domingo, 27 de outubro de 2013

Brasil: sem crescimento da produtividade nao se diminui a desigualdade

Receita para reduzir desigualdade brasileira divide os especialistas

  • Educação e crescimento maior estão entre saídas recomendadas

CLARICE SPITZ, CÁSSIA ALMEIDA E LETÍCIA LINS (EMAIL·FACEBOOK)

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Na pobreza. Maria Aparecida Alves faz as contas do trabalho como ambulante em Recife Foto: Terceiro / José Carlos Mazella

Na pobreza. Maria Aparecida Alves faz as contas do trabalho como ambulante em RecifeTerceiro / José Carlos Mazella

RIO E RECIFE - A desigualdade parou de cair, mostrou a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada pelo IBGE. Educação, crescimento, manutenção das políticas de valorização do salário mínimo e programas de transferência de renda são as saídas indicadas por especialistas ouvidos pelo GLOBO para o país continuar na rota da melhoria da distribuição de renda.

Mas não há unanimidade. A maior parte ainda vê ganhos com a valorização do mínimo e o Bolsa Família, mas a educação é considerada a porta de saída mais duradoura por todos os especialistas. Baixo crescimento e produtividade podem emperrar esse processo. Como o mínimo é reajustado por uma fórmula atrelada ao PIB e à inflação, acabará ficando menor. Baixo crescimento também significa menos arrecadação para transferências.

— Essas duas políticas resultaram num salto, mas esse ‘efeito salto’ se esgota ao longo do tempo. Estamos observando uma redução de velocidade de impacto desse modelo de mínimo e transferências — afirma a economista Barbara Fritz, da Freie Universität, em Berlim, e do Instituto Desigualdades.

O economista Claudio Dedecca, da Unicamp, observa que, com 13,8 milhões de famílias atendidas, ou um quarto da população brasileira, o Bolsa Família tem pouco espaço para crescer. Para ele, o PIB precisa subir 4%, o que acha factível, para reativar o papel da política pública:

— Se não houver crescimento da economia e investimento forte, esse fôlego da política pública é limitado e está mostrando sinais de esgotamento.

O economista João Saboia, da UFRJ, lembra que o salário mínimo teve um crescimento de mais de 100% em paridade de poder de compra entre 2000 e 2011 e foi determinante para a redução da desigualdade, mas que agora é preciso avançar em produtividade.

— Estamos numa encruzilhada. A retomada do crescimento passa pelo aumento dos investimentos, caso contrário, significará alta da inflação. É preciso investir e aumentar a produtividade do trabalho, com a qualificação da mão de obra.

O acesso à educação de qualidade é considerado crucial se o país quiser continuar na mesma via social. Para Naércio Menezes, economista no Insper-SP, sem aumento da população no ensino superior, essa desigualdade se manterá. Ele diz que, no Brasil, 11% da população de 25 a 34 anos têm ensino superior completo, enquanto no Canadá, chegam a 56%, e nos EUA, 40%. O México supera o Brasil: lá são 20%. Aumentou o prêmio para quem tem pós-graduação em relação aos que têm apenas ensino superior. Em 2003, era de 40% e subiu para 61%, em 2012.

— Isso mostra que a demanda por esse pessoal mais qualificado tem aumentado.

O professor emérito da Universidade de Columbia Albert Fishlow acha que o Brasil gasta pouco e mal com educação.

— O país ainda está atrás do Peru na educação secundária. A reação costuma ser “vamos investir 10%” como se fosse a solução, mas é necessária uma política coerente e contínua.

Pobreza extrema eliminada em 2014

A economista Sonia Rocha, do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade, defende incorporação dos programas de transferência de renda em caráter definitivo.

— A renda em si não transforma. Traz um conforto e dá previsibilidade às famílias. Mas a transformação de vida vem essencialmente pela educação e nisso fizemos progressos muito lentos.

O diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea Rafael Osório diz que o Brasil Carinhoso, ação que complementa a renda dos beneficiários do Bolsa Família, vai eliminar a pobreza extrema em 2014.

— As pessoas que estiverem na extrema pobreza no ano que vem serão por um choque transitório ou por erros de medida, mesmo que a economia cresça pouco e se não houver nada que faça o desemprego subir muito. Os programas de transferência vieram para ficar. Nenhuma sociedade com padrão de desenvolvimento vive sem um sistema de garantia mínima.

A economista Lena Lavinas, da UFRJ, defende o aumento da linha de pobreza e uma taxação maior para os ricos.

— Há um enorme espaço para transferir mais renda a grupos mais vulneráveis e pobres, revendo a linha da pobreza. É preciso também mais alíquotas de IR: hoje o 27,5% vale tanto para quem ganha R$ 5 mil quanto para quem ganha R$ 300 mil.

Enquanto especialistas tentam achar saídas, a ambulante Maria Aparecida Alves faz as contas no barraco improvisado, ao lado do viaduto Tancredo Neves, em Boa Viagem, um dos locais com o metro quadrado mais caro de Recife. Sem Bolsa Família, ela vive com filhos e os quatro netos:

— Eles (as autoridades) derrubaram os nossos barracos, lá na Vila Bom Jesus.



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