Meus
comentários rápidos sobre este artigo:
Qualquer membro de uma entidade corporativa, SOBRETUDO trabalhando com recursos públicos, ou seja, de cada um de nós, que se dedique a criticar a instituição em que trabalha, deveria ser saudado, em lugar de vergonhosamente demitido, como ocorreu com esse pesquisador.
Todos sabemos, menos os dirigentes atuais da Embrapa ao que parece, que a ciência, a governança, as políticas públicas em geral, só progridem à custa da constante reavaliação dos seus objetivos, dos seus propósitos, do seu mandato. De contrário é a estagnação no burocratismo, na entropia, no foco centrado em seus próprios interesses (da corporação), em lugar de servir a ciência, a sociedade, quem nos paga.
Considero lamentável que alguém que se dedique a revisar os fundamentos da atividade da instituição para a qual trabalha seja varrido para baixo do tapete, pior, atirado pela janela, apenas porque disse coisas que não agradaram os círculos dirigentes.
Mais do que isso: trata-se de escabrosa censura, sanção imoral, e repressão indevida. A mesma coisa diríamos do ato de atirar contra o mensageiro: em lugar de ler a mensagem e refletir sobre o seu conteúdo, elimina-se o mensageiro, como se fatos deixassem de existir apenas porque são fatos.
A direção da Embrapa deveria responder a CADA UM dos argumentos de Zander Navarro, e provar que o dinheiro que recebe está sendo bem empregado, que ele reverte em resultados para a sociedade (quantas patentes, por exemplo?), quais os benefícios reais de suas atividades.
Lembro-me perfeitamente do início do governo aloprado dos lulopetistas, quando a Embrapa foi dominada por aqueles militantes ignaros que queriam fazer reforma agrária ao estilo cubano, ou mexicano, ou só investir em benefícios para a agricultura camponesa, e como ela foi usada -- está no artigo -- como elemento do populismo diplomático do grande meliante político, ao ser obrigada a se instalar em países africanos, a um custo enorme para a sociedade, quando outras formas de cooperaçãoo, mais eficientes e menos custosas, poderiam ter sido empregadas para determinados fins. Foi um período negro na Embrapa, dominada por fantasias ideológicas, em lugar de trabalho sério de pesquisa e desenvolvimento.
Aliás, o Brasil sempre foi o único país do mundo esquizofrênico a ponto de contar com dois ministérios da área rural, completamente opostos um ao outro: um supostamente do agronegócio, mas carente de recursos para campanhas absolutamente necessárias -- como a vacinação preventiva do gado contra epizootias, por exemplo --, e um outro, entregue aos militares do MST, via movimentos políticos alinhados com o PT, que usaram o MDA para seus objetivos nada econômicos, totalmente políticos (e até corruptos). O Brasil embarcou numa esquizofrenia completa, inclusive defendendo políticas contraditórias nas negociações comerciais multilaterais.
Chegou-se ao cúmulo de o diretor da FAO, eleito em função da demagogia diplomática lulopetista, oferecer um prêmio à Venezuela chavista pelo COMBATE À FOME.
Minha solidariedade ao Zander Navarro, com quem compartilho a mesma atitude desafiadora em face de instituições congeladas no burocratismo.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10 de janeiro de 2018
Por favor, Embrapa: acorde!
Concorrentes
correm à nossa frente e a estatal dorme embalada pelos sonhos do passado
*Zander
Navarro
O Estado
de S. Paulo, 05 Janeiro 2018
A
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), na maturidade dos seus
44 anos, tem sido corriqueiramente apresentada como um luminoso e excepcional
caso na apodrecida constelação do Estado. Seria uma das raras estrelas com
algum brilho – a “joia da Coroa”. Destoaria da generalizada inoperância dos
órgãos públicos. Seria eficiente e até supostamente organizada sobre rígidos
cânones fundados no mérito. Mais ainda, seria a principal responsável pelo
sucesso da agropecuária, setor que, felizmente, vem salvando a nossa economia
há anos.
Mas esse
é o senso comum. As afirmações são acompanhadas de rala comprovação e partem da
visão superficial de uma sociedade que se deleita com o divertimento de enganar
a si mesma. Um provável estratagema mental coletivo operado para escapar da
assombrosa realidade que nos cerca.
Existem
inúmeros resultados e fatos notáveis associados à organização no passado e, com
justiça, precisam ser sempre exaltados. Desafortunadamente, no entanto, a
realidade atual é bem diferente. A Embrapa custa US$ 1 bilhão anualmente aos
contribuintes e emprega 10 mil empregados em (pasmem) 47 unidades espalhadas
por quase todos os Estados. E vai criar mais uma em Alagoas. Mas seu verdadeiro
tamanho operacional é o de uma universidade federal de porte médio, como a do
Paraná ou a do Rio Grande do Sul, se comparados seus pesquisadores e os
professores, também pesquisadores, dessas instituições (em torno de 2,5 mil).
Com uma diferença crucial: as universidades também formam profissionais. Em
cada uma delas, são pouco mais de cem cursos. A Embrapa desenvolve pesquisa
agrícola, sem cursos nem alunos. E aqui começam os problemas. Não são recentes,
surgiram desde o final da década de 1990, sem reação eficaz de seus dirigentes.
Sendo o espaço limitado, esboçam-se a seguir os quatro maiores impasses
concretizados ao longo desse período.
Primeiramente,
à luz das espetaculares transformações de um setor que rapidamente emerge como
o principal produtor de alimentos do mundo, a Embrapa não se preocupou nem em
entender essas mudanças, para achar um lugar virtuoso para si, nem ajustou como
deveria a sua agenda de pesquisa às demandas crescentes da agropecuária.
Grandes empresas, normalmente multinacionais, ocuparam o seu lugar no
fornecimento de tecnologias, nas principais cadeias do agronegócio. Os 1,1 mil
projetos ora em desenvolvimento ilustram a absurda e disparatada fragmentação
do seu rol de pesquisas. Não existem focos de prioridade. É como se a empresa
se tivesse transformado numa universidade, embora sem oferecer cursos. E isso
acontece porque a Embrapa não tem, de fato, nenhuma estratégia própria.
Sua
missão institucional é uma vaga afirmação de inocentes noções. O mantra atual é
“entregar valor à sociedade”. O que isso significaria? É, na verdade, uma fuga
da realidade. Ante o desafio, seu presidente deveria esclarecer à sociedade a
inquietante pergunta: afinal, para que serve mesmo a Embrapa, uma das raras
estatais totalmente dependentes do Tesouro?
O
segundo dilema foi a substituição de, acreditem, dois terços dos pesquisadores,
por meio de concursos realizados em especial durante os anos petistas. Em troca
desse favorecimento, Lula envolveu a empresa na África, buscando votos para
tentar a vaga no Conselho de Segurança da ONU e, também, eleger o chefe da FAO.
Houve a citada substituição de pesquisadores e hoje a Embrapa é dominada por
uma nova geração, usualmente de extração urbana e escassos vínculos com a
produção agropecuária e as realidades rurais. Somados às centenas de cargos
comissionados, os custos correntes explodiram e, por isso, nos últimos anos a
proporção do orçamento destinada diretamente à pesquisa vem caindo para apenas
4% a 6% do total.
Os
outros impasses são de natureza moral. O terceiro é um fato estatístico gerador
de amplas implicações. A Embrapa, grosso modo, paga o dobro dos salários das
universidades federais e suas pesquisas cada vez mais se afastam das demandas
da produção. Seus pesquisadores, inexistindo uma estratégia institucional,
estão encurralados diante deste chocante dilema moral: como justificar seu bem
remunerado trabalho, desenvolvendo conhecimentos de escassa aplicabilidade
prática? Uma comprovação: a Embrapa praticamente não realiza pesquisas
econômicas, mas apenas com foco agronômico e tecnológico. Como justificar essa
bizarra orientação, quando a agropecuária é a mais decisiva atividade econômica
em nossos dias?
Finalmente,
o quarto impasse é também moral. E simples de ser enunciado. O desenvolvimento
da agropecuária está fomentando uma impressionante concentração da riqueza (o
que será reafirmado pelos dados do novo censo). Como justificar que uma
gigantesca e cara empresa pública, sustentada por toda a sociedade, trabalhe
cada vez mais e quase que exclusivamente para os ricos segmentos do
empresariado rural?
O ano
entrante é decisivo para a Embrapa. Seu atual presidente será provavelmente
substituído. Não poderia estatutariamente ser reconduzido. Haverá também a
substituição do atual titular do Ministério da Agricultura, onde está alocada a
empresa. E teremos eleições presidenciais. Qual será o futuro da Embrapa? É um
cenário imprevisível, para o qual a organização está despreparada. Seu
funcionamento interno é autoritário e não permite debater a situação e a
construção de cenários plausíveis. E existe enorme resistência da direção em
promover as mudanças urgentes e necessárias.
Nenhum
país do mundo com importância agrícola deixa de ter uma empresa de pesquisa
pública forte e “encharcada na realidade”. Nossos concorrentes estão correndo à
nossa frente. A Embrapa, no entanto, permanece adormecida em berço esplêndido,
embalada pelos sonhos do passado.
*Sociólogo
e pesquisador em ciências sociais - e-mail: z.navarro@uol.com.br