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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Meus livros podem ser vistos nas páginas da Amazon. Outras opiniões rápidas podem ser encontradas no Facebook ou no Threads. Grande parte de meus ensaios e artigos, inclusive livros inteiros, estão disponíveis em Academia.edu: https://unb.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida

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quarta-feira, 23 de julho de 2025

O Brasil, sem poder de barganha Celso Ming O Estado de S. Paulo

O Brasil, sem poder de barganha

Celso Ming
O Estado de S. Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 2025

Aos poucos, a indignação infantil e inconsequente vai sendo substituída por uma visão mais realista das nossas precariedades.
A primeira reação do presidente Lula ao anúncio do presidente Trump sobre o tarifaço de 50%, a vigorar a partir de 1º de agosto, foi apelar para a soberania nacional e para revides em nome do princípio da reciprocidade. Lula chegou a avisar que recorreria à Organização Mundial do Comércio, providência que teria a mesma força de um pedido de apoio ao arcebispo de Nova York. Nesta quinta-feira, declarou que “gringo não vai dar ordens” e, em pronunciamento em cadeia nacional de rádio e televisão, disse que “No Brasil, ninguém está acima da lei”.
Mas, na avaliação de parte dos empresários brasileiros, cutucar a onça com vara curta poderia levar ao pior. O País está na defensiva, tentando se apegar a alguma ajuda dos empresários norte-americanos prejudicados com a alta dos preços dos produtos exportados pelo Brasil. Nem a primeira carta enviada a Donald Trump, logo após o anúncio do tarifaço geral em abril, conseguiu resposta.
O presidente Trump parece ter eliminado a principal justificativa apresentada em sua carta do dia 11, quando alegou que o ex-presidente Jair Bolsonaro estava sendo vítima de uma caça às bruxas. “Bolsonaro nem chega a ser amigo”, disse Trump. “É apenas conhecido.”
A verdade é que o Brasil começa a se dar conta de que não tem poder de barganha diante de Trump, e qualquer alegação pode servir de pretexto para algum ato econômico de força. Até mesmo o Pix é acusado como política desleal aos Estados Unidos – apenas porque as bandeiras de cartões de débito começam a perder função e se tornar inúteis.
A economia brasileira carrega mazelas, enquanto o governo segue se enganando com a ideia de que somos “um país tropical, abençoado por Deus!”
Outra seria a condição do Brasil para enfrentar trancos como esse se não houvesse o rombo fiscal e, em consequência dele, os juros não tivessem de ir para a lua, derrubando a competitividade do produto nacional. Ou se a indústria e boa parte do setor produtivo não carregassem os problemas que têm hoje com seu sistema imunológico debilitado porque vivem dopados pelo protecionismo, pelos subsídios, pelas isenções tributárias, pela criação de reservas de mercado, pela imposição de conteúdos locais e pela artificialidade da competitividade zero, como a da Zona Franca de Manaus.
Bem outra seria a situação do Brasil se seus governos tivessem tomado a iniciativa de fechar acordos comerciais com o resto do mundo, em vez de insistirem tanto no Mercosul, que, até agora, não conseguiu passar ao estágio inicial de integração: o de área de livre comércio.
Esta é uma situação grave que, pelo menos, pode ser aproveitada pelo governo como oportunidade para abandonar a distribuição de presentes de Papai Noel, levar a sério a saúde das contas públicas e realizar as reformas sempre anunciadas e nunca enfrentadas.

sábado, 2 de setembro de 2023

O Brasil, uma Argentina em marcha lenta? - Armando Castelar Pinheiro, Paulo Roberto de Almeida

 Re-compartilhando a partir de postagem original de Dilson Sampaio da Fonseca, a quem agradeço a transcrição desta matéria. Permitam-me uma introdução um pouco sombria.

O Brasil, uma Argentina em marcha lenta?

Retiro dela uma única certeza, em várias dimensões e formatos, todos negativos; os gastos públicos vão continuar aumentando, a carga fiscal vai se agravar, a dívida pública tomará uma parte maior do PIB (e os juros das receitas tributárias), o crescimento vai diminuir, a renda vai estagnar ou até decrescer, com menos investimentos, menos emprego, mais desigualdes e conflitos distributivos, mais politicos populistas e irresponsáveis, mais inflação, mais pobreza, mais atraso.

Estou sendo pessimista?

Certamente, mas é o que me sinaliza o comportamento predatório dos politicos e dos mandarins do Estado,assim como a mediocridade intelectual de grande parte das oligarquias econômicas e dos dirigentes políticos. 

Ou seja, estou prevendo um constante declinio para o Brasil, com a agravante de que ele não é uma fatalidade, mas totalmente autoconstruîdo por nós mesmos, pelos políticos, pelos aristocratas do serviço publico, pela população em geral, que quer mais Estado, mais subsidios, mais salários e privilégios. Somos uma Argentina em marcha lenta, sem aquela soberba típica dos argentinos (que acredito bem mais diminuída hoje).

Dificilmente a tendência dos politicos, de direita e de esquerda, será pela contenção constitucional dos gastos públicos. Então, será o que está no meu titulo!

Desculpem a longa introdução, mas leiam o artigo de um professor realista.

Paulo Roberto de Almeida 

Escolhas de política econômica

Armando Castelar Pinheiro *

Valor Econômico, 1/09/2023

Faz todo sentido que se discuta estabelecer um teto para a carga tributária

Em artigo de 1992, intitulado “Law or Economics”, George Stigler observa que “enquanto a eficiência constitui-se no problema fundamental dos economistas, a justiça é a preocupação que norteia os homens do direito (...) é profunda a diferença” entre esses dois focos, o que “significa, basicamente, que o economista e o jurista vivem em mundos diferentes e falam diferentes línguas”.

O mesmo poderia ser dito, claro, em relação a economistas e políticos, estes mais focados na popularidade e no impacto eleitoral dos seus atos. Isso explica muito da frustração dos economistas por não emplacar reformas econômicas cujos benefícios lhes parecem claros. O que não significa que haja erro: em uma democracia os políticos procuram refletir, em suas escolhas, as preferências de seus eleitores, como deveria ser.

Por outro lado, isso também não elimina o custo de se escolherem políticas econômicas ineficientes, como bem mostra o baixo crescimento de nosso PIB per capita há tantas décadas, a despeito de todo nosso potencial. Ou o que acontece atualmente com a Argentina, onde as taxas de inflação e de pobreza sobem “a olhos vistos”.

Essa questão me veio à mente assistindo ao “talk show” ocorrido esta semana na cerimônia de entrega do prêmio Valor 1000, com os relatores da reforma tributária na Câmara e no Senado. Muito da conversa acabou girando em torno da necessidade de, no contexto da reforma, se colocar um teto para a carga tributária. Assim, segundo o senador Eduardo Braga, “entendemos como profundamente importante a limitação da carga tributária no texto constitucional”.

Essa é uma proposta relevante por pelo menos três fatores. Primeiro, pois, como lembrado no “talk show”, a experiência da reforma do PIS/Cofins mostrou que, na ausência de uma trava explícita, a promessa de não aumentar a carga corre o risco de não ser cumprida. Isso inclusive pela incerteza de se garantir que a arrecadação será a mesma, o que leva a se preferir errar para mais do que para menos na fixação das alíquotas.

Segundo, pois muito da negociação federativa em curso sobre a reforma tributária vem sendo equacionada abrindo-se as portas para aumentar outros tributos que não aqueles incidentes sobre o consumo, que são o objeto em si da reforma. Assim, a proposta aprovada na Câmara dá espaço para se elevar impostos como o IPTU, o IPVA e o ITCMD, além de criar a possibilidade de os Estados passarem a tributar produtos primários e semielaborados.

Terceiro, pois a política fiscal que está hoje colocada se baseia em um forte aumento da carga tributária, de forma a gerar superávits primários em um contexto de expansão real do gasto público. A previsão mediana do Prisma Fiscal de agosto é que o Governo Central feche este ano com déficit primário de 1% do PIB, que cairia para 0,8% do PIB em 2024. O resultado seria uma dívida bruta de 79% do PIB ao final de 2024, que, de acordo com o Boletim Focus, seguiria subindo nos anos seguintes.

Para estabilizar a relação dívida/PIB, dados o potencial crescimento da economia e a taxa neutra de juros, seria necessário gerar um superávit primário entre 2% e 2,5% do PIB: ou seja, 3% a 3,5% do PIB a mais do que se tem hoje. E, como o modelo atual de política econômica não prevê segurar o gasto público, que tende a continuar crescendo, esse resultado só seria possível via forte aumento da carga tributária, como vem se buscando fazer de variadas maneiras.

Há, porém, dois complicadores importantes. Um, que o cenário econômico, internacional e doméstico, tende a se complicar nos próximos anos. Lá fora, a tendência é que o PIB mundial cresça menos, mas ainda assim as pressões inflacionárias sigam fortes. Isso por conta de pressões vindas da desglobalização das cadeias de produção e da substituição do petróleo por fontes mais limpas de energia. Além disso, como também aqui dentro, o aumento do endividamento público e políticas fiscais mais expansionistas vão pressionar a taxa neutra de juros, como vimos ocorrer após o abandono do teto de gastos. No Brasil, também sentiremos o fim do bônus demográfico. Tudo isso pode fazer com que o superávit primário necessário para estabilizar a razão dívida/PIB seja ainda mais alto.

Outro complicador é que o Brasil já tem uma carga tributária muito alta, como apontado pelos participantes do “talk show”. Em 2022, segundo cálculos do Tesouro Nacional, essa atingiu 33,7% do PIB, basicamente o mesmo que a média da OCDE (34,1%), um patamar já muito elevado para um país emergente como o Brasil.

Aumentos adicionais da carga tributária vão reduzir ainda mais o nosso potencial de crescimento econômico. A maior tributação vai estimular a informalidade, gerar ineficiências diversas e afastar os investimentos. Menos crescimento significa menor geração de emprego e renda e renovadas pressões por mais gasto público.

Faz todo sentido, portanto, que se discuta estabelecer um teto para a carga tributária: nas palavras do senador Braga, “para dizer não ao Estado e assim...., protegendo, portanto, o contribuinte,... impor ao Estado a necessidade de rever os seus gastos”. Ir na direção oposta é optar por um modelo que vai gerar ainda menos crescimento e nos deixar ainda mais distantes de acabar com a pobreza no país.

*Armando Castelar Pinheiro é professor da FGV Direito Rio e do Instituto de Economia da UFRJ e pesquisador-associado do FGV Ibre