segunda-feira, 22 de março de 2010

1901) Rififi no FMI: Brasil enfrenta Colombia

Crise no FMI
Merval Pereira
O Globo, 21.3.2010

Uma crise diplomática de amplas proporções para o governo da Colombia, e que o governo brasileiro procura reduzir a uma simples questão administrativa, se desenrola nos bastidores do Fundo Monetário Internacional (FMI), acrescentando mais um contencioso nas relações com países da América do Sul governados por políticos conservadores, como o Chile, onde o presidente Lula não foi para a posse de Piñera, ou o Peru de Alan Garcia.

O economista Paulo Nogueira Batista Junior, diretor executivo do FMI em Washington, demitiu recentemente a economista colombiana Maria Inês Agudelo do cargo de Diretora-Substituta.

O Brasil representa diversos países no FMI, como a Colômbia, República Dominicana, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, Suriname e Trindade e Tobago, mas a Colombia alega que a economista, ex-vice ministra das Finanças, ocupava um posto que era de representação do país, e não poderia ser demitida.

Oficialmente, não há uma explicação, e ao ser procurado Paulo Nogueira não quis falar, alegando se tratar de assunto administrativo interno, e por avaliar que, ao falar sobre o tema em público, poderia ser indelicado com pessoas envolvidas.

María Inés Agudelo, também não quis se pronunciar. Mas nos bastidores do FMI, as versões correm soltas, alimentando um clima de crise política entre os governos do Brasil e Colombia.

Os colombianos fizeram protestos formais junto ao governo brasileiro e atribuem informalmente a demissão às posições políticas de Paulo Nogueira, que seria ligado à ala esquerda mais radical do governo Lula, interessada em boicotar o governo conservador de Uribe, tirando-lhe poder nos organismos internacionais.

O fato de que Paulo Nogueira pediu a substituição de Maria Ines Agudelo por outro representante colombiano, alegado pelo governo brasileiro como prova de que se trata apenas de uma questão adminstrativa, é entendido pelo governo colombiano como tentativa de rebaixar sua representação, tornando-a subordinada ao diretor-executivo brasileiro.

O governo brasileiro alega que a Colombia sempre elogiou a atuação do diretor-executivo Paulo Nogueira no FMI, e ressalta que foi com seu apoio que a entidade criou linhas alternativas de crédito mais flexíveis na crise de 2008, que ajudaram a Colômbia.

O governo brasileiro procura retirar do episódio qualquer tom ideológico, mas atribui a politização do caso pelo governo Uribe a uma insatisfação com o fato de o governo brasileiro não querer apoiar a reeleição do Presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o colombiano Luis Alberto Moreno.

Mais uma vez, as críticas de autoridades brasileiras à atuação do BID ganham, na visão da Colombia, cores ideológicas, enquanto da parte brasileira são tidas como posições meramente técnicas.

Há na origem da eleição de Moreno para o BID um fator político importante: ele venceu a eleição em 2005 derrotando o candidato do governo brasileiro João Sayad, que tinha o apoio argentino, mas só recebeu 11 dos 48 votos dos países-membros da instituição.

Moreno foi eleito com o apoio do governo Bush, pois os Estados Unidos têm a maior participação no banco. Hoje, no entanto, a situação é distinta, pois a nova administração Obama também estaria insatisfeita com a atuação do BID durante a crise financeira internacional.

O Ministro da Fazenda, Guido Mantega, é um dos mais ácidos críticos da gestão de Moreno, e recentemente disse claramente que era preciso "uma nova gestão mais eficaz em benefício da região".

Uma das queixas maiores é quanto ao custo dos empréstimos do BID, que não seriam compatíveis com a situação financeira da América Latina.

Seja por questões ideológicas, seja por questões meramente técnicas, o fato é que o governo brasileiro está negociando desde o ano passado a apresentação de uma candidatura alternativa para a sucessão de Moreno, em outubro deste ano.

E procura uma parceria com os Estados Unidos, que a Colombia também busca. Uma das consequências dessa crise atual gerada pela demissão da diretora colombiana é que a Colombia se recusa a ser representada pelo Brasil daqui por diante no FMI, o que provocará uma mudança de procedimentos.

O governo brasileiro acha que a Colombia quer mesmo é ficar sob a representação dos Estados Unidos no FMI, o que aumentaria a já estreita ligação entre os dois países nos organismos internacionais, e dificultaria qualquer ação americana contrária, que setores da administracão Obama já defendem.

O governo colombiano acha que o governo brasileiro o discrimina justamente por essa proximidade com os Estados Unidos.

O governo brasileiro, que já perdeu outras indicações para organismos internacionais como na Unesco, quando apoiou o egipcio Farouk Hosni, acusado de anti-semitismo, que perdeu para a búlgara Irina Bukova; ou quando tentou a indicação de Luís Felipe de Seixas Corrêa na Organização Mundial do Comércio (OMC), tenta agora montar novamente uma candidatura para o BID.

Diversos nomes estão sendo cogitados, todos a nível de ministro de Estado, entre eles o do Planejamento, Paulo Bernardo, e o da Fazenda, Guido Mantega, além do ex-ministro da Fazenda Antonioo Palocci, o que só faz aumentar nos colombianos a sensação de que estão sendo vítimas de uma grande armação política brasileira para esvaziar sua presença nos organismos internacionais.

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Governo brasileiro afronta a Colômbia
Artigo de Opinião: RODRIGO BOTERO MONTOYA
O Globo, 22/03/2010

Um incidente na vaga que compartilham Colômbia e Brasil na Diretoria do Fundo Monetário Internacional ameaça deteriorar as relações bilaterais, por causa da aparente aceitação do comportamento abusivo do seu diretor-executivo no FMI, Paulo Nogueira, que têm expressado as autoridades brasileiras.

No dia 18 de fevereiro, María Inés Agudelo, a diretora-suplente pela Colômbia, recebeu um telefonema de Nogueira, que de forma intempestiva e grosseira lhe ordenou abandonar seu escritório em um prazo de 24 horas. Para acrescentar o insulto à injúria, Nogueira resolveu notificar o gerente do Banco de la República, governador pela Colômbia no Fundo, da destituição de Agudelo, solicitando-lhe o envio de currículos de possíveis candidatos a substituíla, para que ele selecionasse o representante do governo colombiano perante o Fundo em Washington.

María Inés Agudelo, ex-vice-minis tra da Fazenda da Colômbia, não era uma empregada de Nogueira. Sua destituição constitui uma irregularidade que não corresponde ao espírito do acordo constitutivo da vaga no FMI, nem ao acordado entre os governos da Colômbia e do Brasil. Segundo esse entendimento, as autoridades colombianas selecionam o diretor-suplente no FMI conforme seu melhor critério. Quando se discutem na Diretoria assuntos relacionados com o interesse colombiano, quem intervém é o diretor-substituto, não o diretorexecutivo brasileiro.

Esse entendimento não se pode violar abruptamente, por um ato tosco, sem que se rompa a tradicional harmonia, baseada no respeito mútuo, que tem caracterizado há tempos as relações entre a Colômbia e o Brasil. Também fazem parte da mesma diretoria a República Dominicana, o Equador, a Guiana, o Haiti, o Panamá, o Suriname e Trinidad e Tobago. O acordo que a constituiu estabelece que, durante o período 2004 a2016, o cargo de diretor executivo corresponde ao Brasil, e o de diretor-suplente à Colômbia. Os demais países nomeiam assessores que devem preencher determinados requisitos profissionais. Caso contrário, o diretorex ecutivo pode solicitar ao governador do respectivo país no Fundo que designe um substituto.

Tal como interpretam o acordo as autoridades econômicas colombianas, o status do diretor-suplente é diferente daquele dos assessores. Sua nomeação e remoção são atos soberanos do governo colombiano, e não são da alçada do diretor-executivo brasileiro.

No entanto, o documento que rege o manejo dessa diretoria não tem força contratual. Não existe um recurso legal válido para corrigir uma arbitrariedade como a que acaba de ocorrer.

Por definição, os acordos de cavalheiros funcionam quando aqueles que os executam se comportam como tal.

Alexandre Kafka, Murilo Portugal e Eduardo Loyo, os representantes anteriores do Brasil no FMI, manejaram de forma impecável as relações com Colômbia. Mas cavalheirismo não é o traço característico de Paulo Nogueitra ra, que conquistou a animosidade dos seus colegas na Diretoria do Fundo.

As autoridades colombianas têm reagido com firmeza e discrição. O Banco Central e o Ministério da Fazenda, assim como o Ministério de Relações Exteriores e a Presidência do Brasil, têm sido notificados sobre a inconformidade colombiana com o comportamento do seu representante no FMI.

As autoridades econômicas colombianas informaram ao diretor-gerente do Fundo que Nogueira não está autorizado a intervir em nenhum assunto relacionado com a Colômbia. Nesses casos, viajaria a Washington um funcionário do Banco de la Repúblicapara defender o interesse colombiano.

O governo brasileiro deve entender que o abuso de Nogueira significa um custo político considerável. Sua solidariedade com um comportamento inaceitável é incompatível com o objetivo de manter relações cordiais com a Colômbia.

RODRIGO BOTERO MONTOYA é exministro da Fazenda da Colômbia.

Um comentário:

  1. Nogueira acha que pode agir num orgão internacional como um comissionadozinho de prefeitura do pt. O cara não tem postura nem capacidade para estar lá. Participou, no governo Sarney, da equipe econômica que teve a pior atuação em toda a história do Brasil, promovendo desastres como plano cruzado e moratória da dívida, caloteando o FMI do qual hoje ele é, pateticamente, diretor.

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