De vez em quando, a solidariedade tropeça nas contradições, como lembra o advogado do Senador boliviano "hospedado" na embaixada do Brasil em La Paz:
Blog de Augusto Nunes, 19/07/2013
Advogado do senador
boliviano Roger Pinto Molina, enclausurado na embaixada brasileira em La Paz
desde 28 de maio de 2012, Fernando Tibúrcio enviou à coluna uma carta que
escancara a arrogância afrontosa do tiranete Evo Morales. Enquanto exige que as
nações possam conceder asilo a quem desejarem, o Lhama-de-Franja (com o apoio
dos comparsas) continua impedindo que o parlamentar oposicionista viaje para o
Brasil, que o contemplou com o status de asilado.
Integrante da Associação
Bolivariana Cucaracha (ABC), o governo lulopetista faz o que determinam os
mandamentos da entidade. Um deles avisa que só merece ser tratado como
perseguido político quem contraria os interesses dos Estados Unidos e seus
aliados. Figuram nessa categoria, por exemplo, Julian Assange e Edward
Snowden. Políticos que se opõem aos estadistas de hospício agrupados na
ABC nunca são perseguidos. Não passam de inimigos da pátria que viraram
criminosos comuns. Nada merecem além de cadeia.
Leia o que escreveu Fernando
Tibúrcio e os documentos que complementam o texto. São peças com vaga
assegurada no acervo do museu que mostrará o que foi a política externa da
cafajestagem:
Caro Augusto Nunes,
Quem lhe escreve é o
advogado do senador boliviano Roger Pinto Molina, asilado há treze meses na
Embaixada do Brasil em La Paz. Excelente a cobertura que VEJA e seus colunistas
vêm dando ao tema.
No último domingo, o
articulista Mac Margolis, do Estadão, revelou o paradoxo que
existia em Evo Morales apoiar o asilo a Julian Assange e negar
a concessão de um salvo-conduto ao senador Roger Pinto Molina, algo que o meu
amigo Tuto Quiroga, ex-presidente da Bolívia, qualifica de “dupla moral”. Hoje
foi a vez da BBC e
do El País
falarem de paradoxos. É paradoxo que não acaba mais.
Na sexta-feira, na
reunião de cúpula do Mercosul, em Montevidéu, os mandatários ali presentes
aprovaram uma declaração que,
em seu ponto 9, fala o seguinte:
“Las Presidentas de la
República Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, y de la República
Federativa del Brasil, Dilma Rousseff, el Presidente del Estado Plurinacional
de Bolivia, Evo Morales, el Presidente de la República Oriental del Uruguay,
José Mujica Cordano, y el Presidente de la República Bolivariana de Venezuela,
Nicolás Maduro Moros, reunidos en Montevideo, el día 12 de julio de 2013, en
ocasión de la XLV Reunión Ordinaria del Consejo del Mercado Común:
9. Repudiaron las
acciones que puedan menoscabar la potestad de los Estados de conceder e
implementar de forma plena el Derecho de Asilo, y en ese sentido rechazar todo
intento de presión, hostigamiento o criminalización de un Estado o de terceros
sobre la decisión soberana de cualquier nación de conceder asilo.”
O problema é que essa
bem-vinda declaração foi feita pensando em Edward Snowden. Ninguém se lembrou,
ou era incômodo lembrar-se, de Roger Pinto Molina.
Também no domingo Cláudio
Humberto publicou uma notícia
bombástica. Evo teria mandado revistar o avião da Força Aérea
Brasileira que levou o então e agora ministro da Defesa Celso Amorim à Bolívia
no fim do ano passado, à procura do senador Roger Pinto. Ou seja, Evo teria
usado o mesmo condenável expediente que o embaixador espanhol em Viena tentou
usar contra ele. Essa história eu já tinha ouvido de uma fonte respeitável na
Bolívia (uma fonte, no jargão jornalístico, tipo 1). Tal fonte não tinha a
certeza se a busca no avião da FAB fora mesmo a mando de Evo e também se o
objetivo era pegar no pulo o senador. Mas considerava as duas premissas
possíveis.
Na terça o Ministério da
Defesa confirmou, em nota, que a inspeção de fato aconteceu, mas que teria sido
em 2011, antes do senador Roger Pinto Molina buscar proteção na Embaixada do
Brasil em La Paz. Escrevi no mesmo dia uma “nota da nota”, comentando as
explicações do ministro Amorim, que tenta, dentre outras coisas,
explicar por que mesmo em 2011 era possível que as autoridades bolivianas já
estivessem à caça do senador (sem contar o fato de que, mais tarde, o próprio
ministro reconheceu que outras inspeções ocorreram).
Gostaria que você tomasse
conhecimento do teor do habeas corpus extraterritorial que impetrei em favor do
senador e que tem como precedente uma decisão da Suprema Corte dos Estados
Unidos em favor de Lakhdar Boumediene, um ex-prisioneiro de Guantánamo (veja aqui a
petição inicial). O habeas corpus deve ser julgado agora no mês de
agosto pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal.
A título de curiosidade,
comento que a arrogância boliviana – ou melhor, bolivariana – foi tal que
acabou virando assunto de família. Minhas filhas, estudantes de direito da UnB
e também estupefatas com o que está acontecendo com o senador – mais do que eu,
já que elas têm ainda aquela energia da juventude – decidiram em sinal de
protesto (protestar está na moda!) enviar em 17 de junho uma carta ao
presidente Jimmy Carter. É preciso ressaltar que Jimmy Carter foi
convidado por Evo Morales para mediar a questão do acesso ao mar da Bolívia. A
carta não obteve resposta e aí está outra contradição. Carter, um notório
defensor dos direitos humanos, fez também vista grossa a um notório caso de
violação de direitos humanos. Um abraço.
Fernando
Tibúrcio Peña