Jamil Chade, Correspondente
GENEBRA - As eleições presidenciais no Brasil estão sendo alvo de um acompanhamento específico por parte das agências da Organização das Nações Unidas (ONU). O Estado apurou que a entidade decidiu fazer um monitoramento minucioso do que está ocorrendo no País, temendo que a principal democracia da América Latina possa ser afetada por um clima de tensão política inédito desde os anos 80.
Escritórios da ONU que lidam com política regional ou direitos humanos têm feito o acompanhamento com detalhes sobre a situação atual e cenários. A informação tem servido de base para permitir que a cúpula da organização em Nova York e em Genebra esteja atualizada sobre os acontecimentos e possa, eventualmente, reagir com declarações públicas.
O monitoramento não significa qualquer tipo de envio de missão internacional ou dúvidas sobre o processo eleitoral por parte da entidade.
Fontes do alto escalão da ONU indicaram à reportagem que dois temas principais estão sendo monitorados: incidentes de violência e tensão durante o processo eleitoral e o impacto que o resultado pode ter em termos geopolíticos no hemisfério Ocidental, já chacoalhado depois da chegada de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos.
Considerado como "estratégico", o Brasil havia voltado ao radar internacional desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Naquele momento, Ban Ki Moon, o então secretário-geral da ONU, pediu "serenidade a todos os lados" envolvidos na crise política, justamente temendo uma instabilidade social no País.
Em 2016, a diplomacia brasileira colocou em operação uma estratégia para garantir que, em qualquer fórum internacional, a versão oficial sobre o impeachment fosse transmitida. A mensagem era de que o processo tinha seguido todos os passos constitucionais, que o Supremo Tribunal Federal havia realizado o acompanhamento do caso e que o Congresso havia votado. A ordem era passar a ideia de uma “normalidade institucional” e garantir que o estado de Direito não havia sido abalado.
O envolvimento da ONU acabou se intensificando diante do processo que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado e preso pela Operação Lava Jato, levou ao Comitê de Direitos Humanos da entidade. O caso será concluído apenas em 2019, mas obrigou o governo brasileiro a dar respostas aos peritos que, por sua vez, passaram a acompanhar de perto os trabalhos do Judiciário.
Recentemente, foi a vez do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU reagir diante da crescente popularidade do candidato à Presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro. Em agosto, o então chefe do escritório da ONU, Zeid al Hussein, qualificou o discurso do candidato de “um perigo” para certas parcelas da população no curto prazo e para o “País todo” no longo prazo. Ele foi substituído logo depois pela chilena Michelle Bachelet, que, por enquanto, não se pronunciou publicamente sobre as eleições brasileiras.
Bolsonaro chegou a mencionar que, se eleito, o Brasil deixaria o Conselho de Direitos Humanos da ONU, recuando dias depois. “Não serve para nada essa instituição”, disse Bolsonaro. Em julho, durante entrevista no programa Roda Viva, Bolsonaro ainda defendeu a ditadura militar (1964-1985) e disse que, se eleito, não vai abrir os arquivos do regime. “Não houve golpe militar em 1964. Quem declarou vago o cargo do presidente na época foi o Parlamento. Era a regra em vigor”, disse.
Tensão - Uma eventual vitória do PT também tem sido acompanhada de perto pela ONU, que teme o acirramento das tensões e resultados que possam ser questionados.
A violência durante a campanha, que resultou inclusive no atentado a faca contra Bolsonaro, foi considerada como sinal de alerta sobre possíveis cenários de tensão. Em comunicado, o Escritório para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) condenou o ataque e “observou o crescimento das tensões nas últimas eleições em países da América Latina e manifestou preocupação com os casos de ameaças contra candidatos concorrendo a cargos nos poderes Executivo e Legislativo no Brasil”. O Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos apelou ao “diálogo”.
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