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sábado, 15 de julho de 2017

Academicos gramscianos continuam com as velhas ilusoes "brics-ianas": relato em Carta Capital


Três típicos acadêmicos gramscianos criticam, no costumeiro estilo dessa tribo e no pasquim costumeiro da comunidade, a atual política externa do Brasil, a partir de um "fórum acadêmico" sobre o Brics, realizado recentemente na China
Vindo dessa categoria de analistas, não se poderia mesmo esperar outra coisa, senão uma pauta totalmente comprometida com a anterior  "política externa ativa e altiva", que tanto encantou a tribo dos convertidos. 
Como eles partem do suposto de que o governo atual é "golpista" , eles condenam igualmente a política externa, pois seu ponto de partida é a diplomacia anterior, e tudo o que discordar dos antigos pressupostos é ipso facto golpista, equivocado, caudatário do império, e todos os demais defeitos que ideólogos do lulopetismo diplomático podem encontrar em qualquer diplomacia que não esteja alinhada com suas escolhas políticas peculiares.
Eles acham que o Brics deveria ser tão importante no governo atual quanto o foi no anterior, que aliás criou o grupo, quase que totalmente dominado pela China, um país que, como se sabe é um grande defensor da democracia e dos direitos humanos. Os três não admitem que o governo atual possa ter qualquer atitude de retraimento em relação a um grupo que possui a peculiaridade de ter sido escolhido não por vontade dos quatro países originais, mas por uma sugestão específica de um economista de um banco de investimento pensando unicamente, exclusivamente, em maiores retornos de mercado para investimentos financeiros do grande capital multinacional.
Para eles não existe nenhuma contradição nesse fato, como tampouco  nenhuma estranheza em proclamar que a intenção manifesta desse grupo é a convergência entre esses países para facilitar o "reordenamento do poder mundial". 
Falta aos acadêmicos gramscianos uma reflexão ponderada sobre o significado do grupo em termos de  modernização econômica e social, com respeito aos direitos humanos, democracia e liberdades econômicas de cada um dos países, uma vez que suas convicções políticas não alcançam esses aspectos, mas permanecem num jogo de soma zero de um ilusório "poder mundial". 
Não espero converter nenhum dos três gramscianos a outras convicções, pois as deles já são arraigadas, e se manifestam em frases tão simplistas, redutoras, no limite idiotas, como a que eles repetem como um mantra: o atual governo estaria comprometido com um "alinhamento submisso aos poderes centrais". 
Eles provavelmente preferem que um governo "progressista" como o que eles defendem -- aquele mesmo que provou a Grande Destruição econômica, e lançou o Brasil no descrédito mundial ao produzir, deliberadamente, o MAIOR ESQUEMA DE CORRUPÇÃO já visto no mundo -- acompanhe outros "anti-hegemônicos" numa espécie de "alinhamento ativo com poderes periféricos". Esse é o desejo dos três gramscianos que escrevem o que transcrevo abaixo.
Como sempre, meu blog está aberto a todo tipo de reflexão, de preferência as mais inteligentes, mas mesmo argumentos idiotas, como os que figuram abaixo, merecem transcrição, numa prova de quão débil mentalmente é a nossa academia, quão simplistas podem ser esses acadêmicas, quão alinhados ideologicamente podem ser os gramscianos, quão coniventes com uma organização criminosa e um governo corrupto eles podem ser.
Paulo Roberto de Almeida  
Brasília, 15 de julho de 2017
 

Relações Internacionais

Fórum Acadêmico dos BRICS e os (des)caminhos da diplomacia brasileira

por Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI) — Carta Capital, 14/07/2017; link: https://www.cartacapital.com.br/blogs/blog-do-grri/o-forum-academico-do-brics-e-os-des-caminhos-da-diplomacia-brasileira
Brasil teve participação pífia, condizente como o momento atual do país e sinalizou que os BRICS não são prioridade
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Wikimedia Commons
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Temer ao lado dos líderes dos BRICs em cúpula do G-20 em 2016. No Fórum Acadêmico deste ano, porém, participação comprovou que grupo não é prioridade
Por Renata Boulos, Diego Pautasso e Cláudio Puty*
Ocorreu em Fuzhou, na China, entre os dias 10 e 12 de junho de 2017, o 9º Fórum Acadêmico dos BRICS com o tema “Pooling Wisdom and New Ideas for Cooperation”. O Fórum reúne organizações da sociedade civil, think tanks e partidos políticos e costuma preceder a Cúpula dos BRICS no país anfitrião.
Quatrocentas pessoas formaram o público principal do evento, composto por membros dos governos dos cinco países (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), países visitantes (como Filipinas e Argentina, por exemplo), instituições acadêmicas, organizações da sociedade civil e partidos políticos.
O encontro teve grande importância para a China, pois é um dos principais fóruns onde a paradiplomacia ocupa lugar central e tem sido um espaço de consolidação dos BRICS para além dos chefes de estado.  
O Brasil teve uma participação pífia, condizente como o momento atual do país e mais uma vez sinalizou que os BRICS não são prioridade para o atual governo. O think tank brasileiro, IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), sequer se fez comparecer porque a direção do órgão simplesmente não liberou as passagens dos pesquisadores. 
A Presidência da República e o Itamaraty mandaram representantes do terceiro escalão, que não expressaram qualquer diretriz da política externa brasileira, tampouco nossa estratégia para o agrupamento BRICS. Imaginamos que esboçá-las deva ser uma tarefa árdua, à medida que sabemos que malta temerosa hoje ocupando o Palácio do Planalto não constitua propriamente um governo.    
Talvez por conta disso, a articulação entre os membros do governo brasileiro e integrantes da sociedade civil, think tanks e partidos políticos tenha sido praticamente nula, como se fôssemos membros de países distintos. Causa espécie a falta de entendimento do papel do BRICS como mecanismo de articulação de países emergentes, cujo papel no reordenamento do poder mundial é irrefreável.
Especificamente neste Fórum - que representa um espaço para estratégias de cooperação entre buscando mecanismos de convergência de diversos setores da sociedade -  a ausência do governo diz muito, e foi notada por russos, chineses e sul-africanos, que, por sinal, enviaram delegações de alto nível.
Esse evento refletiu o quadro mais abrangente de (des)caminho da política externa brasileira, evidente desde o início do governo surgido do golpe. A outrora diplomacia acusada de ‘politizada’, agora conduzida pelo PSDB de José Serra e Aloysio Nunes produz constrangimentos em série e é digna de uma República de Bananas, não de um país da importância do Brasil.
Recordemos.  A nova direção do Itamaraty inaugurou sua gestão disparando baterias contra os países vizinhos e fechando embaixadas na África e no Caribe. Agora segue com a ridícula obsessão por ingressar na anacrônica OCDE e promove operações militares com o exército americano em plena Amazônia brasileira.
Enquanto isso, as instituições voltadas à política externa soberana e autônoma, como a UNASUL, Mercosul, CELAC, a política africana brasileira e os BRICS praticamente saíram da agenda internacional. A resposta infantil à crítica de órgãos internacionais de direitos humanos (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos) sobre o ‘uso recorrente de violência’ contra manifestantes na Cracolândia em São Paulo refletem o caráter do atual governo.
E não para por aí. Recentemente, o Brasil decidiu reduzir drasticamente sua participação no Banco de Investimento em Infraestrutura Asiático (AIIB, na sigla em inglês), encabeçado pela China e do qual o Brasil é membro fundador, ficando com 50 ações ao invés das 32 mil ações inicialmente acordadas.
Não tivemos sequer participação no Fórum do grande plano de infraestrutura da China para o mundo: o  “Belt and Road Initiative” quando até nossos vizinhos argentinos e chilenos se fizeram presentes.  Finalmente, o ápice dessa festa funesta e aziaga é a série inacreditável de gafes cometidas por Michel Temer em suas visitas internacionais.
Entre os dias 3 e 5 de setembro, ocorrerá a 9ª Cúpula de Chefes de Estado do BRICS em Xiamen, província de Fujian (China), com tema "BRICS: parceria mais forte para um futuro mais brilhante". Enquanto isso, o Brasil parece incapaz de formatar um projeto de inserção internacional para além de recuperar um alinhamento submisso aos países centrais – incluindo aí uma atuação voltada a aprofundar a crise venezuelana.  
Mais que lapsos, não ter projeto é o próprio projeto deste governo ilegítimo, impopular, envolvidos em malversações múltiplas, cuja única função é desmontar não somente o ciclo de políticas consagradas no período Lula-Dilma, mas inclusive conquistas oriundas da Constituição de 1988 e mesmo da Era Vargas. O governo Temer é a cara das nossas elites.
*Renata Boulos é mestre em relações internacionais (Universidade de Essesx) e sócia-diretora do INCIDE – Instituto de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. Integrante do Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais/GR-RI
Diego Pautasso é doutor em Ciência Política (UFRGS) e professor de Relações Internacionais da UNISINOS
Cláudio Puty é Ph.D. em economia (New School for Social Reserch), professor da UFPA e professor visitante da University of International Business and Economics/Pequim

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Jose Serra sobre o governo e a politica externa - entrevistra a Eliane Cantanhede (OESP)

‘Governo não tem a opção de fracassar’, diz José Serra

O Estado de S.Paulo,

Com promessa de ‘turbinar’ o Itamaraty, Serra prepara viagem à Argentina para começar ‘atualização’ do Mercosul

BRASÍLIA - O novo chanceler, José Serra, enumera os erros da política externa dos 13 anos de governo do PT, anuncia que vai discutir uma “atualização” do Mercosul em sua primeira viagem internacional, hoje, à Argentina, e assume um compromisso com a opinião pública e os diplomatas: “Vamos turbinar o Itamaraty”.

Serra disse estar acertando com o ministro do Planejamento, Romero Jucá, como cobrir a carência de R$ 800 milhões do Itamaraty, que tem até atrasado salários e aluguéis e imóveis no exterior. Fora isso, há dívidas de R$ 6,7 bilhões do Brasil a organismos e bancos internacionais, tema também em discussão.
Ele também prometeu abrir o País ao mundo e uma relação melhor com os Estados Unidos. “Nossa relação comercial com os EUA deve com certeza se tornar mais próxima e o grande investimento aí é a remoção de barreiras não tarifárias”, disse na noite de sexta-feira, em entrevista ao Estado na qual resumiu os desafios do governo Michel Temer: “Não temos a opção de fracassar. Tem que dar certo”.

José Serra durante posse como Ministro das Relações Exteriores no Itamaraty, em Brasília.
José Serra durante posse como Ministro das Relações Exteriores no Itamaraty, em Brasília.
O que é uma política externa “regida pelos valores do Estado e da Nação”?
A política externa lida com os interesses nacionais num contexto mundial e vamos ter uma política de Estado, numa nova modalidade de política externa independente. Além de não se alinhar às potências, será independente de partidos e de aliados desses partidos no exterior, diferentemente do que havia nos governos do PT.
O sr. não vê diferenças entre a política externa de Lula e a de Dilma? O sr. chegou a ficar bem próximo do chanceler de Lula, Celso Amorim, quando o sr. era ministro da Saúde e ele embaixador em Genebra e atuaram juntos para a quebra de patentes de medicamentos contra a Aids.
Trabalhamos muito bem e de forma produtiva. Aliás, o Celso deixou de fumar cachimbo por minha causa. Eu disse que ele não podia fumar cachimbo e ir a reuniões antitabagismo e ele jurou que tinha deixado de fumar. Minha relação com o Celso foi muito boa. Depois, no Itamaraty, prefiro não analisar.
Uma crítica a Amorim era que ele era antiamericanista, mas o sr., pelo passado de UNE e de esquerda, também é visto assim.
Não é bem assim, mas, de todo modo, não tenho condições agora de revisar a minha biografia e o que eu pensava a respeito. Só que tive uma experiência pessoal que foi muito importante, quando passei parte do meu exílio nos Estados Unidos, nas Universidades de Princeton e Cornell, e comecei a conhecer a sociedade e a democracia americanas muito de perto. Daria uma outra entrevista eu contar o impacto que eu tive ao viver o cotidiano e junto à base da sociedade a democracia americana.
O sr. assume num momento em que o Brasil precisa revigorar as relações com Washington, depois que elas ficaram esgarçadas pela contaminação ideológica no Brasil e pela espionagem da NSA até da presidente...
NSA, o que é isso? Os EUA são uma peça essencial do mundo contemporâneo, embora já não tão dominante como no passado, pois você tem novos centros de poder e de economia, caso típico da China. Nossa relação com os EUA é secular e fundamental e deve com certeza se tornar mais próxima no comércio. O grande investimento aí é a remoção de barreiras não tarifárias. Eles têm uma rede de proteção não tarifária, na área fitossanitária, por exemplo, que exige negociação. Vamos trabalhar incessantemente nessa direção.
Uma eventual eleição do republicano Donald Trump pode atrapalhar esse processo?
Prefiro não acreditar nisso...
No seu discurso de posse o sr. defendeu a reaproximação com parceiros tradicionais, como EUA, Europa e Japão. É o fim da política Sul-Sul?
Veja, se o Brasil é um país continental, tem de ter relações com o mundo inteiro. Nós vamos levar adiante nossa relação com a África, mas não com base em culpas do passado ou em compaixão, mas sabendo como podemos cooperar também beneficiando o Brasil. Aliás, minha ideia é fazer um grande congresso no ano que vem entre Brasil e África, para discutir comércio, cooperação e trocas, inclusive na área cultural, onde temos grande afinidade.
Quando fala em compaixão, o sr. quer dizer que o Brasil não vai mais perdoar dívidas de países africanos, como fez Lula?
Pedi um levantamento para definir o que será feito daqui em diante. O Brasil não é um país que tem dinheiro sobrando, não somos um país desenvolvido. Não implica estabelecer relações predatórias com nenhuma parte do mundo, mas temos que gerar empregos e combate à pobreza aqui dentro também.
Dilma disse em entrevista ser ignorância uma política externa sem os vizinhos e sem os Brics.
A impressão que eu tenho é de que ela não sabe o que está dizendo. Entendo as dificuldades e até esse certo desnorteamento e me sinto constrangido e pouco à vontade para debater com ela nessas condições.
Muitos elogiaram, mas muitos consideraram acima do tom diplomático suas notas contra o diretor da Unasul e os países “bolivarianos” que criticaram o processo político brasileiro. Foram acima do tom?
Foi um tom abaixo das agressões feitas. Na minha primeira reunião no ministério eu disse que não iríamos nem calar nem escalar. Essa é a linha. O que fizemos foi apontar o que não era verdadeiro. Dizer que a democracia está atropelada no Brasil? Que não há garantias democráticas? Basta qualquer um de fora passar uns dias aqui para ver que a democracia está funcionando normalmente. Foi um processo traumático? Foi. Mas todo dentro da democracia e do previsto pela Constituição.
Como fica a relação com Venezuela, Cuba, Equador, Bolívia, Nicarágua e El Salvador, que se manifestaram sobre o Brasil? E com o diretor da Unasul?
A tendência é ir tendo relativizações. Aliás, eu sou amigo do Ernesto Samper (da Unasul). Depois da nota, nós já nos falamos.
Por que a primeira viagem é para a Argentina?
A Argentina é considerada por nós para lá de prioritária. Entre os propósitos da viagem está o debate sobre a atualização do Mercosul, criação do mecanismo de ação conjunta Brasil-Argentina e acertar uma conferência regional sobre ilícitos nas fronteiras, uma questão vital para o Brasil e para a Argentina.
Quando se fala nisso, pensa-se no Paraguai, que, aliás, atuou para evitar notas oficiais contra o Brasil.
Uma ação dessa natureza é inviável sem a colaboração dos países, porque não se resolve na linha das fronteiras, mas no interior dos países. Estou convencido de que teremos a cooperação da Argentina, do Paraguai, da Bolívia, da Colômbia... O Paraguai é um país que está se modernizando e o chanceler deve vir aqui em breve.
O sr. falou em atualização do Mercosul. O que significa isso, já que o sr. é considerado inimigo do Mercosul?
Não, não sou, mas o Mercosul é uma união alfandegária que terminou sendo um obstáculo a acordos bilaterais de comércio. Houve uns 500 acordos bilaterais nos últimos anos, mas o Brasil só fez três: com Israel, Palestina e Egito. É preciso aprofundar as condições da zona de livre comércio, porque ainda há barreiras, e encontrar formas de flexibilizar as regras para permitir acordos bilaterais mundo afora.
Uma das críticas à política externa do PT é que foi toda centrada no multilateralismo na OMC, que não deu certo, vetando o bilateralismo, que todos os demais fizeram. Isso vai mudar?
O multilateralismo poderia ter sido bom para o Brasil, mas, na medida em que Doha, da OMC, não avançou, ficou preso nisso, sem multilateralismo e sem acordos bilaterais. Mas, veja, não estou dizendo que vamos abandonar a OMC, apenas que vamos ter os pés no chão.
O Brasil vai reforçar relações com a Aliança para o Pacífico?
É uma grande prioridade. Relação Brasil-Chile sempre foi próxima e temos boa relação com Colômbia e Peru. Queremos estreitar relações com o México, que é da Aliança para o Pacífico e, assim como a Argentina, é prioridade número 1.
Aproximar dos pragmáticos e neutralizar os bolivarianos?
Posso ser sincero? Não tem nada a ver com conjunturas políticas. Tem a ver com estratégias mais permanentes.
Na era Lula-Amorim, o Brasil participava de negociações para a crise do Irã, para a crise do Oriente Médio... O sr. vai priorizar o comércio em detrimento da diplomacia, ou isso vai voltar?
Sem megalomania. Vamos participar pela paz, pelo entendimento, usando as vantagens comparativas que o Brasil possa ter, mas, repito, sem megalomania.
Com suas críticas à política externa do PT, vem aí uma dança de cadeiras em cargos-chave da chancelaria e das embaixadas?
Vamos manter uma política gradualista de preenchimento de cargo e o mais importante é que nós vamos turbinar o Itamaraty. Nesses anos todos, seja pelo jeito de fazer política externa, seja pelas dificuldades orçamentárias mais recentes, houve certo desânimo e ceticismo que comprometeram a autoestima do Itamaraty. Mas isso, eu prometo, será revertido.
Como, se o governo prevê um rombo de R$ 170,5 bilhões?
A carência imprescindível do Itamaraty é da ordem de R$ 800 milhões e não precisa ser tudo de uma vez. Então, o peso do Itamaraty nas finanças públicas é insignificante e eu não posso atribuir senão ao descaso tudo isso que vinha acontecendo.
E as dívidas com organismos e bancos internacionais?
Quem paga é o Planejamento e hoje (sexta-feira) passei um bom tempo com o ministro Romero Jucá discutindo isso. Ao todo, são R$ 3 bilhões de dívida com os organismos, mais R$ 3,7 bilhões para os bancos (BID, Bird, FMI...)
Vai ter corte de embaixadas e consulados?
Eles criaram uns 60 postos e agora são 227. Será que tudo isso é necessário? Estamos vendo custo-benefício.
A concessão de passaporte diplomático para o tal bispo evangélico foi uma derrapada?
Eu não assino passaportes, seria exótico se assinasse. O problema é que a Igreja Católica sempre teve dois passaportes diplomáticos, as evangélicas reivindicaram a mesma coisa, e algum governo, acho que do Lula, concedeu. Não cabe ao governo definir que uma igreja é mais ou menos importante que a outra.
O Itamaraty é um trampolim para sua candidatura em 2018?
Claro que não, não tem trampolim nenhum. Tudo o que eu quero é fazer uma boa administração aqui. Pode parecer uma declaração de político tradicional, mas é verdadeira.
Seus filhos acreditam nisso?
Meus dois filhos, sim, principalmente o homem. As mulheres são mais desconfiadas.
E se o governo Michel Temer naufragar?
Os desafios são imensos, mas não temos a opção de dar certo ou fracassar. Tem de dar certo, pelo País. O impeachment é doloroso e traumático, mas é uma questão de salvação do Brasil.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Mais Brics: nem mortos, nem performantes, sobrevivendo -- Marcos Troyjo (FSP)

Não concordo com a premissa do artigo, pois não concordo em que a ideia do grupo diplomático tenha sido uma boa coisa, seja para os países, em si, seja para o mundo.
Que os países sejam grandes, tenham perspectivas de crescimento -- desde que apliquem as boas políticas -- que eles tenham certo peso na política e na economia mundial, tudo isso fala por si.
Mas eles o são individualmente, por mérito (ou demérito) próprio, não em virtude do amálgama, da assemblagem política, que só foi feita por ambição e narcisismo dos seus dirigentes, que estão buscando oportunidades de marketing, para darem uma impressão de que juntos podem mais do que sozinhos.
Pode até ser, mas aí vira um denominador comum pelo mínimo, e geralmente por causas negativas. Eles podem, atuando conjuntuamente, impedir que certas coisas propostas pelo G7, por exemplo, sejam feitas, mas não creio que tenham força para produzir "bondades" para o mundo.
Concordo totalmente em que a chave para os Brics, COMO para qualquer OUTRO PAÍS, seja colocar a casa em ordem. Para isso não precisa de Brics nenhum, aliás até atrapalha...
Em que, por exemplo, o NDB, o novo banco de desenvolvimento, vai modificar a oferta de capital no mundo? Vai aumentar? Apenas marginalmente. Vai melhorar a qualidade dos empréstimos? Dificilmente. Pode ser que seja uma boa coisa, pois competição -- entre bancos financiadores -- sempre é uma boa coisa para qualquer setor. Mas não creio que isso altera as condições de funcionamento dos mercados financeiros ou o acesso a fontes de recursos por países pobres.
O Brics era um exercício intelectual para investidores que virou um grupo de pressão. Foi uma boa coisa para cada um deles e para o mundo. Muitos responderão que sim. Eu respondo que não.
Paulo Roberto de Almeida

A suposta ascensão e queda dos Brics
Sócios querem mais Brics; mercados financeiros, menos
MARCOS TROYJO
Folha de S.Paulo, 11/11/2015

É radicalmente díspare a maneira com que diferentes atores e grupos de interesse abordam o papel dos Brics no cenário global.
Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul querem mais Brics. Os mercados financeiros, aparentemente, menos.
Tais diferenças de perspectiva revelam uma curiosa combinação de, por um lado, fantasias irrealizáveis com, por outro, análises "binárias". Na maioria dos casos, tais abordagens são bastante superficiais.
Num extremo, a noção de que o grupo está revolucionando a ordem econômica internacional por meio do estabelecimento de novas instituições, como o NBD (Novo Banco de Desenvolvimento), com capital de US$ 100 bilhões, ou o Arranjo Contingente de Reservas, de igual montante, que permite aos países assistência mútua no advento de crises de liquidez.
A partir dessa plataforma, outras obras conjuntas seriam erguidas –ou ações táticas empreendidas– em palcos como as Nações Unidas.
A abstenção por parte dos Brics em votação na ONU que visava à condenação da Rússia por haver aproveitado o tumulto na Ucrânia para anexar a Crimeia seria exemplo de tal força de coordenação dos Brics.
Os cinco países-membros partiriam para coordenação macroeconômica mais sofisticada, e até mesmo a conclusão de transações comerciais entre si em outra moeda que não o dólar norte-americano. Ou seja, os Brics como polo, se não antiocidental, ao menos "alternativo" ao Ocidente.
Noutro, a decretação do "fim" dos Brics. O mau desempenho econômico de Brasil, Rússia e África do Sul –e a redução dos percentuais de crescimento da China– apontariam que a validade do conceito "expirou".
O último lance nessa tese declinista vem da interpretação, por parte do mercado financeiro, de uma recente decisão do banco de investimento Goldman Sachs.
A instituição há pouco anunciou que estava encerrando seu fundo específico sobre Brics, realocando ativos para outros veículos de investimento rotulados sob o conceito mais amplo de "mercados emergentes" (de que os Brics também fazem parte).
Tal decisão parece ainda mais simbólica, pois foi a partir de um estudo conduzido por Jim O' Neill no próprio banco que o termo "Brics" ganhou grande notoriedade.
Quando, há cinco anos, Christian Déséglise e eu fundamos o BRICLab (um centro para o estudo dos Brics) na Universidade Columbia, em Nova York, nosso intuito não era alardear um futuro da economia global dominado pelos Brics.
Tampouco tratava-se de sugerir, pelas muitas diferenças internas que marcam o grupo, que suas iniciativas conjuntas e mesmo seu potencial econômico rumavam inexoravelmente para o fracasso.
Achamos que a ideia de Brics era (e continuará) válida como fórmula para comparar as estratégias (ou a falta delas) em projetos de poder, prosperidade e prestígio de quatro (China, Índia, Rússia e Brasil) das sete maiores economias do mundo (medidas pelo poder de paridade de compra) tanto pelos cálculos do FMI como do Banco Mundial em 2014.
Além de seu papel relativo na economia global, esses países são superlativos em território, população e influência regional, além de acomodar importante estoque do fluxo globaI de investimento estrangeiro direto (IED).
Obviamente, o desalento de operadores financeiros com os Brics não é apenas questão de modismo. Com exceção da Índia, todos subperformam –porque estão errando muito.
A China superestimou a velocidade com que a mudança de seu modelo econômico migraria da ênfase em poupança, investimento e exportações para o foco no consumo interno.
A Rússia pagou para ver na disposição do Ocidente em aceitar passivamente a irradiação de seu vulto de poder sobre a vizinhança na Europa Oriental. Além do que, economicamente fez pouco para diminuir sua dependência na exportação de commodities. E as agruras brasileiras são bem conhecidas.
Ainda assim, os Brics continuarão. Nos vários níveis de governo, academia e empresariado a cooperação no âmbito dos Brics aumenta.
A construção institucional vai se expandir e com isso aumentar o peso específico dos Brics em áreas como o financiamento do desenvolvimento ou o comércio e investimento intragrupo.
Não vale, contudo, acreditar ingenuamente que esses movimentos redesenharão em definitivo a ordem internacional.
Bem como a notícia da morte de Mark Twain, rumores sobre o fim prematuro dos Brics são "amplamente exagerados". Não há nada de automático ou definitivo em torno da potencial queda ou ascensão do grupo ou de seus membros.
Neste momento, a melhor coisa que os Brics poderiam fazer para melhorar sua projeção global seria colocar a casa econômica em ordem. E, claro, tal tarefa se impõe na presente conjuntura menos a Índia e China –e muito mais a Rússia e Brasil.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Brics: mais uma ideia que fez chabu? Provavelmente nao, mas as perspectivas sao pessimistas

Agora que o banco do investimento Goldman Sachs acaba de se desfazer de sua carteira Brics, que só apresentou prejuizos nos últimos anos, caberia rever o conceito e a própria utilidade do grupo.
Trata-se, como já afirmei diversas vezes, de uma construção totalmente artificial, provavelmente o primeiro grupo de natureza diplomática formado por indução externa, não por uma análise serena e ponderada de suas possibilidades intrínsecas, mas decidido a partir das sugestões de investimento financeiro de um banco privado.
Em outros termos, os dirigentes políticos do Bric -- seu acrônimo original -- atuaram de forma narcisística, e por impulsos totalmente de marketing político, não a partir de uma decisão ponderada de natureza técnica.
Desde 2008, ainda antes de sua constituição formal como grupo diplomático, eu já me manifestava a esse respeito.
Apesar de que algumas realidades mudaram desde então, creio que minha análise permanece válida em seus contornos essenciais.
Paulo Roberto de Almeida 
Anápolis, 10/11/2015


1884. “Questionário sobre BRIC”, Brasília, 5 maio 2008, 4 p. Respostas a questionário colocado por estudante de RI de Curitiba, sobre os BRICs no contexto internacional. Postado no blog Diplomatizzando (13.07.2010; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/07/questionario-sobre-o-bric-paulo-r.html).
Questionário sobre o BRIC
Nome do entrevistado: Paulo Roberto de Almeida
Data da entrevista: 5 de maio de 2008
Ocupação do entrevistado: Diplomata e professor universitário

1)     O conceito BRIC foi criado pelo Goldman Sachs para designar as potências, que segundo o relatório que eles elaboraram, serão as maiores em 2050. Você concorda que os quatro países que compõe o BRIC serão superpotências?
R: Não! Para ser mais preciso, apenas um dos BRICs, segundo esse estudo, se alçará à condição de primeira economia planetária, enquanto as outras três estarão em patamares diversos: será a China, supostamente à frente dos EUA a partir de 2040 se, por acaso, sua taxa de crescimento se mantiver num patamar razoável e a dos EUA continuar num ritmo moderado. As outras três ficarão atrás do Japão ou até da Alemanha. Supostamente, os quatro BRICs, conjuntamente, terão ultrapassado o G-6 do estudo – G-7 menos Canadá – em torno daquela data, mas isto não quer dizer que todas serão superpotências, uma vez que essa condição supõe uma capacidade de projetar poder externo que nem todas exibirão. Pode-se dizer que a Rússia e a China já são superpotências, detentoras de mísseis nucleares e alguma capacidade naval e aérea, mas não parecem dispor das mesmas condições de empreender grandes operações navais ou aerotransportadas como os EUA e a OTAN. Por outro lado, uma superpotência também dispõe de uma clara liderança tecnológica e certa dominação financeira, o que não parece o caso de nenhum dos BRICs.

2)     Qual o caminho que o Brasil deve trilhar para que o Brasil possa acompanhar o crescimento dos outros países do BRIC?
R: Basicamente crescer a uma taxa sustentável e sustentada, o que significa manter uma taxa de investimento compatível com um nível razoável de crescimento. A atual taxa de investimento parece insuficiente para garantir isso. Por outro lado, a economia precisa ser capaz de desenvolver fontes próprias de inovação tecnológica, o que não depende unicamente da FBKF (formação bruta de capital fixo) e sim de uma cultura da inovação que ainda não está devidamente assentada nas instituições pertinentes, ou seja, empresas e universidades. Em outros termos, o governo precisa ser menos “extrator” de recursos do setor privado e participar dos investimentos produtivos – geralmente em infra-estrutura, educação e C&T --, assim como precisa reverter o processo de crescimento da carga fiscal, nitidamente em contradição com os requerimentos do crescimento. Isso significa uma profunda reforma fiscal – e não apenas tributária – com redução dos gastos correntes e aumento das alocações voltadas para a capacitação da mão-de-obra e educação da população em geral. Nenhum desses problemas tem a ver com o ambiente internacional – que ao contrário tem sido extremamente positivo com o Brasil – e sim com o ambiente interno.

3)     Quais os empecilhos para o crescimento brasileiro?
R: Numa palavra: o Estado, ou seja, seu caráter predatório, extrator, obstrutor do direcionamento da poupança privada para o setor produtivo. Em detalhe, temos obstáculos sistêmicos ao crescimento – que são a elevada carga fiscal e o baixo volume de investimentos para as necessidades de crescimento – e elementos estruturais – que são o baixo nível de educação da população e a péssima infra-estrutura disponível. Temos ainda a visão introvertida das elites, que fazem com que o Brasil seja um país especialmente renitente a maior abertura externa, condição importante para modernizar a sua indústria e serviços e assim oferecer novas oportunidades de crescimento no contexto da economia global, onde estão hoje as maiores possibilidades de captação de recursos – capitais, know-how – para fins de desenvolvimento produtivo.

4)     Por que é tão difícil para uma empresa brasileira se colocar como grande multinacional? O que deve ser feito para que isso mude?
R: Baixo grau de vinculação da economia brasileira à economia mundial e mentalidade introvertida dos próprios empresários. Ausência de mecanismos financeiros para a projeção externa dessas empresas, o que é válido no plano interno também, a despeito do apoio de uma agência pública como o BNDES. Poucos executivos possuem realmente os requisitos da internacionalização, sobretudo porque as universidades e outras escolas estão pouco conectadas com congêneres nos países desenvolvidos. Essas empresas foram, durante muito tempo, protegidas “contra” a competição externa, em vista de políticas públicas protecionistas e nacionalistas, ou basicamente introvertidas.

5)     A Rússia tem realmente capacidade de se tornar tão grande quanto as projeções do Goldman Sachs mostram? O que a Rússia tem atualmente de superpotência e o que falta para ela?
R: Trata-se de uma potência nuclear, ou militar, e a esse título incorporada ao G-7, mas que carece de outras condições econômicas e tecnológicas para realmente liderar o mundo no sentido da interdependência ativa, em conformidade com a globalização. Ela tem muitos recursos naturais, alguns deles estratégicos, como petróleo e gás, mas tem uma população em declínio e condições de governança ainda deficientes.

6)     A Índia tem uma população gigantesca e é a casa de grandes milionários, o que mais esse país tem a favor e o que ele tem contra seu crescimento?
R: A favor, uma inserção quase natural na globalização, graças à herança inglesa deixada pela antiga metrópole colonial, o que se manifesta no regime político democrático, no sistema jurídico “inglês” e em certas instituições universitárias. Uma diáspora indiana nos EUA permitiu fazer um link de negócios e de serviços com as empresas inovadoras desse país e associar mais estreitamente os indianos à economia global. De negativo, uma infra-estrutura pavorosa, uma população miserável, taxas de analfabetismo ainda enormes – o que a rigor não impede sua inserção na globalização – e um ambiente regulatório ainda negativo para os negócios de forma geral.

7)     A China é hoje a fábrica mundial devido aos seus baixos custos? Essa posição é favorável para o país? E para o cenário mundial?
R: Certamente, para ambos. A principal vantagem comparativa, absoluta e relativa, da China, é sua grande população, daí a condição imbatível na produção de manufaturas de massa, especialmente eletrônicos, mas produtos industriais em geral. Isso é excelente para a China, elevando a qualificação profissional de sua população, trazendo renda e prosperidade para o país, e ainda melhor para o mundo, pois isso tem um efeito deflacionário, do contrário o custo de vida teria se elevado no plano mundial. Por outro lado, ela está fazendo um “favor” aos países avançados, ao obrigá-los a constantemente se elevar na escala tecnológica, ao dominar de modo quase absoluto as tecnologias disponíveis. Tudo isso é extremamente positivo para a economia mundial, ainda que possa “destruir” empregos nos países desenvolvidos (e em alguns intermediários, como o Brasil).

8)     Como um país comunista chegou onde a China está hoje?
R: O comunismo foi um parênteses “passageiro” na história milenar da China, uma sociedade de grandes tradições culturais e científicas, uma grande economia, “temporariamente” diminuída por dois ou três séculos de decadência tecnológica e de dominação ocidental, atrasada ainda mais por um regime disfuncional como o socialismo centralizado, e agora operando uma volta em força para o centro da economia mundial, ainda que não totalmente de forma autônoma, na atual conjuntura. O comunismo foi um enorme atraso, embora um a mais, em dois ou três séculos de decadência contínua. A China está apenas recuperando o tempo perdido agora, da mesma forma que sempre fez nos períodos anteriores, isto é, de maneira autoritária, centralizada, imperial e despótica. O comunismo combina com a história secular da China, de governos centralizados e autoritários, sem respeito aos direitos humanos ou ao meio ambiente. Ou seja, a China continua fundamentalmente igual, mas agora incorporando tecnologia estrangeira, o que não era o caso anteriormente.

9)     Não existe um acordo envolvendo os quatro países, um acordo assim pode vir a existir? Pode-se criar um bloco econômico BRIC?
R: Existem tentativas de criação de um grupo “diplomático” dos BRIC, out of this intellectual exercise made by Goldman Sachs. Ocorreram contatos diplomáticos, reuniões informais e até uma reunião formal de vice-ministros, preparando uma reunião formal de ministros do que pode ser o “lançamento” formal de um novo G-4, ou “the BRIC”. Trata-se provavelmente mais de impulso “narcisista” do que propriamente um grupo unido em torno de uma agenda comum, não fosse, talvez, o desejo inconfessado de contestar o “velho” G-7, do qual a Rússia faz parte, no G-8, mas numa posição que sempre foi “bizarra”, para dizer o mínimo. Cada um deles pode ter suas motivações peculiares para “opor-se” ao G-7, que pode ser o motivo mais evidente da constituição desse grupo, uma vez que não está visível, de imediato, que agenda comum “a favor” possa uni-los. Seria, de todo modo, um bloco bem mais político, ou diplomático, do que econômico, ainda que fundamentado no fato de que os quatro foram os “designados” – pela divina providência do Goldman Sachs – para “superar” o atual G-6.

10)  Comparando-se os BRIC’s, qual a maior semelhança e qual a maior diferença entre os países?
R: São todos “emergentes”, ou seja, países de grande crescimento e de grandes possibilidades na economia mundial, mas como diferentes modos de inserção nessa economia. Dois grandes fornecedores de commodities, mas diferentes, como Brasil e Rússia – com commodities agrícolas e energéticos, respectivamente – e dois países voltados para as tecnologias inovadoras, como China e India, mas com diferentes capacitações nesses terrenos manufatureiros ou de serviços. De todos, o Brasil é inquestionavelmente o mais “capitalista” de todos, a despeito de suas deficiências regulatórias. Tambem, com a India, tem estruturas políticas formalmente democráticas, ainda que de baixa qualidade, tendo em vista o constante desrespeito à lei por parte das próprias autoridades. Sua taxa de corrupção pode não ser mais alta ou mais baixa do que os outros três, mas é certamente entranhada na máquina pública, como qualquer registro jornalístico poderia comprovar, mas essa característica parece ser igualmente partilhada pelos demais. Os outros três são potências nucleares reconhecidas, embora apenas Rússia e China sejam formalmente aceitas e “legitimadas” nessa categoria.

11)  O que você tem a dizer sobre o BRIC?
R: Existem enormes diferenças estruturais, de dotação de fatores, de políticas públicas – macroeconômicas e setoriais – entre cada um deles, assim como eles ostentam agendas internacionais bastante dessemelhantes entre si, não sendo possível visualizar, prima facie, interesses comuns, a não ser, talvez, o já alegado “interesse” – mais presumido do que real, talvez – em contestar o poder das velhas potências (do G-7) para melhor assentar o seu próprio poder.
                  Mas esse tipo de “disputa” é irrelevante do ponto de vista de uma agenda positiva para o resto do planeta, ocupado em problemas de insegurança, de desenvolvimento deficiente em vários continentes – com pobreza disseminada em várias regiões – e as ameaças ambientais e de epidemias globais ainda remanescentes ou até crescentes.
                  Os BRICs dariam uma enorme contribuição ao mundo se pudessem apresentar agendas minimamente coincidentes sobre como resolver, ou pelo menos encaminhar, alguns desses problemas mais urgentes.
 Paulo Roberto de Almeida

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Brics, a grande desilusao? - Ana Palacio (Project Syndicate)


Eu não diria que o Brics é uma falácia, uma vez que se trata de uma invenção de um economista interessado apenas em investimentos e que foi transformada em grupo diplomático -- totalmente artificial -- por decisão política de políticos oportunistas, apenas isso. Acho que se trata de um equívoco, mas não de uma falácia, pelo menos não no sentido clássico da expressão.
A construção é artificial, e os objetivos mais ainda...
Enfim, existe, como existem seres mais pesados que o ar que voam, com a ajuda de motores possantes. Quando esses motores não possuem mais potência, o animal estranho desaba. 
Pode ser que isto aconteça com o Brics, mas não seria por isso que ele seria equivocado. 
É que esse animal estranho aponta para diversos lados, cada um mais contraditório do que os outros.
Ou seja, não vai sair do lugar...
Paulo Roberto de Almeida

The BRICS Fallacy
Ana Palladio
Project Syndicate, September 30, 2015

MADRID – The recent downgrade of Brazil’s credit rating to junk status was followed by a raft of articles heralding the crumbling of the BRICS (Brazil, Russia, India, China, and South Africa). How predictable: schadenfreude almost always follows bad news about the BRICS, whose members were once hailed as the world’s up-and-coming economic powerhouses and next major political force.
There is something deeper going on here. The world’s seeming obsession with the BRICS’ perceived rise and fall reflects a desire to identify the country or group of countries that would take over from the United States as global leader. But, in searching for the “next big thing,” the world ignores the fact that the US remains the only power capable of providing global leadership and ensuring some semblance of international order.
The story of the BRICS is a familiar one. It began as a technical grouping in 2001, when the British economist Jim O’Neill lumped them together (without South Africa) and gave them their catchy name for the sole reason that they were all large, rapidly growing emerging economies. But, recognizing that economic power could translate into political influence, the BRICS held their first informal meeting in 2006, and their first leaders’ summit in 2009.
The bloc was going places – or so it seemed. But seven years, seven summits, and one new member (South Africa joined in 2010) later, the significance of the BRICS remains hotly debated.
The disparities among the BRICS are well known. China’s economic output is nearly twice that of the rest of the BRICS combined, and roughly 30 times that of South Africa. Their governance models are vastly different, from India’s robust democracy to Russia’s illiberal model to China’s one-party system. Russia and China, both permanent members of the UN Security Council, have offered, at best, lukewarm support for the other BRICS’ aspirations to join them. And then there are its members’ bilateral disagreements, including a heated territorial dispute between India and China.
Nonetheless, the BRICS have acted in concert on more than one occasion. Last March, amid near-universal condemnation of Russia’s annexation of Crimea, the country’s BRICS counterparts – even those that had long supported the inviolability of borders and non-intervention – abstained from a UN General Assembly resolution affirming Ukraine’s unity and territorial integrity.
Three months later, the BRICS released their “Leaders’ Summit Declaration” condemning the imposition of economic sanctions on Russia by the European Union and the US. Most concretely, the long-anticipated New Development Bank, run jointly and equally by the five BRICS countries, opened its doors in Shanghai in July.
Clearly, the BRICS are a thing. They are just not the thing.
The BRICS arose at a time when much of the world, especially the advanced economies, was mired in crisis. The “fall of the West” narrative ran alongside that of the “rise of the rest.” But the story has not played out quite as anticipated.
Economically, the BRICS are facing serious challenges. In addition to a well-documented growth slowdown, China has lately experienced considerable stock-market turmoil and currency devaluation. The Brazilian and Russian economies are contracting; South Africa’s growth has slowed; and India, though maintaining relatively strong growth, must undertake important reforms.
The BRICS have also failed to fulfill their promise of international leadership. At the beginning of the decade, Brazil showed a certain aspiration, along with Turkey, to press ahead with an alternative nuclear deal with Iran. But that proposal fell apart, and, amid pressure from corruption scandals and falling commodity prices, Brazil left the global stage.
South Africa and India also continue to punch below their apparent weight internationally (notwithstanding Indian Prime Minister Narendra Modi’s visibility). As for Russia, the only traditional world leader of the bunch, the Kremlin’s Ukraine policy has done severe damage to the country’s international profile – damage that not even its possible diplomatic coup in Syria can undo.
Only China has displayed an inclination to lead, as exemplified by President Xi Jinping’s visit to Washington, DC last week, which produced major announcements on climate action, cyber security, and international development. China has also been pursuing initiatives like the Asian Infrastructure Investment Bank and the revitalization of the Shanghai Cooperation Organization. But China’s growing assertiveness, particularly in the South China Sea, has fueled the perception that it is more of a threat than a leader. All in all, the BRICS no longer seem to be rising.
At the same time, the core of the West no longer seems to be declining. Although Europe remains mired in crisis and existential self-doubt, and Japan is still finding its feet after two decades of economic stagnation, the US is as relevant as ever. Indeed, no major global challenge – from conflict in the Middle East to climate change to global financial regulation – can be confronted without American engagement.
America’s enduring dominance will rile many, and with good reason. A quarter-century after the Cold War’s end, the world should have arrived at a more equitable and balanced way of getting things done. But it has not, and no other single power is in a position to take America’s place. Europe is too inward looking; China inspires too much suspicion; and India, despite showing signs that it is preparing for a greater global role, lacks enough international authority on its own. As a result, nearly 20 years after former US Secretary of State Madeleine Albright dubbed her country “indispensable,” it remains so.
The imperative now is for the US and the world to recognize this. Rather than focusing our attention on alternatives to US leadership, we should be emphasizing its importance – an approach that would help to spur the US to rededicate itself to its international responsibilities. There have been hints that this impulse still exists – notably, the Iranian nuclear deal – but they remain inadequate to the challenges confronting the world.
The international order is at a crossroads. It needs the US to guide it – with ingenuity, initiative, and stamina – in the direction of peace and prosperity. Obsessing about who might eventually replace America is bound to get us all lost.

Ana Palacio, a former Spanish foreign minister and former Senior Vice President of the World Bank, is a member of the Spanish Council of State, a visiting lecturer at Georgetown University, and a member of the World Economic Forum's Global Agenda Council on the United States.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Brics: um relatorio do Ipea

Tenho por hábito só escrever coisas com as quais eu me sinto confortável, ou seja, quando exista alguma empatia entre o assunto e o seu analista, no caso, este escrevinhador.
A despeito de eu saber muita coisa sobre os Brics, e até de ter escrito um capítulo sobre o Brasil nos Brics, para um livro publicado em Portugal ainda recentemente, creio que eu não saberia escrever qualquer capítulo, ou seção para o relatório abaixo.
Não é que me faltasse capacidade, mas é que eu não saberia encontrar coisas muito positivas para dizer sobre cada uma dessas áreas no formato Brics.
Estou certo de ser entendido...
Paulo Roberto de Almeida

IPEA. Relatório sobre os BRICS foi entregue a chefes de Estado. Ipea coordenou a elaboração do documento do Conselho de Think Tanks apresentado na cúpula de Ufá.
24/07/2015.

Chefes de Estado dos cinco países que formam os BRICS receberam na recente cúpula em Ufá, na Rússia, o documento Towards a long-term strategy for BRICS (Rumo a uma estratégia de longo prazo para os BRICS, em tradução livre). Essa é a proposta do Conselho de Think Tanks dos BRICS para o futuro da parceria entre os cinco países – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. A elaboração do texto foi coordenada pelo Ipea, think tank oficial do Brasil junto ao bloco.

O texto é dividido em cinco capítulos: Promovendo a Cooperação para o Desenvolvimento e Crescimento Econômico; Governança Política e Econômica; Justiça Social, Desenvolvimento Sustentável e Qualidade de Vida; Paz e Segurança; e Troca de Conhecimento e Inovação para o Progresso. A cúpula dos chefes de Estado ocorreu no dia 9 de julho, com a presença da presidenta Dilma Rousseff.

Entre as várias recomendações listadas, estão a necessidade de os países ampliarem posições nas cadeias globais de valor, reduzirem gradualmente as desigualdades sociais, desenvolverem novos produtos financeiros para segmentos específicos das populações, buscarem a reforma do Conselho de Segurança da ONU, trocarem experiências bem-sucedidas na área social e facilitarem a emissão de vistos para pesquisadores.

Também é sugerida a criação de um centro de pesquisas sobre políticas sociais dos BRICS, de um fórum de debates sobre controle de armas e não-proliferação e de um instituto para inovação e tecnologia. O documento entregue aos chefes de Estado é mencionado na declaração final da cúpula de Ufá como uma iniciativa bem-vinda. O texto começou a tomar forma durante a terceira reunião do Conselho de Think Tanks, em março de 2014, no Rio de Janeiro, organizada pelo Ipea.

Towards a long-term strategy for BRICS - A proposal by the BRICS Think Tanks Councilhttp://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/150724_brics_long_term_strategy.pdf

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Renato Baumann sobre os Brics: um processo em construcao (Russia Direct)

Eis as considerações, todas ponderadas e razoáveis, apresentadas pelo diretor do IPEA para as Relações Econômicas e Politicas internacionais, Renato Baumann, à pergunta sobre se os Brics deveriam ver o Ocidente como parceiro ou como rival:
Renato Baumann, Director of Studies on Economic and International Policy Relations at the Institute of Applied Economic Research (IPEA), Brazil.
To start with, it is difficult for Brazil  – and probably also South Africa  – to consider themselves as non-Western: geography matters. With this clarification, I understand that the question refers to how the main economies – the U.S. and Western Europe – see the BRICS initiative.
My guess is that the economic agents in those countries view the BRICS right now with a mix of curiosity and skepticism. Curiosity, because the group comprises some of the most important economies. But since it is very recent, it is still to be seen how the group will evolve and consolidate. Skepticism, because it is a set of five countries with different histories and objectives, with lower rates of growth now than when the group was formed.
The very reason for forming the BRICS has always been the joint perception by the five countries with regard to the needed changes in global governance. This has led to a demanding position, sometimes rather critical of the status quo. This has also led to a number of initiatives to try and increase mutual knowledge. More importantly, the group has initiated a substantive, unprecedented initiative, with the creation of a joint institution – the New Development Bank – that will allow for some degree of freedom in having an additional source of resources for investment projects in infrastructure. At the same time, it will be a big challenge to joint action by the five countries.
This means that the BRICS countries hardly see “the West” as rivals, with perhaps the exception of one or other members, involved in specific conflicts. As a group, the overall sentiment is that this is a “building up exercise,” and not a contest.

Russia Direct, July 13, 2015