O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Portugueses estreitamente vigiados (e nao e' de agora) - Paulo Werneck

Sem Escalas

Paulo Werneck
Guardamoria, 14/09/2013
Pedro II
Fonte: Wikipedia

Algumas leis proibiram que estrangeiros aportassem nos domínios portugueses, mas esta a seguir, de Pedro II, proibia que portugueses aportassem em portos estrangeiros. A idéia de ambas as proibições é impedir que riquezas existentes nas conquistas lusas fossem parar nos mercados de consumo sem pagar o "pedágio" devido nas alfândegas reais.

Pedro II, não o nosso imperador, claro, mas o bisavô e trisavô de dom João VI. Nosso Dom João era filho de Dona Maria I, a louca, com Pedro III, e Pedro III era irmão de Dom João V, neto de Pedro II e pai de Dona Maria... Não admira que ela tenha ficado louca, mãe e prima de Dom João.

Chega de papo de família e vamos à lei. 
Traslado da Lei promulgada em doze de Dezembro de ſeiſcentos oitenta e quatro. 

Dom Pedro por graça de Deos Rei de Portugal, e dos Algarves, daquém, e dalém mar, em África Senhor de Guiné, e da Conquiſta, Navegação, Commercio da Ethiopia, Arábia, Perſia, e da India, &c. Faço ſaber a quantos eſta minha Lei geral virem, que por experiencia ter moſtrado os grandes deſcaminhos, que ſe fazem nos direitos de minhas Alfandegas, e Eſtancos, nos Navios que ſe recolhem em pórtos eſtranhos, e outros juſtos reſpeitos, que a iſſo me movêrão: fui ſervido com o acordo dos do meu Conſelho, eſtabelecer a preſente Lei geral, pela qual prohibo, e mando, que nenhum Navio, ou embarcação de qualquer lote que ſeja, que do eſtado do Braſil, Maranhão, e mais Conquiſtas vier para eſte Reino, ou para as Ilhas adjacentes, poſſa ſem evidente perigo do mar, ou Coſſario, tomar porto eſtranho, nem nelle fazer efcala, e o Meſtre do Navio, ou embarcação de qualquer lote que ſeja, que contra a prohibição deſta minha Lei entrar voluntariamente em porto eſtranho, por eſte meſmo feito perderá os ſeus bens, em que tambem ſe comprehenderá a parte que tiver no meſmo Navio, ou embarcações, e ſerá degredado dez annos para o Eſtado da India, aonde não poderá nunca mais ſer Meſtre, ou ter occupação alguma de mandar, excepto a de Marinheiro; e nas meſmas penas incorreráõ os Pilotos dos ditos Navios, e embarcações; e os Senhores dellas, ou delles, que forem comprehendidos por participantes, ou ſcientes na meſma culpa, além de perderem a parte que tiverem nas ditas embarcações, incorreráõ na pena de dous mil cruzados, que já eſtava eſtabelecida por outra minha Lei, e em quatro annos de Africa. E os Meſtres dos Navios, e embarcações, que correndo com o tempo, ou corridos dos inimigos, tomarem algum porto eſtranho, por não poderem de outro modo evitar o perigo, ſe emquanto eſtiverem nelle, (que ſera ſó em quanto não ceſſar aquella cauſa) commerciarem, conſentirem, ou permíttirem que ſe tire fazenda, aſſucar, tabaco, ou outra qualquer, derogados ditos Navios, ou embarcações, incorreráõ nas meſmas penas impoſtas neſta Lei aos que tomão os ditos pórtos voluntariamente; nas quaes outroſim incorreráõ as peſſoas que tirarem, ou ajudarem a tirar das ditas embarcações qualquer dos ditos gêneros, ou fazenda que nellas venha. E para melhor obſervancia do diſpoſto neſta Lei: Hei por bem, que além das devaças que todos os annos hão de tirar neſta Corte o 0uvidor da Alfandega della, e na Cidade do Porto, e Villa de Viana, os Corregedores daquellas Comarcas, (depois de recolhidas as Frotas) ſe poſſa também denunciar em público, ou em ſegredo dos tranſgreſſores della, por qualquer Official de Juſtiça, ou peſſoa do povo, ainda que ſejão cúmplices no meſmo delicto; e ficará em ſua eſcolha poder denunciar diante dos Corregedores da Corte, ou de qualquer outro Miniſtro; e em cada huma deſtas maneiras que fação certa a tranſgreſsão deſta Lei, levará o denunciante ametade dos bens dos culpados, os quaes mandarei avaliar, para lhe dar a eſtimação da dita ametade, em caſo que não queira ſer deſcuberto; e aos cúmplices que denunciarem, ſe lhes perdoará também a meſma culpa, ſem que ſe proceda contra elles pela confiſsão, que de ſi meſmo fizerão, em caſo que não provem a denunciação; e todos os mais bens, e dinheiro que procederem das codemnações dos réos deſte crime, tirada a parte que ſe applica aos denunciantes, ſe repartiráõ igualmente para a criação dos Engeitados, Hoſpital de todos os Santos deſta Corte, e Redempção dos cativos, que poderáõ ſer parte nos proceſſos das accuſações, e condemnaçôes do dito crime; e para que venha á noticia de todos, mando ao meu Chanceller mór faça publicar eſta Lei na Chancellaria, na fórma que nella ſe coſtumão publicar ſemelhantes Leis, inviando cartas com o traslado della ſob ſeu ſinal, e meu ſello, aos Corregedores, Provedores, e Ouvidores das Comarcas, para que a publiquem, e fação publicar nos lugares aonde eſtiverem, e nos mais de ſuas Comarcas, e ſe regiſtará nos livros da Meza do Deſembargo do Paço, e nos da Caſa da Supplicação, e Relação do Porto. Manoel da Silva Collaço a fez em Lisboa a vinte e ſete de Novembro de ſeiſcentos oitenta e quatro. Franciſco Galvão a fez eſcrever. Rei. Por Decreto de Sua Mageſtade de vinte e ſete de Outubro de mil ſeiſcentos e oitenta e quatro. João Lamprea de Vargas. Diogo Marchão Themudo. João de Roxas de Azevedo. Foi publicada na Chancellaria Mór eſta Lei de Sua Mageſtade por mim Dom Sebaſtião Maldonado, Védor da dita Chancellaria, perante os Officiaes della, e de outras peſſoas, que vinhão requerer ſeus deſpachos. Lisboa doze de Dezembro de mil ſeiſcentos oitenta e quatro.
A ressaltar a prática de incentivar as denúncias, dando parte dos bens arrecadados para o denunciante, bem como a doação do restante para obras de caridade, nada ficando para o tesouro real, salvo o aumento do risco dos descaminhadores.

Também é de se notar o cuidado com que a lei é escrita, cuidando de abrir exceção para os casos de força maior, mas cuidando, nesse caso, de manter firme o que Miguel Reale denominaria o "valor" da norma, qual seja o não descaminho das mercadorias.

Por redenção dos cativos devemos entender o pagamento dos resgates exigidos pelos mouros para libertar os portugueses por eles aprisionados, prática usual da época.


Fonte:

José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa. Systema, ou Collecção dos Regimentos Reaes. Tomo Quarto. Lisboa: Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1785.

Um comentário:

Anônimo disse...

http://www.project-syndicate.org/focal-points/the-lehman-legacy

Vale!