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quarta-feira, 2 de abril de 2025

Cúpula do BRICS será no Brasil - Luiz Alberto Machado e Paulo Galvão Jr. (Espaço Democrático)

 ARTIGO

A 17ª Cúpula do BRICS será no Brasil

Economistas Luiz Alberto Machado e Paulo Galvão Jr. analisam o cenário internacional antes da reunião do Rio de Janeiro

Luiz Alberto Machado e Paulo Galvão Jr, economista e colaborador do Espaço Democrático

1/04/2025

Embora a maior parte das atenções da mídia esteja voltada para os preparativos da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP30, prevista para ocorrer entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025, em Belém, no Pará, o Brasil sediará, antes disso, outro importante evento internacional. A 17ª Cúpula do BRICS será realizada nos dias 6 e 7 de julho de 2025, no Rio de Janeiro. O BRICS é um grupo econômico de países emergentes, inicialmente composto por Brasil, Rússia, Índia e China, e posteriormente, pela África do Sul. Nos últimos anos, o grupo expandiu-se para incluir novos membros, como Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Irã, e, mais recentemente, a Indonésia.

É preciso revelar que a Arábia Saudita foi convidada a juntar-se ao grupo econômico em 2023, mas ainda não oficializou sua entrada como o 11º país membro do BRICS. A Arábia Saudita é o líder da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e o príncipe herdeiro, Mohammad bin Salman, poderá ampliar os seus investimentos e comércio exterior com os dez países membros do BRICS.

Já a Argentina foi convidada a ingressar no grupo durante a gestão do ex-presidente Alberto Fernández, na 15ª Cúpula do BRICS, em Johanesburgo, na África do Sul, entre 22 a 24 de agosto de 2023, mas, o presidente argentino Javier Milei não aderiu ao grupo em 22 de dezembro de 2023, após uma carta explicando que não considerava oportuna a incorporarão do país como membro pleno a em 1 de janeiro de 2024.

A presidência rotativa do BRICS, em 2025, está a cargo do Brasil, que tem enfatizado a importância de promover a reforma das instituições de governança mundial (ONU, FMI e Banco Mundial) e fortalecer a cooperação entre os países do Sul Global. A cúpula ocorrerá em um momento de desafios geopolíticos, incluindo tensões com a guerra comercial iniciada pelo presidente americano Donald Trump.

Recentemente, o cessar-fogo entre a Ucrânia e a Rússia por 30 dias é um grande caminho para a paz duradoura na Europa Oriental, proposta liderada pelo presidente Trump ao líder ucraniano Volodymyr Zelensky e ao líder russo Vladimir Putin.

A 17ª Cúpula

Sob a liderança brasileira, o grupo planeja discutir, na 17ª Cúpula do BRICS, uma variedade de temas críticos, tais como: combate à fome e à pobreza; redução das desigualdades; promoção do desenvolvimento sustentável; enfrentamento as mudanças climáticas; avanço da inteligência artificial (IA); e mais empréstimos do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) para os países emergentes.

A expansão do BRICS também será um dos principais focos da cúpula. A inclusão da Indonésia, oficializada como membro pleno em janeiro de 2025, destaca o interesse crescente de nações emergentes no grupo econômico. No entanto, nem todas as adesões foram bem-sucedidas. Em outubro de 2024, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva vetou a entrada da Venezuela, justificando que o presidente Nicolás Maduro não apresentou resultados eleitorais presidenciais transparentes.

O BRICS almeja a criação de um sistema de pagamentos utilizando moedas dos países membros. Recentemente, o presidente Lula sinalizou que o grupo quer propor a tecnologia da criptomoeda para o comércio exterior entre os dez países membros, com o uso da blockchain, reduzindo a dependência do dólar americano. Mas, o presidente norte-americano Donald Trump já ameaçou aplicar tarifas protecionistas de 100% contra os países do BRICS se isto ocorrer.

Panorama econômico dos 10 membros

Na atualidade, o grupo BRICS representa 36% da superfície terrestre do planeta, 48% da população mundial, 28% do Produto Interno Bruto (PIB) nominal global, 26% do comércio internacional e 72% das reservas internacionais do mundo.

O BRICS tem se consolidado como uma força econômica global e a entrada de novos membros fortalece ainda mais sua influência mundial, sobretudo no Sul Global. É importante analisar alguns indicadores dos dez países integrantes na atualidade.

 

 

Esses dez países emergentes, juntos, têm PIB nominal de cerca de US$ 30 trilhões, população total de cerca de 4 bilhões de habitantes e reservas internacionais de cerca de US$ 7 trilhões, e, principalmente, buscam ampliar sua influência comercial.

Entre os BRICS+ existem nove países parceiros: Cuba, Uganda, Tailândia, Cazaquistão, Bolívia, Uzbequistão, Malásia, Bielorrússia e Nigéria. Recentemente, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan revelou publicamente grandes interesses da Turquia em ingressar no grupo, sendo um país estratégico geograficamente na Europa e na Ásia.

É preciso explicar que o BRICS Plus inclui os dez países membros do grupo BRICS, mais os nove países parceiros. Portanto, o BRICS, é formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, um grupo econômico de grande relevância no cenário global. Recentemente, o grupo expandiu-se para o BRICS Plus, que agora inclui 10 países membros — com a adição do Egito, EAU, Etiópia, Irã e Indonésia — e nove países parceiros estratégicos (Cuba e Bolívia, na América; Uganda e Nigéria, na África; Tailândia, Cazaquistão, Uzbequistão e Malásia, na Ásia; e Bielorrússia, da Europa). Essa ampliação pode ter impactos no comércio agropecuário mundial, criando novas oportunidades no BRICS+ para os exportadores brasileiros, por exemplo.

A possível entrada do México

O presidente Lula convidou o México, juntamente com o Uruguai e a Colômbia, para participarem da 17ª Cúpula. Embora esses países latino-americanos não sejam membros plenos do grupo, o presidente rotativo do BRICS destacou a importância de sua participação para ampliar o diálogo internacional.

A Cúpula do BRICS reunirá líderes de dez países membros e doze países parceiros para discutir temas relevantes ao desenvolvimento sustentável e à cooperação internacional. Além de países convidados, como o México. Hoje, gera um debate interessante sobre as vantagens e desvantagens para a possível entrada do México no BRICS, considerando o contexto econômico e geopolítico vigente.

Vantagens para o México no BRICS

A diversificação das relações econômicas, pois o México tem uma forte dependência dos Estados Unidos, devido ao Tratado México-EUA-Canadá (T-MEC). Participar do BRICS poderá ampliar suas relações comerciais com economias emergentes, reduzindo essa dependência.

O acesso a novos mercados e investimentos em plena Quarta Revolução Industrial. Com economias como China e Índia no grupo, o México poderá atrair investimentos em infraestrutura, tecnologia e energia, além de fortalecer suas exportações para novos mercados.

O maior papel geopolítico, porque o BRICS busca ser um contraponto à influência ocidental liderada pelos EUA e União Europeia (UE). O México poderá ter mais peso diplomático ao integrar um grupo econômico que defende um mundo multipolar.

E o fortalecimento do peso mexicano. A criação de mecanismos financeiros alternativos ao dólar americano poderá beneficiar a economia mexicana ao reduzir sua vulnerabilidade às flutuações da moeda americana.

Desvantagens para o México no BRICS

A possível tensão com os EUA, vizinho e maior parceiro comercial. O México poderá enfrentar pressões políticas e econômicas ao se aproximar demais do BRICS, especialmente da China e da Rússia, que têm relações tensas com Washington.

Os desafios internos de integração, pois o México já está inserido em diversas alianças regionais, como a Aliança do Pacífico, desde 2012. Uma entrada no BRICS poderá criar conflitos estratégicos e dividir suas prioridades diplomáticas.

As diferenças de modelo econômico vigente. O México tem uma economia mais alinhada com o livre mercado ocidental, enquanto países como China e Rússia têm modelos econômicos fortemente influenciados pelo Estado.

E a falta de um consenso interno. Não há um posicionamento claro dentro do governo da presidenta Claudia Sheinbaum, dos empresários mexicanos e da sociedade mexicana sobre entrar no BRICS. O país latino-americano poderá preferir manter relações com o grupo sem formalizar uma adesão.

O convite para participar da Cúpula do BRICS mostra que há um interesse em aproximar o México do grupo. No entanto, a decisão de ingressar oficialmente dependerá de uma análise cuidadosa dos impactos na relação com os EUA e do equilíbrio entre vantagens comerciais e riscos políticos.

Se o México conseguir manter boas relações com ambos, T-MEC e BRICS, poderá se beneficiar economicamente sem prejudicar sua posição estratégica. Por outro lado, um alinhamento mais forte com o BRICS poderá gerar reações adversas de Washington, o que poderá afetar sua economia altamente integrada com os EUA, mas já sofrendo com as tarifas protecionistas de 25% dos produtos oriundos do México.

Desafios e oportunidades

A 17ª Cúpula do BRICS representa, portanto, uma oportunidade para os países membros reforçarem sua cooperação e influenciarem a agenda global. A expansão do grupo econômico e a inclusão de novos membros, como EAU e Indonésia, por exemplos, demonstram a relevância crescente do BRICS no cenário internacional.

Finalizando, desafios persistem, como a necessidade de equilibrar interesses divergentes e responder a pressões externas, especialmente de potências como China e Índia. Portanto, o sucesso da cúpula dependerá da capacidade dos líderes em promover um diálogo construtivo e implementar ações concretas que beneficiem não apenas os países membros e países parceiros, mas também do Sul Global.

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Henry Kissinger, pensador a ator das relações internacionais - Luiz Alberto Machado (Espaço Democrático)

 { ARTIGO }

Henry Kissinger, pensador a ator das relações internacionais

Luiz Alberto Machado escreve que o secretário de Estado de dois presidentes americanos nos deixa legado de ensinamentos de relações internacionais, segurança e diplomacia

Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático

Edição Scriptum


Fazendo uma rápida retrospectiva de minha trajetória profissional, constatei que estive quase integralmente vinculado à vida acadêmica em universidades ou a instituições de produção de ideias, pensamentos ou políticas públicas, os chamados think tanks.

No que se refere à vida universitária, embora tenha ministrado aulas no Mackenzie (onde me formei) e nas Faculdades São Judas Tadeu, minha relação maior e mais longa foi com a Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), onde permaneci por mais de 35 anos. Das inúmeras lembranças que guardo da FAAP, algumas merecem destaque especial: o envolvimento com a criatividade e a economia criativa, e, na Faculdade de Economia, a criação do curso de Relações Internacionais, as missões estudantis e o Fórum FAAP, simulações de reuniões das agências multilaterais organizadas por alunos da Fundação para estudantes de ensino médio em São Paulo e em Ribeirão Preto.

Já no que tange aos think tanks, iniciei no Convívio – Sociedade Brasileira de Cultura, passando depois pelo Instituto Liberal, pelo Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, definido por seu fundador, Norman Gall, não apenas como um think tank, mas como um think and do tank, antes de chegar ao Espaço Democrático.

Essas rememorações foram provocadas pela notícia do falecimento de Henry Kissinger, aos 100 anos de idade, no dia 29 de novembro último.

E por que me recordei dessas passagens?

Primeiro porque ao me interessar cada vez mais pela área de relações internacionais em função do curso da FAAPacabei tomando conhecimento da importância de Kissinger, inicialmente como ator e protagonista do mundo real (realpolitik), como secretário de Estado da nação mais poderosa do mundo. Nessa condição de ator e, por vezes, protagonista, Kissinger passou por diferentes momentos e, embora tenha recebido o Prêmio Nobel da Paz em 1973, juntamente com o vietnamita Le Duc Tho, está longe de ser considerado uma unanimidade, colecionando, ao longo do tempo, tanto admiradores como severos críticos.

Nascido na Alemanha e ocupando as funções de assessor de segurança nacional e secretário de Estado de dois presidentes norte-americanos, Richard Nixon e Gerald Ford (1969-1977), Kissinger esteve diretamente envolvido em alguns dos mais marcantes episódios da segunda metade do século 20, entre os quais a Guerra do Vietnã, a Guerra Fria, a reaproximação diplomática dos Estados Unidos e da China, a Guerra do Yom Kippur e o apoio às ditaduras latino-americanas, com destaque para as do Chile, da Argentina e do Brasil.

Não foi por outra razão que a concessão do Prêmio Nobel da Paz a ele foi amplamente contestada, a ponto de um editorial do jornal The New York Times ter classificado o caso como “Prêmio Nobel da Guerra”.

A relevância de Kissinger, no entanto, está longe de ter se esgotado com sua saída da secretaria de Estado, estendendo-se por muito tempo tanto no plano real, na condição de consultor que oferecia aconselhamento à elite empresarial mundial e atuando em conselhos de empresas em vários fóruns de política externa e segurança, quanto no plano intelectual, graças à influência de seus livros. Essa influência, aliás, começou antes mesmo de ele se tornar o diplomata mais importante de sua geração, uma vez que o livro baseado em sua tese de doutorado, O mundo restaurado, publicado em 1957, em que ele analisa como Metternich, primeiro-ministro da Áustria-Hungria durante o Congresso de Viena de 1815, procurou restabelecer a ordem política anterior à revolução Francesa e às guerras napoleônicas, teve enorme aceitação em Washington. Posteriormente, seus livros Diplomacia (Saraiva Universitária, 2012) e Liderança: seis estudos sobre estratégia (Objetiva, 2023) transformaram-se em leituras recomendadas a qualquer pessoa interessada em relações internacionais e diplomacia. O mesmo vale para a biografia sobre ele assinada por Walter Issacson (2005).

Kissinger, que era fascinado pelo Brasil, esteve no País por diversas vezes. Numa delas, ministrou palestra na FAAP para alunos, professores e convidados especiais. Admirador também de futebol, contribuiu para a ida de Pelé para o Cosmos de Nova York, numa das inúmeras tentativas de popularização da modalidade nos Estados Unidos.

Por todas essas razões. Henry Kissinger é um autêntico exemplo de alguém que se notabilizou tanto como pensador como ator. Ainda em plena atividade aos 100 anos, nos deixa legando muitos ensinamentos aos estudiosos de relações internacionais, segurança e diplomacia.

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.