RIO e BRASÍLIA — Os pouco mais de 6 milhões de empregados domésticos brasileiros passaram a ter os mesmos direitos que o restante dos trabalhadores no início deste ano. As discussões no Congresso se repetiram entre as famílias, de como arcar com os novos custos de horas extras e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). O pagamento do Fundo ficou para depois, mas a proibição de mais de duas horas extras por dia e o reeembolso pela jornada a mais já é realidade. Entre as famílias acompanhadas pelo GLOBO, temos as duas pontas dessa equação. No Rio, a empresária Flávia Ritto, uma das sócias da holding de empresas Nova Rio, sentiu pouco os efeitos da lei, apesar de ter quatro funcionários na folha: uma empregada, um motorista, uma faxineira e uma passadeira.
—
Não senti o peso da regulamentação. Eles estão registrados na minha
empresa e já ganham FGTS e hora extra. Mas perdi uma empregada e até
tentei viver sem, mas não deu.
Este ano, ela assumiu as despesas com mais uma empregada, a da mãe. O gasto ficou em torno R$ 1.500, sem o FGTS:
— Para ela, ainda não estamos recolhendo.
Na
outra ponta, está a diarista Solange Moraes, também do Rio. O trabalho
em três casas diferentes, sem horário fixo, permite que ela consiga
fazer os cursos que deseja — este ano foi de espanhol — e se preparar
para entrar na faculdade de Engenharia Química, na UFRJ, seu sonho. Está
há 20 anos nessa vida. Nos primeiros anos, o trabalho era de domingo a
domingo. Precisava sustentar os nove filhos. Adoeceu gravemente. Ficou
três meses internada no Hospital Geral de Bonsucesso com a recomendação
de deixar o trabalho árduo. Mas não deixou. Diminuiu o ritmo. Para ela,
mais direitos acabaram provocando dificuldades, porque surgiu o temor de
perder o emprego.
— Ficou difícil. Muita gente não questionou os patrões sobre os novos direitos para não perder o emprego.
Como
é diarista, a rotina de Solange não mudou. Costuma trabalhar seis horas
no máximo em cada casa, “para não ser muito explorada". Mas nada de
carteira assinada, um desejo antigo que se tornou maior após a doença,
quando ficou sem renda de uma hora para outra. O segundo casamento foi
desfeito enquanto estava acamada com um doença rara nos rins. Ela perdeu
o direito ao plano de saúde .
Em
Brasília, a PEC das domésticas alterou os planos da família dos
funcionários públicos Laurício Cruz e Andreza Monteiro. Hoje eles contam
com uma diarista a cada 15 dias. Quando as contas com a reforma do
sobrado diminuírem, será possível contratar a profissional para fazer a
limpeza uma vez por semana. Mas ter uma empregada todos os dias está
fora dos planos.
—
Meu maior sonho de consumo hoje é ter uma empregada. Mas como? Vai
custar pelo menos R$ 1,5 mil por mês, incluindo salário, imposto,
transporte, alimentação. O quarto de empregada vai virar depósito. Não
questiono o direito delas. Mas, com a nova lei, não dá para pagar. É uma
questão de orçamento — afirmou.