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sábado, 30 de abril de 2011

A diva blogueira e a corrupcao do sistema: desmoralizando Betania...

Apenas transcrevendo...

[Acréscimo em 30 de abril: um comentário de um leitor, na sequência desta postagem, e meus próprios comentários in fine...PRA]

O escandaloso blog de poesia de Maria Bethânia
Digestivo Cultural n. 478, 27/04/2011

Na música, todo mundo louvava Maria Bethânia, por ela não haver se rendido à acomodação dos outros Doces Bárbaros. Não havia se perdido em rock como Caetano, não havia se desencaminhado na política como Gil e não havia se aposentado precocemente como Gal Costa. Maria Bethânia parecia incansável: gravando compositores novos, fazendo pesquisa de ritmos, lançando selo próprio e, claro, fazendo shows - admiráveis desde a concepção até a performance (de tirar o fôlego das cantoras mais jovens). Acontece que a mesma Bethânia - que musicalmente admirávamos tanto - protagonizou um (ou se deixou envolver num) dos maiores escândalos de captação de recursos, via Lei Rouanet, via Ministério da Cultura, via Governo Dilma, via Era Lula...
O projeto "O Mundo Precisa de Poesia" se apresentou ao MinC como um "blog", onde Maria Bethânia recitaria um poema por dia, e, para isso, solicitava quase 1,8 milhão de reais, sendo que 600 mil apenas para a sua remuneração. Tudo bem que o MinC aprovou "apenas" 1,35 milhão de reais para captação, mas conhecendo os blogs - como a blogosfera conhece - a grita foi geral. Primeiro porque qualquer pessoa que já tenha aberto uma conta de e-mail na Web, sabe qual é o custo de montar um blog: 5 minutos. Evidente que o custo de manter um blog é outro. Mas para fazer vídeos, e distribui-los via YouTube, não demora muito mais, não. Depois, porque o projeto literalmente caiu na rede e seu conteúdo era uma piada de mal gosto. A "síntese", os "objetivos" e a "justificativa" eram de uma redação quase infantil. E a equipe era a dos usual suspects: Conspiração Filmes, Andrucha Waddington e Hermano Vianna.
Para completar: dos quase 2 milhões solicitados, o webdesigner receberia 6 mil, no total, e a manutenção/atualização do site custaria, simples e apenasmente, 8,4 mil reais (durante um ano). Em defesa de Bethânia - ou do projeto em que ela foi usada de "laranja" - vieram dizer que estava tudo dentro da lei. Podia até estar, mas, como d izia Boris Casoy nos bons tempos, não deixava de ser "uma vergonha". Outros projetos, de outros Doces Bárbaros, vieram à tona, para engrossar o caldo, mas a nova Ministra da Cultura nem ficou vermelha. Desta vez, o governo não poderia jogar na conta da "herança maldita" de FHC (e do PSDB), porque o projeto remontava ao ano passado (2010)...
Ao fim e ao cabo, esse projeto é, na realidade, uma das contas que a sociedade está pagando pela terceira eleição, na sequência, do mesmo governo. Porque no Ministério da Cultura também existe malversação de recursos, e quem se aprochegou dos cofres públicos nos últimos 8 anos, quer continuar se beneficiando nestes próximos 4 anos...

>>> Blog da Bethânia, o projeto

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Um leitor, conhecedor dos meandros das políticas culturais neste país que é nosso (embora seja mais de alguns do que de todos), me escreve o que segue:

Professor, este texto é de uma sequência de equívocos:

1. O mecanismo de incentivo fiscal não é uma marca da Era Lula. É Lei (de 91), que está tentando ser modificada já que deixa o incentivo à cultura via renúncia fiscal (ou seja, $ público) nas mãos da capacidade de captação dos proponentes - ou seja, muito mais no depto marketing do que no de cultura. Os mal informados acusam, inclusive, a tentativa de reforma da lei de "dirigismo estatal" dos investimentos culturais. Muitos projetos INCRIVEIS foram realizados via Lei Rouanet, mas muitos piores do que o da Betânia também. Esse "escândalo" poderia ter se dado em qualquer momento já há muito tempo. Não posso compreender porque acham o caso da Betânia mais escandaloso do que o do famoso banco que trouxe o famoso circo via lei de incentivo, fez um monte de propaganda e ainda cobrou ingresso caríssimo. (veja em http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u59903.shtml). Ou seja, vamos perceber que a situação é MUITO MAIS complexa do que a narrada nesse texto...

2. Gil não se "desencaminhou" na política. Foi de importância decisiva no Ministério da Cultura, deixou um incrível legado. Inclusive foi o responsável por criar outras abordagens para a política pública cultural brasileira que não a do incentivo fiscal, formulando Programas que hoje são referência para diversos países. Ou seja, o texto mistura alhos com bugalhos da forma que é conveniente ao argumento. Diz que o personagem é "desencaminhado", justamente ele que foi quem mais fez contra o que o autor diz achar um absurdo...

3. Quem pode julgar o processo artístico de Caetano ou Gal??!!! "Aposentadoria precoce de Gal" é uma das expressões mais preconceituosas que já vi. Só porque ela não se esforça para estar toda hora na mídia com uma novidade? Mas não é essa a acusação que o autor do texto faz a Caetano Rock'n'roll? Perceba a contradição e a petulância desses comentários...

Entenda, não é o caso de defender um governo ou outro, mas de ver a Cultura como um campo complexo de ação pública, tão imbricado nos processos de transformação do Estado como qualquer outro. Um governo não pode, por voluntarismo, modificar a aplicação da Lei. Ela tem que ser reformada pelos complexos mecanismos da nossa democracia, e é justamente isso que está sendo feito, de forma não imune a acusações de pessoas como o autor desse texto.

Se for publicar a resposta, por favor preserve meu nome, porque gente como o autor desse texto contra a Betânia não hesita em pegar o que vc escreve, tirar de contexto e circular por aí.

[Leitor anônimo]

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Permito-me agregar o que segue (PRA):

Não vou comentar o post principal, que coloquei apenas por instinto de provocação, que sempre é o meu, independentemente da correção e objetividade dos argumentos, mas que NÃO subscrevo, esclareço. Apenas era o tema do momento, suficientemente escandoloso para chamar a atenção da "mídia", como chamou, e despertar sentimentos de animosidade ou de defesa, entre os interessados por esta área da vida nacional. Apenas por isto postei aqui, mas concedo que o tom é rancoroso e não traduz a racionalidade que se espera de um blog como este, que se pauta, como indicado, por respeito a ideias inteligentes. Não era o caso do post e do tema, e eu deveria ter abandonado a intenção. Agora já está postado e despertou reações do distinto público que aqui comparece.
Tampouco vou comentar o que está transcrito acima, de um leitor inteligente e cognoscenti.
Vou apenas dizer o que penso do sistema e do caso.

É evidente que num país invadido, dominado, subjugado por políticas públicas, especialmente as setoriais, que interessam a grupos de interesse, como o Brasil, não poderiam faltar políticas de "favorecimento" disto e daquilo, para todos e cada um.
Um Estado esquartejado por grupos de interesse, geralmente poderosos, como o Brasil, no qual o dinheiro do contribuinte, do empresário, do cidadão comum, e especialmente dos pobres -- que jamais pagam imposto de renda, mas que deixam 50% do que ganham para o Estado sob a forma de impostos -- é evidente que num país assim sempre haverá espertos, e mais espertos que os espertos, que conceberão, aplicarão e se beneficiarão de políticas ditas "incentivadoras" para estimular esta ou aquele setor que não recebe os "sinais corretos" do mercado.
Cultura é obviamente um deles. Muitos, talvez a maioria concordam com a afirmação de que iniciativas e empreendimentos culturais não podem e não conseguem se pautar pelas "regras de mercado" -- vocês sabem, aquelas coisas perversas geralmente ligadas ao lucro e à acumulação de capital -- e que por isso mesmo devem se beneficiar de incentivos públicos (ou seja, o dinheiro de todo mundo -- para que as magníficas produções culturais de artistas "fora do mercado" possam alcançar o público, geralmente o público mais vasto de cidadãos comuns que não podem pagar uma ópera na Metropolitan House, e que depende mesmo de TV aberta e de "espetáculos populares".
O caso da Bethânia talvez nem seja o mais escandaloso no caudal de "projetos culturais" que recolhem -- é bom que se diga -- não o dinheiro do MinC, mas o imposto devido por capitalistas, que assim podem posar de amigo das artes e de mecenas culturais. Provavelmente, assessores mais espertos, inclusive com a ignorância da cantora, aproveitaram esse mecanismo perverso de redistribuição de renda -- no Brasil é sempre dos pobres em favor dos ricos -- para carrear alguns milhões para seus apartamentos da Vieira Souto.
Seja lá o que for, minha posição é muito clara e a expresso aqui.

Sou contra todas essas políticas setoriais do Estado em favor de quaisquer grupos de interesses que existam, QUAISQUER: usineiros, industriais da FIESP, cantores populares, garimpeiros, pescadores, enfim, vocês escolhem o que quiserem.
Para mim só existe um grupo de interesse que não é especial, mas que é básico: as crianças, de qualquer cor, de qualquer renda, de qualquer origem geográfica e de qualquer formação cultural ou background social.
A única política que o Estado deveria ter seria esta: escolas de qualidade, em tempo integral, para todas as crianças, apenas isto. Dos 4 ou 5 anos, até os 17 anos, a sociedade nacional "suportaria" -- no sentido de apoiar -- escolas de qualidade.
Depois, bye, bye, até logo. Cada um que se vire no mercado.
Apenas isto, e nada mais do que isto.
Acredito que o Brasil e os brasileiros sejam suficientemente inteligentes para julgar o que penso do resto das políticas públicas.
Ponto.
Assunto encerrado.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 30 de abril de 2011