A presidente (com "e") merece um balanço de sua gestão, embora eu ache esse ritual dos 100 dias desnecessário. Balanços devem ser feitos toda vez que uma determinada política produzir efeitos que possam ser aferidos, avaliados, sopesados, comparados com efeitos reais ou potenciais de outras política, enfim, fazer o tipo de análise crítica que todo governo merece (afinal, somos nós que estamos pagando para que ele governe).
Eu, por exemplo, considero que a marca principal deste governo, no que ele fez até agora, foi a improvisação, total e absoluta.
Um ministério enorme, que é, em sua grande maioria, composto de mediocridades desconhecidas, e que foi herdado, por outra parte, do governo anterior, não pode mesmo se distinguir por brilhantes políticas econômicas ou sociais. Pretende ser continuidade, mas não consegue, pois a herança maldita que lhe foi deixada pelo governo irresponsável anterior o está precipitando numa espiral inflacionária que, no seu populismo otimista, o governo atual não sabe debelar.
Pagaremos caro por essa herança, por um governo exacerbado de pretensões e parco de soluções.
Paulo Roberto de Almeida
Os primeiros cem dias
Editorial - O Estado de S.Paulo
12 de abril de 2011 | 0h 00
A presidente Dilma Rousseff completou 100 dias de governo com a economia em crescimento, elevado nível de consumo e ampla oferta de emprego, mas também com inflação acelerada, câmbio em perigosa valorização, gasto federal em rápido crescimento e sinais de alerta nas contas externas. Cem dias podem ser um prazo muito curto para a solução de problemas complexos, mas devem ser suficientes para um governo definir seu estilo. Este deve ser o foco de um primeiro balanço da nova administração: a orientação adotada até agora levará a um crescimento prolongado e seguro ou agravará os desajustes e levará o País a uma nova sucessão de crises? O governo tem dado - na avaliação mais otimista - uma resposta dúbia a essa questão.
As opções do governo foram discutidas com notável clareza pelos economistas Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, e Pedro Cavalcanti Ferreira, professor da Fundação Getúlio Vargas, em artigo no Estado de domingo. A partir de 2008, quando se agravou a crise internacional, a administração petista vem-se mostrando inclinada a ressuscitar o modelo de crescimento em vigor entre os anos 1950 e 1980. O modelo caducou e o País entrou numa fase de quase estagnação, com breves surtos de crescimento interrompidos por longos e penosos períodos de crise.
Esse padrão só foi rompido quando os governantes se dispuseram a promover, a partir de 1994, um ajuste real, sem truques, no sistema de preços, na gestão pública e nas contas externas. Erros foram cometidos durante esse esforço, mas o resultado, altamente positivo, foi uma ampla renovação da política econômica, de seus instrumentos e de seus critérios.
O trinômio metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário passou a sintetizar o novo padrão de política macroeconômica, mas, ao lado disso, consolidou-se uma nova divisão de papéis entre o setor privado e o Estado. Idealmente, esse não deveria ser um Estado omisso, mas empenhado em cumprir com austeridade e eficiência funções indispensáveis ao bom funcionamento da sociedade e ao desenvolvimento econômico e social.
Em vez de dar continuidade à construção desse Estado, a administração petista vem demonstrando, especialmente a partir do segundo governo Lula, uma inquietante nostalgia do velho desenvolvimentismo. "Nostalgia", palavra usada pelos economistas Armínio Fraga e Pedro Cavalcanti Ferreira, é um rótulo quase simpático para uma tendência muito perigosa. Eles apontam o risco: a tentativa de repetir a experiência dos anos 50 a 80 poderá levar o País a espatifar-se em mais uma década perdida. Mas o quadro se torna muito mais assustador quando se acrescentam os detalhes do dia a dia, como a pobreza estrutural, a concentração de renda e de riqueza nas mãos dos grupos escolhidos para protagonizar o crescimento, a persistência da inflação e a recorrência de penosas crises de balanço de pagamentos.
A crise de 2008 impôs a todos os governos importantes ações intervencionistas. Maiores gastos públicos, maior oferta de crédito e operações de socorro a grupos privados constituíram o grosso das políticas anticíclicas. Algumas dessas ações foram adotadas no Brasil. Mas, passada a crise, o governo brasileiro resiste a abandonar inteiramente as ações anticíclicas. A resistência não é só do governo, mas também, é claro, de grupos beneficiados pelo aumento dos gastos, pela expansão de empréstimos subsidiados e por outros benefícios distribuídos pelo poder público.
Ao mesmo tempo, os desajustes se acumulam. O saldo da conta corrente do balanço de pagamentos, hoje deficitário, diminuiu 4 pontos porcentuais do PIB enquanto a relação de preços entre produtos exportados e importados aumentou 40%. Com uma evolução de preços tão favorável, como explicar a sensível deterioração das contas externas, a não ser por um grave desajuste interno?
A escolha correta é simples. Em vez de ressuscitar um modelo falido, deve o governo cuidar de tarefas de importância evidente, como arrumar suas contas, investir em educação e qualificação profissional e criar condições para a expansão do investimento, limitado a insuficientes 18,4% do PIB. Não é preciso criar um setor público empreguista, balofo e intervencionista para cumprir essas tarefas.
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