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sexta-feira, 19 de março de 2010

1888) O dialogo sobre a revolucao russa continua...

Bem, não por minha iniciativa, mas não sou de recusar um debate.
Vejamos o que recebi em retorno ao post anterior (ver o imediatamente precedente):
PS: Alertado por um leitor, observo que o advogado em questão anda com o seu computador um pouco atrasado; a mensagem foi postada em 19/03/2010, mas o seu computador ainda "vive" em 2008.

On Jun 19, 2008, [sic] at 8:01 PM, Pedro Maciel - Maciel Neto Advogados wrote:

Professor, Boa Noite!
Vamos lá:
1º) não sou trotsquista (sou pontepretano) na adolescência sim, fui militante do PSI, vendi jornal O TRABALHO na faculdade, etc e tal, assim como o Pallocci e o Vicente (atual Presidente da ANA), hoje penso que sou um socialista que acredita na democracia como elemento fundamental e transformador dar relações, não cultuo dogmas ou verdades, se o meu texto passou essa idéia vou reescrevê-lo; por que estou no PCdoB? É uma longa historia...

2º) hoje, em relação ao socialismo, penso como Fidel, o qual na sua entrevista ao Jornalista Inácio Ramonet, que afirma categoricamente que “... a teoria e prática do socialismo ainda estão por serem escritas.” E se pergunta: “Veja só, o que é marxismo? O que é socialismo? Isso não está bem definido. Em primeiro lugar, aúnica economia política que existe é a capitalista; mas a capitalista de Adam Smith. Então andamos fazendo socialismo muitas vezes com categorias adotadas do capitalismo, o que é uma das grandes preocupações na construção do socialismo, (...) Marx fez apenas uma breve tentativa na CRITICA DO PROGRAMA DE GOTHA de definir como seria o socialismo, porque era um homem muito sábio, muito inteligente e realista para imaginar que se poderia escrever uma utopia sobre como seria o socialismo. O Problema foi a interpretação das doutrinas, e foram muitas. Por isso os progressistas permaneceram tanto tempo divididos, e as polêmicas entre anarquistas e socialistas, os problemas depois da revolução Bolchevique de 1.917 entre trotskistas e stalinistas ou, digamos, para os partidários daquelas grandes polêmicas que foram geradas, a divisão ideológica entre os dois grandes dirigentes.”

Esclarecidos esses pontos acredito que a revolução de outubro poderia ter sido algo de transformador, mas não foi... E acredito que UM dos fatores determinantes foi a burocracia, a transformação do partido em classe dirigente, ignorando a possibilidade de criação de uma democracia não burguesa.

O capitalismo de fato não se abalou, mas os capitalistas sim, até hoje eles arrepiam quando pensam na possibilidade (remotissima) do fim da propriedade privada.

A revolução, ou golpe, de 1917 falhou porque foi incapaz de desenvolver-se economica e socialmente de forma democratica, foi incapaz de levar a Russia (depois URSS) do arcaico - em relação à Europa Ocidental - ao moderno de forma democratia, foi incapaz de romper com as relações feudais (servidão) e com os baixos níveis de produtividade de forma democratica e, principalmente, foi incapaz de vencer o império religioso (afinal era a Igreja Ortodoxa que coroava os czares). Ou seja, da "Santa Russia Imperial" caminhou 360o. para a "Santa URSS do culto à personalidade", etc e tal.

Quando Stalin assume o poder, e rompe o pacto federativo de Lenin da URSS de 1922 e transformou os pequenos proprietários rurais (declarados inimigos da revolução) em KOLKHOZES - camponezes assalariados; quando Stalin confisca os bens dos pequenos proprietários e cria os GULAG; dá inicio ao "culto à personalidade"; fuziila entre 1936 e 1938 1 milhão de "inimigos" (periodo em que 6 milhões de camponezes morreram), etc, etc, etc, o movimento perde qualquer legitimidade e pode ser chamado de qualquer coisa, menos de socialismo.

Não tenho conhecimento cientifico da História, sou um advogado e não historiador ou cientista social, mas sei que para entender o que aconteceu em 1917 temos de conhecer a estrutura da Russia, a Guerra contra o Japão de 1.904,a Revolução de 1.905, o "Domingo Sangrento", o nascimento nesse contexto dos sovietes a "revolta do encouraçado Potenkin", as greves e as invasões de terra, a convocação da DUMA, a aliança entre a burguesia e os sovietes, a traição dos burgueses na DUMA (que votaram com o Czar), a aliança entre os Bolcheviques e o pessoal do socialismo rural (que talvez fosse mais honesto que os demais), a 1o.Guerra Mundia, em 1.914, a "revolução anônima" de fevereiro de 1.917 liderada por Kerenski, as tentativas de golpe contra Kerenski, a chegada de Lenin à Estação Finlândia em San Petesburgo dizendo exatamente o que o povo queria ouvir "TODO PODER AOS SOVIETES, PAZ, TERRA E PÃO), etc e tal.

Sobre o seu comentário "A caracterização fantástica desse golpe bolchevique como uma revolução operária e campesina, como você escreve, é o primeiro mito que caberia desmantelar para um debate consequente em torno da revolução russa.", tenho clareza que foi um golpe que ocorreu em 24 de outubro de 1917 em Petrogrado local em que o Soviete de Petrogrado liderado por Trotsky "tomou o poder" e no dia seguinte Lenin "declara a revolução pro decretos", decretos que são apoiados pelos demais societes da Russia.

Vou refletir sobre os seus comentários, que são todos pertinentes, contudo observo que o senhor não discorda que a burocracia, a ausência de democracia e a transformação dos lideres do partido em "classe dirigente" foram importante ingrediente para o fracasso, certo?

abs,
Pedro Maciel

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E o que respondi:

Caro Pedro
Vou tentar resumir os seus argumentos e acrescentar os meus:
1) "não sou trotsquista (sou pontepretano)"
PRA: Acho que o presidente é o unico que tem direito de brincar com fé politica e fanatismo futebolistico; afinal de contas, como os indios, as crianças e os alienados, ele é inimputavel por suas declaracoes, por mais absurdas que elas sejam;

2) "hoje penso que sou um socialista que acredita na democracia como elemento fundamental e transformador dar relações"
PRA: se voce apenas pensa é porque nao tem certeza. Pode em todo caso pensar um pouco e me apontar algum regime socialista, um único sequer, que tenha sido democrático, na concepção normal (sem adjetivos) dessa palavra; se nao conseguir, nao se preocupe: é porque nunca houve...; falar em "transformar relações" revela a mesma vocação totalitária de tantos engenheiros sociais que pensam em mudar a sociedade pelos meios disponiveis (que costumam ser os piores possiveis);

3) "hoje, em relação ao socialismo, penso como Fidel,"
PRA: Sinto muito, mas se voce pensa como Fidel, você está confessando uma vocação totalitária raramente vista na história da humanidade; nem Stalin, nem Mao ficaram tanto tempo no poder; voce nao sente nenhum calafrio ao dizer uma coisa dessas?

4) Fidel afirma: “... a teoria e prática do socialismo ainda estão por serem escritas.”
PRA: Se isso é verdade, então o Fidel é um completo idiota, e tenta fazer de idiotas 10 milhoes de cubanos. Como é que voce explica que ele está ha 50 anos tentando criar uma coisa para a qual não existe nem doutrina nem prática estabelecidas? Só pode ser coisa de um completo maluco, não acha? Ou então, um perigoso lunático, tentado fazer algo do qual não tem a menor ideia de por onde começar e para onde ir.
Se voce de fato pensa como Fidel, então voce é um completo alienado, como ele confessa ser, indiretamente.

5) Fidel continua: "O que é socialismo? Isso não está bem definido. "
PRA: Parabéns; se voce pensa como Fidel, então quer uma coisa que não está bem definida também. Coisa de malucos não acha? Pessoas razoaveis, sensatas, querem coisas sobre as quais elas possuem um mínimo de informações. Esse Fidel só pode ser um idiota completo...

6) Voce afirma: "Esclarecidos esses pontos..."
PRA: Como assim? Nenhum ponto foi esclarecido. Voce e seu amigo Fidel só colocaram dúvidas, angustias, incertezas, nao conhecem nem a teoria, nem a prática do socialismo, que vergonha! Não fizeram o dever de casa, não estudaram, pesquisaram, antes de aderir a essa coisa, digamos, indefinida...

7) "UM dos fatores determinantes [para o insucesso do socialismo na URSS] foi a burocracia, a transformação do partido em classe dirigente, ignorando a possibilidade de criação de uma democracia não burguesa."
PRA: Ah bom, pensei que fosse uma ditadura incapaz de produzir produtos simples, como existem em qualquer sociedade normal. Também não sabia que um partido (de burocratas ou não) fosse capaz de trabsformar-se em "classe" (sic); voce tem certeza?
E essa tal de democracia não burguesa, do que ela é feita? Como é que se pode definir algo pela negativa? Acho que você precisaria definir melhor o que pretende: dizer que quer uma coisa que não seja algo, significa dizer nada, sobre o nada, ou seja, optar pela não opção... Existe aqui aqui que se poderia chamar de inconsistencia lógica, uma tremenda falha conceitual.

8) "A revolução, ou golpe, de 1917 falhou porque foi incapaz de desenvolver-se economica e socialmente de forma democratica..."
PRA: Aqui existe uma incompreensão profunda do que seja uma revolucao ou um golpe: impossível que se desenvolvam de forma democratica, pois se trata de fenômenos ou processos violentos, autoritários, quebrando regras, ou seja, o exato contrario de uma democracia. Acho que voce precisa ver de modo mais claro os fenomenos sociais e politicos em sua definicao precisa e adequaçao à realidade.

9) Resumo: "Quando Stalin assume o poder,... [confisca, fuzila, Gulag...] ...o movimento perde qualquer legitimidade e pode ser chamado de qualquer coisa, menos de socialismo."
PRA: Ah bom, nao apenas o Stalin, mas todos os comunistas e adeptos da doutrina disseram, durante setenta anos, que estavam construindo o SOCIALISMO, e agora você me dizer que não era socialismo. Com que autoridade você diz isso? Escreveu algum manual do verdadeiro socialismo? Está publicado? Quem tem razão?: você ou o Stalin? Ou quem sabe o Fidel? Mas ele também não sabe nada, e já confessou isso. Que bando de indecisos vocês são...

10) "Não tenho conhecimento cientifico da História, sou um advogado e não historiador ou cientista social,..."
PRA: Não precisa ter um conhecimento "científico" da História: o último que pretendeu ter elaborado uma concepção "científica" da História, colocou as bases de um sistema científico que deve ter eliminado, por baixo, um "excedente demográfico" na casa dos 100 ou 200 milhões de pessoas, com mortes morridas e mortes matadas, ou seja, direta e indiretamente.
Não precisa ter conhecimento "científico" da História para saber disso; basta abrir os olhos e observar a realidade. Alguns livros de História que não sejam dessa vertente "científica" também ajudam...

11) Finalmente: "Vou refletir sobre os seus comentários, que são todos pertinentes, contudo observo que o senhor não discorda que a burocracia, a ausência de democracia e a transformação dos lideres do partido em "classe dirigente" foram importante ingrediente para o fracasso, certo?"
PRA: Grato pelos "comentários pertinentes". Acho que você confunde as coisas: burocracia existe em QUALQUER sistema social e politico um pouco mais elaborado, que nao seja um tribo de botocudos, por exemplo.
Ausência de democracia pode significar ditadura, plutocracia, totalitarismo, enfim qualquer coisa. A gente precisa definir as coisas positivamente, nao negativamente, pela ausência de algo...
Por fim, essa coisa de ver líderes de um partido transformados em "classe dirigente" não quer dizer absolutamente nada, isso é linguajar de marxista desocupado.
Quanto a fracasso, tem muitas maneiras de chegar nele: um povo que empobrece, ainda que relativamente, é um povo fracassado, certo? Um povo que elege um caudilho que depois se torna ditador, também pode se confessar fracassado. Um povo que prefere esmola a trabalho, já pode considerar-se um povo fracassado...

Acho que está bem por hoje...

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Paulo Roberto Almeida
(19.03.2010)

6 comentários:

Mário Machado disse...

No mínimo 100 milhões de almas gritam em lamento (fantasmagórico é claro) quando alguém adjetiva a democracia.

pseudopseud disse...

Eu desisto de tentar entender o ponto de vista dese pessoal,apesar de meus esforços,sinceramente.Estudei o que pude sobre socialismo de maneira autodidata e tudo que li não vale nada,então.Vou aguardar ser escrita e quem sabe um dia eu entenda.

Anônimo disse...

Sem entrar no mérito da discussão, as datas dos comentários e do artigo sugerem algum equívoco. O comentário do advogado aparece com uma data de 2008. O seu artigo no Espaço Acadêmico é de 2010. Isso eu não entendi. O computador do advogado estava com a data ajustada errada? Quanto a sociólogos não conseguirem fazer análise sociológica a não ser a partir de princípios marxistas, sugerindo ser impossível fazer análise sociológica sem marxismo para mim parece que isso é uma típica falácia esquerdista. Análises sociológicas existem desde os gregos. O Marxismo adiciona à análise sociológica fatores culturais bem identificáveis. O problema é o isolamento intelectual brasileiro. Vivemos numa espécie de Cuba intelectual, que filtra quaisquer outros tipos de propostas através de muros ideológico-sociais implementados no aparelho universitário. Essa é a triste realidade a que estamos destinados: de um lado Dilma, guerrilheira do Val-Palmares, e de outro, Serra da AP. A falta de preparo de uma sociedade jovem e deseducada, assassina a democracia em sau raiz ao bloquear as poucas sementes discordantes que caem ao acaso em seu solo. Vivemos no Brasil uma Consertacion chilena um poquito mais esperta...

Paulo Roberto de Almeida disse...

Anônimos nao ajudam no dialogo, posto que se escondem atras de algo concreto...
Mas vamos lá:

Eu não disse que só se pode fazer sociologia a partir de "princípios marxistas". Eu disse que a sociologia contemporânea está impregnada de conceitos marxistas, posto que Marx foi um grande pensador social, disso ninguém tem duvida.
Recusar o Marx sociólogo porque o economista é deficiente, o político anti-democrático e o social desastroso, seria cegueira. Todas as contribuições analíticas são bem vindas, sem precisar aderir às propostas malucas de seus proponentes no capítulo das reformas sociais.
Guerrilheiros teriam existindo no Brasil mesmo sem a existência de Marx: anarquistas, blanquistas, proudhonianos, bakuninistas tambem pregavam ou reformas radicais ou revoluções violentas...

paulo araújo disse...

Sobre a crítica ao pensamento de Marx, concordo com o que tenho lido dos pesquisadores que procuram mostrar que, ao contrário do que pregam os sectários do "marxismo como ciência", o pensador alemão está, em relação a Hegel, mais para epígono do que para adversário.

Mas como filosofia é uma praia que eu só me atrevo a ir no rasinho, prefiro ficar no Marx analista político. Eu acho o 18 Brumário um livro magistral. Até hoje é leitura fundamental para entendermos melhor a ocorrência de certos eventos históricos como Chávez, Lula, Golpe de 64, Pinochet etc.

José Marcos disse...

UM ADENDO

Estava escrito no blog:
"Pode em todo caso pensar um pouco e me apontar algum regime socialista, um único sequer, que tenha sido democrático, na concepção normal (sem adjetivos) dessa palavra; se nao conseguir, nao se preocupe: é porque nunca houve..."
Pensei um pouquinho e lembrei-me do governo SOCIALISTA de Miterrand. Vale?