Por uma Venezuela novamente democrática
Aloysio Nunes, ministro das Relações Exteriores
O Estado de S. Paulo, 06/06/2017
Defendemos o respeito aos princípios democráticos para que o povo venezuelano possa voltar a ser senhor do próprio destino.
Participei, no dia 31, da 29.ª Reunião
dos Ministros das Relações Exteriores da Organização dos Estados
Americanos (OEA), convocada para tratar da crise política e humanitária
na Venezuela.
O que motivou a Reunião de Chanceleres foi a constatação de que o estado democrático de direito deixou de vigorar na Venezuela.
O que vemos diariamente naquele país é a
arbitrariedade de um governo que cerceia as liberdades fundamentais de
seus cidadãos, destrói a independência do Judiciário, ignora a voz do
Legislativo, sufoca a oposição e se nega a organizar eleições.
Prisioneiros políticos e de consciência
lotam os porões do regime. O saldo crescente de mortos e feridos,
resultante dos confrontos entre oposicionistas e forças governamentais
nas ruas, é um verdadeiro escândalo em uma região que fez uma escolha
decidida pela paz, pela democracia, pelos direitos humanos e pela busca
do desenvolvimento.
Podemos ter opiniões diversas, do ponto
de vista político ou ideológico, sobre o governo venezuelano, mas o fato
inegável é que, a cada dia, aumenta o número de cidadãos venezuelanos
vitimados por uma impiedosa repressão governamental. Até quando isso vai
continuar?
Não podemos deixar o povo venezuelano
desamparado. Nosso continente já sofreu demais o flagelo do
autoritarismo, por isso qualquer ameaça de retrocesso nos toca
profundamente e exige nossa ação.
O governo brasileiro está firmemente
comprometido com a criação das condições para uma saída política e
pacífica para a Venezuela, que deve ser encontrada pelos próprios
venezuelanos com o apoio e a facilitação de um grupo representativo de
países e da OEA.
Entre os países-membros da OEA, há
reconhecimento generalizado da gravidade da crise, da urgência de um fim
imediato para a violência e da necessidade de um diálogo efetivo, real,
entre o governo e a oposição, com vistas à definição de um cronograma
de transição política pacífica.
O grupo de países composto por
Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Estados Unidos,
Guatemala, Honduras, México, Paraguai, Panamá, Peru e Uruguai já
apresentou uma proposta sólida para avançar nesse sentido.
Preocupa-nos, em especial, a convocação
pelo governo venezuelano de uma Assembleia Constituinte segundo
procedimento que está à revelia do princípio do sufrágio universal
inscrito na própria Constituição bolivariana.
Trata-se de medida que, além de alijar
ainda mais o Poder Legislativo legítimo, provocará seguramente, se não
for revertida, a radicalização cada vez maior da crise política e o
alastramento da violência.
Estamos trabalhando com os países
caribenhos da OEA para aproximar a proposta deles da nossa e, assim,
fortalecer nossa atuação conjunta em defesa da democracia e da paz na
Venezuela. A Reunião de Chanceleres em Washington demonstrou que estamos
unidos no firme propósito de ajudar os venezuelanos a alcançar uma
solução para a crise o mais rápido possível.
Não posso deixar de enfatizar a trágica
dimensão humanitária da crise. Milhares de cidadãos venezuelanos
atravessam todos os dias a fronteira com o Brasil. Vêm ao nosso País
compelidos pela escassez na Venezuela de gêneros indispensáveis à
sobrevivência.
O governo da Venezuela não pode
restringir mais a entrada no país e a distribuição, sem discriminações,
de alimentos e medicamentos para socorrer sua população.
A crise humanitária é consequência
direta da privação de direitos sofrida pelos venezuelanos. Defendemos o
respeito aos princípios democráticos para que o povo da Venezuela possa
voltar a ser senhor do próprio destino. A soberania e a autodeterminação
na Venezuela precisam emanar de um povo capaz de participar ativamente
da vida da nação, em ambiente democrático verdadeiramente livre. Somente
na democracia é possível trilhar o caminho da paz social e da
prosperidade, que é o que nós brasileiros desejamos aos irmãos
venezuelanos.
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