Triunfo e tragédia de Robert J. Oppenheimer
O filme Oppenheimer é - descontando passagens prosaicas que poderiam ter sido evitadas — um monumento extraordinário no plano cinematográfico, no de efeitos cênicos — idas e voltas antes e depois do projeto Manhattan — e no terrenos das interpretações pelos atores, mas é, sobretudo, uma grandiosa saga e admirável reconstrução histórica sobre, como está dito no próprio filme, o maior projeto científico-militar já visto numa corrida contra o tempo para evitar que o mais nefando regime criminoso de todos os tempos, o totalitarismo nazifascista ganhasse a corrida estratégica para destruir as democracias ocidentais e um outro totalitarismo pela mais terrivel arma jamais inventada pelo homem.
Ironicamente, ela tinha sido concebida para eliminar a ameaça nazista nessa corrida, que acabou sendo superada por meios “convenvionais” — sem descurar os terriveis bombardeios aéreos sobre alvos civis na Alemanha e no Japão—, e que depois foi usada contra um inimigo que também já estava teoricamente vencido, mas cuja rendição final e incondicional exigiria, provavelmente, um número absurdamente alto de vitimas civis e militares (aqui dos dois lados), numa proporção 4 ou 5 vezes superior ao número de mortos no bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki em agosto de 1945.
Um dos aspectos mais interessantes do filme é traduzido por um processo paranoico anticomunista motivado por um personagem que permanece nas sombras durante o projeto Manhattan, a União Soviética, aliada durante todo o projeto, mas a grande inimiga imediatamente após.
Recomendo enfaticamente o filme para todos os que se interessam pela história, não temerosos de passar 3 horas sentados na frente de uma grande tela (sim, ver na TV ou no computador não é a mesma coisa).
Mas recomendo primariamente que os interessados se informem previamente sobre essa história toda, seja nos livros — o filme é baseado na história do “American Prometheus” —, sejam o Google e na Wikipedia. Vai ajudar a compreender certas passagens, pois o filme vai e volta em diferentes episódios dos anos 1930 aos 50.
Prevejo uma batelada de Oscars em 2024.
Paulo Roberto de Almeida
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Transcrito da História Esquecida
Einstein e Oppenheimer, década de 1930.
“Embora eu conhecesse Einstein por duas ou três décadas, foi apenas na última década de sua vida que fomos colegas próximos e algo como amigos. Mas pensei que poderia ser útil, porque tenho certeza de que não é cedo demais – e talvez quase tarde demais para nossa geração – começar a dissipar as nuvens do mito e ver o grande pico da montanha que essas nuvens escondem. Como sempre, o mito tem seus encantos; mas a verdade é muito mais bonita.
No final de sua vida, em conexão com seu desespero por armas e guerras, Einstein disse que se tivesse que viver tudo de novo, seria um encanador. Este era um equilíbrio de seriedade e brincadeira que ninguém deveria tentar perturbar. Acredite, ele não fazia ideia do que era ser encanador; muito menos nos Estados Unidos, onde contamos a piada de que o comportamento típico desse especialista é que ele nunca traz suas ferramentas para o cenário da crise. Einstein trouxe suas ferramentas para suas crises; Einstein foi um físico, um filósofo natural, o maior de nosso tempo.
Einstein é frequentemente culpado, elogiado ou creditado por essas bombas miseráveis. Na minha opinião não é verdade. A teoria especial da relatividade pode não ter sido bonita sem Einstein; mas teria sido uma ferramenta para os físicos e, em 1932, a evidência experimental da interconversibilidade da matéria e da energia que ele havia previsto era esmagadora. A viabilidade de fazer algo com isso de forma tão massiva não ficou clara até sete anos depois, e então quase por acidente. Não era isso que Einstein realmente buscava. Sua paarte foi criar uma revolução intelectual e descobrir, mais do que qualquer cientista de nosso tempo, quão profundos eram os erros cometidos pelos homens antes disso. Ele escreveu uma carta a Roosevelt sobre energia atômica. Acho que isso foi em parte sua agonia com o mal dos nazistas, em parte não querendo prejudicar ninguém de forma alguma; mas devo relatar que aquela carta teve muito pouco efeito e que o próprio Einstein não é realmente responsável por tudo o que veio depois. Acredito que ele mesmo entendeu isso."
Robert Oppenheimer, 1965
American Prometheus: The Triumph and Tragedy of J. Robert Oppenheimer