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segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Investimentos no Brasil: progressos e atrasos - Suely Caldas


Os investimentos de Dona Dilma

Suely Caldas
O Estado de S.Paulo, domingo, setembro 23, 2012

Decisão e disposição para tocar em frente o investimento em infraestrutura são indispensáveis. Mas encontrar caminhos para fazer acontecer é passo fundamental. Sem isso, não há como avançar. Depois de quase dois anos sem um programa econômico nem definição de rumos para atrair o investidor privado, finalmente o governo Dilma Rousseff despertou. E como quem desperta de um longo sono e descobre ter perdido muito tempo, Dilma deu um salto brusco da cama e bradou que quer e vai fazer. E rápido. Mas demora em encontrar o caminho certo.
Insegurança, indefinições, avanços e recuos e uma perniciosa teimosia em misturar investimento com ideologia têm marcado as últimas tentativas do governo em atrair o capital privado para investir em portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, energia e combustíveis. O grande ausente desta corrida é o sempre esquecido setor de saneamento básico - construção de redes de esgoto e água adequadas -, justamente no que o País tem enorme carência, que gera atraso social e saúde precária da população local.
Ao constatar que não há dinheiro público para tocar os investimentos de que o País precisa, Dilma passou a atuar no campo da regulação. Ou seja, arquiteta modelos de contratos de concessão de serviços ao capital privado em que cabe ao governo definir regras de operação (inclusive em defesa do interesse público), monitorar a execução e fiscalizar seu cumprimento. Como fez o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que criou as agências reguladoras justamente com essa atribuição. Em sua gestão, o ex-presidente Lula simplesmente ignorou a infraestrutura, mas Dilma retomou o caminho seguido por FHC.
Criou a estatal Empresa de Planejamento e Logística (EPL) e com ela tirou dos ministérios setoriais (em destaque o dos Transportes) a atribuição de planejar e tocar projetos de investimento. Como fez FHC, ao criar as agências reguladoras, que Dilma tratou de enfraquecer quando era ministra de Minas e Energia, para recuperar controle e poder. No momento, a EPL trabalha na concepção de modelos para portos e aeroportos, mas não interferiu nos casos da renovação das concessões do setor elétrico e na exploração do petróleo do pré-sal, esta definida antes da criação da estatal.
Entre os setores que a presidente tenta fazer prosperar, o mais adiantado e também mais confuso é o de aeroportos. Com uma particularidade: há urgência em dar uma solução à expansão do Galeão (Rio de Janeiro) e de Confins (Belo Horizonte), que terão movimentação multiplicada em 2014 com a Copa do Mundo. Mas como andam os investimentos de Dona Dilma, caro leitor? Vamos por partes.

Aeroportos. O governo licitou a concessão dos Aeroportos de Guarulhos, Viracopos (São Paulo) e de Brasília (Distrito Federal). Mas a presidente não gostou do resultado, por duas razões: 1) as operadoras que venceram a licitação são inexperientes e podem se revelar incapacitadas para controlar o trânsito de mais de 5 milhões de passageiros/ano; e 2) o desenho da concessão colocou a estatal Infraero como minoritária, com 49% das ações, e sem poder de controle na gestão dos três aeroportos.
Disposta a corrigir o que enxergou como erros, Dilma recuou do primeiro modelo e despachou para a Europa um grupo de altos funcionários para sondar o interesse de grandes operadoras europeias por uma nova fórmula em que elas atuariam em parceria com a Infraero, mas em posição minoritária e com a estatal no comando da gestão. Ouviram um sonoro não.
Quando o ideológico predomina sobre a racionalidade do negócio, o caminho costuma ser o fiasco. Além disso, é ingenuidade imaginar que operadoras experientes aceitassem entrar apenas com dinheiro e conhecimento técnico e submeter-se ao comando de uma estatal, com todos os defeitos de ingerência política que dão fama às estatais no Brasil.
Diante do fracasso, a equipe de Dilma arquiteta agora um novo desenho: as empreiteiras ficam fora do consórcio, a Infraero entra com 49% das ações e as operadoras estrangeiras assumem a posição majoritária das ações e a responsabilidade da gestão dos dois aeroportos (Galeão e Confins). Além disso, um importante e bem-vindo acréscimo: haverá uma ação do tipo golden share, que dá ao Estado poder de veto em certas decisões estratégicas. O governo FHC recorreu à golden share nas privatizações da Vale e da Embraer, e até hoje não foi necessário a ela recorrer. Em aeroportos, uma golden share tem a vantagem de prevenir situações de risco à segurança do País.
Não há, ainda, uma decisão final para o Galeão e Confins, mas espera-se que o pragmatismo de Dilma prevaleça sobre sua teimosia ideológica.

Exploração do petróleo. Se a 11.ª rodada de licitação de novas áreas de petróleo ocorrer em maio de 2013, como assegurou o governo na terça-feira, o Brasil terá completado quatro anos e cinco meses vivendo a absurda situação de renunciar (sem motivo aceitável) a explorar um produto com alto potencial de gerar empregos, renda, progresso, divisas, crescimento econômico e poder de engordar o Produto Interno Bruto (PIB).
É inexplicável os governos Lula e Dilma terem passado tanto tempo sentados em cima de tamanha riqueza sem explorá-la. A desculpa de o Congresso Nacional não ter aprovado a lei da divisão dos royalties do petróleo do pré-sal, além de não valer para as áreas que serão listadas na 11.ª rodada, é fora de propósito. Na verdade, o governo desistiu de pressionar o Congresso para apressar a aprovação dessa lei, como fez com tantas outras e mostrou que, quando quer, é capaz de domar o Poder Legislativo. Vejamos agora se, no caso do petróleo, realmente acontece o brusco despertar de um longo e profundo sono.

Energia. Foi bem-vinda a decisão de reduzir a tarifa da energia elétrica, mas o governo o fez de forma tão autoritária, sem dialogar com as empresas, que vai conseguir é atrasar o processo, além de provocar demissões de funcionários, como já foi anunciado por Furnas e que será seguido pelas demais empresas do grupo Eletrobrás (Eletronorte e Chesf).

Portos. O governo trabalha em alternativas para atrair o investidor privado e expandir a capacidade portuária. A que leva menor chance pode ser a melhor: privatizar as empresas Docas, que administram os portos do País.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Antidiplomacia: uma nova forma de diplomacia?

A antidiplomacia de Dilma

Editorial O Estado de S.Paulo, 24 de julho de 2012

A diplomacia brasileira deve ser conduzida pelo presidente da República, conforme manda a Constituição. No entanto, isso não significa que essa liderança possa ser exercida de modo arbitrário, como deu a entender o comportamento de Dilma Rousseff no recente caso do Paraguai e em outros episódios de seu ano e meio de mandato.
É fato que, desde que chegou ao poder, o PT fez da partidarização sistemática da política externa sua marca. Os oito anos do governo de Lula foram ricos em exemplos da transformação da diplomacia em exercício ideológico. Houve casos dignos de figurar em manuais de relações internacionais, mas pelo seu aspecto negativo. Para lembrar apenas um deles, o Brasil apequenou-se ante a ocupação, por tropas bolivianas, de duas refinarias da Petrobrás naquele país, em maio de 2006. Como resposta ao óbvio vilipêndio do patrimônio brasileiro, Lula, em vez de defender a Petrobrás, disse que o ato boliviano era "soberano" e que a Bolívia precisava de "carinho".
Com a chegada de Dilma ao Planalto, houve a expectativa de que esse perfil danoso ao País fosse alterado. O otimismo foi alimentado, para começar, pelo discurso público da presidente na direção da defesa dos direitos humanos no Irã - cujo presidente, além de negar a ocorrência do Holocausto e dirigir um regime que persegue minorias e opositores, era aclamado por Lula como seu "companheiro". Parecia que Dilma abandonaria enfim o antiamericanismo pueril do lulopetismo ao alinhar-se aos países civilizados na condenação da violência iraniana. Agora, no entanto, acumulam-se demonstrações de que aquele gesto era na verdade o primeiro de uma série de movimentos voluntaristas de Dilma, interessada sobretudo em imprimir sua marca pessoal na diplomacia.
Quando teve a chance de mostrar sua força como estadista, na conferência do clima Rio+20, em junho, Dilma impacientou-se com seus diplomatas e preferiu festejar um documento final articulado, às pressas, para não ter peso decisório nenhum, de modo que pudesse ser aceito por todos e dar a impressão de uma grande competência diplomática.
Depois, quando chamada a apagar o incêndio causado pela destituição do então presidente Fernando Lugo no Paraguai, também em junho, jogou mais gasolina no fogo, ao aceitar a tese de que houve um golpe e que, portanto, o Paraguai tinha de ser duramente punido.
Mais tarde, patrocinou pessoalmente a lamentável manobra para incluir a Venezuela no Mercosul, aproveitando a oportunidade do "gancho" a que foi submetido o Paraguai, que resistia ao ingresso do país de Hugo Chávez no já desacreditado bloco sul-americano.
Na essência, o excessivo personalismo de Dilma na política externa não difere da contaminação político-ideológica observada nos oito anos de Lula. Em ambos os casos, as decisões foram tomadas não exatamente segundo o interesse nacional, conforme manda a Constituição, mas de acordo com projetos de afirmação e manutenção de poder. No governo de Lula, esse desvio se deu na aproximação imprudente com autocratas como Chávez, comprometendo a independência do Brasil na definição de seus interesses externos. Em nome da exigência de buscar a "formação de uma comunidade latino-americana de nações", conforme determinação constitucional, Lula colocou o País a serviço do delirante projeto bolivariano.
Com Dilma, a ideologia lulopetista segue em primeiro plano nas relações internacionais, mas a "gerentona", como ela gosta de ser vista, acrescentou um componente ainda mais explosivo, que são suas idiossincrasias. A presidente não se entende com seu chanceler, Antonio Patriota. Ela quer uma "diplomacia de resultados" e nutre franca hostilidade a fazer concessões e aos rapapés das mesas de negociação, o que contraria um dos princípios basilares da diplomacia. Nessa toada, com mais dois anos e meio na cadeira de presidente, ainda há tempo de sobra para que Dilma dê novos trancos pessoais na diplomacia nacional, que sempre se pautou pelo comedimento, comprometendo ainda mais a influência do Brasil no concerto internacional.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Mudar o mix da politica econômica - Affonso Celso Pastore


'O Governo deveria mudar o mix da política econômica'

LEANDRO MODÉ, RAQUEL LANDIM



O Estado de S.Paulo, 

23 de julho de 2012


Para ex-presidente do BC, nova política fiscal ajudaria a destravar o crescimento

O economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central (BC), prepara uma revisão da estimativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. O novo número, que sairá do forno nos próximos dias, ficará perto de 1,5% - metade da nova projeção do governo, divulgada sexta-feira. "Pelos indicadores de consumo, de investimentos, de produção industrial, acho extremamente difícil crescer 2,0%", afirma, nesta entrevista exclusiva ao Estado.
Pastore é um economista da linha ortodoxa, mas, diferentemente da maioria de seus pares, adota um tom desapaixonado para criticar o governo - cuja área econômica é mais afinada com a chamada heterodoxia. Assim como muitos de seus colegas, o ex-presidente do BC vê uma mudança nos pilares macroeconômicos (câmbio flutuante, sistema de meta de inflação e superávit primário) na gestão Dilma Rousseff. Mas pondera: "Dependendo da conjuntura, pode haver desvios (no tripé). Não são desvios que se possa dizer que são permanentes".
Em outro exemplo de avaliação serena, Pastore diz que a política fiscal pode, sim, ser usada para ajudar no crescimento econômico. "Existe uma segunda dimensão da política fiscal que é fazer políticas contracíclicas. Quando a economia desacelera, o País faz superávits menores." Não se trata, portanto, de gastança deliberada.
"Cuida das crianças, faz o Bolsa-Família, investe em educação, mas para de reajustar o salário mínimo de forma violenta. Dá muito voto para o governo, mas só aumenta consumo e reduz a poupança. O Brasil precisa da poupança doméstica para poder crescer", argumenta.
O sr. pretende revisar a previsão para o crescimento do PIB em 2012?
O segundo trimestre não vai ser tão ruim quanto o primeiro, mas também não é estimulante. Se o PIB avançar 0,5% no segundo trimestre, seria preciso crescer 1,7% no terceiro e no quarto para chegar a 2,0% no ano. Pelos indicadores de consumo, de investimentos, de produção industrial, acho extremamente difícil. Dessa forma, a probabilidade de o crescimento ficar abaixo de 2,0% em 2012 é muito alta. É uma questão de disputar qual é o número que vamos nos fixar, mas diria que está mais perto de 1,5%.
O crescimento do PIB é baixo, mas o consumo vai bem e o mercado de trabalho vive pleno emprego. Por quê?
É um enigma. O que explica é que a indústria está espremida entre dois braços. Um é a competitividade externa, pois a indústria não consegue repassar a alta de custos para os preços. O outro é o aumento do custo de mão de obra. Se o governo injetar demanda na economia, seguindo a mesma reação da crise de 2008, crescerá a necessidade de mão de obra, aumentará o salário real e subirá o custo da indústria, que não vai conseguir repassar preço. Isso estreita a margem de lucro e reduz a produção. O País fica numa situação curiosa que é a economia em pleno emprego com indústria estagnada.
O sr. está confortável com a inflação? Como vê o impacto da alta dos preços dos alimentos?
Há hoje uma subida nos preços das commodities que atrapalha. Por isso, a inflação, em um ano, deve subir. Se os preços dos produtos agrícolas subirem 10%, o IPCA daqui a um ano estará 0,8 ponto porcentual mais alto do que hoje. Não é um efeito devastador, mas é algo adicional para a inflação.
O BC cortou demais os juros? Será preciso subir as taxas em breve?
Se a crise externa produz um contágio no mercado interno, você tem obviamente de trazer as taxas de juros para baixo. Mas se a desaceleração da atividade também é consequência do fato de que estamos em pleno emprego e a indústria está desacelerando porque os salários subiram, a queda da taxa de juros sozinha não é propriamente o remédio. O remédio é aumentar a competitividade da indústria. O governo deveria mudar o mix de política econômica e usar mais política fiscal.
De que maneira?
Quero ser muito preciso sobre qual tipo de política fiscal. Não podemos abdicar de utilizar a política fiscal para reduzir o tamanho da dívida. Mas existe uma segunda dimensão da política fiscal que é fazer políticas contracíclicas. Quando a economia desacelera, o País faz superávits menores. Mas isso implicaria que o governo, em vez de utilizar uma regra fixa para o superávit primário, fizesse o chamado superávit estrutural. Quando a economia está abaixo da média, reduz o superávit primário com o compromisso de elevá-lo quando houver uma fase de prosperidade.
É possível que o governo baixe o superávit este ano por causa da crise?
O governo pode fazer o que quiser, mas não pode perder de vista o fato de que precisa continuar reduzindo a relação dívida/PIB. Acho até que o governo vai baixar o superávit primário. Mas, de antemão, deveria assumir o compromisso de um regime fiscal que garantisse que voltará a subir.
O sr. propõe uma nova política fiscal?
Completamente diferente da atual. Preserva o que temos, cuida das crianças, faz o Bolsa-Família, investe em educação, mas para de reajustar o salário mínimo de forma violenta. Dá muito voto para o governo, mas só aumenta consumo e reduz a poupança. O Brasil precisa da poupança doméstica para poder crescer.
Nessa nova política fiscal, quem seriam os perdedores?
O governo tem de fazer uma opção política. Se quiser mais voto, tem de continuar transferindo renda. Se quiser mais crescimento econômico e um país mais sólido, vai perder voto. Por isso, a vontade do governo de alterar a política fiscal nessa direção é muito baixa. Acho difícil mudar.
Como avalia a desvalorização do real para ajudar a indústria?
A indústria perdeu competitividade e não consegue repassar aumento de custos para os preços. Isso não ocorre por falta de demanda. Por isso, se você der uma possibilidade de repasse pela desvalorização do câmbio, ela (indústria) subirá o preço para aumentar a margem. Significa que o repasse da alta do dólar para a inflação (tecnicamente chamado de pass-through) não pode ser pequeno.
Esse cenário obrigará o BC a voltar a elevar o juro?
Se for para trazer a inflação para 4,5% em 2013, o BC terá de elevar o juro em algum ponto do ano que vem.
Alguns analistas têm argumentado que o tripé de política macroeconômica - câmbio flutuante, meta de inflação e superávit primário - acabou, principalmente por causa das ações do governo no câmbio e nos juros. O sr. concorda?
A curva de reação mostra que, hoje, o BC dá um peso maior ao crescimento do que dava no passado. Quanto ao câmbio, algo existe dentro do governo que diz que eles preferem um câmbio acima de R$ 2,00. E algo existe no BC que me diz que ele prefere a taxa de câmbio abaixo de R$ 2,10 por causa do risco inflacionário. Caracterizar isso como um regime de bandas de flutuação está mais próximo da realidade do que pensar que é um câmbio flutuante. É possível viver com um câmbio flutuante, com câmbio numa banda, etc. É possível viver com um juro que momentaneamente responda mais à atividade econômica. Mas, a longo prazo, é preciso que o juro responda mais à taxa de inflação e o câmbio flutue mais. Dependendo da conjuntura, pode haver desvios. Não são desvios que se possa dizer que são permanentes.
Estaria o governo tentando fazer ajustes na política macroeconômica para evitar ações mais estruturais?
Quando há um estoque de automóvel grande, o governo baixa o IPI. O mesmo vale para a linha branca. Isso mostra preocupação com setores. Não digo que o governo esteja errado. Em 2008, o presidente (Barack) Obama salvou a indústria automotiva. Mas não se pode fazer só isso. Se fizer isso e todo o resto, está bem. O importante é fazer também o resto, não apenas isso.
O que é o resto?
É um conjunto de coisas. Entre elas, redução de impostos sobre bens de capital, desoneração ampla da folha de salários, redução da taxação sobre energia elétrica, transformação do PIS/Cofins em impostos sobre o valor adicionado. Também há mudanças do lado dos gastos, a questão da falta de investimentos em infraestrutura. Não vejo o governo fazendo isso.
Se há um problema estrutural que explica o baixo crescimento da economia brasileira em 2011 e 2012, por que as projeções para 2013 apontam uma expansão entre 4,0% e 4,5%?
Os 4,0% do ano que vem decorrem do carry-over (efeito estatístico) deste ano, que é estimado em cerca de 2%. Em outras palavras, não precisamos crescer muito no ano que vem para, na comparação da média de 2013 com a média de 2012, chegarmos aos 4%. O segundo ponto nessa questão está relacionado ao PIB potencial. O PIB potencial é aquele que mostra o que pode crescer a mão de obra, a taxa de investimento e a produtividade. Ao analisar tudo isso, concluímos que o Brasil não consegue crescer hoje 4% ao ano. É claro que não se pode dizer que esse número é uma constante da natureza que não vai variar nunca mais. Mas, nas condições de hoje, nosso crescimento potencial é de menos de 4,0% ao ano.
Qual seu cenário para a crise global?
A perspectiva para o mundo é de crescimento baixo por alguns anos. Os EUA não vão sair já da crise. Mas, em compensação, na hora em que pegarem o "momento de crescimento", vão ter um ciclo melhor que o do resto do mundo. A Europa tem problemas muito mais sérios. Ao optar por manter o euro, algo em que acredito, a Europa terá de caminhar para uma coisa que se chama união fiscal. O grande drama disso é a perda de parte da soberania pelos Estados nacionais. No plano político, não é fácil. Esse processo será longo. A Europa vai conviver com essa letargia por um período muito extenso.
E a China?
Está desacelerando. Europa e Estados Unidos, juntos, têm quase 50% do PIB mundial. A China tem um modelo exportador que vende justamente para EUA e Europa. Portanto, a China desacelera junto, o que já está ocorrendo. Isso afeta o mundo e o Brasil.

sábado, 5 de maio de 2012

El Brasil de Dilma Rousseff - Revista CIDOB d’Afers internacionals

Revista CIDOB d’Afers internacionals – El Brasil de Dilma Rousseff: Balance del primer año de Gobierno

Tras diez años de Gobierno de Lula da Silva, Dilma Rousseff asumió en 2011 la Presidencia de Brasil como heredera del carismático líder del PT. La nueva jefa de Estado adquirió los retos de mantener los logros hacia un desarrollo más inclusivo, profundizar las transformaciones económicas y asumir las responsabilidades del creciente liderazgo brasileño en un contexto de crisis económica internacional. Este número monográfico hace un balance del primer año de Gobierno en cuatro dimensiones: en primer lugar, se abordan los desafíos económicos y sociales internos para la gobernabilidad de Brasil, especialmente las perspectivas de crecimiento y la lucha contra la pobreza; en segundo lugar, se analiza el liderazgo en la cooperación regional y las relaciones hemisféricas; seguidamente, en tercer lugar, se trata la ampliación de la proyección de Brasil en el ámbito global y, finalmente, en último lugar, cómo todo ello se proyecta en la relación con la Unión Europea y España.
Número especial aqui.
Desafíos para la gobernabilidad de Brasil
El contexto de la cooperación regional y las relaciones hemisféricas
La proyección global de Brasil
 Las relaciones de Brasil con la Unión Europea y con España: hasta dónde llega la relación estratégica
 Otros artículos

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Politicas industrial e comercial do governo - observacoes PRA


Políticas industrial e comercial do governo Dilma: observações pontuais

Paulo Roberto de Almeida
Diplomata, professor.
Respostas a questões colocadas por jornalista da imprensa brasileira.

1) O governo tem eleito setores na hora de oferecer reduções de impostos e mudanças de cobrança de encargos trabalhistas. É essa uma prática eficiente para fortalecer a produção industrial?

 PRA: A produção industrial, em sua acepção própria, envolve o conjunto do setor chamado usualmente de secundário, ou seja, transformação manufatureira de matérias-primas, insumos e produtos intermediários diversos com vistas à oferta de bens finais, duráveis, não-duráveis e semiduráveis, para os mercados consumidores, internos e externos. O que o governo vem fazendo, de forma absolutamente improvisada e aleatória – ou seja, atuando apenas quando pressionado por determinados setores que podem estar sentido mais intensamente o peso da concorrência externa – é oferecer algumas facilidades de forma tópica, elegendo setores que se mobilizaram para pedir medidas do governo.
Não se trata, portanto – e isso precisa ficar bem claro –, de uma política, e sim de respostas a demandas específicas por parte de alguns setores. O governo apresenta seu conjunto de medidas como constituindo uma política, mas é evidente que seu caráter discriminatório não permite qualificá-lo dessa maneira, apenas e tão somente como um “pacote de ajuda”, restrita, localizada, pontual e, provavelmente, equivocada e insatisfatória.
O que fortalece a posição industrial de um país? Em primeiro lugar, a existência de um ambiente de negócios estável, previsível, aberto aos investimentos industriais, apresentando externalidades positivas – infraestrutura, mão-de-obra educada e treinada, mercados solventes – e sobretudo podendo trabalhar com custos compatíveis com os existentes na concorrência, que atualmente tem dimensão mundial. Ora, é evidente que esses requisitos e pré-condições não existem no Brasil, qualquer que seja o critério sob o qual examinemos esse ambiente, sobretudo aqueles fatores institucionais, macro e microeconômicos que viabilizam ou não uma atividade industrial competitiva: crédito acessível, estímulos à inovação, pressões competitivas que induzem à melhoria dos processos produtivos e dos produtos deles resultantes. Basta consultar qualquer um dos relatórios correntes que tratam dessas questões: o Doing Business, do Banco Mundial, por exemplo, ou o World Competitiveness Report, do Fórum Econômico Mundial. Existem diversos outros, mas esses dois já possuem ampla gama de informações sobre o ambiente em que trabalham as indústrias localizadas no Brasil (nacionais e estrangeiras).
E o que se observa, consultando esse tipo de material? De modo geral, a posição do Brasil não é muito gratificante na escala de países, situando-se, em geral, no último terço da lista. Mas, a realidade é ainda mais dramática, do ponto de vista das políticas, justamente. Se fracionarmos os critérios e as classificações setoriais desses relatórios e pesquisas em dois grupos distintos, de um lado, os que de tipo “macro”, ou seja, que têm a ver com o quadro geral dos negócios no Brasil, sob responsabilidade do governo, portanto, e, de outro lado, os elementos “micro”, que têm a ver com a própria ação das empresas, como responsabilidade privada, o quadro que emerge é estarrecedor. Todos os critérios atinentes ao governo – infraestrutura, impostos, comércio exterior, burocracia em geral – empurram o Brasil para as últimas posições desses rankings, ao passo que se isolamos os critérios pertencentes ao universo das próprias empresas, a classificação apresenta sensível melhora. É evidente que o papel do governo é retardatário e constitui mais um obstáculo do que propriamente um elemento positivo na atividade industrial.
Agora, se além de não cumprir com seus deveres de oferecer um ambiente positivo para a ação do setor privado, o governo ainda fica poluindo o ambiente, ao criar regras específicas, especiais, exclusivas, para certos grupos ou setores, sem estender os mesmos favores e privilégios aos demais, é evidente que o governo está praticando, em primeiro lugar, uma discriminação odiosa, no limite inconstitucional, mas de toda forma imoral e vergonhosa. Em segundo lugar, o que ele está fazendo é poluir todo o ambiente de negócios no Brasil com regras ad hoc, de expedientes casuais e casuísticos, fazendo uma mixórdia naquilo que se chama habitualmente de “regras do jogo”, que se convertem assim, em regrinhas pessoais para um jogo específico determinado não pelos próprios empresários e responsáveis pelas indústrias, individualmente, mas por um pequeno grupo de burocratas que ser arvora o direito – a arrogância seria um termo mais apropriado – de saber mais sobre o mundo da produção do que os próprios responsáveis.
Em terceiro lugar, o governo está dizendo ao conjunto da classe empresarial do Brasil que ela só pode existir, competir e sobreviver por meio de seus favores específicos, não através de um conjunto de regras claras, impessoais, não discriminatórias, estáveis e tudo o mais. Isso já não é mais capitalismo, e sim fascismo econômico: o governo está transformando o empresariado industrial em servos do poder, em títeres que só existem e atuam por meio dos fios e scripts manipulados por um bando de burocratas. Não sei se os líderes empresariais já se deram conta, mas eles deixaram de viver num país capitalista, aberto e competitivo, para viver num ambiente de fascismo econômico, dirigista, dependente, intervencionista, numa palavra, se vive em stalinismo industrial.

2) A pedido dos próprios empresários, o governo adotou barreiras contra produtos importados nos mais diversos setores. Alguns dizem que o Brasil está ficando protecionista e temem a volta da reserva de mercado que tanto mal fez ao desenvolvimento do país no passado. Os setores beneficiados, porém, dizem que há uma guerra comercial em curso: com excesso de produção nos países de origem e favorecidos pelo real valorizado e pela guerra dos portos, não apenas estrangeiras, não instaladas no país, mas até subsidiárias de multinacionais com fábricas aqui estão colocando produtos a preços abaixo do razoável para desovar a produção no Brasil e preservar os empregos em seus países de origem. Como o senhor vê essa questão?

Existem vários equívocos nesse tipo de argumentação, obviamente capciosa, e construída exatamente para justificar as medidas protecionistas sempre reclamadas por certos empresários, mas que não deveriam existir se as condições existente no ambiente de negócios do Brasil, justamente, fossem favoráveis. Não existe nenhuma “guerra comercial” em curso, apenas reflexos de deficiências “made in Brazil”, que impedem a produção industrial feita aqui de ser competitiva interna e externamente. Nenhum dos problemas que afetam a indústria brasileira tem origem externa; ao contrário, todos eles derivam de erros macroeconômicos – como a enorme dívida pública, por exemplo, que leva a juros altíssimos, e daí à atração de capitais que gera valorização cambial – e de insuficiências do ambiente microeconômico no Brasil: tributação extorsiva, péssima infraestrutura, burocracia lentíssima em todo o espectro de negócios, custos altos de transação tanto pela cartelização de fato em vários setores (comunicações é um deles) quanto pela morosidade da justiça.
A própria mal chamada “guerra dos portos” é um exemplo claríssimo da selva legal em que se converteu o Brasil, que já não constitui mais um mercado unificado, mas, como na era medieval, um arquipélagos de pequenos mercados regionais – os 27 estados dessa falsa federação – cada qual com suas regras, níveis de impostos e concorrência predatória e selvagem no plano fiscal, justamente. Outros fatores e exemplos poderiam ser aduzidos para demonstrar que a chamada institucionalidade, ou seja o quadro legal sob o qual deveriam trabalhar os agentes privados, tem recuado a épocas pretéritas, criando um ambiente de negócios totalmente permeado por regras ad hoc e constante barganha de favores, uma vez que as dificuldades e a enorme carga fiscal é criada pelas próprias autoridades políticas.
O governo adota medidas que são inclusive ilegais no plano do sistema multilateral de comércio. Alguns poucos exemplos: a Cofins, que é uma contribuição para o financiamento da seguridade social, jamais deveria ser aplicada às importações, pois está claro que nenhum dos produtos importados se beneficiou – um termo mal aplicado neste caso – de qualquer contrapartida do governo ou do emprego de mão-de-obra local, cujo sistema previdenciário tivesse hipoteticamente de ser financiado por um imposto específico; trata-se simplesmente de um abuso e de uma ilegalidade, até inconstitucional. Por outro lado, a exigência de conteúdo local para produtos importados, ou seja, que já pagaram tarifa de importação, é absolutamente contrária ao princípio do tratamento nacional – um dos cânones do Gatt – e aos acordos emanados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais, especificamente o acordo Trims, Acordo sobre Aspectos Comerciais de Investimentos, que proíbe expressamente a imposição de qualquer tipo de conteúdo local ou de exigências de exportação. Ou seja, o governo está se contrapondo a regras do sistema multilateral de comércio de modo aberto e explícito, o que apenas acrescenta ao primitivismo e ao caráter tosco dessas medidas.
O governo está simplesmente premiando um grupo de indústrias poderosas, e seus amigos sindicalistas, e obrigando todos os brasileiros a pagar a conta, como se fosse pecado aos cidadãos preferirem produtos mais baratos e de melhor qualidade, como os importados. O governo, confirmando sua natureza fascista econômica, compele os cidadãos a pagar mais caro quando eles poderiam estar consumindo mais e melhor num sistema aberto como deveria ser o de um país normal.
Todos os argumentos do governo são capciosos e sem fundamento, e se formos examinar a origem real dos problemas existentes veremos que todos eles têm origem no próprio Brasil, e aqui deveriam ser resolvidos por medidas e políticas que atacassem seus fundamentos, não por paliativos e bodes expiatórios que apenas prolongam a existência desses problemas. Não é culpa de americanos, europeus ou chineses que os juros no Brasil sejam tão altos; eles tampouco têm culpa pela alta carga tributária imposta pelo governo aos produtores brasileiros (nacionais e estrangeiros aqui instalados); eles não têm a menor parcela de responsabilidade pela nossa péssima infraestrutura ou pelos elevados custos derivados de carteis setoriais ou monopólios de fato (como a Petrobras); eles jamais tiveram algo a ver com a baixíssima taxa de poupança no Brasil, um fator derivado de escolhas políticas, e de políticas econômicas, que privilegiam o consumo e não o investimento, ou que desviam a poupança potencial para o financiamento do próprio governo. Todos esses problemas são “made in Brazil”, e enquanto não forem corrigidos, vão continuar pesando sobre o destino do país.
O que o governo vem fazendo, numa típica “política de avestruz”, é isolar o Brasil do resto do mundo, praticando o velho protecionismo e os desvios autárquicos do passado. Pagamos um alto preço pelo insulamento da economia nacional do ambiente internacional, em todos os setores, e aparentemente estamos adentrando em mais um período de introversão industrial e de protecionismo comercial. Não poderia haver coisa pior para nosso itinerário enquanto nação moderna: o governo nos conduz ao atraso.

Paulo Roberto de Almeida
Paris, 6 de abril de 2012