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domingo, 14 de junho de 2020

Gabinete do Ódio: seus membros e suas ações - Juliana Dal Piva (O Globo)

O Gabinete do Ódio nasceu bem antes da campanha presidencial: foi um grupo recrutado com o objetivo precípuo de montar histórias, inventar mentiras, criar notícias falsas, difamar adversários, disseminar uma imagem heroica do tosco capitão, enfim perpetrar falcatruas eleitorais, com o apoio financeiro de capitalistas bolsonaristas. Seus principais membros estão hoje instalados no 3ro andar do Palácio do Planalto, continuando a fazer o mesmo trabalho sujo.
Paulo Roberto de Almeida

Quem são os jovens recrutados por Carlos Bolsonaro para erguer o aparelho digital do governo




Carlos Bolsonaro na Câmara dos Vereadores do Rio
Carlos Bolsonaro na Câmara dos Vereadores do Rio

O presidente Jair Bolsonaro sempre creditou o triunfo de sua vitória eleitoral em 2018 à estratégia digital traçada pelo filho “02”, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), nas mídias sociais. A estrutura que impulsionou um deputado restrito a nichos ao Palácio do Planalto começou a ser montada com a contratação de alguns jovens na casa dos 20 anos, criadores de páginas de paródias e personagens políticos no Facebook — hoje, integrantes do que ex-aliados do governo Bolsonaro classificam como “gabinete de ódio”, o núcleo instalado no Palácio do Planalto que se dedica a atacar adversários nas redes. O recrutamento foi definitivamente selado numa reunião do clã Bolsonaro com alguns desses jovens, no salão de festas do primogênito e hoje senador Flávio, em 11 de março de 2017 — mais de um ano e meio antes da eleição.

Dos filhos do presidente, Carlos Bolsonaro foi o que descobriu primeiro o potencial das redes sociais para a família. Ele está no Twitter desde agosto de 2009. O GLOBO encontrou publicações de Carlos em uma conta pessoal no Facebook desde 2011. E foi por essa rede social que ele encontrou e recrutou dois dos principais assessores do presidente Jair Bolsonaro, ainda em 2013. 
O primeiro foi José Mateus Sales Gomes. Em 10 de abril de 2013, Carlos publicou: “Tô passando mal de rir com a page ‘Bolsonaro Zuero’”. Natural de Caucaia, na Grande Fortaleza, Mateus tinha 21 anos quando caiu nas graças do vereador. De Campina Grande (PB), chamou a atenção do filho do presidente a página “Bolsonaro Opressor”, criada por Tércio Arnaud Thomaz, outro selecionado por Carlos, mas para assessorar o então deputado Jair Bolsonaro. Seis anos depois, Matheus e Tércio têm assento no terceiro andar do Palácio do Planalto.
Os dois foram os precursores de vários outros que Carlos foi descobrindo e trazendo para junto do clã. Agora, na Presidência, também está Mateus Matos Diniz, engenheiro formado há dois anos, ex-aluno de Olavo de Carvalho e a quem Carlos conheceu em 2017.

Religioso, Mateus defende a castidade. Inclusive recomenda em seu Instagram que “todo dia use cinto apertado, para que ele te lembre do seu compromisso”. Também defende que “não existe sexo fora do casamento. O que existe fora é uma tentativa de emular o sexo imitando seus acidentes”.

Bem antes da campanha eleitoral que os levou ao poder central, e à diferença da narrativa de apoio espontâneo nas redes sociais, os Bolsonaros organizaram reuniões com criadores de páginas na internet. O primeiro encontro presencial ocorreu no sábado 11 de março de 2017, no salão de festas do prédio de Flávio, na Barra da Tijuca. O próprio Carlos registrou o momento no Instagram no dia seguinte: “Reunião sábado à noite, com alguns representantes de diversos grupos, com o objetivo de endireitar o Brasil (AM, CE, PE, SP, RJ, MG, PA, PB, PR)”.
Quem esteve na reunião relata que, já pensando na eleição de 2018, a família discutiu a organização da páginas e a criação de grupos no WhatsApp e introduziu a estratégia sobre ataques a adversários. Segundo um dos que participaram da reunião, a produção de memes e ataques era parte da estratégia: obter uma estrutura de comunicação que pudesse ser operada diretamente, de ponta a ponta.

Publicação do Carlos Bolsonaro sobre a reunião
Publicação do Carlos Bolsonaro sobre a reunião 
O deputado federal Carlos Jordy (PSL-RJ), então vereador de Niterói, também esteve na reunião de 2017. “Se hoje a família Bolsonaro tem grande repercussão, muito se deve a esses dois caras: Bolsonaro Zuero (Matheus) e Carteiro Reaça (Gil Diniz)”, escreveu Jordy, ao legendar foto com os dois. Ele nega ter havido discussões sobre ataques deliberados a rivais e diz que foi só um momento de “aproximar os movimentos da família Bolsonaro”.
Marcou presença ainda Guilherme Julian Freire, amigo de Matheus “Zuero” e agora assessor do deputado Hélio Lopes. O deputado Gil Diniz disse que acompanhou Eduardo Bolsonaro porque, na época, era seu assessor:
—Foi mais para unificar a pauta. No outro ano haveria eleição presidencial, e começamos a organizar esses movimentos. Não lembro de memes ou ataques.

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Sem respostas
Alex Junqueira, ex-assessor de Gil Diniz, afirma, porém, que, quando conheceu o deputado, o trabalho dele para Eduardo Bolsonaro consistia essencialmente na fabricação de memes para atacar adversários. Diniz ficou conhecido pela página “Carteiro Reaça”.
— Eu o conheci em 2018; ele era assessor do Eduardo. Eu era motorista, o Eduardo ia do lado, e o Gil, atrás. Ele (Gil), nessa época, fazia os memes e depois, quando foi deputado, de outubro até março, o que ele sabia fazer era assassinar a reputação dos outros — afirmou Junqueira, que denunciou Diniz por prática de “rachadinha”, tornando públicas conversas do grupo que Diniz mantinha com assessores nas quais este pede conteúdo para atacar adversários como o governador João Doria.
Diniz afirma que Junqueira também publicava as mensagens que “agora chama de ataques” e se tornou seu adversário político. Procurados, o Palácio do Planalto (questionado sobre a função dos assessores), Flávio, Carlos, Eduardo e Helio não responderam.
Juliana Dal Piva