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sábado, 16 de janeiro de 2021

O movimento tradicionalista: Benjamin Teitelbaum - Carta Capital

 Santa ignorância

Revista Carta Capital | Capa
15 de janeiro de 2021



Benjamin Teitelbaum, da Universidade do Colorado, explica a interpretação tortuosa da realidade compartilhada pelo radicalismo de direita.

Especialista em radicalismo de direita, professor da Universidade do Colorado e autor do livro Guerra pela Eternidade: O retorno do tradicionalismo e a ascensão da direita populista, Benjamin Teitelbaum decifra o caráter anticientífico e negacionista dos apoiadores de Donald Trump e suas cópias mundo afora.

"A característica definidora do tradicionalismo é seu desejo abrangente de rejeitar a 'modernidade' e, com isso, a ideia de que a sociedade poderia progredir e melhorar significativamente", afirma na entrevista a Clarissa Carvalhaes.

"Isso normalmente significa rejeitar coisas como ciência moderna, universidades modernas e o Estado democrático. Também pode significar rejeitar esforços para criar sociedades mais integradas e igualitárias em termos de raça e gênero."

CartaCapital: Do ataque ao Capitólio à negação da Covid-19, como podemos identificar o tradicionalismo nesses movimentos destrutivos?

Benjamin Teitelbaum: O tradicionalismo pode inspirar os indivíduos a rejeitar as alegações de especialistas científicos durante, digamos, a pandemia. A abraçar, em vez disso, o conhecimento rejeitado pela sociedade moderna dominante como o esoterismo religioso e as teorias de conspiração. Desrespeitar o funcionamento das instituições governamentais. E opor-se aos movimentos políticos que buscam criar um mundo melhor. Assim, aqueles atraídos pelo tradicionalismo podem celebrar a dispensa em massa de perícia científica e educação formal, o mau funcionamento do governo e o colapso das agendas sociais progressistas.

CC: Como uma crise que mina a economia e colapsa o sistema de saúde global pode ser lucrativa para este grupo?

BT: Pensadores desse tipo celebraram o fato de que a pandemia, segundo eles, desacelerou a globalização. Eles acreditam que as nações que se sairão melhor são aquelas que fortalecerem suas fronteiras, ilhas literais ou figurativas. Continuar com o sonho de um mundo sem fronteiras, no qual indivíduos e bens se movem sem obstáculos, um sonho progressista que os tradicionalistas consideram com desprezo, provoca a morte na era da Covid.

CC: Qual a interpretação que eles têm de movimentos como o feminismo, a comunidade LGBT, os direitos humanos, a diversidade social e a própria democracia?

BT: Todos os movimentos que você mencionou compartilham alguns recursos. Eles podem esforçar-se para desfazer a hierarquia social na sociedade, para assegurar que ser de um determinado gênero, orientação sexual, grupo cultural ou classe não limite suas oportunidades políticas ou econômicas. Um crítico diria que eles se esforçam tanto para igualar quanto para homogeneizar, e não segundo um princípio espiritual, mas segundo uma doutrina secular universal (como a noção de direitos humanos). Então, os tradicionalistas acreditam que esses valores que você citou reinarão durante a era das trevas, uma época em que fronteiras de todos os tipos se desintegram e nos unimos em uma massa homogênea em torno dos valores humanos antiespirituais os mais baixos possíveis.

CC: O que vamos viver não será mais uma disputa entre esquerda e direita, mas um conflito entre tradicionalistas e pluralistas?

BT: O que você tende a ouvir, em vez de observadores políticos, é que a linha que define a política vai se tornar globalismo versus nacionalismo: aqueles que querem aumentar a circulação de bens, dinheiro e seres humanos em todo o mundo, e aqueles que querem diminuí-la. Outros dizem que a nova linha divisória será materialismo versus imaterialismo, políticos cuja principal preocupação é a economia (sejam eles liberais de livre-mercado ou socialistas) versus aqueles que se preocupam mais com valores políticos culturais ou espirituais, quaisquer que sejam. E os tradicionalistas poderíam encontrar um papel para si próprios em qualquer uma das variantes, especialmente em sua combinação, em causas políticas que buscam fortalecer as fronteiras e a identidade nacionais com o objetivo de estimular um renascimento espiritual. Se o passado recente for precedente, essas figuras não serão a face mais pública desses movimentos nem tentariam rotular publicamente uma causa como "tradicionalista". Em vez disso, eles operariam por trás dos líderes como figuras e gurus, como Rasputin, empurrando a causa para frente com fervor incomum e indiferença pela destruição forjada no processo.

CC: O Twitter e o Facebook excluíram permanentemente a conta de Donald Trump. Como decisões como essa podem afetar esse movimento?

BT: As plataformas de mídia digital desempenham um papel estratégico importante nos movimentos de extrema-direita, e claro, e acho difícil subestimar até que ponto a exclusão de Donald Trump do Twitter vai atrapalhar suas operações políticas nesses grupos. Para os tradicionalistas envolvidos com a direita, a mídia social tem um significado mais profundo além de sua aplicação estratégica: ela oferece um meio de contornar o mundo da mídia profissional convencional (uma instrução modernista projetada para criar um público mais informado) que eles presumem que está destinado a ser perverso e enganoso. Consequentemente, a perda de sua capacidade de contornar a mídia convencional pode significar mais para eles do que um mero obstáculo prático. Isso pode significar um desafio metafísico mais profundo à sua causa.

CC: Por muito tempo o tradicionalismo foi considerado um grupo "menor". O Brasil deve temer o avanço desse pensamento?

BT: O tradicionalismo não foi projetado para ser, nem acho que jamais será, um movimento de massa. E muito excêntrico, muito bizarro, muito radical em sua oposição às coisas que a maioria de nós considera senso comum. Sua recente ascensão à proeminência política, da mesma forma, não foi graças a qualquer organização, mas ao sucesso estranhamente simultâneo de indivíduos isolados que desempenharam o papel de conselheiros ou ideólogos em vários movimentos políticos populistas em todo o mundo.

CC: É possível indicar a influência desse tradicionalismo no governo Bolsonaro?

BT: Sim. O próprio Bolsonaro exibe muitas dessas tendências. Mas as figuras dentro e ao redor de seu governo que os abraçam com mais fervor e com a consciência mais ideológica são Olavo de Carvalho e Ernesto Araújo.

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"O tradicionalismo não foi projetado para ser um movimento de massa. É muito excêntrico, bizarro"

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