Ao contrário do que costumo fazer, hoje vou escrever para sugerir, enfaticamente, que vocês visitem o site do sociólogo, Simon Schwartzman, e leiam o que Samuel Pessoa (economistas do IBRE-FGV) e colunista da Folha escreveu sobre o artigo do economista André Lara Resende que foi publicado na sexta-feira no Valor Econômico. Vou colocar o link no final deste post, mas antes faço algumas observações.
Primeiro, todos sabemos que André Lara Resende é um economista brilhante que junto com Pérsio Arida , Edmar Bacha, Francisco Lopes, Gustavo Franco entre outros foi uma das cabeças por trás da concepção do Plano Real. No entanto, confesso que concordo com todos as críticas que Samuel escreveu no pequeno texto no blog do Simon Schwartzman.
Segundo, a discordância de Samuel em relação ao artigo do Lara Resende concentra-se em três pontos: (i) Lara Rezende acredita que o Nacional Desenvolvimentismo era um projeto que combinava uma rede de proteção social com a industrialização forçada. Da mesma forma que Samuel, não concordo com essa interpretação e existe até uma literatura nova que se chama “O Novo Estado Desenvolvimentista” que mostra bem a diferença entre um modelo que prioriza industrialização forçada (que foi o nosso velho estado desenvolvimentista) versus outro no qual a politica industrial e de promoção setorial competem por recursos com politica social – tem três bons textos sobre isso: dois do Peter Evans e outro do David Trubek. O nosso modelo dos anos 70 não foi ativo em politica social.
(ii) Samuel discorda da ideia que a maior parte do que o Estado arrecada de nossa elevada carga tributária se transforma em aumento do consumo do governo – ineficiência da máquina pública. É como se o Estado fosse uma grande máquina inchada e que para reduzirmos o gasto público precisaríamos, apenas, de um fabuloso gestor privado. Isso é pura ficção. O Brasil gasta muito com transferências e consegue-se explicar quase todo o aumento do gasto público desde 1990 olhando apenas para as contas públicas ligadas as transferências (previdência e gastos sociais com LOAS, Bolsa Família, seguro desemprego e abono salarial).
É nesse segundo ponto que aparece o “problema da meia-entrada” que Samuel explica e que vem sendo popularizada em um texto do Marcos Lisboa e Zeina Latif. O Estado, no Brasil, gasta muito porque fizemos opção por várias “meias-entradas”, mesmo que essas decisões (como bem lembra meu amigo e ex-presidente do IPEA Fernando Rezende) estejam sujeitas a problemas de assimetria de informação e atuação de grupos organizados (aqui que entra o problema de ação coletiva da Mancur Olson). Nas palavras de Samuel: “a própria sociedade, e não um estamento apartado da sociedade, que se beneficia das meias entradas”.
Concordo com isso. Não foi uma elite dominante que ainda sofre influência do Estado Português colonial que decidiu sobre “nossas jabuticabas”. Infelizmente fomos “nós” com todas os vícios e imperfeições de nosso processo político e a atuação de grupos de pressão. Por isso que Samuel fala, e concordo com ele, que uma forma de tentar corrigir o problema do excesso de “meias-entradas” é deixando claro o custo das políticas: se as pessoas tomam consciência do link entre o que pagam de impostos e como o dinheiro é aplicado isso pode começar um interessante debate que poderia levar a uma reforma tributária e fiscal.
(iii) Por fim, o último ponto que Samuel discorda é que André Lara Resende associa os movimentos das ruas às necessidades de moderar a demanda por crescimento econômico em função das limitações de recursos naturais do planeta. Lara Resende tem essa ideia fixa que o mundo se aproxima de um limite ao consumo e, assim, precisamos aprender a viver com menos e priorizar qualidade de vida e não mais o crescimento. Acho uma tese interessante, mas tenho uma imensa dificuldade de concordar com essa ideia e não vi ninguém nas ruas defendendo essa tese.
Querer melhor qualidade de vida não significa reconhecer as limitações de recursos naturais do nosso planeta. Na verdade, nós brasileiros adoramos gastar, algo que o próprio Lara Resende reconhece na sua entrevista hoje à jornalista Alexa Salomão, no Estado de São Paulo, quando fala de nossa “estrutural insuficiência de poupança”. – clique aqui para ler a matéria do Estadão.
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