate em foco detalhado.
De um lado, os que afirmam que os chineses estão comportando-se como neocolonialists (ocidentais), ansiosos por explorar as vastas riquezas de matérias-primas e minerais do continente. Eles veem a China como interessada em ocupar cada espaço não coberto por empresas multinacionais ocidentais.
Do outro lado, principalmente fora dos EUA e predominantemente na África e nos mercados emergentes, estão os que aplaudem a ascensão da China e apontam para os seus sucessos como uma forma tardia de justiça econômica. Estes acreditam que finalmente é hora de uma potência não ocidental rica e mirando horizontes de tempo de longo prazo emergir como parceira viável para o continente.
Melhor ainda, argumentam essas vozes, os chineses - com a sua proposta de construção de infraestrutura em t roca da exploração de matérias-primas - estão apenas cumprindo o que acabaram revelando-se promessas vazias, feitas há um século pelas potências ocidentais.
Construção de ferrovias ligando áreas do interior à costa? A eventual perspectiva de formar uma rede cobrindo a África Subsaariana? Formação de redes de rodovias e autoestradas de quatro pistas a preços acessíveis em todo o continente? Disponibilizar moderníssimos complexos de escritórios, construídos dentro de orçamentos que as nações africanas têm condições de custear?
Concentrem-se primeiro em acabar com a fome; depois, disseminem-se os benefícios não tão materiais da democracia. Esse foco assegura a formação de um eleitorado com melhor formação educacional e autoconfiante, não suscetível à compra barata de votos.
Essas são, certamente, metas que os líderes africanos vêm perseguindo há muito tempo. Mas, no passado, uma combinação tóxica de sua própria corruptibilidade, laços obscuros entre ex-países colonizadores (e suas elites empresariais) e os novos governantes, bem como estruturas de planejamento excessivamente complexas, muito frequentemente resultaram em projetos proibitivamente caros.
Considerando que o crescimento econômico da África tem sido retardado pela inexistência de infraestrutura de transportes confiável - nos países e entre eles - essa é uma oferta mais que tentadora. Ela representa uma oportunidade de proporções históricas.
Sim, o continente tem uma abundância de aeroportos e de telefones celulares, mas devido à infraestrutura totalmente insuficiente, o comércio continua sendo dificultado de uma maneira reminiscente da Europa pré-1820.
Nesse sentido, as iniciativas empreendidas pelos chineses na África são, agora, o equivalente histórico do que as guerras napoleônicas trouxeram para um país como a Alemanha. Representam um há muito tempo necessário brado de alerta para o abandono de tradições ultrapassadas, para um avanço à era de intercâmbio e comércio modernos.
Sem ignorar os problemas inerentes à maneira como os chineses operam, inclusive o fato de que empregam predominantemente mão de obra de suas próprias empresas de construção civil, mesmo para projetos no interior da África subsaariana, a visão chinesa é muito distinta da abordagem ocidental nos últimos 50 anos.
A fórmula do Ocidente aplicada à África pós-independência, pós-1960, é priorizar a construção da democracia em detrimento da construção de mercados. Os chineses, como se sabe, optam exatamente pelo oposto.
Em tese, é sempre preferível concentrar-se em estruturas democráticas. E a secretária Clinton certamente referiu-se enfaticamente a isso durante sua visita. Mas em países onde a pobreza continua excessiva, um contra-argumento desconfortável pode ser sustentado, apoiado no histórico dos últimos 50 anos.
E se uma democracia atrofiada constituiu-se em obstáculo ao surgimento de um verdadeiro mercado para as economias nacionais? Nessas circunstâncias, não será preferível privilegiar a construção de um mercado para produzir uma estrutura mercantil suficientemente distribuída?
Esse é, sem dúvida, um dilema bastante desconfortável para ser analisado pelos ocidentais. Mas, claramente, são os africanos que precisam optar por seguir ou não o conceito ocidental de "democracia primeiro".
Melhor ainda, os defensores da estratégia chinesa para a África podem apontar para o fato de que a África não é a China. A preservação do poder em um Estado de partido único não está em causa na maior parte da África.
Em outras palavras, concentrem-se primeiro em acabar com a fome; depois, disseminem-se os benefícios não tão materiais da democracia. Esse foco assegura a formação de um eleitorado com melhor formação educacional e autoconfiante, não suscetível à compra barata de votos.
Essa abordagem também implica que o desenvolvimento econômico produza desenvolvimento político. Coincidentemente, isso é bastante semelhante ao que ocorreu na história da Europa. Lá, a tomada das rédeas da economia catalisou a demanda por mais direitos políticos por parte das classes mercantis, que terminou por colocar a Europa no rumo de democracia plena.
Por enquanto, em grande parte da África, a evolução política permanece tão atrofiada quanto o desenvolvimento econômico. Dito de outro modo, mas em última análise no mesmo sentido, a maturidade política - no sentido de democracia suficientemente robusta para que as eleições resultem em mudança efetiva no poder - só funciona praticamente em países como Gana, onde o desenvolvimento econômico é suficientemente avançado e amplo.
Ponderar esse tipo de sequenciamento é certamente desconfortável para os ocidentais que têm uma preferência instintiva pela democracia. Apesar disso, essa preferência é também desconcertante - especialmente tendo em vista a forte ênfase dos americanos em economia de mercado em seu país. Os americanos, como sabemos, foram afortunados em seu caso histórico especial, onde os desenvolvimentos econômico e político caminharam de mãos dadas.
É muito desconcertante observar nesse debate sobre construção de mercado versus construção de democracia - que são os chineses, e não os americanos - que podem argumentar persuasivamente que seu foco na África é a criação de futuros clientes e parceiros comerciais.
Esse foco em clientes parece contrário à doutrina marxista. E, de fato, os chineses podem citar ninguém menos que o admirável Adam Smith como sua testemunha principal. Ao avaliar estratégias econômicas de grandes impérios, escreveu ele: "Fundar um grande império com o propósito único de criar um povo de clientes pode, à primeira vista, parecer um projeto capaz de servir a uma nação de lojistas. Trata-se, porém, de um projeto totalmente impróprio para uma nação de lojistas. Mas extremamente adequado a uma nação cujo governo é influenciado por lojistas".
Embora os direitos ao voto não possam ser considerados um luxo, na realidade africana, ao menos, o foco central na construção da democracia, em vez da construção de mercados, tem tido o efeito perverso de asfixiar, e não de promover, o crescimento econômico. (Tradução de Sergio Blum)
Stephan Richter é editor chefe do "The Globalist".

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quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Cotas sociais e raciais, e a minha concepcao de Justica - Paulo Roberto de Almeida

Recebo diversos comentários a meu post sobre as cotas sociais, mais um exemplo do imenso besteirol racista que continua a prevalecer num país mentalmente atrasado que se chama Brasil. Alguns até me pediram comentários mais elaborados sobre a questão, ou seja, no sentido em que as cotas sociais e raciais representariam uma espécie de compensação pelas desigualdades históricas da sociedade brasileira e pelo "racismo" embutido nos comportamentos sociais.
Não vou elaborar muito neste momento, por falta de tempo e oportunidade. Vou apenas declarar em que creio, e o que rejeito, posturas que devem ter, aliás, ficado claras com base em inúmeros pronunciamentos meus neste mesmo espaço.

Sou totalmente, integralmente, absolutamente contrário a qualquer tipo de cota, seja por qual motivo for, racismo, pobreza, deficiências de diversos tipos, etc.
Sou totalmente, integralmente, absolutamente a favor do mérito individual, do esforço pessoal, da responsabilidade total de um indivíduo sobre seu próprio destino, além e acima de quaisquer considerações particularistas ou corporativas.

A sociedade, o Estado, devem, sim, oferecer chances ou oportunidades iguais a todos, ao mais rico dos rebentos como ao mais miserável dos jovens e crianças. Isso se faz pela escola pública obrigatória, de caráter universal, e por uma escola média, que prepare para a vida profissional ou para uma carreira graduada no terceiro ciclo. E para por aí. Todo o resto é responsabilidade individual.

A mais pobre das crianças pode, se assim desejar, se qualificar  no ensino usando dos mais diversos recursos à disposição de todos, pois atualmente, nas condições da sociedade global, praticamente a quase totalidade do estoque de conhecimento útil acumulado pela humanidade encontra-se livremente disponível nas bases de dados abertas e livres.
Posso, se me permitem uma referência pessoal, citar o meu caso.
Venho de uma família muito pobre, que não possuía jornais ou livros em casa. Todos os livros que eu li foram os da escola, ou os da biblioteca pública, assim que pude frequentá-la. 
Tudo o que sei, tudo o que fiz, tudo o que sou capaz de fazer, eu o devo aos livros e aos estudos autodidatas que fiz, desde a minha primeira infância. Estimulado ou não pela família, tomei conhecimento, a partir de certo momento -- ao comparar meus magros recursos com a situação de relativo bem-estar de colegas de escola -- desse fato elementar: eu nunca conseguiria me distinguir, me destacar, me afirmar na vida, a menos que eu superasse a falta de meios com o maior empenho relativo nos estudos. E assim fiz.
Eu fiquei melhor que todos os meus colegas, ricos ou pobres, apenas na base das leituras.
Acredito que isso esteja ao alcance de todos.

As cotas sociais são uma demagogia.
As cotas raciais são apenas isso: racismo.
O mérito individual deve prevalecer, a competição, a concorrência, a distinção do saber são os únicos critérios possíveis de serem sustentados numa sociedade que pretende realmente fazer justiça.

Os ricos não são culpados por existirem pobres, e a pobreza não é uma condição insuperável ou absolutamente impeditiva do sucesso de um indivíduo motivado.
A pior condição para alguém é a de se considerar dependente ou assistido por alguma entidade pública; isso é acomodação ou preguiça, e ambas são intoleráveis.

As oportunidades iguais surgem com uma boa educação para todos, não com cotas de qualquer tipo no terceiro ciclo.
Cotas são abomináveis, uma confissão de fracasso em constituir uma sociedade normal.

Obviamente, meus argumentos são totalmente esdrúxulos num país disfuncional e mentalmente atrasado como o Brasil.
Não espero adesão, apenas declaro o que penso.

Estamos nos atrasando, de fato retrocedendo. Uma pena...
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 9/08/2012

Bem feito, senhores reitores: insistiram na demagogia, enfrentem o desastre, agora... - Reinaldo Azevedo

Não seria capaz de elaborar uma análise tão detalhada em torno da imensa bobagem perpetrada pelo Congresso e que vai ser endossada, aparentemente, pelo Executivo. Mas a opinião abaixo reflete muito do que eu já pensava sobre esse tema.
O racismo ao inverso iniciado pelos militantes do novo Apartheid, e endossado pelo partido no poder, foi acolhido demagogicamente pelos reitores, e até pela Suprema Corte, aliás de forma inconstitucional.
Enfim, o Brasil é um país em que até juízes da Suprema Corte conseguem ser inconstitucionais, o que é extraordinário.
As universidades públicas jás estavam a caminho da decadência, agora vão direto para o desastre.
Paulo Roberto de Almeida 


Reinaldo Azevedo, 9/08/2012

Pois é… Ah, a alegria “democratista” dos inocentes, dos bem-pensantes, dos tolos. Algumas almas que se queriam e se querem generosas acreditavam que, se flertassem “só um pouquinho” com o cotismo, estariam contribuindo para a justiça social. Jamais se deram conta de que o papel das universidades, por exemplo, não é acabar com a desigualdade — tampouco perpetuá-la. Ou elas se orientam exclusivamente segundo os critérios de competência ou desempenho — vale dizer: mérito —, ou estarão assumindo um papel que não é o seu. Nem cumprirão a sua função primordial nem se desincumbirão com eficiência da nova tarefa que lhes é atribuída. Quando declararam constitucional a aplicação de cota racial — contra, entendo eu, a Carta Magna —, os ministros do Supremo não imaginavam o que estava por vir. Modestamente, eu imaginava isso e antevejo coisas piores. Pois bem, a presidente Dilma Rousseff está prestes a fazer uma grande besteira. E vai fazer. Porque é da natureza da corrente de pensamento a que ela pertence. A que me refiro?
A deputada Nice Lobão (PSD-MA), mulher do ministro Edson Lobão (Minas e Energia), tem dois grandes feitos na carreira: é a campeã de faltas às sessões da Câmara em 2011 e é autora de um projeto, já aprovado também no Senado — só falta agora a sanção de Dilma — que determina que as universidades e os institutos técnicos federais reservem 50% das vagas para alunos oriundos das escolas públicas. Mas não só isso! Nice Lobão resolveu transformar o ingresso na universidade num misto de charada grega com luta de classes e racialismo (sabem como são esses marxistas radicais da família Lobão, né?). A estrovenga aprovada no Senado está aqui.
Como funciona?
1 – Os alunos das escolas públicas serão selecionados segundo o seu “Coeficiente de Rendimento” no ensino médio. Para eles, o Enem, por exemplo, não terá a menor importância.
A ESTUPIDEZ ESPECÍFICA -  Já aqui se abre a primeira e escandalosa porta para injustiças. Dentro da ruindade geral das escolas públicas, há diferenças brutais de qualidade. O aluno que tiver um bom desempenho numa escola relapsa e pouco exigente levará vantagem ao competir com o que tiver um desempenho médio numa escola séria. Mais: sabemos que inexistem critérios objetivos para avaliar se o currículo oficial foi mesmo ministrado. Aliás, não existe um currículo nacional!!! Não encontrei na lei nenhuma referência sobre estado de origem do estudante e vaga pretendida. Como se trata de ensino federal, entendo que o candidato de um estado pode concorrer a uma vaga na federal de outro. O ensino médio é uma lástima no país inteiro, é fato. Mas sabemos que, mesmo dada a ruindade geral, há disparidades regionais brutais. Não só isso: os negros e pardos de Santa Catarina somam pouco mais de 11%; na Bahia, chegam a 78%. Um negro ou pardo de Santa Catarina que disputasse uma vaga na Universidade Federal da Bahia certamente seria selecionado segundo a cota baiana, mas carregando o “Coeficiente de Rendimento” da escola catarinense.
2 – Atenção para a loucura: metade daqueles 50% de vagas reservadas a escolas públicas terá de ser preenchida por alunos oriundos de famílias com renda per capita de até 1,5 salário mínimo.
A ESTUPIDEZ ESPECÍFICA – A lei é omissa sobre a forma como se vai fazer essa verificação. Será com base apenas na declaração do candidato? Cada universidade federal terá de investigar a renda familiar do aluno para saber se ele fala a verdade? Ora… Não há estrutura para isso. Fingir pobreza passará a ser um bom negócio. Será um critério de seleção superior ao conhecimento de matemática e língua portuguesa. Tão logo isso esteja em vigência, é evidente que haverá uma inflação de candidatos com renda per capita inferior ao limite estabelecido, certo? E a lei que convida à fraude.
3 – Deputados e senadores avançaram ainda mais na sandice. Essa metade da metade que tem de pertencer a famílias com renda per capita inferior a 1,5 mínimo tem der ser preenchida por autodeclarados negros, pardos e indígenas, segundo o percentagem apontada pelo IBGE na unidade da federação em que está a universidade.
A ESTUPIDEZ ESPECÍFICA – Um pobre branco da escola pública leva desvantagem ao competir com um preto pobre ou mestiço pobre da escola pública, ainda que os dois tenham, então, o mesmo perfil social. A propósito: no caso do candidato indígena, o seu Coeficiente de Rendimento no que concerne ao domínio da língua terá como referência o português ou o idioma da sua tribo? Nesse caso, quem avalia?
4 – E aqueles outros 25% — a metade da metade oriunda da escola pública, mas que pode pertencer a famílias com renda per capita superior a 1,5 mínimo? Também para eles vale o critério da cor da pele.
ESTUPIDEZ ESPECÍFICA – É a mesma do item 3
A estupidez geral
A senhora Dilma Rousseff, que apoia o projeto, está botando os últimos pregos no caixão das universidades e institutos federais de ensino. Por quê? Só porque está abrindo as portas aos alunos da escola pública? NÃO!!! PORQUE METADE DAS VAGAS DESSAS INSTITUIÇÕES NÃO TERÁ MAIS NENHUM COMPROMISSO COM O DESEMPENHO DOS ALUNOS.
Notem que nem mesmo se exigirá deles uma nota aceitável no Enem — um exame que já é comprovadamente fraco. O único critério associado a desempenho é o tal Coeficiente de Rendimento, auferido em escolas distintas, provas distintas, segundo critérios distintos. Cria-se, obviamente, uma pressão sobre o professor da escola pública — que já padece, como diria o poeta, de diabólicos azares — em favor da facilitação. Ele e seus alunos terão clareza de que uma prova mais severa pode concorrer para criar dificuldades futuras ao aluno.
A escola pública vai melhorar?
A proposta, longe de democratizar o ensino universitário, concorre para democratizar a ignorância e para rebaixar o ensino universitário. Como se está assegurando ao aluno o ingresso na universidade segundo critérios que nada têm a ver com desempenho e competição, o que se tem, na prática, é uma pressão contrária: quanto mais relapso é “bonzinho” for o professor, tanto melhor.
Conheço e convivo com professores universitários, alguns meus contemporâneos da universidade. Atestam que a quantidade de semianalfabetos que chegam ao ensino superior é assustadora. Em vez de concorrer para melhorar a escola pública — sim, eu sei que é um processo demorado, mas não há outra saída —, essa lei vai usar a baixa qualidade como facilitador para o acesso ao ensino superior — vale dizer: quanto pior a escola de ensino médio, melhor!
Eis aí. Reitores das universidades federais incensavam as políticas de cotas. Também eles, mesmo sendo quem são, houveram por bem mandar os critérios acadêmicos para a ponta do pavio e aderir à demagogia. E os cotistas avançaram. A deputada Eunice, da grande família Lobão, pegou carona no debate e resolveu levar a coisa a sério, a seu modo. Pimba! Elio Gaspari, o maior propagandista das cotas no Brasil — para ele, quem se opõe à ideia é a turma do “andar de cima” — deve estar satisfeito.
Agora os cotistas pretendem que o mesmo modelo seja aplicado ao mercado de trabalho público e privado. Chegará a hora em que alguém proporá que o Congresso, as Assembleias, as Câmaras de Vereadores e os tribunais obedeçam a critérios dessa natureza — por que não? Teremos uma democracia que não será feita dos mais votados e dos mais competentes, tudo em nome da… Justiça!
Ao votar a favor da proposta, o senador Pedro Taques (PDT-MT), que costuma ser sério, evocou a experiência americana como exemplo de política bem-sucedida de cotas. Acho que ele deveria estudar melhor o assunto — e não vou me alongar agora sobre esse particular. Noto, no entanto, que cota social e racial, com essa precisão na divisão da cor da pede e com esse número de vagas garantidas aos cotismo, não foi aplicada em lugar nenhum do mundo, nem na África do Sul pós-apartheid.
Agora, os reitores das universidades federais e os professores estão assustados. Sabem o que os espera. Anos de incúria e de desastre no ensino público vão cair inteiros no seu colo. Em muitas universidades, já se discute a criação de cursos especiais para os alunos, algo que os capacite minimamente em matemática e língua portuguesa. Eu estou falando sério.
O desastre já está em curso
Não é o que se vá produzir o desastre. Ele já está em curso. Será agravado. Entre os estudantes do ensino superior, 38% não dominam habilidades básicas de leitura e escrita, segundo o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), divulgado pelo Instituto Paulo Montenegro (IPM) e pela ONG Ação Educativa. Vejam quadro.

Em 2001/2002, 2% dos alunos universitários tinham apenas rudimentos de escrita e leitura. Em 2010, essa porcentagem havia saltado para 4%. Vale dizer: 254.800 estudantes de terceiro grau no país são quase analfabetos. Espantoso? Em 2001/2002, 24% não eram plenamente alfabetizados. Um número já escandaloso. Em 2010, pularam para 38%. Isso quer dizer que 2.420.600 estudantes do terceiro grau não conseguem ler direito um texto e se expressar com clareza. É o que se espera de um aluno ao concluir o… ensino fundamental!
O quadro já era ruim, como se nota, e foi agravado pela dupla Lula/Haddad. Agora, a lei da dona Lobão, aprovada na Câmara, acolhida por ampla maioria no Senado e a ser sancionada por Dilma vai se encarregar de liquidar com o que resta.
Minhas homenagens ao senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que lutou brava e quase solitariamente contra essa estupidez no Senado. Foi inútil. Em nome da proteção aos pobres e aos vulneráveis, a maioria dos senadores mandou os pobres e os vulneráveis para a ponta do pavio. O que esses valentes fizeram foi condenar os ensinos fundamental e médio públicos à eterna ruindade. E essa ruindade, que já havia se alastrado para o ensino universitário, lá se instará de vez!
Espero um texto de Elio Gaspari demonstrando por que isso é bom para os brasileiros e por que os críticos da proposta da dona Lobão são “demofóbicos”. Eu sempre presto muita atenção aos argumentos dos “demofílicos”.
PS – Ah, sim: Câmara, Senado e Dilma vão pisotear a autonomia universitária. Bem feito, senhores reitores! É nisso que dá ter o nariz marrom, viver de joelhos para o Executivo, subordinar a inteligência a um ente de razão. Vocês pediram chicote e vão ter chicote! Serão os coveiros das universidades federais.

Seu iPhone sumiu ou foi roubado?; encontre-o...


How to Make Your Lost Phone Findable

David Pogue, 9/08/2012 (The New York Times)
Last week, I lost my iPhone on a train. I used Apple’s Find My iPhone feature to track it to a house in suburban Maryland, and the local police were able to return it to me. Because I’d tweeted about these developments, the quest for the phone became, much to my surprise, an Internet-wide, minute-by-minute real-life thriller. (You can read the whole story here.)
FDDP
The Times’s technology columnist, David Pogue, keeps you on top of the industry in his free, weekly e-mail newsletter.
Sign up | See Sample
Several readers wrote to ask how to set up their own phones to be findable. As you’d guess, given last week’s experience, I have some strong feelings about the importance of setting up Find My iPhone or the equivalent on Android phones.
First, though, some caveats.
These phone-tracking systems work only if your lost phone is turned on and online; if its battery is dead or it’s powered off, it can’t see the Internet and can’t show you its location.
Furthermore, professionals know about Find my iPhone. As soon as they steal a phone, they connect it to a computer running the iTunes program and wipe it, so that Find My iPhone won’t work anymore.
All right — duly warned? Here’s how you set things up. iPhone first.
First, you need a free iCloud account; sign up at www.icloud.com. You’ll provide your e-mail address and a password that you make up.
Now, on the iPhone or iPad, open Settings. Tap iCloud. Scroll down and turn on Find My iPhone. When the phone asks if you’re sure, tap Allow.
While you’re at it, you might consider tapping Settings (top left corner) to back out to the main Settings screen; then tap General, tap Passcode Lock and give your phone or tablet a password.
I was very glad I had protected my phone this way when it got lost; the password meant the thief couldn’t actually use the phone or access my e-mail, photos and so on.
All right. Now suppose the worst has come to pass. Your phone is gone.
Go to any computer and log into icloud.com. (Or use the Find My iPhone app on another iPhone or iPad.) There, when you click Find My iPhone, you’ll see the location of your phone on a map. You can switch to satellite-photo view to see the actual building or land.
If the phone is offline, a check box lets you request an e-mail alert if the phone ever pops back online. That’s precisely how I found my own phone. The thief turned it off on a Monday, so I couldn’t use Find My iPhone. On Thursday, an e-mail message let me know it had been turned back on, and showed me where it was.
Often, the phone is somewhere in your car or your house. If that’s the case, you can make it ping loudly for two minutes, even if it the ringer was on Mute, and even if the phone is asleep.
You can also make a message pop up on the screen; if you left the phone in a taxi or a meeting room, for example, you can offer a reward this way, or transmit your phone number. If a well-meaning person finds your phone, you might get it back.
If you didn’t protect the phone with a password, you can either click Lock (to password-protect the phone by remote control) or, if you’re really concerned, click Remote Wipe. That’s a means of erasing the phone by remote control. So the bad guy gets away with your phone, but your e-mail, photos and other digital treasures remain private. Of course, at that point, you can no longer find the phone or send messages to it using Find My iPhone.
If you have an Android phone, you have to visit Google Play, the new name for the Android app store, and download an app in advance. One great, free option is Find My Droid. Despite the name, it works on any recent Android phone.
If your phone gets lost, you text a password to the phone to activate the app. Suddenly your ringer turns on at maximum volume and rings for 30 seconds. You can send a different code to request a link to the phone’s location; you get coordinates and a link to a Google map. The Remote Wipe feature requires the Pro version, $4.
Another app, Plan B, lets you see where your Android phone is, in much the same way, but you can download it after the phone’s gone missing. That’s right; you can remotely download it. When you do, the app self-opens and sends the phone’s location to your registered Gmail address.
These apps are amazing; they even out the odds of recovery when your phone has gone missing. A couple of readers even felt sorry for the person who took my phone, maintaining that Find My iPhone rendered him hopelessly outmatched, and asserting that it was an invasion of his privacy for me to be able to see where he took my phone.
Still, many readers shared Find My iPhone failure tales. The phone may not be turned on. The bad guy may be smart enough to erase it. And there may be no way of recovering the phone, even if you know where it is. Even if you provide the phone’s location, some police departments will help you get it back, and others won’t.
These problems could be overcome. Police help recover jewelry, cars and other stolen goods — why not expensive cellphones?
And the cellphone carriers know where our phones are at all times, even when the phone has been erased; they can track the phone’s serial number. At the moment, however, the Verizons and AT&T’s of the world have no interest in using that information to help you recover your lost phone. Why should they? If it’s lost, you’ll buy another one.
In other words, fewer phones will be stolen or lost, and more will be recovered, if society comes to its senses. But for that to happen, we need more than Find My iPhone; we need Find My Common Sense.

As cotas sociais e o verdadeiro problema da educação no Brasil - Editorial OESP


O que as cotas mascaram

Editorial O Estado de S.Paulo, 9/08/2012

Câmara dos Deputados aprovou, o Senado acaba de endossar e a presidente Dilma Rousseff vai sancionar jubilosamente o projeto de lei que obriga as universidades e escolas técnicas federais a reservar 50% de suas vagas a candidatos que cursaram o ensino médio na rede pública. Metade dessa metade se destinará a alunos cuja renda familiar per capita não ultrapasse 1,5 salário mínimo. Menos ou mais pobres, sempre terão prioridade os estudantes autodeclarados negros, pardos e indígenas. A amplitude das cotas raciais variará conforme o peso de tais grupos na população dos respectivos Estados, aferido pelo censo. Quando for insuficiente o número de candidatos elegíveis pelo critério racial, as vagas restantes serão disputadas pelos demais egressos do sistema público. A norma valerá por 10 anos, quando então os seus resultados serão avaliados.
A adoção de cotas raciais na universidade é constitucional, conforme decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF), em abril último. Isso não quer dizer que o sistema devesse ser adotado. Os seus insuperáveis defeitos de origem são múltiplos - a começar pela enormidade, em sentido literal e figurado, da reserva de vagas, configurando uma limitação brutal da disputa não discriminada pelo acesso à formação superior. Mesmo entre os defensores da aplicação do chamado modelo de ação afirmativa na educação, para corrigir desigualdades e preconceitos impregnados na sociedade brasileira, há quem considere "descabelado" excluir do preenchimento pelo critério exclusivo do mérito uma em cada duas vagas disponíveis na rede federal de terceiro grau e escolas técnicas. Além disso, a imposição de um índice único a todas as 59 universidades mantidas pela União representa uma gritante ruptura do princípio da autonomia universitária.
Nas palavras do diretor da Fapesp e ex-reitor da Unicamp, Carlos Henrique de Brito Cruz, trata-se de "uma usurpação" do direito de cada universidade de escolher o modelo de ampliação das oportunidades de acesso a seus cursos que julgar mais adequado ao seu perfil e vocação. É assim que já funciona. Pelo menos 30 dessas instituições implantaram sistemas de cotas, de acordo com as suas peculiaridades. A Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, reserva 20% do total de suas vagas a vestibulandos autodeclarados negros e pardos e 11 vagas em 7 cursos para indígenas. A Universidade Federal do Rio de Janeiro, por sua vez, reserva 30% dos lugares para alunos da rede pública oriundos de famílias com renda mensal per capita de até um salário mínimo. E não adota cotas raciais. Agora, o projeto em vias de virar lei acaba com esse laboratório de experiências de manifesta utilidade.
O mais grave, de toda forma, é que esse tipo de favorecimento impositivo a alunos da escola pública antes escamoteia do que contribui para resolver o notório problema da baixa qualidade do ensino fundamental e médio gratuito. O benefício perpetua na prática um padrão de aprendizagem insuficiente para dar aos jovens condições razoáveis de ingresso na universidade pública, mesmo em cursos menos concorridos. Já não bastasse isso, a restrição de vagas tem o efeito perverso de fomentar a discriminação às avessas, ao empurrar para faculdades particulares, não raro aquém do nível de suas congêneres públicas, alunos cujas famílias podem arcar com as suas mensalidades.
Os efeitos sobre o ensino superior das políticas de cotas já em andamento ainda estão por ser determinados. Para os cotistas, indica uma avaliação da Unicamp, o benefício tende a variar na razão inversa do grau de dificuldade do curso escolhido. E pode-se presumir que o projeto será tanto mais danoso para uma universidade quanto mais rigorosos forem os seus padrões de ensino e, principalmente, de pesquisa.
A alternativa não é cruzar os braços. A USP, por exemplo, concebeu um bem-sucedido esquema de incentivos. O Inclusp, como é chamado, não apenas concede bônus de até 8% nas notas do vestibular a ex-alunos da rede oficial, como ainda envia "embaixadores" aos colégios para divulgar o programa e incentivar os jovens a fazer o exame. Neste ano, 28% dos candidatos aprovados vieram da escola pública.

Universidade para o povo? - Simon Schwartzman


A aprovação, pelo Senado, do Projeto de Lei da Câmara 180/2008, que reserva 50% das vagas das universidades públicas e escolas técnicas federais para alunos que tenham cursado todo o ensino médio na rede pública, parece ser exatamente o que demandavam em 1961 os estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais, entre os quais Vinícius Caldeira Brant, Theotônio dos Santos Jr., Ivan Otero Ribeiro, Herbert José de Souza (o Betinho) , Guido Antônio de Almeida, Antônio Octávio Cintra e eu, em artigos publicados em Mosaico, a revista de nosso DCE.  Dizíamos então que era necessário “abrir as portas da Universidade para o povo e, em toda parte, lutar por aquilo que é do povo. Democratizar o acesso ao ensino, mas reformular completamente sua estrutura, devotá-la à pesquisa criadora, instrumento de formação de uma cultura popular. Cultura popular que consistirá, para as classes exploradas, na consciência de sua destinação histórica. Até hoje a cultura tem consistido na contemplação do mundo. Posta a serviço do homem, erigida em consciência popular, ela constituirá um ponto de partida para a luta de transformação social”.
Levou cinquenta anos, mas parece que finalmente conseguimos! O tema da revista eram as diferentes alienações e como superá-las, e ela está disponível aqui. O texto sobre a Universidade, além da ilustração inicial de Amaury de Souza, está ao final da revista,  na página 115.
Não se equivoca quem vê na idéia que tínhamos de Universidade a Tese 11 sobre Fueuerbach de Marx, que dizia que os filósofos (e, por extensão, os cientistas e intelectuais)  até hoje interpretaram o mundo, mas o que se trata é de transformá-lo. Estava embutida também a idéia de que a separação entre cultura popular e cultura científica e técnica era uma forma entre outras de dominação, e que desapareceria quando, finalmente, as portas das universidades, pela ação revolucionária de nós estudantes, fossem finalmente abertas para o povo.
Alguns de nossos companheiros de Mosaico já não estão entre nós, e eu não  poderia falar por ninguém, mas desde então entendi que não era bem assim. Entendi, por exemplo, que a diferença entre conhecimento especializado e conhecimento popular não é um simples artifício, mas o resultado de um processo complexo e difícil de formação, capacitação e especialização profissional que nem todos conseguem cumprir, e que não se pode resolver por um ato revolucionário como o que um dia Mao Tsé Tung tentou com sua famosa e trágica revolução cultural. Entendi também que a tentativa de Marx de romper a separação entre conhecimento e ação levaria, como levou na antiga União Soviética e seus defensores, à politização extrema do conhecimento e suas instituições, típica dos regimes políticos e das seitas totalitárias, com a degradação do trabalho intelectual. Entendi que sociedades modernas necessitam de universidades aonde deve predominar os valores do mérito e da qualidade do trabalho intelectual tanto de professores quanto dos alunos, e que o princípio de justiça da educação superior deve estar baseado na igualdade de oportunidades para o desenvolvimento da capacidade intelectual de cada um. Entendi que  as universidades não deveriam ser um instrumento de militância revolucionária, e sim um componente central da sociedades democráticas e abertas.
Isto não significa, no entanto, que o caráter elitista das universidades de então não fosse verdadeiro, como continua sendo até hoje. Basta olhar os dados de renda familiar dos estudantes de nível superior para constatar que eles provêm, em sua grande maioria, de setores de renda média e alta.  Em parte, isto tem a ver com os custos do setor privado, que hoje é responsável por 75% das matrículas do ensino superior brasileiro. Mas também com os processos seletivos tradicionais das universidades públicas, que tendem a selecionar, para os cursos mais procurados, os jovens que se beneficiaram de uma educação média de mais qualidade, graças aos recursos financeiros de suas famílias. Segundo os dados do Ministério da Educação, os investimentos diretos por estudante no ensino superior público e gratuito eram, em 2010, de 18 mil reais por estudante, em comparação com 3.580 gastos por estudante da educação básica. Este gasto tão elevado com a educação superior seria justificável se todo o ensino superior brasileiro fosse de alta qualidade, e se todos ou pelo menos a maior parte dos benefícios da formação de alto nível das universidades revertesse para a sociedade, e não para os alunos individualmente. Sabemos, no entanto, que a qualidade do ensino superior público brasileiro é muito variável, e que os diplomas servem muitas vezes para que as famílias consigam manter seus padrões de renda e acesso ao emprego, reproduzindo assim o círculo vicioso da desigualdade. Esta não é, seguramente, toda a história, mas é inegavelmente uma parte importante dela.
Diante desta situação, me parece perfeitamente razoável que o país decida, através de seus representantes no Congresso, que as universidades públicas passem a atender prioritariamente aos filhos das famílias de renda mais baixa, que estudam na rede pública de educação básica cuja qualidade é bastante precária, restringindo o espaço para os filhos de classe média e alta, que podem pagar por seus próprios estudos. O uso de critérios raciais na seleção dos alunos me parece absurdo, como já argumentei em outras partes, mas o critério de dar preferência aos oriundos de escola pública me parece bastante razoável, embora sujeito também a problemas. Aceita esta premissa, a questão que se coloca é como as universidades vão lidar com esta nova realidade de ter metade dos alunos admitidos por processos competitivos e metade admitidos sem maiores considerações de desempenho.
A maneira mais fácil de resolver o problema é postular que ele não existe. Nossas idéias de 1961 sobre a união da teoria com a prática, da pesquisa e da militância, e do desaparecimento da separação entre  o conhecimento das elites e do povo, assim como da separação entre o trabalho manual e intelectual,  não morreram de todo, e  podem ser reconhecidas no conceito de “politecnia” que circula entre certos meios no Brasil e que tem sido utilizado para justificar a transformação dos antigos centros federais de formação profissionais, os CEFETs, em Institutos Nacionais de Tecnologia, equiparados para todos os efeitos às universidades federais.
O suposto é que todas diferenças de formação desapareceriam se os alunos fossem expostos a uma educação de qualidade. Infelizmente, não há evidência de que isto seja assim, da mesma maneira de que não há evidência de que cursos de nivelamento ou reciclagem consigam superar, com facilidade, déficits de formação no uso da linguagem, de conceitos básicos de ciências e de uso de aritmética e matemática acumulados ao longo dos anos. Ao contrário, a evidência é que este tipo de nivelamento, embora não impossível, é extremamente caro e de resultados incertos. A opção mais adequada é oferecer uma variedade de formações profissionais para pessoas com níveis distintos de formação prévia, proporcionando tanto competências cognitivas como não cognitivas (relacionadas por exemplo à capacidade de trabalho em grupo, liderança, responsabilidade e motivação), permitindo ao mesmo tempo que as pessoas avancem em suas carreiras e formação conforme as características de cada um.
Sem isto, cursos mais competitivos em áreas como medicina ou engenharia ou nas faculdades de direito mais disputadas, que hoje oferecem por exemplo 100 vagas para os estudantes mais qualificados, passarão a ter somente 50, tornando muito mais difícil o acesso por esta via, e estimulando os alunos mais qualificados a buscar outras instituições, provavelmente no setor privado. Com 50% de alunos selecionados por mérito   de forma mais competitiva do que antes, e outros 50% por cotas, caberá às universidades decidir se ensinarão predominantemente para uns ou para outros (expulsando na prática a outra metade) se dividirão as turmas em duas, ou se seguirão apostando em que tudo será resolvido pelo conceito mágico de “politecnia”.
O encaminhamento correto desta questão seria criar instituições e carreiras diferentes para estudantes diferentes, tratando de atender com competência a cada setor, e criando mecanismos para permitir que os estudantes que queiram e possam circulem de um setor de formação tecnológica de curta duração, por exemplo, para outro mais acadêmico. A diferenciação é inevitável quando o ensino superior se massifica, e ela ocorre seja através de políticas deliberadas, seja por processos descontrolados em que cada um procura se salvar como puder, com prejuízo para todos.. Seria bom se fosse possível, no Brasil, combinar um número relativamente pequeno de instituições  de alta qualidade e seletividade com um número muito maior de instituições voltadas para a educação de massas, com diferentes níveis de exigência e projetos pedagógicos,  com políticas adequadas para tratar de forma diferentes as as questões de acesso e as questões de qualidade e excelência,  tanto no setor público quanto no privado. Não é este, no entanto, o caminho que parece que temos pela frente.

O Brasil fica menos inteligente, e mais racista: cotas ditas sociais e novo Apartheid

Por vezes eu me pergunto se o Brasil está regredindo mentalmente. E concluo que sim.
Talvez não o Brasil, mas pelo menos certas categorias de "representantes do povo", que fazem tudo para piorar o Brasil, acabando com o mérito.
Quanto aos militantes do Apartheid, eles nada mais fazem senão cumprir sua agenda racista.
A universidade regride, mas não apenas por isso: ela já estava regredindo antes, por outras causas, mas esta é uma das "melhores"...
Paulo Roberto de Almeida 


Em votação simbólica, Senado aprova política de cotas em universidade federais
Jornal da Ciência, com Agências de Notícias, 8/08/2012

Agora, o PLC 180/2008 segue para sanção presidencial. O Palácio do Planalto prometeu vetar o trecho do projeto que estabelece que o ingresso por meio de cotas deve ocorrer pela média das notas do aluno no ensino médio, sem vestibular ou sistema similar. 
A política de cotas para ingresso nas universidades e escolas técnicas federais foi aprovada pelo Plenário do Senado na noite desta terça-feira (7). O Projeto de Lei da Câmara (PLC) 180/2008, que assegura metade das vagas por curso e turno dessas instituições a estudantes que tenham feito o ensino médio em escolas da rede pública, foi aprovado em votação simbólica e agora segue para sanção presidencial.

Pelo projeto, pelo menos 50% das vagas devem ser reservadas para quem tenha feito o ensino médio integralmente em escola pública. Além disso, para tornar obrigatórios e uniformizar modelos de políticas de cotas já aplicados na maioria das universidades federais, o projeto também estabelece critérios complementares de renda familiar e étnico-raciais.

Dentro da cota mínima de 50%, haverá a distribuição entre negros, pardos e indígenas, proporcional à composição da população em cada estado, tendo como base as estatísticas mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). As universidades terão quatro anos, após a publicação da lei, para implementar o novo sistema.

O tema tramitava havia 13 anos no Congresso, mas, por ser polêmico, só foi aprovado depois que o governo mobilizou aliados. A expectativa era que fosse votado hoje, mas o governo aproveitou o plenário cheio ontem à noite para concluir a tramitação.

O projeto prevê que as cotas irão vigorar por dez anos a contar de sua publicação Depois disso, haverá revisão do tema com o objetivo de verificar se o modelo deu certo. "É um período de transição para garantir a igualdade na seleção", disse a senadora Ana Rita (PT-ES), uma das relatoras do texto.

Veto - Um trecho aprovado ontem deve ser vetado pela presidente Dilma Rousseff. Ele estabelece que o ingresso por meio de cotas deve ocorrer pela média das notas do aluno no ensino médio, sem vestibular ou sistema similar. Para facilitar a aprovação no Senado, o Palácio do Planalto prometeu vetar essa mudança.

Defesa - O PLC 180/2008 foi defendido pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que informou que, de cada dez alunos do País, apenas um estuda em escola privada. Ou seja, o projeto beneficiaria a ampla maioria dos estudantes brasileiros. A senadora Ana Rita (PT-ES) também saiu em defesa da proposta, garantindo que o projeto faz "justiça social com a maioria da população brasileira".

Já o senador Pedro Taques (PDT-MT) citou os Estados Unidos como exemplo bem-sucedido da política de cotas nas universidades. Ele disse que o país, que era extremamente racista em um passado próximo, após adotar a política de cotas raciais nas universidades, tem agora um presidente negro. Para o senador, no Brasil é preciso adotar ações afirmativas para assegurar oportunidade a todos.

Único voto contrário - O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) reprovou a iniciativa sob o argumento de que "impõe camisa de força" a todas as universidades federais brasileiras, ao ferir sua autonomia de gestão. Além disso, argumentou o senador, para que o ensino superior seja de qualidade, é preciso adotar um critério de proficiência, ou seja, que os alunos que ingressem na instituição tenham notas altas.

Outra crítica do senador ao projeto é a exigência de que as vagas para cotas raciais, por exemplo, sejam proporcionais ao contingente de negros ou índios existentes no estado onde se localiza a instituição de ensino.

Aloysio Nunes observou que um negro inscrito em uma universidade de Santa Catarina disputaria um número menor de vagas do que outro estudante, também negro, mas inscrito em uma instituição da Bahia. Aloysio Nunes foi o único senador a votar contrariamente ao projeto em Plenário.

'Lei fere autonomia universitária', diz diretor da Fapesp
O projeto de lei aprovado que prevê metade das vagas de universidades federais para alunos oriundos da rede pública é visto com reservas por educadores. Para o diretor da Fapesp e ex-reitor da Unicamp, Carlos Henrique de Brito Cruz, a proposta é ruim porque fere a autonomia. "É uma usurpação da autonomia universitária, porque viola o direito de que cada instituição decida o modelo mais adequado, que tenha mais relação com a sua tradição de avaliar o mérito acadêmico", argumenta.

Para o professor Ocimar Alavarse, da Faculdade de Educação da USP, o estabelecimento de cotas sociais é importante uma vez que pode facilitar o acesso de estudantes de escolas públicas a cursos mais concorridos. "Basta ver os cursos mais disputados de qualquer universidade pública, para ver como é raríssimo encontrar algum estudante oriundo do sistema público", diz. Segundo ele, isso perpetua a disparidade social, já que os estudantes do sistema público tendem a ter um nível socioeconômico mais baixo.

Uma boa implementação da política, no entanto, depende de estudos prévios. "É preciso pegar os dados do Sistema de Avaliação Básica (Saeb), para entender as particularidades desses estudantes de escolas públicas. Eles não são todos iguais", avalia. "Não dá para fazer políticas genéricas." Quanto às cotas raciais, ele é contrário. "Acho que isso não funciona, porque vai muito da autodefinição e os detalhes e diferenças são todos muito sutis", explica Alavarse.

Segundo o projeto de lei, nas vagas reservadas a cotas sociais ocorrerá um ajuste racial, feito com base nos porcentuais dos perfis étnicos em cada estado. Por exemplo, a reserva de vagas para negros em Santa Catarina será menor que na Bahia.

Nas universidades estaduais paulistas, a discussão sobre cotas raciais está fora da pauta. Assim que o Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela constitucionalidade das cotas raciais, em abril deste ano, USP, Unesp e Unicamp se disseram contrárias à medida. Elas defendem a prevalência do mérito na seleção, embora tenham ações de inclusão - sem, no entanto, reservar vagas.

Atualmente, a USP mantém o Programa de Inclusão Social (Inclusp), que dá bônus no vestibular a estudantes da rede pública. Neste ano, 28% dos novos alunos vieram de escolas públicas.

Mesmo sem reservar vagas, a Unicamp é a única que tem benefício específico para pretos, pardos e indígenas. Eles chegam a receber 7% de bônus na nota, cerca de 2 pontos porcentuais a mais que alunos de escola pública - também beneficiados. No último vestibular, 8,9% dos matriculados na Unicamp vieram do grupo de pretos, pardos e indígenas.

Das três, a Unesp foi a que mais incluiu alunos vindos de escolas públicas: 41%.


quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Auto-governanca: o exemplo de uma pequena comuna europeia


Mises Daily, August 8, 2012



Anarchy in the Aachen
by Peter C. Earle on August 8, 2012
Can a community without a central government avoid descending into chaos and rampant criminality? Can its economy grow and thrive without the intervening regulatory hand of the state? Can its disputes be settled without a monopoly on legal judgments? If the strange and little-known case of the condominum of Moresnet — a wedge of disputed territory in northwestern Europe, and arguably Europe's counterpart to America's so-called Wild West — acts as our guide, we must conclude that statelessness is not only possible but beneficial to progress, carrying profound advantages over coercive bureaucracies.
The remarkable experiment that was Moresenet was an indirect consequence of the Napoleonic Wars (1803–1815), which, like all wars, empowered the governments of participating states at the expense of their populations: nationalism grew more fervent; many nations suspended specie payments indefinitely; and a new crop of destitute amputees appeared in streets all across Europe.
In the Congress of Vienna, which concluded the war, borders were redrawn according to the "balance-of-power" theory: no state should be in a position to dominate others militarily. There were some disagreements, one in particular between Prussia and the Netherlands regarding the miniscule, mineral-rich map spot known as the "old mountain" — Altenberg in German, Vieille Montagne in French — which held a large zinc mine that profitably extricated tons of ore from the ground. With a major war recently concluded, and the next nearest zinc source of any significance in England, it behooved the two powers to jointly control the operation.
They settled on an accommodation; the mountain mine would be a region of shared sovereignty. So from its inception in 1816, the zone would fall under the aegis of several states: Prussia and the Netherlands initially, and Belgium taking the place of the Netherlands after gaining its independence in 1830. Designated "Neutral Moresnet," the small land occupied a triangular spot between these three states, its area largely covered by the quarry, some company buildings, a bank, schools, several stores, a hospital, and the roughly 50 cottages housing 256 miners and support personnel.[1]
The territory "originate[ed] in mistake … perpetuated by [the] jealousy [and] inability of … two governments to concur in partition," and initially, little changed within the district.[2] But over the next few decades, Moresnet's small size and ambiguous oversight by several national powers came together to create an inadvertent experiment deep in the Aachen forests of northwestern Europe.
The first factor is that, although nominally monitored by several nations, by virtue of its small size, Moresnet was loosely supervised at best. Not only was it so small that a crumb would blot out its existence on most maps; neither was there much reason for its overseers to direct attention to it: it sat quietly, reliably excavating 8,500 tons of zinc each year. Occasionally a patrolling Prussian, Dutch, or Belgian soldier would wander close to the border — as a demilitarized zone, Moresnet territory was explicitly off limits for military forces — but for the most part the mining community was left alone.
And it wasn't just administrators who lost track of the of the anomalous territory; it was secluded enough that one traveler recalled inquiring
at [a nearby] hotel, at some neighboring shops, and at both of the railway stations … [but still couldn't be told] how to reach Neutral Moresnet; they had no idea at all, or guessed at random at various impossible stations.[3]
Within the triangle, there was a minimal government in the form of a burgomaster, assisted by a "Committee of Ten." Despite its somewhat ominous name, the committee "wield[ed] no real power" and the burgomaster was "far from being a … despot."[4]
Moresnet also employed a police force of one, referred to with local good humor — and perhaps mocking nearby Prussia with its General Staff and large social class of military officers — as Moresnet's "Secretary of War."[5] The lone police officer was usually "to be seen in full uniform enjoying a game of chess or billiards with the burgomaster at the beer garden on the shores of the lake."[6]
Through the rest of the 19th century, Moresnet's course ran distinct from that of surrounding European states. In 1848, for example, violent revolutions broke out in Italy, France, Germany, Denmark, Hungary, Switzerland, Poland, Ireland, Wallachia, the Ukraine, and throughout the Habsburg Empire. For Moresnettians, life in 1848 proceeded unperturbed, and the year was noteworthy only for the first minting of sovereign coins, which local merchants accepted for use alongside other currencies.[7]
Despite its isolation, word slowly spread that within Moresnet — if one could find it — "imports from surrounding countries were toll free, the taxes were very low, prices were lower and wages higher than in [other European] countries."[8]
Over the following decades the population of the tiny region grew correspondingly: by 1850, the population had doubled, and in addition to the zinc mine, new businesses and even some small farms began to spring up.
Alongside the negligible tax burden, a unique legal climate favored the expansion of economic activity within the tiny district. On inception, the Congress of Vienna, which created Neutral Moresnet, held that its laws would be construed in accordance with the Code Napoleon, known for
its stress on clearly written and accessible law, [which] was a major step in replacing the previous patchwork of feudal laws.… Laws could be applied only if they had been duly promulgated, and only if they had been published officially (including provisions for publishing delays, given the means of communication available at the time); thus no secret laws were authorized. It [also] prohibited ex post factor laws.[9]
And most importantly of all, the code placed a primary importance on "property rights … [which] were made absolute," naturally generating a favorable climate for commercial enterprise.[10] One periodical noted that a "thief tried … [nearby] gets … a few months, while the Code Napoleon specifies five years."[11]
This contrasted sharply with the Allgemeines Landrecht legal system of neighboring Prussia, which "used an incredibly casuistic and imprecise language, making it hard to properly understand and use in practice," but which for some legal purposes may have held advantages over the Code Napoleon.[12] Alternately, disputes could be directed to the burgomaster's "petty tribunal" for quick decisions on smaller issues and disputes.[13] His
head-quarters were … "under his hat." He went about town and held court wherever he happened to be when his service as justice was required, which, happily, was not often. When complaint was made to him, he would listen patiently and attentively … [then] whistle some favorite air, and thus take time to resolve the matter in his mind.… His judgments were always intelligible and fair, insomuch that they were never excepted to or appealed from during all his term of thirty-five years.[14]
Moresnet inhabitants, therefore, had access to several different systems for resolution of disputes — a rudimentary market for justice — and were therefore empowered to take their issues to the venue they felt afforded the best chances of satisfactory resolution.
Further, residents of Neutral Moresnet were not required to fulfill the compulsory military requirements of their nations of origin.[15] This no doubt motivated many of the new arrivals, in particular those from Prussia, which fought half a dozen wars during the 19th century.[16]
The population of the hamlet quadrupled between 1850 and 1860, topping 2,000 residents. One newcomer was particularly significant. Dr. Wilhelm Molly arrived in 1863 to become the general practitioner of the mining company, and soon won celebrity by thwarting a local cholera epidemic in Moresnet. Like many physicians of his era, Dr. Molly had numerous interests, some of which would play a role in Moresnet's development over the next half-century.[17]
From the beginning of the designation of Neutral Moresnet, it was known that the Vieille Montagne zinc mine could not, and would not, produce indefinitely. In 1885, the zinc mine finally wound down and ceased operation, but this wasn't especially worrisome economically: numerous businesses were now flourishing, including "60–70 bars and cafes [along] the main street," a number of breweries, small farms, and at least one dairy operation.[18] Taxes hadn't changed since the designation of the neutral zone in 1816, and visitors noted that Moresnet was "without the beggars who are [a] sadly familiar sight" across the rest of Europe.[19]
To Dr. Molly, the closing of the zinc mine hardly presented reason for the culmination of Neutral Moresnet as a community, much less its end. On the contrary, he became the foremost advocate of pursuing a path of complete independence and severing the few ties that Moresnet had with Prussia and Belgium. Within a year after the zinc mine closed down, he spearheaded the founding of a local, private postal service — but it was quickly shut down by Prussian and Belgian authorities.
Undeterred, he explored numerous other initiatives. In 1903, a group of entrepreneurs proposed developing a casino there to rival those in Monte Carlo, offering to build electric trolleys to nearby towns and "share the profit with every citizen."[20] In fact, a small casino opened briefly, but like the postal service was short-lived; on hearing of it, the king of Belgium threatened Moresnet's always-tenuous independence.
But Belgium proved the least of Moresnet's worries. In 1900 the Prussian state — now itself consolidated into the greater German Empire — began to undertake "aggressive" tactics towards pressuring the residents of the zone to consent to absorption.[21] None too subtle and true to its martial heritage, Prussian efforts included "outright sabotage," such as cutting off Moresnet's electricity and telephone connections at times.[22]When citizens attempted to run new electrical and telephone lines, Prussia attempted to thwart them, as well as "prevent[ing] the appointment of new … officials" known to support Moresnettian independence.[23]
But "these people, small though their territory, w[ould] not be cabined, cribbed, confined."[24] In fact, despite being harassed by a state thousands of times larger and armed to the teeth, by 1907 the population of the hamlet had increased to almost 3,800, only 460 of whom were descendents of the original Moresnettians.[25] The rest came from varied and far-flung locations: not only Germans, Belgians and Dutch, but also former residents of Italy, Switzerland, and Russia — and eventually two Americans and even one Chinese resident. A large cathedral had come to occupy the center of the community, which had expanded to over 800 homes.[26] Even though Belgian Aix-la-Chapelle was nearby and offered a more cosmopolitan experience, in general, the Moresnettians chose "not [to] leave the Triangle, but variedly find the spice of life within its slender borders."[27]
Dr. Molly — now living in the "thoroughly autonomous" Neutral Moresnet for half a century — began to view the independence and prosperity of Moresnet as a place compatible with the Weltanschauung of another of his intellectual pursuits: the universal language and culture of Esperanto.[28] While a detailed discussion of Esperanto is beyond the scope of this writing, the synthetic language was founded in 1887 by L.L. Zamenhof to eliminate the "hate and prejudice" that he theorized arose between ethnic groups owing to language differences and often leading to war; and it should come as little surprise that Esperanto's founder additionally expressed his
profound [conviction] that every nationalism offers humanity only the greatest unhappiness.… It is true that the nationalism of oppressed peoples — as a natural self-defensive reaction — is much more excusable than the nationalism of peoples who oppress; but, if the nationalism of the strong is ignoble, the nationalism of the weak is imprudent; both give birth to and support each other.[29]
Embracing this thinly veiled antistate philosophy and having corresponded for years with prominent Esperantists around the world, in 1906, Dr. Molly met with several colleagues to discuss designating Neutral Moresnet as a self-determining global haven for Esperantists; a territory that would "embrace aims and ideals affecting the brotherhood of man … civilized life … emancipating ourselves from all that is absurd and unworthy in convention, all that the ignorant centuries have imposed upon us."[30] Core to that initiative, he proposed that the name of the enclave be changed to Amikejo — Esperanto for "place of friendship" — not only espousing their explicitly peaceful nature, but undoubtedly a propagandist thumb in the eye of ever-marauding Prussia.[31]
Two years later, in 1908, a large celebration was held commemorating the launch of the renamed Amikejo, complete with festivities and the airing of a new national anthem.[32] Unsurprisingly, the occasion went unnoted (and Amikejo unrecognized) by nearby states, although numerous newspapers reported the event.
By 1914, Amikejo's population topped 4,600 people, peacefully cohabitating in an economically prosperous political limbo characterized by an "absence of definite rule."[33] Signs and notifications were printed in German, French, and Esperanto, and residents had developed one of the "queerest and most unintelligible dialects in the world."[34] Indeed, an American — an American of the turn of the century, no less — described the establishment as having "a sort of al fresco freedom of life, an untrammelledness which comes naturally from long-continued absence of centralized restraint."[35]
Indeed; for a century, residents and settlers in the diminutive wedge of land had found governments — internally and foreign — superfluous to and iniquitous toward the attainment of individual liberty. In one sense the Moresnet/Amikejo experiment might be viewed as Europe's analog to the American West, covering a greater length of time but on a much smaller scale. Summarizing, one reporter described it as
one of the smallest and strangest territories in the world … an encircling ridge of high mountains veritably buries it from neighboring civilization and culture and leaves it in a little world of its own.… [And] for nearly a century, the inhabitants have never experienced the feeling of being under the rule of an emperor, king or president. They are independent, governed by no one, at liberty to do as they please.[36]
More to the point, another visitor described Amikejo in simple terms: "a legal anarchy."[37]
Despite a vibrant, small-scale economy, the existence of the district remained enormously fragile in the tempestuous political environment of early 20th-century Continental Europe. Amikejans perennially worried over the "impermanency of their pleasing status," and this concern was realized in 1914 when war broke out between France and Germany.[38]Although Amikejo escaped destruction as invading German forces bypassed it — it was, fortuitously, "an oasis in a desert of destruction" — the War proved a ready excuse, confirming the suspicion that "Prussia … always had the intention to appropriate the territory" when Germany statutorily annexed the district in 1915.[39]
Two inconceivably bloody years later, with the end of the war in sight, only the Contemporary Review, a British journal of politics and social reform, considered the plight of Amikejo née Moresnet:


The fate of Moresnet has been forgotten in this immense catastrophe. We must bear it in mind. After the victory the plenipotentiaries who draw up the conditions of peace must not neglect this poor little piece of independence which has been victimized.[40]
The cost of the Great War was unimaginably staggering, dwarfing those of previous conflicts in virtually every category: 37 million casualties, the influenza pandemic, widespread hunger, civil dislocation, economic wreckage, and more. But another, seldom-considered consequence of the war — of all wars — was, and is, the uncountable heaps of unfulfilled promises and discarded goals left in the wake of the conflagration. And with article 32 of the Treaty of Versailles — "Germany recognizes the full sovereignty of Belgium over the whole of the contested territory of Moresnet"[41] — these were joined by yet another: Dr. Molly's vision.
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