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terça-feira, 13 de novembro de 2018

Paulo Kramer: Bolsonaro e militares, os novos liberais

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Minha entrevista à Época desta semana.


 Colaborador do programa de governo de Bolsonaro, o cientista político Paulo Kramer diz que o presidente eleito poderá ser a liderança política que vai liberalizar a economia brasileira.



por Guilherme Evelin


10 Perguntas para KRAMER



1- Como o senhor interpreta a eleição de Jair Bolsonaro?

Bolsonaro virou o estuário das expectativas nacionais para virar a página do lulopetismo. É óbvio que a maior crise econômica que o Brasil viveu, fruto da roubalheira e do desastre fiscal do lulopetismo no poder, teve um papel importante na fermentação desse descontentamento. Mas a questão econômica esteve praticamente ausente do debate eleitoral. O vetor que predominou nessa eleição foi a raiva. E colocou frente a frente petistas e antipetistas, lulistas e antilulistas.


2- Como responde a quem aponta os riscos de retrocesso para o autoritarismo no novo Governo?

Esse risco está hoje no espelho retrovisor. O Brasil correu esse risco durante os 13 anos e meio do lulopetismo no poder, cujo projeto era de eternização no poder, claramente presente em todos os documentos oficiais importantes do PT. Todas as facções do partido, à exceção da extinta Democracia Radical — comandada pelo José Genoino e que tinha como inspiração Norberto Bobbio (pensador italiano, socialista liberal) —, eram favoráveis à substituição de um regime de representação de uma pluralidade de interesses por um regime de cooptação, em que o dirigente político-partidário define quem participa ou não da política. Com Bolsonaro, não há riscos para a democracia, assim como não há risco de desfazimento do rumo liberal que a economia tomou a partir do impeachment de Dilma Rousseff.


3- Por quê? Muitos analistas colocam em dúvida a conversão ao liberalismo de Bolsonaro por ele ser um militar de carreira e por seu histórico de votações no Congresso Nacional, que mostrou um viés estatizante e protecionista.

Bolsonaro por ele ser um militar de carreira e por seu histórico de votações no Congresso Nacional, que mostrou um viés estatizante e protecionista. Quando bate nessa tecla, a imprensa está algumas páginas atrasada em relação à evolução do pensamento de Bolsonaro — não só dele, mas também dos militares próximos a ele. A ida do Paulo Guedes para a equipe mostra que alguma mudança ocorreu na cabeça desse pessoal. Os generais estão convencidos de que a economia tem de tomar um rumo liberal há muito tempo. O peso das ideias e opiniões desses militares, como o general Augusto Heleno (escolhido por Bolsonaro para chefiar o Gabinete de Segurança Institucional), é muito importante, tanto quanto o peso do próprio Paulo Guedes. Eu também fui comuna e sempre discutia a diferença entre condições objetivas e condições
subjetivas. A intensa tendência econômica por trás do impeachment da Dilma é um deslocamento do eixo da política econômica. O Brasil perdeu objetivamente as condições de ter uma economia levada pelo Estado, e isso propiciou um deslocamento para uma economia voltada para o mercado. A condição subjetiva é a tal liderança política.


4- Bolsonaro, proveniente do Exército, uma das mais fortes corporações brasileiras, será a liderança política a implantar uma economia liberal de mercado num país com histórico fortemente estatista e corporativista?

A política é cheia dessas ironias. Essa visão no Exército a favor de um Estado grande e forte — influência do positivismo — foi superada. Se você conversa com os professores das escolas militares, nota uma evolução dos currículos e das bibliografias, com uma educação de muitíssima qualidade, muito superior à área de ciências humanas das universidades civis. O militar, de uma maneira geral, é um cumpridor mais escrupuloso dos regulamentos. O patrimonialismo é o contrário: procura acochambrar os regulamentos de maneira a fazer prevalecer o interesse do governante do momento, de seus amigos, de sua família. O patrimonialismo brasileiro chegou a seus limites objetivos: morais, políticos, fiscais e econômicos. Espero que haja condições subjetivas para sua superação e para a implantação de um regime representativo no Brasil.


5- Como observador do dia a dia do Congresso, o senhor acredita que
Bolsonaro será capaz de montar uma coalizão sem se apoiar em partidos?

Do ponto de vista da ciência política, será uma experiência interessante. As frentes mais atuantes, como as bancadas evangélica e ruralista, sempre tiveram um acesso privilegiado aos líderes dos partidos. Mas o que ainda vige nos regimentos é a lógica da verticalidade partidária na distribuição de presidências de comissões, de cargos nas mesas, e na atribuição de relatoria de matérias importantes — e não a da horizontalidade das frentes temáticas. 


6- Como aprovar a reforma da previdência sem recorrer à distribuição de cargos e de verbas por meio de emendas parlamentares?

A bancada que veio eleita na onda de Bolsonaro, na Câmara e no Senado, é mais conservadora, mas não necessariamente mais reformista e mais liberal. Como o poder de persuasão do presidente é muito grande nos primeiros momentos de uma nova Presidência,
Acredito que ele terá sucesso na passagem dessas reformas no Congresso. Até porque, se ele não fizer isso rapidamente, não vai fazer nunca mais.


7- A Lua de Mel vai ser curta então?

Bolsonaro precisa aproveitar a janela de oportunidade da imensa popularidade dele. O carisma é fugaz. Max Weber (sociólogo alemão) dizia que a democracia de massas modernas exige uma liderança carismático-plebiscitária. O líder no Executivo deve usar sua legitimidade e o apoio da opinião pública para pressionar o Congresso. Há duas forças inerciais contra isso: de um lado a classe política, do outro a burocracia. Se elas não tiverem uma liderança, a tendência dessas duas forças é trabalhar apenas pela própria sobrevivência. Então, Bolsonaro vai precisar ser esse lídercarismáticoplebiscitário que Max Weber dizia ser importante. E esse encanto dura pouco.


8- Quanto tempo?

Um ano, no máximo. As dificuldades já são enormes por causa das crises econômica, moral e política. Como as expectativas também são muito altas — e a expectativa muito alta tende a ser a véspera da desilusão —, o presidente e seu governo precisam agir muito rapidamente.


9- O senhor foi punido pela Universidade de Brasília (UnB) por frases supostamente racistas em salas de aula. Não teme que o Escola sem Partido gerasse uma caças às bruxas macarthista dentro das universidades?

Eu e outros colegas sofremos o diabo com o macarthismo da esquerda. A universidade pública brasileira é dominada pelo marxismo e por seus subprodutos mais recentes, como a ideologia de gênero e a ideologia racialista. Para quem é liberal como eu, isso é uma aberração. Por causa disso, fui covardemente atacado na academia brasileira. De minha parte, não existe ânimo revanchista. Eu só gostaria de ver revertido esse processo de desmoralização da universidade brasileira, levado a efeito pelos ideólogos do lulopetismo. 


10-  Como é que se faz um processo desses sem gerar novas perseguições?

Uma coisa muito alvissareira será a transferência das universidades federais para o Ministério da Ciência e Tecnologia. Acredito que serão introduzidos controles mais exigentes no que diz respeito à produtividade e à qualidade do trabalho acadêmico. Isso vai ajudar muito.

A política externa do governo Bolsonaro - Rubens Barbosa

A POLÍTICA EXTERNA E O NOVO GOVERNO

Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 13/11/2018

            O presidente Jair Bolsonaro enfrentará o mais imprevisível e complexo cenário internacional desde 1945. O multilateralismo (ONU e OMC) e a globalização estão sob ataque com o risco concreto de uma guerra protecionista, colocando em perigo a ordem liberal e ameaçando trazer de volta a recessão.
            Políticas equivocadas nos 15 anos do PT colocaram o Brasil em uma situação de isolamento nas negociações comerciais, de atraso na inovação e tecnologia, de perda de poder, influência e de espaço no comércio internacional e de manufaturas, além de ter crescido abaixo da média mundial e dos países em desenvolvimento.
Sendo o Brasil uma das dez maiores economias do mundo, espera-se que o novo governo responda - como foi feito nos últimos dois anos - a esses desafios e busque restaurar e ampliar a voz do país no cenário internacional, e nos reinserir nos fluxos dinâmicos da economia e do comércio exterior.
            Sem apriorismos ideológicos, e com visão de futuro, o Itamaraty deveria definir as prioridades, segundo o atual interesse nacional e as transformações do cenário internacional no século XXI. Parece evidente que os principais interesses estratégicos do Brasil se encontram nos EUA, na Europa e na Ásia, em particular com a China, pela importância da agenda bilateral. A integração regional deveria merecer uma atenção especial, já que interessa ao Brasil ampliar a liberalização comercial, aprofundar os acordos vigentes e a integração física da região. Em relação ao Mercosul, depois de 25 anos de sua criação, para reexaminar seu funcionamento e sua prioridade para o Brasil, poderia ser convocada a Conferência Diplomática, prevista no Tratado de Ouro Preto, que estabeleceu a união aduaneira. O relacionamento com a Venezuela deveria merecer cuidado especial pelo impacto sobre nossos interesses (tráfico de armas e drogas, refugiados, divida), assim como deveriam ser ampliadas as medidas de coordenação com nossos vizinhos para proteção das fronteiras a fim de combater o crime transnacional.
            Nas organizações internacionais, o Brasil terá de ampliar e dinamizar sua ação diplomática nos temas globais, tais como sustentabilidade, energia, tráfico de armas e de drogas. O combate à corrupção, assim como ao terrorismo, à guerra cibernética, controle da internet, e as questões de paz e segurança, têm de receber especial atenção, assim como a ampliação do Conselho de Segurança, as operações de paz e a questão da não proliferação. O Brasil tem de continuar a defender valores que prezamos internamente, como a democracia e os direitos humanos, em especial na América do Sul. O tema ambiental e do desenvolvimento sustentável deveriam merecer um lugar de destaque como um dos principais ativos externos do Brasil.
            No comércio exterior, não se pode adiar uma nova estratégia de negociações comerciais bilaterais (acordos na região e fora dela), regionais (Mercosul) e globais (Organização Mundial de Comércio) para por fim ao isolamento do Brasil, com ênfase na abertura de novos mercados e na integração do Brasil às cadeias produtivas globais com vistas ao crescimento econômico, ao aumento dos fluxos do comércio exterior e do investimento externo visando a geração de emprego. Deverá ser finalizada a negociação do Mercosul com a União Europeia e estimulados os entendimentos com Japão, Canadá, Singapura, Coreia e EFTA e eventualmente com o TPP, o acordo com a Ásia. A criação do superministério da economia com a incorporação do ministério da Indústria e Comércio Exterior poderá gerar um conflito de competências com o Itamaraty nas negociações externas.
O novo presidente terá de tomar decisões de imediato, com ajustes e ênfases segundo sua visão de mundo. A mais urgente será reagir à decisão do órgão de apelação da OMC sobre o pedido da UE e do Japão para mudanças da politica de incentivos do setor automotriz e de informática. Outras são a crise na Venezuela, o problema com os refugiados, as medidas para fortalecer o controle de nossas fronteiras, a avaliação do funcionamento do Mercosul, a adesão à OCDE, o acordo de salvaguarda tecnológica com os EUA para viabilizar a Base de Alcântara, e as negociações dos acordos comerciais, em especial com a UE e com o Canadá, além da definição do que queremos do BRICS que se reunirá em nível presidencial no Brasil. A resposta à campanha de descrédito do Brasil no exterior deveria merecer atenção especial do novo governo.
            Caso se mantenham algumas medidas já anunciadas, não serão tranquilas as perspectivas da ação externa do futuro governo. Os objetivos maiores da continuidade da política externa aconselhariam que temas sensíveis como a mudança da Embaixada para Jerusalém, a relação com Taiwan, a saída unilateral do Mercosul e dos BRICS, a suspensão da relação com Cuba e a associação à OTAN sejam discutidos, levando em conta sobretudo os interesses nacionais e as implicações políticas e mesmo econômicas e comerciais. A dar crédito a informações vindas da equipe de transição, seria preocupante o esvaziamento do Ministério das Relações Exteriores pela retirada de competências relacionadas às negociações comerciais, ao acompanhamento dos contenciosos na OMC e às atividades de promoção comercial, inclusive quanto à manutenção da APEX na Chancelaria.
            Espera-se que, a partir de 2019, a ação do Itamaraty não repita as estripulias do PT com sinal trocado: em vez de ênfases nos países bolivarianos e de esquerda, aproximação, sem qualificações, com países conservadores, afins ideologicamente ao novo governo.
            O futuro ministro terá a responsabilidade histórica de continuar a fortalecer a Casa de Rio Branco e manter as linhas permanentes da atuação externa como política de Estado e não de governo de turno.

Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE).


Grande Guerra (1914-18) e as pequenas guerras contra Trump (2017-18)

Macron’s pyrrhic victory over Trump

The Washington Post, November 12, 2018


It was another embarrassing European visit for President Trump, who traveled to Paris on Friday for ceremonies marking the 100th anniversary of the end of World War I. It might have been an easy opportunity to mend fences and honor the sacrifices of Washington’s traditional allies. Instead, Trump only underscored the widening gulf between the United States and its European partners.
Before he even landed, Trump provoked controversy by attacking French President Emmanuel Macron over comments Macron made on international security.
Then, on Saturday, Trump skipped a planned visit to the Aisne-Marne American Cemetery, which honors U.S. soldiers killed in the Battle of Belleau Wood — because of rain in Paris. The decision sparked a furious reaction from American commentators and observers elsewhere, who believed the inclement weather should not have stopped Trump from doing his duty. A host of other leaders and dignitaries, including Canadian Prime Minister Justin Trudeau, braved the elements to pay their respects.
“Rain was a regular feature on the Western Front,” quipped Tobias Ellwood, a conservative British parliamentarian and the country’s minister for veterans, in a tweet. “Thankfully it did not prevent our brave heroes from doing their job.”
On Sunday, Trump — as well as Russian President Vladimir Putin — skipped a procession of dozens of world leaders, who walked together down the Champs-Elysees toward the Arc de Triomphe. The symbolism was not lost on the watching press. Then, by that famous monument, Macron delivered a pointed rebuke of Trump’s “America First” agenda.
“Nationalism is a betrayal of patriotism,” Macron said. “By putting our own interests first, with no regard for others, we erase the very thing that a nation holds dearest, and the thing that keeps it alive: its moral values.”
Whatever “bromance” once existed between Trump and his French counterpart has long faded, no matter a few polite tweets shared this weekend. Trump withdrew from both the Paris climate accord and the Iranian nuclear deal, ignoring Macron’s efforts to persuade him otherwise. He has cheered the rise of right-wing populists throughout Europe, including domestic rivals of Macron. Meanwhile, the French president has consciously styled himself in opposition to Trump.
“I think [Macron] has shed any illusion about Trump that flattering him will be a way of getting concessions,” said Thomas Wright of the Brookings Institution to The Post. “But he is hesitant to push back hard because he’s not sure what that will get him. It’s cautious realism.”
In an interview with CNN’s Fareed Zakaria, Macron insisted that his beliefs are not those of the jet-setting “globalist” caricature evoked by Trump and his far-right counterparts in Europe, but are instead those of a pragmatic internationalist aware of the shared challenges facing world leaders.
“I would say I’m a patriot. I do believe in the fact that our people are very important and having French people is different from German people. ... But I’m not a nationalist,” Macron said. “I’m a strong believer in cooperation between the different peoples, and I’m a strong believer of the fact that this cooperation is good for everybody, where the nationalists are sometimes much more based on a unilateral approach and the law of the strongest, which is not my case. That’s probably our difference.”
In that belief, Macron is joined by German Chancellor Angela Merkel — arguably the most important establishment figure in Europe but a diminished leader now clearly in the twilight of her career. “It’s easy to destroy institutions, but it’s incredibly difficult to build them,” Merkel said on Sunday, once more defending the post-World War II international order that has guaranteed much of Europe decades of peace and prosperity.
On Saturday, Macron and Merkel went to Compiègne, where the armistice that ended World War I was signed — and where Hitler compelled France’s surrender in 1940. At a site of national victory and defeat for both countries, they rallied for unity.
But such an emotional scene may not quite reflect the spirit of the present. Like Macron, Merkel has warned of Europe’s need to strengthen itself collectively in the face of an unreliable America. Yet both leaders face stiff political tests at home.
Macron’s approval ratings slumped to record lows in recent months. A poll last week placed Macron’s centrist ruling party behind the French far-right ahead of next year’s elections for the European Parliament. And Merkel’s announcement that she will not seek reelection as German chancellor was seen as a mark of the waning clout of liberal centrism on the continent.
As both the far-right and the left gather strength, European leaders are struggling to find common ground on issues ranging from monetary policy to immigration and how to confront the Kremlin.
“Europeans are too deeply divided among themselves — and on the fundamentals,” said Dominique Moïsi, a foreign policy analyst at the Institut Montaigne in Paris and former Macron campaign adviser, to my colleague James McAuley. “He’s weakened by the fact that he’s orphaned by Merkel and he’s weakened inside by the spectacular fall of his popularity.”
These divides — and his own domestic travails — hobble Macron’s attempts at global leadership, analysts suggest. “There is a clear north-south division over the euro crisis and an east-west division over migration and Russia,” said Mark Leonard of the European Council on Foreign Relations to The Post. “You also have highly polarized societies in most member states, and that does mean that having a single leader of Europe is kind of utopian at the moment.”
As part of the pleasantries of the visit, Macron declared his “great solidarity” with Trump. But the true bond they share may simply be that of presidents fighting uphill battles.

O pensamento de Xi Jinping, nova disciplina universitaria - Economist

O pensamento Xi Jinping, agora entronizado ao mesmo título que o pensamento de Mao Tsé-tung, que não sei se ainda é estudado. Por exemplo: "o poder está na ponta do fuzil"; bem representativo.
Essa coisa de "socialismo com características chinesas" seria um pouco como "tutu à mineira", ou "cuscus paulista", ou "feijoada carioca", ou "sarapatel à baiana"?
Acho que ultrapassa a dimensão culinária e vai muito mais longe. Uma longa marcha, enfim...
Paulo Roberto de Almeida

China is struggling to explain Xi Jinping Thought

Universities have been mobilised to help

The Economist, 11/11/2018

THE INSTITUTE of Xi Jinping Thought on Socialism with Chinese Characteristics for a New Era occupies several rooms in the Marxism department of Renmin University in north Beijing. Qin Xuan, the institute’s director, says it is one of ten similar centres for the study of the philosophy that is attributed to China’s president. The institute has only a small administrative staff but about 70 affiliated academics. It produces research, offers advice to policymakers and organises seminars.
Mr Qin says that part of his team’s job is to explain Xi Thought to journalists, foreign diplomats and Chinese youngsters. In October he and researchers at other such institutes, all founded in the past year, appeared as judges and commentators on a youth-targeted game-show called “Studying the New Era”. It involved students who stood on the bridge of a starship and answered questions, posed by an animated robot, about Mr Xi’s speeches and biography. The show was part of an unusually lively series of programmes about ideology called “Socialism is Kind of Cool”, produced by a provincial television station.
A year has passed since Mr Xi, at a five-yearly Communist Party congress, declared that China had entered a “new era” and outlined how the party should manage this. The congress gave its rubber-stamp approval and revised the party’s charter to enshrine Mr Xi’s thinking on the topic as one of its guiding ideologies (he and Mao are the only ones named in the document as having Thought with a capital T—a mere Theory is ascribed to Deng Xiaoping).
Since Mr Xi took power six years ago, his aim has been fairly clear: to boost the party’s control over China’s fast-changing society while enhancing the country’s influence globally. But his Thought is woolly: a hodgepodge of Dengist and Maoist terminology combined with mostly vague ideas on topics ranging from the environment (making China “beautiful”) to building a “world-class” army.

Cartographic contortions

Xi Thought is now being “hammered home harder” than any set of ideas since Deng launched his “reform and opening” policy nearly 40 years ago, says Kerry Brown of King’s College, London. Most universities have incorporated lectures on the topic into the basic-level ideology courses which all Chinese students are required to take. Some have created additional elective courses for undergraduates. This academic year high schools have been supplied with new materials to help them teach it, too.
The indoctrination effort extends well beyond academia. In May the party’s propaganda department published a 355-page, 30-chapter book which it said provided an “in-depth” understanding of Xi Thought. It said every party cell must study the work. Last month the party’s mouthpiece, the People’s Daily, published on social media a labyrinthine mind-map based on the book (for a high-resolution image of this map, see economist.com/xismind). It is so packed with ideas and quotations that much image-expanding effort, as users complained, is required to make it legible. The map’s complexity conveys the ordeal that those trying to master the Thought are facing.




A slog, but it’s the thought that counts

To help them, some big firms have set up Xi Thought “study rooms”. So too have libraries and community centres. In July Global Times, a tabloid owned by the People’s Daily, crowed that the Thought was being “studied in all corners of society, from local governments to media outlets, from university students to street cleaners”.
One purpose appears to be to enhance Mr Xi’s stature as a leader comparable in power to Mao. Deng Theory is less often mentioned these days. Last month Mr Xi made his first publicised trip in six years to Guangdong, the southern province where many of Deng’s reforms first took hold. During his tour Mr Xi did not even mention the architect of those reforms—a striking omission given that next month China will mark the 40th anniversary of their launch.
In April Qian Xian, a party journal, said there had been continual debate over the meaning of “socialism with Chinese characteristics”, the concept at the heart of Deng Theory. In an apparent dig at a weakness of the Theory, the article said “some people” thought the phrase was another way of saying “capitalism with Chinese characteristics”. This, it said, had created “theoretical chaos”. Mr Xi stresses that socialism with Chinese characteristics is in fact about “socialism and not any other kind of –ism” (point two, subsection three on the mind-map).
Deep understanding is not required. The party has a long history of requiring people to mouth leaders’ slogans as a way of showing loyalty. Research on Xi Thought is mostly banal. Kevin Carrico of Macquarie University in Australia studied the Thought through a distance-learning course run by Tsinghua, one of China’s best universities. He wrote in Foreign Policy that the video lectures repeated platitudes that would be “familiar to anyone who has spent time in Beijing in the last 40 years”. They offered, he said, “an unprecedented opportunity to observe the poverty of China’s state-enforced ideology”.
Xi Thought is formally described as a summary of the “collective wisdom” of the party, and to some degree it is. In addition to borrowing from his predecessors, it is likely that Mr Xi relied heavily on the work of Wang Huning, a former academic who has played an important behind-the-scenes role in devising party-think since early this century, including Mr Xi’s notion of a “Chinese dream” (number three on the mind-map, with numerous subordinate points). Last year Mr Wang joined the seven-member Politburo Standing Committee, the pinnacle of party power.
Yet promoting Mr Xi as China’s thinker-in-chief could put him at risk. The more he is linked to China’s “new era” the harder it will be for him to deflect criticism for anything that goes wrong. A speech late last month by Deng Pufang, one of Deng’s sons, gave a hint of dissent within the elite. In it Mr Deng appeared to criticise Mr Xi’s assertive foreign policy. China, he said, should “keep a sober mind and know our own place”. That idea is not on the map.

For a high-resolution image of this map, see economist.com/xismind



This article appeared in the China section of the print edition under the headline"Mind-boggling"

domingo, 11 de novembro de 2018

Ministrecos do supreminho: torrando o dinheiro do povo, em clima de acinte

Halloween supremo
Hotel de luxo, charutos, carro do Itamaraty, jantar em mansão, vinhos e compras, muitas compras: Crusoé acompanhou o animado feriadão de ministros de tribunais superiores brasileiros em Nova York
Crusoé, 09/11/2018
 A mansão de 12 milhões de dólares que sediou o convescote noturno das excelências: o anfitrião era um advogado estrelado

Um homem de terno acende um cigarro embaixo da marquise do Plaza Athénée, luxuoso hotel a dois quarteirões do Central Park, em Nova York. Ele está sob o toldo da fachada. O segurança pede, com um “please”, que ele saia dali e vá para perto de um cinzeiro a céu aberto. É a lei da cidade, explica. “Oh, you donʼt like me here? You donʼt have to like!”, diz o fumante, com sotaque brasileiro: “Você não gosta de eu estar aqui? Não tem que gostar mesmo!”.
O concierge sai do hotel para apaziguar a pequena confusão. Mas, antes que o climão se resolva, um veículo utilitário para na frente do hotel. É um carro oficial do Consulado do Brasil, dirigido por um funcionário cujos salários são pagos pelo contribuinte brasileiro. Dele desembarcam Gilmar Mendes e sua mulher, Guiomar, acompanhados de uma assessora. “Vamos trabalhar, ministro?”, diz, em português, o homem que estava fumando, também ele uma figura ilustre no Brasil: é Luís Felipe Salomão, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a segunda mais alta corte do país. Enquanto isso, o concierge ajuda a desembarcar as malas do casal Mendes.

É quinta-feira, dia 1° de novembro de 2018. O ministro do cigarro, assim como Gilmar, integrava uma comitiva de duas dúzias de pessoas que passaram quatro dias em Nova York. O motivo da viagem foi profissional: ministros do Supremo Tribunal Federal e do STJ, além de outros magistrados, funcionários de tribunais e advogados viajaram para a cidade no feriado de Finados, a convite, para participar de um seminário organizado pela Fundação Getúlio Vargas e pela Universidade Columbia, com apoio do jornal Financial Times, da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos e da CLS Brazil, uma associação de brasileiros que estudam ou já estudaram na prestigiosa instituição universitária americana.
Além de Gilmar Mendes, ficaram no Plaza Athénée, cuja diária parte de 500 dólares (cerca de 2 mil reais), o presidente do STF, Dias Toffoli, e os ministros João Otávio de Noronha, Ricardo Villas Bôas Cueva, Luis Felipe Salomão e Mauro Campbell Marques, do STJ.

Cada ministro levou um acompanhante ou dois – eram familiares ou assessores.
Mala de vinho
O único compromisso marcado para a quinta era o jantar de abertura do evento. Então, menos de meia hora depois da chegada da comitiva, os brasileiros já saíam. Estavam livres para bater perna. As famílias dos meritíssimos aproveitaram o veranico que na quinta- feira deixou Nova York com 20°C de temperatura em pleno novembro, quando a média fica abaixo de 10°C. Mulheres, filhos e filhas e sobrinhos dos ministros saíram do hotel à tarde e voltaram só à noite – com muitas sacolas, claro.

Já na manhã de sexta, o início do seminário atrasa. O ministro João Otávio de Noronha, presidente do STJ desde o fim de agosto, chegaria apenas às 9 horas, quando a mesa de que participaria, marcada para as 8h30, já havia começado.
Enquanto esperam, participantes brasileiros conversam no fundo do auditório. “Suas compras chegaram no hotel?”, pergunta um deles. “Chegou quase tudo, falta uma coisinha ou outra. Os vinhos chegaram todos.” O animado servidor do Judiciário reservou até uma mala especial para transportar garrafas. “Cheia de compartimento. Não quebra.” Um assistente de ministro conta que teve de pagar 512 dólares na Alfândega, em viagem recente, porque tinha comprado três telefones. O outro saca do bolso o seu aparelho e passa para os interlocutores, que constatam ser um iPhone XS Max, modelo lançado semanas antes, que custa de 1.099 a 1.449 dólares. “Mas o seu é diferente, né? É coisa fina”, diz a colega, mostrando o seu iPhone 8, que já há algum tempo deixou de ser de última geração.
O evento começa. Enquanto um juiz americano fala, um brasileiro na plateia usa o livreto com a programação do evento e um lápis para fazer contas. Um outro pede a programação emprestada. Folheia e diz: “Não vai fazer muita conta, hein?”. O dono do papel ri e se explica: “Tô calculando quanto vai ter que pagar de imposto. Deu duzentos e poucos [dólares]”.
Nas poltronas distribuídas no pequeno palco, os palestrantes discutem a judicialização da medicina no país. Dias Toffoli diz que se sente tentado a começar o discurso saudando menos pessoas, como fez o médico Claudio Lottenberg, presidente do grupo UnitedHealth, sentado a seu lado. “Imagina se o médico chega na sala de operação e diz ‘excelentíssimo anestesistaʼ, ‘excelentíssimo instrumentadorʼ. O paciente já morreu antes de ele terminar.”
Era a segunda vez de Dias Toffoli e de Lottenberg no evento. A primeira edição do seminário Law and Economics se deu no feriado de 12 de outubro de 2017. E contou com vários dos mesmos participantes: os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Villas Bôas Cueva. O médico-empresário Lottenberg, interessadíssimo no que pensam as excelências sobre as questões que dizem respeito aos negócios que comanda, também estava lá na edição do ano passado. Em 2017, a programação completa do evento foi publicada na internet, incluindo os dois jantares de recepção. Já em 2018, o site da faculdade de direito de Columbia apenas indicava que “vários juízes” brasileiros participariam do evento.
As palestras preenchem toda a sexta, 2, em que no Brasil se comemora o Dia de Finados, com pausa de uma hora e meia para almoçar. Gilmar Mendes é o primeiro a voltar, depois do almoço. O ministro se senta sozinho na primeira fileira. Logo se forma uma pequena fila de estudantes e de outros participantes que querem dar uma palavra. Esse tipo de evento, explica um advogado presente, serve para ensejar uma aproximação com os juízes supremos do Brasil. “É um networking que não tem preço.”

Se a excursão tivesse um guia, ele seria Sidnei Gonzalez. Diretor de mercado da FGV, Gonzalez supervisiona a viagem. Enquanto os ministros palestram, fica em pé no fundo do salão filmando com seu celular. Gonzalez é figura repetida nesse tipo de evento. Figura muito bem relacionada nas cortes superiores, ele se encarrega de organizar seminários e congressos assim de tempos em tempos. Desde 2010, a FGV e o IDP, de Gilmar Mendes, já realizaram ao menos onze eventos conjuntos. Gonzalez e Gilmar, por sinal, compraram apartamentos no mesmo prédio em Lisboa. Em junho, quando O Antagonista publicou a notícia, o diretor da FGV afirmou que a proximidade dos imóveis, avaliados em 600 mil euros cada um, não passava de coincidência. Sobre seu amigo do Supremo, ele disse: “A relação com o ministro Gilmar é 98% profissional”.
“Benefício colateral”
O seminário termina perto das 20 horas. Na noite de sexta, há só um integrante da comitiva comendo uma salada de 34 dólares no restaurante do Plaza Athénée. A maioria está num jantar ali perto.
No número 10 da rua E 62 fica uma mansão construída em 1910. O prédio de três andares tem duas salas — os ornamentos das paredes de uma delas são em talha dourada, como nos palácios europeus. O valor de mercado da casa beira os 12 milhões de dólares (cerca de 42 milhões de reais). Até 2015, ela estava registrada em nome de uma offshore. Depois, foi transferida para outra empresa, cujo nome não é revelado em documentos públicos americanos. Em sites imobiliários, seu aluguel é estimado em 60 mil reais mensais.
É nessa casa que acontece o jantar da turma que organiza o evento com os convidados especiais do Judiciário. Três chefs com chapéus de mestre-cuca cuidam da comida — massas, canapés e uma opção de carne. Uma trupe de garçons abre as garrafas de vinho, da adega da casa. A música ambiente é ao vivo, tocada por um trio com violão, violoncelo e percussão.
A comitiva brasileira está em peso no evento. Os últimos saem às 23h20 e esquecem a porta da frente aberta. Alguns decidem percorrer os dois quarteirões até o hotel a pé. Outros chamam carros do Uber. Um dos últimos a sair é o advogado Marcus Vinícius Furtado Coelho, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dono de uma requisitada banca de Brasília e amigo do peito de ministros de tribunais superiores.
Três homens se referem ao encontro noturno como “o jantar do Arnoldo”. Arnoldo é Arnoldo Wald, um dos advogados tributaristas mais conhecidos (e caros) do país, que estava na platéia do seminário e fora mencionado em uma das mesas.
O “jantar do Arnoldo” é mencionado como parte imperdível da programação. Na verdade, imperdíveis são seminários e convenções como esse, quase sempre em feriados, e quase sempre uma oportunidade para as excelências confraternizarem com advogados e viajarem com as famílias sem ter que gastar com passagens e hospedagens – os custos, normalmente, são bancados pelos organizadores. Um dos presentes disse a Crusoé, pedindo para não ser identificado, que os promotores de seminários assim “não pagam honorários” pelas palestras, mas em contrapartida custeiam a viagem.
“É o que a gente chama de benefício colateral”, diz um funcionário do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que, desta vez, não estava entre os convidados. Uma funcionária do STF confirma que os seminários são um “plus” para magistrados, familiares e assessores — algo que não é salário, mas vem embutido com alguns cargos relevantes na estrutura das cortes.

O tal benefício colateral está em todas as esferas do Judiciário. Em 2016, ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Superior Tribunal de Justiça participaram de um seminário numa sexta-feira no Hotel Jatiúca, em Maceió. O evento foi curto. Durou apenas uma sexta, apesar do nome longo: “Os Efeitos da Desconsideração da Personalidade Jurídica à Luz dos Entendimentos Consolidados nos Tribunais Superiores”.
Em março de 2017, Luiz Fux emendou dois eventos nos EUA, com três dias de distância um do outro. O ministro participou de um jantar em sua homenagem oferecido pelo Council of the Americas, em 21 de março. No dia 24, esteve no seminário “Direito e Economia: Diálogos Brasil x EUA”, na Faculdade de Direito de Harvard.
Outros encontros acontecem nos dois meses de férias dos supremos juízes, em janeiro e julho. O seminário “Cidadania em um Mundo de Transição”, por exemplo, ocorreu em julho e levou uma dúzia de ministros a Coimbra, em Portugal. O vice-presidente do STJ, Humberto Martins, foi para palestrar. Do STF, Ricardo Lewandowski e Dias Tofolli estiveram lá para realizar o que a programação classifica como “intervenções”. O quórum de ministros foi alto nas férias: a lista de participantes incluía ainda Marco Aurélio Mello e, do STJ, João Otávio de Noronha, Mauro Campbell, Humberto Martins, Jorge Mussi, Marco Buzzi, Raul Araújo, Marcelo Navarro, Sebastião Reis, Benedito Gonçalves e Rogério Schietti.

Charuto e bagagem
O voo de volta da maioria dos convidados ilustres brasileiros está marcado para as 16h30 do domingo. O que não os impede de aproveitar a última manhã do passeio em Nova York. Ao meio-dia, o ministro Luís Felipe Salomão sai sozinho do Plaza Athénée de gorro – esfriou e a temperatura está abaixo dos 10°C. Ele anda três quarteirões, passando pela boutique do estilista Roberto Cavalli, e entra no Club Macanudo.
O “clube” é, na verdade, uma das melhores charutarias do mundo, e permite a entrada de não-sócios, desde que respeitem a norma estampada em uma placa dourada na entrada: “temos um código indumentário”. O ministro passa. Rudolph Giuliani, ex-prefeito de Nova York e atual advogado do presidente Donald Trump, já disse em três entrevistas que vai ao salão de mogno escuro sempre que pode. Há consumação mínima de apenas 15 dólares em charutos para cada pessoa que entra. Mas, evidentemente, a conta costuma passar disso.
Trinta minutos depois do ministro, outros dois brasileiros entram no Macanudo. Salomão gastou três horas por lá. Ele sai da charutaria ainda fumando. Anda até o hotel, a duas quadras. Abre, ele mesmo, a porta para entrar – à diferença dos protocolos de Brasília, em que poderosos não precisam colocar a mão na maçaneta.
As excelências brasileiras talvez não fossem a maior preocupação do hotel. O Plaza Athénée havia hasteado a bandeira da Arábia Saudita para uma comitiva bem mais numerosa que a dos magistrados e seus acompanhantes: membros da elite saudita haviam reservado a suíte presidencial e alguns dos quartos mais exclusivos. Estavam na cidade para uma festa de casamento realizada no The Plaza, outro hotel estrelado a três quarteirões dali.
Salomão não teve oportunidade de se despedir do colega Mauro Campbell Marques, que saiu para o aeroporto mais cedo do que ele. No porta-malas da SUV que foi buscar o ministro amazonense do STJ e sua família, há uma grande sacola com o nome Rebag. A grife, na Madison Avenue, é um brechó de bolsas de luxo. Uma Chanel modelo Bi Coco Flap, pequena e (pouco) usada, custa 2.330 dólares na loja. O chofer bate a porta e o carro leva Campbell e seus acompanhantes para o aeroporto JFK, de onde voariam para o Brasil a tempo de dar expediente na terça. Acabou o feriado. Agora só restam outras 87 folgas para os ministros do Judiciário brasileiro – algumas, certamente, com convescotes semelhantes ao marcado para a semana do Halloween na Big Apple.

Como será a política externa do governo Bolsonaro - Fernando Martins (Gazeta do Povo)

Como será a política externa do governo Bolsonaro 

Fernando Martins

Gazeta do Povo, 11/11/2018

Esvaziamento do Mercosul e de outros blocos “ideológicos” de nações do qual os brasileiros fazem parte dos planos de Jair Bolsonaro para a política externa. | Mauro Pimentel/AFP
Pressão intensa e até mesmo guerra, se for necessário, para derrubar a ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela. Rompimento de relações diplomáticas com Cuba. Forte alinhamento com os Estados Unidos e outros países comandados por conservadores, como Israel e Itália. Extradição de Cesare Battisti. Briga com a China para que ela não “compre o Brasil, mas compre no Brasil”. Esvaziamento do Mercosul e de outros blocos “ideológicos” de nações do qual os brasileiros fazem parte. Mudança da Argentina pelo Chile como parceiro preferencial na América do Sul. Abertura comercial ampla.
Durante a campanha eleitoral e até mesmos nos primeiros dias pós-eleições, o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) e seus aliados deram a entender que o Brasil dará uma profunda guinada em sua política externa a partir de 2019. Especialistas em relações internacionais dizem que ainda é cedo para saber exatamente como será a diplomacia brasileira sob o comando de Bolsonaro. Mas eles acreditam que uma mudança muito profunda dificilmente vai acontecer. A possibilidade de o país dar um cavalo de pau na cena mundial tende a ser freada pelo risco de haver prejuízo para os interesses nacionais. 
Ou seja, a realidade da geopolítica vai se impor sobre o discurso do presidente eleito. “O Brasil não são os Estados Unidos e o Bolsonaro não é o Trump”, explica Giorgio Romano, professor de relações internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC). A nação norte-americana é uma superpotência militar e econômica com instrumentos para impor suas vontades – algo que não está disponível ao Brasil.
Bolsonaro, aliás, parece já ter tomado um choque de realidade ao anunciar que escolherá um profissional do ramo para o Itamaraty. O futuro ministro das Relações Exteriores será um diplomata de carreira .
Giorgio Romano lembra ainda que Bolsonaro, na campanha, buscou se contrapor à política externa do PT. Mas o governo de Michel Temer (MDB) já havia promovido mudanças em relação à diplomacia das gestões petistas, adotando uma visão mais pragmática. Com Temer na Presidência, o Brasil se distanciou da Venezuela, aproximou-se dos Estados Unidos e promoveu uma abertura ao capital externo – caso da permissão para que empresas estrangeiras explorem o pré-sal sem estarem subordinadas à Petrobras. A aproximação com países do Pacífico, como o Chile, tampouco é exatamente uma novidade na agenda brasileira.
O professor da UFABC aposta que Bolsonaro tende a manter as linhas gerais das relações exteriores do governo atual. Mas, para ele, haverá mudança no estilo da diplomacia presidencial: “A diferença entre o Temer e o Bolsonaro é que o Bolsonaro vai cacarejar antes de colocar o ovo”. Ou seja, o presidente eleito tende a ser mais “falastrão” que o antecessor.
Além de falar mais, o país também tende a ser mais falado no mundo. Para o professor de relações internacionais Argemiro Procópio, da Universidade de Brasília (UnB), o alinhamento do governo Bolsonaro com os Estados Unidos, se efetivamente ocorrer, vai dar mais visibilidade internacional ao Brasil, o que não necessariamente será bom. “Falem bem ou falem mal, mas falem de mim”, resume Procópio.

Especialista diz que país precisa recuperar imagem desgastada

Contudo, Alberto Pfeifer, coordenador do grupo de análise da conjuntura internacional da Universidade de São Paulo (USP), acredita que o Brasil teria de caminhar justamente na direção de ser “bem falado” no mundo. Segundo ele, a imagem internacional do país está muito desgastada devido aos escândalos de corrupção, ao impeachment de Dilma Rousseff (visto por parte da opinião pública internacional como um “golpe”), à prisão de Lula (interpretada como injusta pela mesma parte da opinião pública externa) e pela própria imagem de Bolsonaro, mostrado no exterior como autoritário, machista, homofóbico, fascista.
Pfeifer aposta ainda que a política externa do governo Bolsonaro vai estar sujeita à agenda econômica: será mais um instrumento para promover o crescimento. E isso tende a ser feito por meio da abertura comercial.
Mas a política de livre comércio internacional também pode esbarrar nas circunstâncias internas. “Bolsonaro vai ter de superar a resistência da Fiesp [a Federação da Indústria do Estado de São Paulo]”, diz Giorgio Romano, professor de relações internacionais da UFABC. Ele alerta que uma abertura comercial unilateral traz o risco de quebrar o que sobrou da indústria brasileira – daí a possível resistência da Fiesp, a principal organização industrial do país.

Venezuela: guerra de palavras não deve virar guerra de fato

O caso da Venezuela é emblemático para mostrar como o discurso de campanha de Bolsonaro pode ser bem diferente do que vai acontecer na prática. 
A ditadura bolivariana de Nicolás Maduro foi usada na propaganda eleitoral de Bolsonaro como exemplo do que o Brasil se transformaria se o PT vencesse a disputa. A retórica pesada, associada a outros fatores, leva muita gente a acreditar que o presidente eleito pode até mesmo declarar guerra se for necessário para tirar Maduro do poder.
Filho do presidente eleito, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), pouco antes do primeiro turno, em uma manifestação a favor de seu pai, em 30 de setembro, sugeriu que o Brasil invadisse a Venezuela para depor a ditadura bolivariana. “O general [Hamilton] Mourão [vice de Bolsonaro] já falou: a próxima operação de paz do Brasil será na Venezuela. O melhor para a crise imigratória que nós vivemos é a saída de Maduro do poder”, disse. 
Não era bem o que Mourão havia dito. Ele apenas havia afirmado que, se a ONU decidisse realizar uma operação de paz na Venezuela, o Brasil poderia participar – descartando a invasão militar pura e simples. O próprio Bolsonaro, pouco antes do segundo turno, disse não querer guerrear com a Venezuela. Ainda assim, o discurso do filho do então candidato serviu para inflamar os eleitores antipetistas. 
A declaração juntou-se a outros fatores que alimentaram a ideia de que, com Bolsonaro no Planalto, haverá a possibilidade de o Brasil compor uma coalização internacional para depor Maduro. Trump – a quem Bolsonaro admira e tenta se aproximar – afirmou publicamente em agosto de 2017 que cogitava a “opção militar” para lidar com o caso venezuelano. O presidente americano também teria conversado com os atuais presidentes do Brasil e da Colômbia sobre o assunto – o que foi negado pelo Planalto.
No dia 29 de outubro, logo após o segundo turno, a Folha de S.Paulo publicou reportagem em que afirma que fontes do governo colombiano diziam que o país estaria disposto a apoiar uma intervenção militar na Venezuela encabeçada pelo Brasil. A Colômbia negou a informação. E um dos principais braços-direitos de Bolsonaro, o general Augusto Heleno, também. “Isso contraria os princípios das nossas relações exteriores. Nós temos como preceito fundamental a não ingerência (...) em assuntos internos de outros países”, disse Heleno.

“O Brasil não vai cometer o suicídio de se meter numa brincadeira armada na Venezuela”

Rumor ou não, o fato é que uma guerra com os venezuelanos seria muito custosa ao país, o que tende a esfriar qualquer ânimo nesse sentido. “O Brasil não vai cometer o suicídio de se meter numa brincadeira armada na Venezuela”, diz Argemiro Procópio. “Eles podem não ter comida nos supermercados; mas têm muita bala”, complementa o professor, lembrando que a Venezuela dispõe de Forças Armadas bem aparelhadas, com equipamentos modernos comprados da Rússia, China e Europa.
Procópio afirma que há outras condições limitantes para uma ação brasileira mais radical em relação à Venezuela. O estado de Roraima não está interligado ao sistema elétrico brasileiro e depende de energia venezuelana. E há grandes empresas brasileiras com negócios no país vizinho, que seriam prejudicados num rompimento radical de relações. “O pragmatismo tende a falar mais alto”, diz.
Isso não significa, contudo, que o governo Bolsonaro não terá uma atitude diplomática dura em relação à Venezuela. Até mesmo porque o Brasil vem sendo afetado diretamente pela crise humanitária na nação vizinha, recebendo grandes levas de refugiados. Isso traz uma série de problemas como segurança, custos de acomodação, deslocamento, saúde.
“O presidente eleito provavelmente apoiará sanções e medidas mais rigorosas para conter o fluxo de refugiados venezuelanos para o Brasil”, escreveu o analista norte-americano Kevin Allison no relatório Signal do último dia 31, publicação de relações internacionais do Eurasia Group.
Para Giorgio Romano, a relação Brasil-Venezuela vai para a geladeira no governo Bolsonaro. Coordenador do grupo de análise da conjuntura internacional da Universidade de São Paulo (USP), Alberto Pfeifer acredita que é possível que haja um alinhamento diplomático do Brasil sob Bolsonaro com a Colômbia para pressionar a Venezuela. Os colombianos também estão recebendo milhares de imigrantes venezuelanos – aliás, muito mais refugiados do que o Brasil.

Estados Unidos: Trump pode ser ‘amigo’ de Bolsonaro, mas negócios à parte

Bolsonaro tem proximidade ideológica com Donald Trump. Ambos são conservadores e de direita. Argemiro Procópio lembra que o americano foi um dos primeiros chefes de Estado a telefonar para cumprimentar Bolsonaro após ele vencer o segundo turno. “Isso é significativo.”
Alberto Pfeifer destaca que a inclinação pró-norte-americana de Bolsonaro ocorre também do ponto de vista pragmático. Os Estados Unidos, afinal, são um parceiro fundamental no comércio, investimentos, transferência de tecnologia. E os brasileiros têm interesse em ampliar essa relação. 
Contudo, Giorgio Romano pondera que a proximidade ideológica entre Bolsonaro e Trump não terá influência nas negociações comerciais quando os interesses dos dois países se chocarem. “Todo amor que o Bolsonaro quer dar aos Estados Unidos não vai ter reciprocidade”, aposta Romano.
Trump vem adotando uma política econômica nacionalista, de proteção da indústria local, que contraria os interesses brasileiros. No fim de setembro, o norte-americano indicou que vai endurecer o jogo comercial com o Brasil. Disse que o país trata as empresas dos Estados Unidos “injustamente” e que esse comércio é “o mais difícil do mundo”. Trump também já havia fixado cotas para a importação de aço brasileiro.

Mercosul e América Latina: além do comércio, Brasil tem outros interesses que vão impedir mudanças profundas 

Logo após Bolsonaro ter sido eleito presidente, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a Argentina e o Mercosul “não são prioridade”. Segundo ele, o bloco tornou o Brasil “prisioneiro de alianças ideológicas”. O anúncio de que o Chile será o primeiro país que o presidente eleito vai visitar após a posse também reforçou a percepção de que haverá um esvaziamento do Mercosul (bloco formado por Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e a hoje suspensa Venezuela). O objetivo seria priorizar o comércio com outros países vizinhos.
Alberto Pfeifer admite que o Mercosul tem problemas e precisa se modernizar. Mas ele acredita que o futuro ministro da Economia desconhece todas as atribuições do bloco. “O que o Paulo Guedes fala de política externa não vale um vintém”, diz. Pfeifer lembra que o Mercosul não é apenas uma união comercial. Os países têm fronteiras e outras questões em comum que são de interesse do Brasil: circulação de cidadãos, tráfico de armas e drogas, vigilância sanitária. 
Argemiro Procópio, contudo, diz que Guedes pecou pela sinceridade. “Às vezes o Mercosul é mais ficção do que realidade.” Procópio diz que o bloco é um grande exportador de commodities agrícolas, essencial para garantir a segurança alimentar mundial. Portanto, teria de ter mais peso. “O Mercosul é uma bela onça que mia como um gato.”
Por isso, Procópio vê o bloco como uma oportunidade para o Brasil. Até mesmo porque há um alinhamento de direita com os governos da Argentina e do Paraguai para promover mudanças mais liberais no Mercosul.
Pfeifer avalia ainda que a Argentina não deixará de ser importante para o país. “A Argentina é grande compradora de manufaturados do Brasil; não é interessante mudar isso.” Ele também acredita que o Brasil pode ampliar a aproximação, que já está ocorrendo, do Mercosul com nações como o Chile, Colômbia e Peru (países que fazem parte da Aliança do Pacífico junto com o México).
Giorgio Romano diz que não é estratégico para o Brasil abrir mão de blocos com os quais pode vir a ter mais peso em negociações internacionais. A partir do ano que vem, aliás, o Brasil vai presidir o Mercosul, a Unasul (União de Nações Sul-Americanas) e os Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

Cuba é uma incógnita: Bolsonaro diz que pode cortar relações

Na América Latina, há ainda outra incógnita: a relação com Cuba. A ilha comunista, assim como a Venezuela, foi outro país usado na campanha de Bolsonaro para dizer o que aconteceria com o Brasil se o PT vencesse. Após ser eleito, ele disse que poderia cortar relações diplomáticas com o país por desrespeitos aos direitos humanos dos cubanos. Mas o presidente eleito deixou aberta a possibilidade de não fazer isso.

China: Brasil vai perder muito se desafiar seu maior parceiro comercial

Bolsonaro passou a campanha dando a entender que entraria numa briga com a China se fosse eleito. Afirmou que não quer que os chineses “comprem o Brasil, mas comprem no Brasil” – referindo-se a sua rejeição a que os estrangeiros adquiram terras e estatais brasileiras, que pretende privatizar. Além disso, em março ele visitou Taiwan – o que teria irritado a China, considera que esse não é um país independente, mas uma província rebelde.
Pequim esperou a eleição passar para dar uma resposta. E ela foi incisiva. Editorial do China Daily, o principal jornal do governo chinês em língua inglesa, advertiu Bolsonaro. Disse que suas críticas ao país asiático podem “servir para algum objetivo político específico (...), mas o custo econômico pode ser duro para a economia brasileira, que acaba de sair de sua pior recessão da história”. “Ainda que Bolsonaro tenha imitado o presidente dos Estados Unidos ao ser verbalmente ultrajante para captar a imaginação dos eleitores, não existe razão para que ele copie as políticas de Trump [que adotou medidas protecionistas contra a China]”, prossegue o editorial.
A pressão diplomática também foi feita pessoalmente. Na última segunda-feira (5), Bolsonaro recebeu uma comitiva de empresários chineses encabeçada pelo embaixador da China no Brasil, Li Jinzhang. O embaixador saiu sem dar declarações.
A posição do presidente eleito sobre a China foi alvo de manifestação inclusive do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “Se formos por esse caminho, vamos levar o Brasil para uma posição como se fosse os Estados Unidos, mas sem ser os Estados Unidos. Nós não temos esta possibilidade. A China é nosso maior parceiro comercial e, se o Brasil tomar certas medidas, eles vão reagir”, disse FHC. 
Os analistas de política internacional concordam. “O pragmatismo vai falar mais alto; Bolsonaro vai perceber que precisa tratar bem seu principal parceiro comercial”, diz Alberto Pfeifer. Giorgio Romano lembra que Bolsonaro tem apoio dos produtores rurais, que dependem do mercado chinês: “O agronegócio vai pedir para ele baixar a bola”.

Israel: a grande mudança de fato, mas que também esbarra em interesses comerciais

A aproximação do Brasil com Israel talvez seja a principal mudança de fato na diplomacia brasileira no governo Bolsonaro. Especialmente porque Bolsonaro dá sinais de que essa aliança se dará na mesma medida em que haveria um esfriamento das relações com a Palestina.
A intenção do presidente eleito de mudar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, seguindo o exemplo dos Estados Unidos, é emblemática nesse sentido. Trata-se do reconhecimento de que a cidade sagrada é a capital dos israelenses. Isso não é aceito pelos palestinos e pelo mundo árabe em geral, que também reivindicam Jerusalém como sua capital. 
Na prática, o gesto de Bolsonaro dá respaldo internacional à política do atual primeiro-ministro de Israel, o conservador Benyamin Netanyahu, que congelou as negociações para a formação de dois Estados no atual território israelense: a Palestina e Israel. Netanyahu inclusive planeja comparecer à posse de Bolsonaro, numa visita que seria inédita de um premiê israelense ao Brasil.
Giorgio Romano afirma, se isso ocorrer, o Brasil rompe com a tradição histórica da diplomacia brasileira, que sempre apoiou a existência dos dois Estados. “É bastante drástico.” A mudança da embaixada, segundo ele, pode ter efeitos ruins e bons para o Brasil.
Do lado positivo, Romano diz que o Brasil pode firmar uma aliança estratégica com Israel, um país com alta tecnologia militar, de irrigação, de informação. Argemiro Procópio concorda. Segundo ele, Israel é um país boicotado no cenário internacional e essa proximidade poderia render bons frutos ao Brasil .
Contudo, há riscos. O principal é a ameaça de que países árabes promovam uma retaliação deixando de comprar produtos brasileiros – sobretudo frango e carne. O mundo árabe, aliás, é um dos principais mercados da indústria de carne brasileira – o que pode fazer com que haja pressão externa e interna sobre Bolsonaro para que ele desista da ideia de mudar a embaixada. 
Autoridades palestinas já criticaram a intenção de Bolsonaro. E o governo egípcio foi o primeiro aliado da Palestina a dar um sinal diplomático de seu descontentamento com a questão da embaixada. Desmarcou em cima da hora a visita que o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira, faria ao Egito entre os dias 8 e 11 deste mês. Oficialmente, foi um problema de agenda. Mas, nos meios diplomáticos, o gesto foi visto como um recado.
Bolsonaro parece ter percebido os riscos de mudar a embaixada. Recentemente, vem dizendo que ainda não bateu o martelo sobre o assunto.

Itália: Battisti pode ser um símbolo de aproximação, mas jogo comercial será duro

A Itália tende a ser a “ponte” de Bolsonaro com a Europa. É um país com o qual ele pretende se aproximar em função de um alinhamento ideológico de direita entre o presidente eleito com o do atual governo italiano. 
A extradição do terrorista italiano Cesare Battisti, mantido no Brasil por decisão do ex-presidente Lula, seria um gesto simbólico nessa direção. Bolsonaro já anunciou que, se o Supremo Tribunal Federal autorizar, vai enviá-lo à Itália, onde Battisti foi condenado pelo assassinato de quatro pessoas. 
Mas a possível aliança Brasil-Itália, do mesmo modo que ocorre com a aproximação com os Estados Unidos, pode esbarrar nos interesses econômicos divergentes dos dois países. O professor Giorgio Romano afirma que a direita italiana é nacionalista e o governo italiano vem buscando privilegiar as empresas do país – o que seria uma dificuldade para um comércio mais amplo entre as duas nações.

Meio ambiente será fator de pressão externa sobre o Brasil

A questão ambiental será um fator de pressão internacional sobre o futuro governo brasileiro. “Bolsonaro é um cético da mudança climática. E, embora tenha recuado de promessas anteriores de tirar o Brasil do Acordo Climático de Paris (...), ele prometeu facilitar as exigências de licenciamento ambiental para projetos de infraestrutura. (...) Não está claro o quanto isso afetaria o já acelerado desmatamento da Amazônia, mas ativistas ambientais estão preocupados”, escreveu o analista norte-americano Kevin Allison, num relatório do Eurasia Group.
Isso pode virar motivo de pressão internacional sobre o Brasil, inclusive com retaliações comerciais. Por exemplo: a fusão dos ministérios da Agricultura e Meio Ambiente, que ainda não foi decidida nem completamente descartada, já foi alvo de críticas de fora do país, além das internas.
O professor Argemiro Procópio, da UnB, avalia que Bolsonaro pode até mesmo resgatar a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCE) para responder às críticas ambientais que possivelmente sofrerá. Procópio diz que a OTCE, que reúne os países amazônicos, foi usada por muito tempo como fórum de defesa dessas nações contra a pressão internacional sobre a Amazônia.