Sobre a tal "neutralidade" brasileira e a questão das sanções "unilaterais"
Muitas pessoas ignoram que, bem antes da África do Sul ser objeto de sanções multilaterais, ela sofreu, durante vários anos, sanções unilaterais por parte de países que condenavam o nefando regime do Apartheid.
Essas sanções seriam menos legítimas por isso?
Claro que não! Tanto que foram depois estendidas a todos e o Brasil teve também de aplicar essas sanções ainda que a contragosto.
A neutralidade, sobretudo no caso de um país que VIOLOU grosseiramente a Carta das Nações Unidas, em diversos artigos, e que perpetra crimes de guerra, contra a paz e contra a humanidade diariamente, pode ser uma indignidade política, não sustentável em qualquer doutrina jurídica que se queira.
Recomendo a leitura do livro de Rui Barbosa, "Conceitos Modernos de Direito Internacional", original de 1916, no qual ele, referindo-se ao caso da Bélgica neutra invadida pelo Império alemão na Grande Guerra, dizia muito claramente que não se pode ser neutro entre a Justiça e o crime (livro de 1983, da Fundação Casa de Rui Barbosa).
A mesma postura teve Oswaldo Aranha, na Segunda Guerra, referindo-se explicitamente a Rui Barbosa, quando alinhou o Brasil às demais Nações Unidas em luta contra as potências fascistas que justamente invadiram outros países, contra o Direito Internacional.
Em 1939, o Brasil não reconheceu a usurpação violenta da Polônia por Hitler, assim como não reconheceu a invasão e incorporação dos três países bálticos à URSS em 1940.
A doutrina jurídica e diplomática brasileira é muito clara com respeito às normas mais elementares do Direito Internacional, e nem o Estado Novo de Vargas ousou contrária-la, por mais que tivesse simpatias fascistas em 1939-40.
Em 2014, o governo Dilma não se pronunciou em face da invasão ilegal da Crimeia pela Rússia, numa clara indiferença pela histórica posição do Brasil no campo do Direito Internacional.
A vergonha começou ali, foi continuada por Bolsonaro, e parece que está sendo retomada por Lula.
O Brasil não pode ser neutro em face das violações grosseiras da Carta da ONU pela Rússia, e teria de deixar isso muito claro.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 23/03/2023
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