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segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Nota do MRE e do MAPA sobre o respeito ao Meio Ambiente no Acordo Mercosul-UE (22/09/2020)

200922NotaMREeMAPAsobreMeioAmbienteAcordoUEMSul

 

Nota conjunta do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento sobre o relatório do governo francês a respeito do Acordo Mercosul-UE

 

Criado: 22 de Setembro de 2020 - 13h26

            

O governo brasileiro esclarece os seguintes pontos a respeito do relatório “Dispositions et effets potentiels de la partie commerciale de l’Accord d’Association entre l’Union européenne et le Mercosur en matière de développement durable”:

 

  • Já em um primeiro exame preliminar sobre o relatório encomendado pelo governo francês sobre o impacto do Acordo Mercosul-UE, divulgado na última quinta-feira, o governo brasileiro observa a necessidade de aprofundar o conhecimento sobre a realidade brasileira bem como considerar os dados técnicos disponíveis sobre o tema.
  • Por ora, afirma, em primeiro lugar, que o referido Acordo não representa qualquer ameaça ao meio ambiente, à saúde humana e aos direitos sociais. Ao contrário, reforça compromissos multilaterais e agrega as melhores práticas na matéria.
  •  O relatório apresenta argumentos não baseados em critérios técnicos, que sugerem que a entrada em vigor do citado Acordo terá impacto ambiental negativo, ao alegadamente ocasionar elevação do desmatamento e pôr em xeque os esforços para combater a mudança do clima ao amparo de acordos internacionais.
  •  O cerne das críticas do relatório aos aspectos ambientais do Acordo em tela diz respeito à relação entre a atividade agropecuária, sobretudo a produção de carne bovina, e o desmatamento.
  • O argumento central baseia-se no seguinte silogismo: (1) o Acordo Mercosul-UE levará a aumento significativo nas exportações de carne bovina dos países do Mercosul para a UE; (2) a expansão da pecuária no Mercosul sempre leva ao aumento do desmatamento; (3), logo, o Acordo Mercosul-UE levará ao aumento expressivo do desmatamento nos países do Mercosul, assim como ao aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) em decorrência do desmatamento.
  • O Brasil já mostrou que é capaz de aumentar sua produção de carne, soja e milho ao passo em que diminui o desmatamento. De 2004 a 2012, o desmatamento da região chamada de Amazônia Legal caiu 83%, enquanto que a produção agrícola subiu 61%. Nesse mesmo período, o rebanho bovino cresceu em mais de 8 milhões de cabeças, chegando a 212 milhões em 2012. Esses dados inserem-se em tendência histórica de intensificação da agropecuária brasileira e dos decorrentes ganhos de produtividade, em sintonia com a preservação ambiental.
  • O aumento de produção no Brasil se dá por inovação tecnológica sem necessidade de expansão de novas áreas. O potencial de expansão de produtividade é enorme, uma vez que a adoção das tecnologias já existentes não se dá de maneira uniforme entre os diversos produtores, sem falar nas tecnologias que ainda serão desenvolvidas pelos órgãos de pesquisas dedicadas ao desenvolvimento de agricultura tropical.
  • No que se refere ao impacto de emissões de gases de efeito estufa (GEE), a LSE concluiu que o impacto resultante da entrada em vigor do Acordo é insignificante. O estudo aponta que após a entrada em vigor do Acordo, o Mercosul será responsável por menos de 1/6 das emissões de GEE da UE.
  • Os autores do relatório parecem desconhecer, ainda, o fato de que já está em pleno vigor sistema de rastreabilidade da exportação de carne bovina brasileira para a UE. As exportações de carne do Brasil ao bloco europeu já devem obedecer ao regulamento comunitário sobre rastreabilidade, mesmo antes da entrada em vigor do Acordo entre o Mercosul e a UE, o qual não diminuirá o nível de exigência europeu a respeito, no momento de sua implementação.
  • Cabe reforçar que o relatório da comissão de avaliação do citado Acordo do governo francês revela as reais preocupações protecionistas daqueles que o encomendaram ao tratar das concessões agrícolas feitas pela UE ao Mercosul.
  • No Acordo Mercosul-UE, quando se trata de produtos agrícolas sensíveis para as partes, os blocos realizaram ofertas em geral com cotas. Este foi o caso da cota tarifária para carne bovina e frango no caso da União Europeia, por exemplo, e as cotas para leite em pó e alho, no caso do Mercosul. Como há limites à comercialização nestes casos, não é possível imaginar estímulos exagerados às exportações dos blocos em produtos negociados com limitação quantitativa.
  • O relatório também ignora o progressivo fortalecimento da legislação ambiental no país. O Brasil foi pioneiro em políticas de conservação, com a implementação de seu primeiro Código Florestal em 1934. Graças a esse esforço de longa data, mais de 66% do território brasileiro é coberto por vegetação nativa. O cultivo está limitado a cerca de 30% do território, do qual 8% está dedicado à agricultura do país e em torno de 22% à pecuária, segundo a Embrapa Territorial. Esse cenário eleva o Brasil à categoria de potência ambiental.
  • O Código Florestal vigente estabelece normas gerais sobre a proteção da vegetação nativa, única legislação ambiental do mundo que destina parcelas das propriedades rurais privadas à preservação sem oferecer qualquer remuneração por isso. Como exemplo, todo proprietário de terras na Amazônia deve dedicar 80% de seu patrimônio para a conservação ambiental. Esse é um benefício para a população global feito pelo produtor rural brasileiro, sem qualquer contraparte ou incentivo do Estado. Esse produtor, que atua em conformidade com a lei e garante a preservação ambiental, é que tem a expectativa de ser beneficiado pelo Acordo. Convidamos os produtores rurais do mundo a aliarem-se à iniciativa dos brasileiros, dando sua contribuição à preservação da biodiversidade, para frear o aquecimento global além de colaborar com a segurança alimentar.
  • O Acordo Mercosul-UE reconhece a importante relação entre o desenvolvimento social e econômico e a proteção do meio ambiente, ao dispor, em seu capítulo sobre comércio e desenvolvimento sustentável, que a liberalização comercial poderá dar contribuição positiva para o desenvolvimento sustentável nos países do Mercosul, nas suas três dimensões – ambiental, econômica e social.
  • O Mercosul busca implementar agenda modernizadora com vistas a conciliar aumento de competitividade/produtividade com padrões elevados de sustentabilidade ambiental. Como parte desta agenda, o bloco concluiu acordos de livre comércio com a UE e com a EFTA, em 2019. Ambos os acordos contêm capítulos dedicados a fortalecer a sustentabilidade e contemplam atividades de cooperação técnica para preservação da biodiversidade, gerenciamento de florestas nativas, pesca e vida animal, além de padrões elevados de proteção das condições de trabalho, de acordo com os objetivos da Agenda 2030. Todos os dispositivos sobre meio ambiente foram acordados conjuntamente entre as partes e vão muito além da maioria dos acordos comerciais em vigor da UE.
  • Como prova do compromisso elevado em temas ambientais, o princípio da precaução está presente no acordo Mercosul-UE. Segundo o princípio, havendo indícios objetivos de que uma atividade possa acarretar danos irreversíveis ao meio ambiente, a ausência de certeza científica absoluta não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.
  • O Acordo tampouco diminuirá o nível apropriado de proteção sanitária, fitossanitária e de inocuidade alimentar soberanamente estabelecido pelas partes. O Acordo também aprimora a cooperação birregional e multilateral em temas como bem-estar animal, biotecnologia, limites máximos de resíduos em alimentos e combate à resistência antimicrobiana. Ressalta-se que os alimentos exportados pelo Mercosul já cumprem com os mais altos padrões sanitários, fitossanitários e de inocuidade, em conformidade com os parâmetros recomendados pelas organizações e mecanismos internacionais de referência.
  • Carece de fundamento a conclusão do relatório de que disciplinas do Acordo nas áreas de saúde pública e inocuidade alimentar poderiam deixar cidadãos europeus em pior situação do que antes do Acordo. As disciplinas negociadas no Acordo foram inspiradas em normativa multilateral já assumidas pelas partes e até em disciplinas já em vigor na UE, que vão além da OMC.
  • Quanto às indicações geográficas (IG), com a entrada em vigor do Acordo, o MERCOSUL protegerá 355 IGs europeias, em contraste com as 340 IGs reconhecidas pelo México e 158, pelo Canadá. A política de IG da UE tem resultado em consideráveis retornos aos produtores europeus que, no entanto, o relatório parece não reconhecer.
  • Muitas das conclusões do relatório refletem as preocupações protecionistas de segmentos europeus, do que é ilustrativa a defesa de que preferências tarifárias só deveriam ser dadas a produtos que sigam os métodos europeus de produção. Porém, não se pode ignorar que as condições edafoclimáticas europeias são distintas das do Mercosul, por conseguinte, os métodos de produção não podem, em muitos casos, serem os mesmos, para que não se tornem insustentáveis. Esse é o caso de dupla ou tripla colheita na mesma área por ano, que se mostra inviável no continente europeu.
  • Chama atenção o fato de o relatório defender medidas de salvaguarda bilaterais sem limite no tempo. O mecanismo de salvaguarda bilateral tem por objetivo gerar conforto às partes de que poderão ajustar-se durante o período de transição do acordo, ou seja, quando e se a redução das tarifas bilaterais estiver causando distúrbio nos mercados. Findo o período de transição do acordo, eventuais distúrbios não mais derivariam da abertura comercial a certa contraparte, mas de outros fatores, como condições climáticas adversas, novos métodos de produção, entre outros motivos, e, portanto, não deveriam fazer uso – neste caso, distorcido - do mecanismo de salvaguarda bilateral.
  • Causa estranheza, por fim, que o relatório esteja focado em produtos de alta sensibilidade agrícola europeia e valha-se de argumentos não comerciais (como o suposto risco de desflorestamento) para garantir proteção econômica a certos produtores.
  • Com base no exposto, o governo brasileiro refuta qualquer afirmação de que o acordo aumentaria a destruição da floresta amazônica. Reafirma que o acordo traz compromissos adicionais aos direitos ambiental e comercial multilateral para regular os fluxos comerciais atuais e futuros a bem da garantia da sustentabilidade ambiental.
  • A entrada em vigor do Acordo tem o potencial de alimentar o ciclo virtuoso em ambos os blocos quanto a:

 Melhoria das condições econômicas,

- Incremento da qualidade de vida dos cidadãos, com geração de emprego e renda, e redução de custo de alimento e bioenergia,

- Desenvolvimento e adoção de tecnologias, para melhoria da eficiência dos setores econômicos,

- Fortalecimento da preservação ambiental, e diminuição a emissão de GEE, visto que reforça o compromisso do Acordo de Paris.

  • A não entrada em vigor do Acordo Mercosul-UE passaria mensagem negativa e estabeleceria claro desincentivo aos esforços do país para fortalecer ainda mais sua legislação ambiental. A não aprovação do Acordo teria, ademais, implicações sociais e econômicas negativas, que poderiam agravar ainda mais os problemas ambientais da região. Malogro em ratificá-lo implicará lacuna importante no fortalecimento da relação entre as partes e na reiteração de um livre comércio sustentável e responsável, que proporcionará prosperidade com preservação da natureza, resultante da melhoria das condições econômicas.

 

Ministério das Relações Exteriores - MRE

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA

 

As bibliotecas de minha infância e adolescência - Paulo Roberto de Almeida

As bibliotecas de minha infância e adolescência 

Paulo Roberto de Almeida

Quando não se tem livros em casa, o jeito é buscá-los em bibliotecas. Em livrarias, também, se você tem dinheiro, mas em bibliotecas públicas se você não o tem, nem a sua família.

Foi o que sempre eu fiz, durante toda a vida. Um dia vou falar de todas as bibliotecas, livrarias, sebos que visitei, mas hoje vou ficar com as minhas primeiras leituras nas bibliotecas de minha infância e adolescência.

Começou com a que estava mais próxima de casa, e nisso fui um privilegiado: a Biblioteca Infantil Municipal Anne Frank (não tinha a menor ideia de quem fosse) ficava um quarteirão apenas, numa rua tranquila, num bairro então periférico de SP, o Itaim Bibi, quase sem asfalto, com muitos terrenos baldios, onde se podia jogar futebol, com algum esforço, ou brincar de esconde-esconde, nos terrenos com mato. Ou então brincar de taco na rua, pois quase não passavam carros, inclusive porque ela terminava por uma pequena ponte de madeira, que se atravessava a pé, pois nem carroça cabia ali.

Confesso que eu não era seduzido por nenhuma dessas atividades: depois do parque infantil, eu comecei a “frequentar” a biblioteca, mesmo dois ou três anos antes de aprender a ler, na “tardia” idade de sete anos (que é quando começavam os quatro anos do ensino primário, o único obrigatório em meados dos anos 1950).

Vindo de avós perfeitamente analfabetos, e de pais que sequer haviam concluído o curso primário, não se poderia esperar que eu tivesse livros em casa ou que fosse estimulado a ler.

Assim, eu ia à biblioteca essencialmente para jogar, o que fazia sempre, ou para assistir filmes, uma vez por semana, quarta ou quinta-feira de tarde. Lembro-me de Oscarito e Grande Otelo, Tarzan, Roy Rogers, Zorro, Hopalong Cassidy, Os Três Patetas, O Gordo e o Magro, e outros filmes do gênero. Quanto aos brinquedos eram muito simples: palitos, dominó, dados e tabuleiro, depois damas, pois xadrez veio bem mais tarde. Havia também revistas infantis, que eu seguia apenas pelos desenhos, pois ainda demorou dois anos para ser apresentado ao difícil mundo das letras.

Mas eu já tinha um imenso respeito pelas letras e pela cultura escrita, provavelmente por me ver cercado de livros, de todos os tipos e tamanhos, que eu folheava pelas ilustrações. Lembro-me de quando minha mãe, Dona Laura, me anunciou solenemente que eu iria para a escola, pois eu já tinha feito sete anos, e o uniforme estava comprado — muita roupa lavada para fora ele custou —, eu respondi que não queria ir. Como assim!?!? Não posso, obtemperei (um verbo que obviamente não estava em meu vocabulário). Como não pode?!?! Tem de ir!

Não posso, continuei. 

Mas por que?!?!

Eu não sei ler, confessei, com vergonha, a única desculpa que eu podia dar.

Não sei como a coisa se arranjou, mas lá fui eu para o primeiro ano do primário,  no Grupo Escolar Aristides de Castro. Creio que me sai muito bem, com meu caderno de caligrafia e algum livro do tipo Ivo Viu a Uva. Dona Iracema — que não tinha nada de “virgem dos lábios de mel”, como vim a ler mais tarde, e sim era uma gordinha baixinha, moreninha e severa — deve ter sido muito eficiente, pois em pouco tempo eu estava de volta à Biblioteca, com todo um imenso universo à minha disposição. 

Foi uma festa: comecei pelas revistas em quadrinhos: Pato Donald, Bolão e Rocambole, os Sobrinhos do Capitão, mas logo fui para literatura “pesada”: Monteiro Lobato, que foi provavelmente minha maior influência nos anos iniciais de formação. Devo ter lido tudo, ou quase tudo, da sua literatura infantil, desprezando durante anos sua obra adulta, que só vim a ler, erraticamente, muitos anos depois. O mundo grego, com seus heróis mitológicos, foi o que mais me fascinou.

Mas aí eu já tinha praticamente “liquidado” quase tudo o que me parecia interessante, inclusive, muito cedo, o História do Mundo para as Crianças, que li muitas vezes. Não lia só na Biblioteca, mas retirava livros para ler em casa, na cama, a contra luz, antes que minha mãe apagasse as luzes, para economizar. Não me lembro de estantes, na infância, e os livros ficavam no criado-mudo ou mesmo no chão. Acho que esgotei as possibilidades da Anne Frank, e antes mesmo de começar a trabalhar no Centro da cidade, já tinha conhecido a Mário de Andrade, que passei a frequentar na primeira adolescência, quando me tornei office-boy numa grande empresa da Rua Boa Vista. 

Foi outro universo que se abriu para mim: aproveitava as saídas para descontar cheques ou pagar contas nos bancos do centro para rápidas incursões na Mário de Andrade, na da Faculdade de Direito do Largo de S. Francisco e também na Livraria Brasiliense da Barão de Itapetininga. Mais tarde aprendi a ir na Biblioteca da Usia, no Consulado Americano — que então ficava no segundo andar do Conjunto Nacional da Avenida Paulista —, na do UCBEU, União Cultural Brasil-Estados Unidos, na da Confederação do Comércio, embaixo do Viaduto do Chá, assim como entrava em todas as livrarias conhecidas: uma delas era a Zahar, da Praça da República, e mais tarde ainda a da Alliance Française, na mesma Barão de Itapetininga.

Posso me lembrar dos vários livros que eu lia (e quando podia retirava) em cada uma delas, mas é uma lista muito grande, que deixo para relatar mais adiante. O que sim posso dizer, genericamente, é que eu passei a ler obras universitárias vários anos de ingressar na universidade, mais ou menos a partir de doze a catorze anos, quando me politizei precocemente, por obra e graça das crises políticas dos anos Jânio-Goulart e do golpe militar de 1964. Passei a ler Caio Prado e Celso Furtado, Marx e Engels e tudo o que me parecia interessante para entender o Brasil efervescente dos anos 1960. 

Só no final da década, com o endurecimento do regime, e a aposentadoria compulsória ou cassação daqueles que seriam meus mestres nas Ciências Sociais da USP — cujos livros eu já conhecia em grande parte —, foi que decidi sair do país para estudar fora. Fui embora, mas não deixei de arrastar alguns livros e cadernos de notas comigo.

Não sabia que passaria sete longos anos de autoexílio na Europa, grande parte dos quais escondido ou refugiado em bibliotecas e livrarias. Mas essa é uma história que eu contarei depois.


Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 28/09/2020


domingo, 27 de setembro de 2020

Al Capone na Casa Branca (ou quase isto): as falcatruas de Trump no Imposto de Renda - David Leonhardt (NYT)

18 Revelations From a Trove of Trump Tax Records

Times reporters have obtained decades of tax information the president has hidden from public view. Here are some of the key findings.

Haruka Sakaguchi for The New York Times

The New York Times has obtained tax-return data for President Trump and his companies that covers more than two decades. Mr. Trump has long refused to release this information, making him the first president in decades to hide basic details about his finances. His refusal has made his tax returns among the most sought-after documents in recent memory.

Among the key findings of The Times’s investigation:

  • Mr. Trump paid no federal income taxes in 11 of 18 years that The Times examined. In 2017, after he became president, his tax bill was only $750.

  • He has reduced his tax bill with questionable measures, including a $72.9 million tax refund that is the subject of an audit by the Internal Revenue Service.

  • Many of his signature businesses, including his golf courses, report losing large amounts of money — losses that have helped him to lower his taxes.

  • The financial pressure on him is increasing as hundreds of millions of dollars in loans he personally guaranteed are soon coming due.

  • Even while declaring losses, he has managed to enjoy a lavish lifestyle by taking tax deductions on what most people would consider personal expenses, including residences, aircraft and $70,000 in hairstyling for television.

  • Ivanka Trump, while working as an employee of the Trump Organization, appears to have received “consulting fees” that also helped reduce the family’s tax bill.

  • As president, he has received more money from foreign sources and U.S. interest groups than previously known. The records do not reveal any previously unreported connections to Russia.

It is important to remember that the returns are not an unvarnished look at Mr. Trump’s business activity. They are instead his own portrayal of his companies, compiled for the I.R.S. But they do offer the most detailed picture yet available.

Below is a deeper look at the takeaways. The main article based on the investigation contains much more information, as does a timeline of the president’s finances. Dean Baquet, the executive editor, has written a note explaining why The Times is publishing these findings.

The president’s tax avoidance

Mr. Trump has paid no federal income taxes for much of the past two decades.

In addition to the 11 years in which he paid no taxes during the 18 years examined by The Times, he paid only $750 in each of the two most recent years — 2016 and 2017.

He has managed to avoid taxes while enjoying the lifestyle of a billionaire — which he claims to be — while his companies cover the costs of what many would consider personal expenses.

This tax avoidance sets him apart from most other affluent Americans.

Taxes on wealthy Americans have declined sharply over the past few decades, and many use loopholes to reduce their taxes below the statutory rates. But most affluent people still pay a lot of federal income tax.

In 2017, the average federal income rate for the highest-earning .001 percent of tax filers — that is, the most affluent 1/100,000th slice of the population — was 24.1 percent, according to the I.R.S.

Over the past two decades, Mr. Trump has paid about $400 million less in combined federal income taxes than a very wealthy person who paid the average for that group each year.

His tax avoidance also sets him apart from past presidents.

Mr. Trump may be the wealthiest U.S. president in history. Yet he has often paid less in taxes than other recent presidents. Barack Obama and George W. Bush each regularly paid more than $100,000 a year — and sometimes much more — in federal income taxes while in office.

Mr. Trump, by contrast, is running a federal government to which he has contributed almost no income tax revenue in many years.

A large refund has been crucial to his tax avoidance.

Mr. Trump did face large tax bills after the initial success of “The Apprentice” television show, but he erased most of these tax payments through a refund. Combined, Mr. Trump initially paid almost $95 million in federal income taxes over the 18 years. He later managed to recoup most of that money, with interest, by applying for and receiving a $72.9 million tax refund, starting in 2010.

The refund reduced his total federal income tax bill between 2000 and 2017 to an annual average of $1.4 million. By comparison, the average American in the top .001 percent of earners paid about $25 million in federal income taxes each year over the same span.

The $72.9 million refund has since become the subject of a long-running battle with the I.R.S.

When applying for the refund, he cited a giant financial loss that may be related to the failure of his Atlantic City casinos. Publicly, he also claimed that he had fully surrendered his stake in the casinos.

But the real story may be different from the one he told. Federal law holds that investors can claim a total loss on an investment, as Mr. Trump did, only if they receive nothing in return. Mr. Trump did appear to receive something in return: 5 percent of the new casino company that formed when he renounced his stake.

In 2011, the I.R.S. began an audit reviewing the legitimacy of the refund. Almost a decade later, the case remains unresolved, for unknown reasons, and could ultimately end up in federal court, where it could become a matter of public record.

Business expenses and personal benefits

Mr. Trump classifies much of the spending on his personal lifestyle as the cost of business.

His residences are part of the family business, as are the golf courses where he spends so much time. He has classified the cost of his aircraft, used to shuttle him among his homes, as a business expense as well. Haircuts — including more than $70,000 to style his hair during “The Apprentice” — have fallen into the same category. So did almost $100,000 paid to a favorite hair and makeup artist of Ivanka Trump.

All of this helps to reduce Mr. Trump’s tax bill further, because companies can write off business expenses.

Seven Springs, his estate in Westchester County, N.Y., typifies his aggressive definition of business expenses.

Mr. Trump bought the estate, which stretches over more than 200 acres in Bedford, N.Y., in 1996. His sons Eric and Donald Jr. spent summers living there when they were younger. “This is really our compound,” Eric told Forbes in 2014. “Today,” the Trump Organization website continues to report, “Seven Springs is used as a retreat for the Trump family.”

Nonetheless, the elder Mr. Trump has classified the estate as an investment property, distinct from a personal residence. As a result, he has been able to write off $2.2 million in property taxes since 2014 — even as his 2017 tax law has limited individuals to writing off only $10,000 in property taxes a year.

The ‘consulting fees’

Across nearly all of his projects, Mr. Trump’s companies set aside about 20 percent of income for unexplained ‘consulting fees.’

These fees reduce taxes, because companies are able to write them off as a business expense, lowering the amount of final profit subject to tax.

Mr. Trump collected $5 million on a hotel deal in Azerbaijan, for example, and reported $1.1 million in consulting fees. In Dubai, there was a $630,000 fee on $3 million in income. Since 2010, Mr. Trump has written off some $26 million in such fees.

His daughter appears to have received some of these consulting fees, despite having been a top Trump Organization executive.

The Times investigation discovered a striking match: Mr. Trump’s private records show that his company once paid $747,622 in fees to an unnamed consultant for hotel projects in Hawaii and Vancouver, British Columbia. Ivanka Trump’s public disclosure forms — which she filed when joining the White House staff in 2017 — show that she had received an identical amount through a consulting company she co-owned.

Money-losing businesses

Many of the highest-profile Trump businesses lose large amounts of money.

Since 2000, he has reported losing more than $315 million at the golf courses that he often describes as the heart of his empire. Much of this has been at Trump National Doral, a resort near Miami that he bought in 2012. And his Washington hotel, opened in 2016, has lost more than $55 million.

An exception: Trump Tower in New York, which reliably earns him more than $20 million in profits a year.

The most successful part of the Trump business has been his personal brand.

The Times calculates that between 2004 and 2018, Mr. Trump made a combined $427.4 million from selling his image — an image of unapologetic wealth through shrewd business management. The marketing of this image has been a huge success, even if the underlying management of many of the operating Trump companies has not been.

Other firms, especially in real estate, have paid for the right to use the Trump name. The brand made possible the “The Apprentice” — and the show then took the image to another level.

Of course, Mr. Trump’s brand also made possible his election as the first United States president with no prior government experience.

But his unprofitable companies still served a financial purpose: reducing his tax bill.

The Trump Organization — a collection of more than 500 entities, virtually all of them wholly owned by Mr. Trump — has used the losses to offset the rich profits from the licensing of the Trump brand and other profitable pieces of its business.

The reported losses from the operating businesses were so large that they often fully erased the licensing income, leaving the organization to claim that it earns no money and thus owes no taxes. This pattern is an old one for Mr. Trump. The collapse of major parts of his business in the early 1990s generated huge losses that he used to reduce his taxes for years afterward.

Large bills looming

With the cash from ‘The Apprentice,’ Mr. Trump went on his biggest buying spree since the 1980s.

“The Apprentice,” which debuted on NBC in 2004, was a huge hit. Mr. Trump received 50 percent of its profits, and he went on to buy more than 10 golf courses and multiple other properties. The losses at these properties reduced his tax bill.

But the strategy ran into trouble as the money from “The Apprentice” began to decline. By 2015, his financial condition was worsening.

His 2016 presidential campaign may have been partly an attempt to resuscitate his brand.

The financial records do not answer this question definitively. But the timing is consistent: Mr. Trump announced a campaign that seemed a long shot to win, but was almost certain to bring him newfound attention, at the same time that his businesses were in need of a new approach.

The presidency has helped his business.

Since he became a leading presidential candidate, he has received large amounts of money from lobbyists, politicians and foreign officials who pay to stay at his properties or join his clubs. The Times investigation puts precise numbers on this spending for the first time.

A surge of new members at the Mar-a-Lago club in Florida gave him an additional $5 million a year from the business since 2015. The Billy Graham Evangelistic Association paid at least $397,602 in 2017 to the Washington hotel, where it held at least one event during its World Summit in Defense of Persecuted Christians.

In his first two years in the White House, Mr. Trump received millions of dollars from projects in foreign countries, including $3 million from the Philippines, $2.3 million from India and $1 million from Turkey.

But the presidency has not resolved his core financial problem: Many of his businesses continue to lose money.

With “The Apprentice” revenue declining, Mr. Trump has absorbed the losses partly through one-time financial moves that may not be available to him again.

In 2012, he took out a $100 million mortgage on the commercial space in Trump Tower. He has also sold hundreds of millions worth of stock and bonds. But his financial records indicate that he may have as little as $873,000 left to sell.

He will soon face several major bills that could put further pressure on his finances.

He appears to have paid off none of the principal of the Trump Tower mortgage, and the full $100 million comes due in 2022. And if he loses his dispute with the I.R.S. over the 2010 refund, he could owe the government more than $100 million (including interest on the original amount).

He is personally on the hook for some of these bills.

In the 1990s, Mr. Trump nearly ruined himself by personally guaranteeing hundreds of millions of dollars in loans, and he has since said that he regretted doing so. But he has taken the same step again, his tax records show. He appears to be responsible for loans totaling $421 million, most of which is coming due within four years.

Should he win re-election, his lenders could be placed in the unprecedented position of weighing whether to foreclose on a sitting president. Whether he wins or loses, he will probably need to find new ways to use his brand — and his popularity among tens of millions of Americans — to make money.

 

Odorico, Severino e Bolsonaro na ONU - Vera Magalhães (OESP)

 Odorico, Severino e Bolsonaro

Vera Magalhães

O Estado de S.Paulo, 23/09/2020

 Brasil se destaca na ONU pela caricatura, e não pela diplomacia


Desde 1947 cabe ao Brasil abrir a Assembleia-Geral das Nações Unidas, na sede da ONU, em Nova York. O primeiro a fazer uso da prerrogativa foi OswaldoAranha. De lá para cá, nossa representação só deteriora. Com Jair Bolsonaro já são dois anos de negacionismo, mentiras e blablablá ideológico. Em 2019, presencial; ontem, em vídeo. Não importa, a vergonha é a mesma.

Infrutífero comparar as falas de Bolsonaro com outras igualmente infelizes de presidentes que o antecederam. De jaquetão e bigode engomado, José Sarney exibiu um inglês macarrônico. Mas não mentiu nem criou fantasias persecutórias aos olhos do mundo, nem tampouco exibiu desconexão completa da realidade.

Dilma Rousseff discursou várias vezes e sua fala recebeu merecidas críticas, por edulcorar os escândalos de corrupção que ajudaram a pavimentar seu impeachment, logo depois, por tergiversar com ataques à democracia em países de esquerda. Mas ela se conteve, por exemplo, e não falou em golpe ao discursar em abril, já às vésperas de ser afastada, para não levar assuntos domésticos e, mais, uma interpretação dos fatos, a um palco internacional.

Com Bolsonaro não há paralelo possível. Quando se pensava que nada poderia superar a fala do ano passado, na deste ano o presidente brasileiro disse cinicamente que o Brasil tem um dos melhores resultados no enfrentamento da covid-19, isso com mais de 137 mil mortos nas costas, enalteceu nossa política ambiental mesmo com a Amazônia e o Pantanal queimando aos olhos do mundo, converteu o auxílio emergencial em dólar e somou todas as parcelas para vender uma bonança dos mais pobres que é falsa e ainda inventou um conceito, a “cristofobia”, que, se bem explorado pelos seus ideólogos reacionários, pode fornecer mais empulhação para as eleições de 2022.


Diante de tal acervo de sandices, os paralelos possíveis com Bolsonaro na ONU se situam na ficção e no baixo clero, de onde o nosso presidente veio e de onde nunca teria saído em condições políticas normais.

A primeira referência é a antológica passagem de Odorico Paraguaçu, personagem do genial Dias Gomes, pelas Nações Unidas. Cercado de um séquito que incluía beatas fervorosas (também há as Cajazeiras do bolsonarismo), um puxa-saco caricato (candidatos a Dirceu Borboleta não faltam no Ministério) e o “capitão” Zeca Diabo (versão anos 80 de miliciano), o prefeito de Sucupira queria oferecer um terreno na cidade para que fosse construída a nova sede da ONU. Megalomania, ridículo e nacional-populismo na veia. Em 1983, pelo menos, era dramaturgia.

Outra passagem que lembra nos contornos patéticos as participações de Bolsonaro no fórum global foi a de Severino Cavalcanti em 2005, como presidente da Câmara, que cobri in loco. Então alvo do escândalo do “mensalinho”, em que era acusado de recolher propina de permissionários da Casa, o deputado pernambucano viajou com direito a séquito e limusine a Nova York e foi alvo de sistemática cobertura de imprensa.

O cerco a Severino, que se escondeu até no banheiro da ONU para fugir da imprensa, levou jornalistas de outros países a nos perguntarem quem era aquele homem para receber tanta atenção. Nos questionavam se ele estava envolvido no escândalo “Petróleo por Comida”. Mal sabiam que era comida por mensalinho mesmo, algo bem mais rastaquera.

Bolsonaro, com suas mentiras cínicas e deliberadas no momento mais grave da vida nacional neste século, rebaixa a Presidência a uma versão digital da Sucupira de Odorico. 

As agências de checagem já trataram de desmontar o discurso fake que ele fez. A mim restaram essas reminiscências envergonhadas. Levaremos anos para suplantar esse momento de rebaixamento do Brasil.