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quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Equivocos economicos do PT: Lula e a Loucura Agricola Europeia (2001) - Paulo Roberto de Almeida

Um dia eu acordei invocado, como disse certa vez o estadista de Garanhuns, o inefável capo di tutti i capi. Acordei invocado porque lia regularmente a imprensa brasileira mais cedo (estava em Washington, e tinha 2 hs para trás) do que o costume, e fiquei imediatamente invocado ao ler declarações do eterno candidato do partido esquizofrênico apoiando a loucura agrícola europeia, a política comum em matéria de agricultura que, mais do que prejudicar o Brasil (isso é o de menos, pois somos competitivos mesmo com a PAC), prejudica sobretudo os países africanos.
Pois invocado estava e invocado fiquei. Decidi escrever o artigo que vai abaixo.
Com base nessas minhas críticas, a revista Veja, sem saber de meu status profissional, me contatou para uma entrevista para as Páginas Amarelas. Pronto, foi só dar essa entrevista (que está disponível em meu site, aqui), onde eu dizia mais ou menos as mesmas coisas, que o Itamaraty resolveu me punir com uma advertência baseada na Lei da Mordaça, a coisa mais vergonhosa que possa ter existido na nossa Santa Casa (não a minha punição, isso é o de menos, mas a lei da mordaça).
Em todo caso, para mostrar que bobagens econômicas como as cometidas pelos companheiros não acontecem por acaso, nem de repente, transcrevo aqui o meu artigo e seus complementos.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 6 de agosto de 2015


O candidato do PT e a loucura agrícola europeia
(com post-scriptum em 13.10.01)

Paulo Roberto de Almeida
Washington, 5 de outubro de 2001

Segundo despacho de Paris reproduzido na imprensa brasileira na quinta-feira, 4 de outubro, o candidato Luís Inácio “Lula” da Silva, em viagem pela Europa e depois de ser recebido pelo primeiro ministro francês Lionel Jospin, defendeu o acertado da política agrícola européia.
A afirmação já seria absurda em seu mérito próprio, mas a postura também está equivocada substantivamente, historicamente, funcionalmente. Apenas posso interpretar que o candidato carece de informações adequadas tanto sobre a agricultura européia, como sobre a brasileira, caso contrário não poderia fazer esse tipo de afirmação, mesmo desejando hipoteticamente agradar seu interlocutor.
Vejamos essas afirmações um pouco mais de perto. Segundo Lula:

1) “Do ponto de vista da realidade européia, eles estão corretos.”
Ao contrário, os europeus estão absolutamente errados, mesmo do ponto de vista exclusivamente europeu. Poderia, eventualmente, ser parcialmente correto se os europeus vivessem em circuito fechado, sem qualquer tipo de intercâmbio com o mundo e sem interferir no comércio agrícola mundial. Esta não é a realidade porém, na medida em que eles são relativamente abertos ao comercio mundial, possuindo mesmo um alto coeficiente de abertura externa, de modo geral. O coeficiente apenas do setor agrícola é, contudo, sensivelmente menor, e sabemos instintivamente por que.
Sobretudo do ponto de vista exclusivamente europeu, entretanto, os europeus também estão errados e o candidato Lula parece ignorar que um punhado de agricultores lobistas e outros aproveitadores políticos arrancam um alto preço de seus concidadãos em virtude da “loucura” agrícola comum. Sabe o candidato Lula que os consumidores (cidadãos) europeus poderiam ter um orçamento alimentar reduzido praticamente à metade se não houvesse a PAC e se o comercio agrícola fosse totalmente liberalizado? Esse é o calculo efetuado por diversos economistas independentes, europeus aliás: a cesta de compras da dona de casa européia poderia ser obtida com metade do dinheiro da feira e do supermercado se não existisse a PAC.

2) “São países que passaram por guerras e mais guerras,..”
O candidato Lula sabe quando foi a última guerra que representou ruptura de abastecimento na Europa? Ela terminou em 1945, sendo que a anterior tinha terminado em 1918. É verdade que no pós-guerra, até 1948 em todo caso, o abastecimento ainda não estava completamente regularizado, mas os EUA contribuíram generosamente com doações alimentares no quadro do Plano Marshall. Ou seja, há cinqüenta anos, ou duas gerações completas, que não há nenhuma ameaça de ruptura de abastecimento na Europa, e não se tem noticia de algum europeu ocidental que tenha morrido de fome nesse período de meio século.
O medo de um passado de fome (ocasional e explicável) não poderia de nenhum modo justificar as distorções do presente, sobretudo porque, supostamente, os alimentos viajam melhor e mais barato atualmente do que sessenta ou oitenta anos atrás.

3) Os europeus “não vêem a necessidade de tratar a comida como uma simples mercadoria,...”
Se a comida não pode ser tratada como mercadoria, o que é, ela supostamente deveria ter sido objeto de disposições especiais nos tratados comerciais, a começar pelo GATT, que regula o comercio de bens no plano multilateral desde 1947. Ora, não existem tais dispositivos restritivos, e os bens alimentares são considerados bens como quaisquer outros.
Foi apenas devido a expedientes abusivos e distorcivos, que europeus e americanos lograram extorquir dos demais países participantes do sistema multilateral de comércio uma exceção “temporária” ao comércio agrícola. Ora, essa exceção se prolonga há mais de 50 anos, e hoje nada, absolutamente nada, justifica a continuidade de uma tal situação. Ela penaliza duramente os países mais pobres, justamente aqueles que supostamente o candidato Lula deveria defender e que são os mais dependentes da agricultura, atividade primária por excelência.
Como, nessa linha de pensamento, se chega a defender agricultores abastados contra os interesses da imensa maioria de agricultores pobres do Terceiro Mundo? Isso me parece uma contradição insanável no argumento de Lula, como aliás já se tinha manifestado na aliança pouco santa entre o MST e “agricultores “do tipo do Sr. José Bové. Para voltar ao argumento do candidato, caberia esclarecer que a imensa maioria dos agricultores pobres dos países em desenvolvimento desejam, apenas e tão somente, que seus produtos agrícolas sejam tratados como simples mercadorias, como quaisquer outras. Nada mais do que isto.


4) Os europeus “vêm (...) a comida (...) como uma questão de soberania nacional.”
Se abobrinha e cenoura são produtos que integram os cálculos estratégicos de soberania nacional, então temos aqui um sério problema de definição do que seja a soberania de uma nação, sobretudo no caso de países altamente industrializados, não dependentes da produção agrícola para a formação do PIB. O que fazer, por exemplo, em relação à educação e à saúde, para não mencionar a segurança pública, interna e externa?
Como fazem o Vaticano, Andorra, Mônaco e muitos outros países menores, que não conseguem ter, por mais que queiram, autonomia alimentar? Eles dispõem, por causa disso, de menos soberania nacional do que os grandes e melhor dotados de recursos naturais? Como fazem países situados em zonas árticas ou tórridas, que dependem do comércio internacional para o essencial de seu abastecimento alimentar? Eles também são menos soberanos por isso?
Consideremos porém países relativamente maiores como Bélgica ou Países Baixos: se eles amanhã deixassem de produzir, por acaso, alimentos, estariam ipso facto condenados à fome e à privação absolutas? Ou poderiam abastecer-se tranqüilamente com seus vizinhos e mesmo junto a países distantes? A segunda hipótese é a mais correta obviamente. Quando a Inglaterra decretou o livre comercio universal, no hoje distante ano de 1856, ela passou a ser uma importadora líquida de alimentos. Nem por isso, os ingleses deixaram de comer bem, ao contrário, seu padrão alimentar melhorou e se diversificou, com base em compras mundiais. A afirmação do candidato Lula revela aqui uma incompreensão quanto às relações entre auto-produção e soberania nacional, característica mais comum nos economistas da era fascista.

5) “Nós precisamos primeiro cumprir com a nossa parte para depois exigir alguma coisa.”
O que significa o Brasil cumprir primeiro a sua parte? Ficar calado e aceitar a loucura agrícola comum européia? Dizer aos nossos próprios agricultores que tenham um pouco mais de paciência com os “pobres” agricultores europeus, que vivem traumatizados com uma suposta ameaça de desabastecimento alimentar motivada por não se sabe qual guerra possível, ou que estão heroicamente defendendo a soberania nacional européia?
O que teríamos de exigir? Alguma concessão absurda dos europeus? Ou apenas um comércio leal, baseado em simples regras de reciprocidade, segundo as quais nos concordamos em abrir nossos mercados ao camembert e ao foie-gras francês, em troca da abertura dos mercados europeus de grãos e de carnes aos nossos produtos?
Essa “nossa parte” precisaria ser melhor esclarecida, do contrário poderíamos pensar que cometemos algum “pecado original” que o candidato Lula não explicou bem o que seria.

6) “Temos que ter uma boa política agrícola e investimento em tecnologia. É isso que vai nos dar competitividade”.
O que significa ter uma “boa” política agrícola? Uma que seja altamente subsidiada como a européia? Subsidiada a ponto de apresentar distorções e aberrações, quando não fraudes maciças, que fazem, por exemplo, com que uma vaca européia ostente uma renda per capita superior à do brasileiro comum? Uma política agrícola que resulta em fraudes repetidas, que nos confrontam a tomates “milionários”, a porcos e vacas que certamente têm conta em banco (na medida em que o pagamento da PAC é feito por cabeça de animal)?
Seria esse o significado de uma “boa” política agrícola? Seria isso, exatamente, de que o Brasil necessita, para tornar-se “grande e forte” como os europeus? Nesse caso estaríamos repassando dinheiro a uma fração muito pequena de cidadãos, condenando milhões de outros a não contarem com os investimentos necessários em saúde publica, educação de qualidade, estradas pavimentadas, segurança pública adequada etc. Sabemos, por experiência, que qualquer dinheiro que se conceder a uma categoria especial de cidadãos (chamemo-los de produtores) vai ter de sair do mesmo orçamento publico geral, que já é considerado insuficiente, pelo próprio candidato Lula, para os absolutamente indispensáveis investimentos sociais que ele reivindica com razão.
Quanto ao grau de competitividade da agricultura brasileira, ela pode não apresentar o mesmo desempenho da européia em todos ou em determinados setores (ainda que para a maior parte de nossos produtos comercializáveis externamente ela é propriamente imbatível), mas diferenciais de competitividade e de produtividade entre os países (que justamente são o motor do comércio mundial) não podem ser de nenhuma maneira invocados como justificativas para o protecionismo obsceno, sobretudo quando levado às raias do absurdo comercial e do irracionalismo econômico, como acontece com a política agrícola européia.
Infelizmente para o candidato Lula, porém, nossa competitividade agrícola não deixa nada a desejar quando confrontada à da Europa ou dos Estados Unidos, com exceção de poucos setores de notória especialização e de alta intensidade tecnológica. De fato, para ser mais dramática ainda a comparação, é justamente por sermos competitivos que estamos sendo penalizados no acesso ao mercado europeu de alimentos e insumos processados. Apenas podemos ingressar com algumas poucas commodities de baixo valor agregado.
O que faz um candidato como Lula, normalmente identificado com as causas do Terceiro Mundo e dos pobres em geral, defender um absurdo do tamanho da PAC? Que virtudes ele encontrou nessa imensa reserva de mercado que não apenas cerceia nosso direito de concorrer no próprio mercado europeu como também compete deslealmente, à custa de maciços subsídios, com nossos produtos em terceiros mercados? Que sentido existe em ver ricos agricultores europeus deslocando do mercado pobres agricultores africanos, asiáticos e latino-americanos, além do mais em setores tão “sofisticados” como o do açúcar, da carne, dos grãos? Que racionalidade existe em proteger esses abastados agricultores, que depois reivindicam mais subsídios ainda para despejar quantidades absurdas, verdadeiras montanhas, de excedentes agrícolas nesses mesmos países pobres da periferia, que não têm como concorrer com o rico tesouro da União Européia. A palavra está novamente com o candidato Lula...

(815: Washington, 5 outubro 2001, 4 pp)
Paulo Roberto de Almeida

Post-Scriptum de Paulo Roberto de Almeida em 13.10.01:
            Em novas declarações à imprensa, em 11 de outubro, ao retornar de sua viagem à Europa, o candidato do PT reafirmou sua compreensão em relação à loucura agrícola européia, e voltou a cobrar do Governo uma política de apoio à agricultura brasileira.
            Segundo Lula, “subsídio para exportação é prejuízo para os países pobres. Precisamos brigar para que os nossos produtos sejam mais competitivos. Queremos ser competitivos não só na agricultura, mas no aço, no setor têxtil, no de calçados e no de máquinas”.
            A questão, no entanto, não está na falta de competitividade dos produtos agrícolas brasileiros, mas sim no protecionismo europeu e na sua política de concorrência desleal contra esses mesmos produtos em terceiros mercados, mediante maciços subsídios que deslocam a produção brasileira. Se os europeus resolvem subsidiar seus aricultores (ou qualquer outra categoria de produtores nacionais), trata-se de decisão soberana de seus legisladores e, em última instância, de sua população, que aprovará ou não tais políticas (desde que transparentes e mensuráveis, em termos de orçamento público, o que permitiria a discussão de eventuais alternativas ao emprego do dinheiro alocado a uma fração reduzida da população).
            A questão central não é, entretando, de escolhas orçamentárias (ou, chamemos generosamente, de “políticas sociais”), mas de definição de políticas comerciais, e é contra isso que se insurge não apenas o governo brasileiro, mas todos os demais países que praticam uma agricultura não subvencionada. O Brasil não teria nada a objetar à política interna de subsídios europeus, se esta não interferisse diretamente com a liberdade dos mercados (algo que os europeus preconizam com uma certa insistência quando se trata de sua própria produção) e com o estabelecimento de condições uniformes de competição no plano internacional. Esse aspecto do problema não parece ter sido percebido pelo candidato do PT, que continua a reclamar da “falta de uma política agrícola” no Brasil (o que não tem nada a ver com o debate sobre a política comercial européia).
            Podemos, e devemos, certamente, buscar com que “nossos produtos sejam mais competitivos”, como afirma o candidato do PT, mas a questão está em que, a qualquer nível de competitividade dos produtos brasileiros, eles continuarão penalizados pela atual política agrícola européia em seu direito de acessar o mercado europeu. Quanto à competição em terceiros mercados, os produtos brasileiros apenas conseguiriam ser “mais competitivos” do que certos equivalentes europeus, se o Tesouro brasileiro os subsidiasse ainda mais maciçamente do que o fazem os europeus (isto é, a “caixa agrícola” de Bruxelas, que já consome metade do orçamento comunitário). Seria esse o objetivo do candidato do PT: entrar em um guerra de subsídios com o “Tesouro” da União Européia?; essa seria a finalidade de uma política agrícola responsável, no Brasil e no Mercosul?
            Não seria mais simples lutar, nos foros multilaterais, em prol da eliminação dos níveis obscenos de subsídios e do protecionismo agrícola europeu, e assim estabelecer condições verdadeiramente equitativas de competição, na qual a competitividade intrínseca a cada produto possa ser o critério único, ou principal, de seu posicionamento no mercado, em lugar de se ter, como hoje, uma luta desleal entre Produtos nacionais e tesouros? Ou Lula acredita que tamanho (orçamentário, neste caso) é documento? Com a palavra, o candidato do PT.
[Washington, 13.10.01]
(Artigo original da imprensa: 3 de outubro de 2001)

Lula justifica barreiras européias

Hugo Sukman, Correspondente - O GLOBO

PARIS. Depois de se encontrar ontem com o primeiro-ministro da França, Lionel Jospin, em Paris, o candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, disse entender a posição européia de impor barreiras alfandegárias a produtos agrícolas brasileiros.
- Do ponto de vista da realidade européia, eles estão corretos. São países que passaram por guerras e mais guerras, e não vêem a necessidade de tratar a comida como uma simples mercadoria, mas como uma questão de soberania nacional. Nós precisamos primeiro cumprir com a nossa parte para depois exigir alguma coisa. Temos que ter uma boa política agrícola e investimento em tecnologia. É isso que vai nos dar competitividade - disse.
Durante a viagem de três dias à França, Lula conheceu o sistema de segurança pública. Segundo ele, com adaptações à realidade brasileira, algumas medidas podem ser adotadas em sua futura política de segurança. Lula disse que quer estudar a adoção no Brasil de políticas como a "polícia de proximidade" francesa, que prepara para cada região uma política de segurança específica.
- A diferença entre o salário mais baixo de um policial francês e o mais alto é de apenas duas vezes e meia. No Brasil chega a 20 vezes, o que resulta num policial desmotivado e despreparado - disse Lula, que recebeu uma medalha da Polícia Nacional francesa.
Durante o encontro com o socialista Jospin, o assunto girou em torno das perspectivas de a esquerda chegar à Presidência tanto na França como no Brasil:
Eles têm grandes chances de ganhar as eleições e já ganharam uma vez. Nós temos chances de ganhar também - disse Lula.

Nova manifestação de Lula em 10.10.01, conforme notícias no site do PT:

Lula rebate críticas sobre questão agrícola:

11/10/2001 - Lula: problema da agricultura não está lá fora, mas aqui mesmo

O líder petista Luiz Inácio Lula da Silva respondeu hoje, em entrevista coletiva após seu retorno da Europa, aos ataques dos ministros do governo, Pratini de Moraes e Pedro Malan. Em declarações à imprensa, os ministros acusaram Lula de contrariar os interesses nacionais em solo francês, ao defender o subsídio à agricultura naquele país. Lula ressaltou que defende o princípio de que os países ricos não podem subsidiar as exportações tirando a competitividade dos países pobres. Em seguida, o petista leu trechos de suplemento do Estado de S.Paulo, em que representante de exportadores agrícolas defende que, em vez de criticar o subsídio estrangeiro, autoridades brasileiras deveriam apoiar a produção interna. Lula cita o exemplo do gasto com pedágio, que é maior que o de gasolina, no transporte de cargas, para demonstrar a falta de competitividade do produto brasileiro. “Cuidar da agricultura é dever do Estado, e esta é uma lição de casa que o governo brasileiro desaprendeu”, sentenciou Lula.

“Enquanto este governo não dá, sequer a totalidade do recurso previsto para a agricultura familiar, a multinacional Monsanto conseguiu, para montar o seu projeto em Camaçari, R$ 784 mi emprestados do BNDES, dos quais R$ 259 mi a fundo perdido financiado pelo Finor, para gerar apenas 309 empregos”, denunciou Lula, baseado nos 55% da verba do Pronaf e nos 7,5% do Orçamento da União previsto para a agricultura, liberados este ano. O líder petista afirma que, com esta política, não só perdemos em competitividade, como “iremos matar o que resta de produção de agricultura familiar neste país”.

Notícia de imprensa, 11.10.01, Agência Estado:

http://www.estadao.com.br/agestado/noticias/2001/out/11/222.htm
<http://www.estadao.com.br/agestado/noticias/2001/out/11/222.htm>

Para Lula, Malan e Pratini "venderam o Brasil"

São Paulo - O presidente de honra do PT e virtual candidato da legenda à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, rebateu hoje as críticas feitas a ele pelos ministros da Fazenda, Pedro Malan e da Agricultura, Pratini de Moraes. "Nem Malan nem o Pratini têm autoridade moral para falar em defesa nacional. Eles fazem parte dos que venderam o Brasil e conseguiram destruir em seis anos o que levou 60 anos para ser construído", disse.
Na quarta-feira, Malan considerou "lamentável" a declaração de Lula de apoio aos subsídios agrícolas feita durante viagem à França. Dias antes, Pratini disse que Lula era "quinta coluna da agricultura". Hoje, Lula reafirmou suas declarações feitas em solo francês.  Afirmou que cada país tende a adotar políticas para defender seus interesses, o que o Brasil não tem feito. Lula criticou os subsídios, mas considerou legítima a tentativa dos franceses de defender seus interesses.
"Subsídio para exportação é prejuízo para os países pobres. Precisamos brigar para que os nossos produtos sejam mais competitivos. Queremos ser competitivos não só na agricultura, mas no aço, no setor têxtil, no de calçados e no de máquinas", afirmou.  Para Lula, cuidar da agricultura "é um dever do Estado. Lição de casa que o nosso governo não tem feito." Lula e o deputado federal Aloizio Mercadante, também secretário de relações internacionais do PT, retornaram terça-feira da Europa, onde estiveram reunidos com autoridades da França, Portugal e Itália.
Eles consideraram a agenda de compromissos realizados diversificada e de "alto nível". Ambos defenderam a necessidade de aprofundar as relações entre a União Européia e o Mercosul.
Ana Paula Scinocca

domingo, 29 de junho de 2014

As “descobertas” de Piketty estao invertidas - George Reisman

As “descobertas” de Piketty estão invertidas
Instituto Ludwig Von Mises Brasil, sexta-feira, 27 de junho de 2014

 

Turning_Piketty_capitalismo.jpgThomas Piketty, um professor neomarxista francês, escreveu um livro de quase 700 páginas, publicado pela Harvard University Press.  Seu título é Capital no Século XXI, em homenagem a Das Capital, obra de Karl Marx escrita no século XIX.  Foi recebido com aplausos delirantes da esquerda intelectual e já consta nas listas de mais vendidos do The New York Times e da Amazon.
Embora seu livro seja ostensivamente dedicado ao estudo do capital e de sua taxa de retorno,Piketty aborda o assunto sem aparentemente ter lido uma única página de Ludwig von Mises ou de Eugen von Böhm-Bawerk, os dois principais teóricos deste assunto. Não há uma única referência a qualquer um destes indivíduos em seu livro. Existem, no entanto, setenta referências a Karl Marx.
Em seu livro, Piketty argumenta que a poupança e a acumulação de capital feita pelos capitalistas geram apenas a redução dos salários dos trabalhadores.  Segundo Piketty, o capital acumulado não tem nenhuma ligação com o aumento da produção; o capital acumulado em nada contribui para o aumento da produção.  Tudo o que ele faz é, supostamente, aumentar a fatia da renda nacional que vai para os lucros ao mesmo tempo em que reduz, de maneira equivalente, a fatia que vai para os salários dos trabalhadores.  
Logo, dado que o capital acumulado não gera nenhuma produção adicional, o efeito de uma mudança nestas duas fatias é uma correspondente mudança em termos absolutos — ou seja, um aumento nos lucros reais dos capitalistas e uma diminuição nos salários reais dos trabalhadores.
Para evitar esta infindável e destrutiva acumulação de capital, bem como sua consequente "espiral de desigualdade", Piketty defende um imposto de renda progressivo, cuja alíquota pode chegar a 80% "sobre rendas acima de US$500.000 ou US$1 milhão por ano", acompanhado por um imposto progressivo que incide diretamente sobre o próprio capital acumulado, cuja alíquota pode chegar a 10% ao ano.
As alegações de Piketty sobre as fatias da renda nacional que vão para os salários dos trabalhadores e para os lucros dos capitalistas podem ser refutadas simplesmente ao imaginarmos as consequências de um aumento na poupança e nos investimentos dos capitalistas, e então observarmos as consequências disso, tanto nos salários pagos quanto na quantidade de lucro no sistema econômico.  Será possível observar que os salários pagos necessariamente aumentarão e a quantidade de lucro necessariamente diminuirá, resultados diametralmente opostos às alegações de Piketty.
Assim, suponha que, inicialmente, a quantidade total de lucro no sistema econômico seja de 200 unidades de dinheiro.  Suponha também que o capital acumulado no sistema econômico seja de 2.000 unidades de dinheiro.  Consequentemente, a taxa média inicial de lucro é de 10%.
E, finalmente, suponha que os capitalistas, que até agora vêm consumindo seus 200 de lucro, decidam poupar e investir metade deste lucro de 200.  Eles, portanto, passam a fazer agora um gasto adicional com bens capitais e com mão-de-obra no valor de 100.
Muito bem.  Qualquer fatia destes 100 que seja usada para pagamentos de salários irá necessariamenteaumentar o total de salários pagos no sistema econômico.  Ao mesmo tempo, o gasto adicional de 100 com bens capitais e com mão-de-obra representa um acréscimo de 100 aos custos agregados do sistema produtivo, custos esses que, por uma mera questão de contabilidade, terão de ser deduzidos das receitas, desta forma reduzindode maneira equivalente os lucros agregados.
Esse aumento nos custos pode ocorrer imediatamente ou ao longo de muitos anos, dependendo de em quê estes 100 serão gastos.  Em um extremo, se eles forem gastos inteiramente com itens que não representam investimentos — como, por exemplo, despesas administrativas —, eles aparecerão nos balancetes imediatamente como custos adicionais.  
Em outro extremo, se eles forem gastos inteiramente em investimentos em bens de capital — como, por exemplo, a construção de fábricas ou de instalações (ativos) cuja vida depreciável seja de quarenta anos —, eles levarão quarenta anos para ser computados integralmente como custos adicionais equivalentes de produção.
De uma maneira ou de outra, estes 100 aparecerão como custos adicionais equivalentes e, portanto, reduzirãode maneira equivalente a quantidade de lucro no sistema econômico.
Isso é regra contábil pura, algo que aparentemente o professor desconhece.
Assim, as tão reverenciadas "descobertas" de Piketty estão, na realidade, invertidas. A poupança e os investimentos dos capitalistas — que aumentam a proporção entre capital acumulado e renda — aumentam a fatia da renda nacional que vai para os salários dos trabalhadores e diminui a fatia que vai para os lucros.
No que mais, essa maior oferta de bens de capital — resultante de uma maior acumulação de capital, possibilitada por mais poupança e mais investimentos — faz aumentar a produtividade da mão-de-obra eaumentar o total de bens e serviços que podem ser produzidos, incluindo uma oferta ainda maior de bens de capital.
Por outro lado, a tributação desta poupança e deste capital acumulado — que é o que defende Piketty — irá gerar efeitos exatamente opostos: menos investimentos, menos salários, menos produção, mais escassez de bens e serviços, mais carestia.
O programa de Piketty é um programa de total destruição econômica, bem ao gosto de seu mentor do século XIX. O mundo e, acima de tudo, os assalariados do mundo necessitam é da abolição de impostos e de regulamentações que obstruem o acúmulo de capital e o aumento da produção.  
As bases sólidas para um aumento no padrão de vida geral e, mais especificamente, nos salários reais são a acumulação de capital e o aumento da produção, e não o igualitarismo e suas teorias e programas insensatos (quando não homicidas).  Tributação e confisco de renda geram apenas prolongamento da escassez, sendo positivos apenas para os burocratas que comandam esse confisco.
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Leia todos os nossos artigos sobre Piketty
George Reisman é Ph.D e autor de Capitalism: A Treatise on Economics. (Uma réplica em PDF do livro completo pode ser baixada para o disco rígido do leitor se ele simplesmente clicar no título do livro e salvar o arquivo). Ele é professor emérito da economia da Pepperdine University. Seu website: www.capitalism.net. Seu blog georgereismansblog.blogspot.com.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Desmantelando o "pikettyanismo" falsamente economico - Donald J. Boudreaux

Piketty: Um tesouro de conceitos errados

Donald J. Boudreaux
Portal Libertarianismo, 17/06/2014
Capital no Século XXI (ainda sem tradução para o português), de Thomas Piketty, pode figurar em breve, junto com O Capital, de Karl Marx, como uma das obras primas mais influentes da economia dos últimos 150 anos. Mas, infelizmente, o tomo de 696 páginas, habilmente traduzido por Arthur Goldhammer para o inglês não é mais esclarecedor sobre o capitalismo do século XXI do que O Capital de Marx era sobre o capitalismo do século XIX.
Apenas como um fenômeno de vendas, o tratado do professor da Escola de Economia de Paris, que foi saudado por três laureados pelo prêmio Nobel – Paul Krugman, Joseph Stiglitz e Robert Solow – demanda a nossa atenção.  Também é digno de nota como o sintoma de uma ideologia perversa que parece dominar o pensamento progressista, incluindo o dos presidentes Barack Obama e François Hollande, e um método falho de análise econômica.
Muitos de nós nos importamos se, e em que medida, a massa de pessoas melhorou absolutamente as condições materiais de vida. Enquanto Piketty não ignora inteiramente a questão, ele se foca na causa e na cura das disparidades relativas em renda monetária e de riqueza entre grupos de pessoas e através dos séculos. Algumas maneiras de diminuir essas disparidades, como taxas punitivas de impostos, correm o risco de prejudicar a todos, tanto pobres quanto ricos. Mas para Piketty, a importância de diminuir as desigualdades monetárias é tão monumental que ele quase totalmente ignora esses riscos.
O método de Piketty de fazer economia envolve, frequentemente, grandes proclamações de “justiça social” e “evoluções” econômicas, mas ele não oferece nenhuma análise da dinâmica de como as decisões individuais são feitas, o que comumente se chama de “microeconomia”, que deveria ser um ponto central da questão que ele levanta.
Ao contrário, o autor paira na estratosfera econômica, e vê somente o único fenômeno visível a essa distância: grandes estatísticas como o crescimento da população ou a parte da renda nacional “reivindicada” pelos muito ricos. De maneira reveladora, Piketty escreve sobre a renda e a riqueza como sendo reivindicada ou “distribuída”, nunca sendo merecida ou produzida. As estatísticas resultantes são muito agregadas para revelar o que acontece com os indivíduos na terra.
Ao invés de olhar para o comportamento por trás das estatísticas, o autor usa ad hoc e, em última instância, teorias pouco persuasivas sobre o “comportamento” das próprias estatísticas agregadas, incluindo pesados agregados impessoais como o retorno de capital e a razão da riqueza nacional para a renda nacional. Ele imagina que estes agregados interagem de uma maneira robótica, com uma lógica própria, intocáveis pela inciativa, criatividade ou escolhas de seres humanos.
CONSIDERE A TEORIA CENTRAL DE PIKETTY, de que a taxa de retorno do capital, que ele chama de “r”, tende a ser maior do que a taxa de crescimento da economia, ou “g”. Para o autor, o fato de que r é mais rápido do que g – em vários pontos percentuais, segundo a conta dele – é suficiente para selar o destino do capitalismo, porque isto implica que os donos do capital necessariamente ficam mais ricos do que aqueles que não são donos. Como a propriedade sobre o capital é “distribuída” de maneira desigual na sociedade, as diferenças de renda e riqueza devem, por sua vez, piorar, “empobrecendo” tanto a classe média quanto os pobres, enquanto elites ricas relativamente pequena vão ter tanto vastos recursos quanto influência desproporcional sobre as decisões políticas do governo.
Apesar da implicação lógica do retorno de capital ser maior do que o crescimento econômico, Piketty não pensa que a plutocratização da sociedade é inevitável. Primeiro, ela pode ser detida e até mesmo revertida por calamidades como guerras mundiais ou o comunismo ao estilo soviético, já que os efeitos destrutivos desses eventos recaem desproporcionalmente sobre os ricos. Pior, ele opina que as consequências bem vindas dessas ações corretivas são somente temporárias.
Mas outro remédio, mais duradouro, está à mão: tributação contundente. Piketty pede por impostos maiores e mais progressivos, não somente sobre a renda – de pelo menos 80% na fatia superior de renda – mas também na riqueza, de preferencia a ser imposta globalmente, para evitar com que diferentes regimes de tributação façam com que os plutocratas saiam de uma jurisdição com altos impostos e se mudem para uma jurisdição com impostos mais baixos. Enquanto ele não é otimista sobre possibilidade de ocorrer à cooperação necessária entre os governos, ele está disposto a aceitar quaisquer medidas que governos mais iluminados possam tomar para impor altos impostos sobre os ricos – e especialmente medidas que podem ser acompanhadas de um compartilhamento de informações maior entre os países em relação a contas em bancos e outros investimentos de propriedade de estrangeiros.
A grande quantidade de falhas arruínam a saga capitalista contada por Piketty, falhas que surgem, principalmente, do desprezo dele aos princípios econômicos básicos. Nenhuma aparece mais claramente do que a noção errada dele sobre riqueza.
Todo semestre, eu pergunto aos meus calouros o quão rico eles seriam se cada um deles valesse tanto quanto Bill Gates, mas estivessem com todas as ações, títulos de propriedade e sacos de dinheiro em uma ilha deserta, sozinhos. Eles imediatamente veem que o que importa não é a quantidade de dinheiro que eles têm, mas, ao invés, o que o dinheiro pode comprar. Nenhum princípio econômico é mais essencial que perceber que, em última instância, riqueza não é dinheiro ou ativos financeiros, mas sim, acesso imediato a bens e serviços reais.
Piketty mal parece perceber essa realidade, e se foca nas diferenças dos portfólios monetários das pessoas. Ele, portanto, ignora o importantíssimo lado da oferta: o que as pessoas – ricos, classe média e pobres – podem comprar com o dinheiro que tem. Ainda mais: na medida em que as desigualdades são absolutamente relevantes, as únicas que realmente importam são as desigualdades de acesso a bens e serviços reais a serem consumidos. Os aposentos de Bill Gates são maiores e mais elegantes que os meus e, eu arrisco dizer, que os seus também. Mas até mesmo aqueles que são os mais pobres dentro de uma economia de mercado viram a capacidade de consumir decolar com o tempo. E quanto mais pobres eles já foram, maior foi a melhoria na capacidade de consumir.
Se nós seguirmos o conselho de Adam Smith e examinar a capacidade das pessoas consumirem, nós descobrimos que quase todo mundo em economias de mercado está ficando mais rico. Nós também descobrimos que as diferenças econômicas reais separando ricos da classe média e dos pobres está diminuindo. Avaliando o padrão de vida – em capacidade de consumir – o capitalismo está criando uma sociedade cada vez mais igualitária.
OS EUA SÃO a bête noire (N do T.: Besta Negra, em francês no original) de Piketty e de outros progressistas obcecados com a desigualdade monetária. Mas a classe média americana dá como certa as casas com ar condicionado, carros e locais de trabalho – junto com os smartphones, viagens aéreas seguras e remédios que tratam de hipertensão até disfunção erétil. No final da Segunda Guerra Mundial, quando as desigualdades de riqueza e renda em termos de moeda eram menores do que tinham sido em qualquer momento do século anterior, esses bens e serviços ou não estavam disponíveis para ninguém ou somente aqueles muito ricos poderiam usufruir deles. Então, independentemente de quantos dólares os plutocratas de hoje acumularam e tem acumulado no portfólio, a acumulação de riqueza das elites não impediu que o padrão de vida das pessoas comuns melhorasse de maneira espetacular.
Além disso, essas melhorias em padrão de vida foram, inegavelmente, muito maiores para as pessoas comuns do que para os ricos. Em 1950, Howard Hughes e Frank Sinatra poderiam, facilmente, pagar por coisas como entregas de pacotes no dia seguinte, conversas telefônicas internacionais de horas de duração e casas com ar condicionado. Para os americanos comuns, entretanto, essas coisas estavam apenas na imaginação. Agora, mesmo que os magnatas e celebridades de hoje ainda tenham acesso a essas amenidades, os americanos de classe média e até mesmo pobres tem acesso a elas também. A redução da diferença entre a riqueza real dos ricos e dos pobres devem acalmar as preocupações em relação aos perigos políticos da expansão da desigualdade no terreno da riqueza monetária.
Falhas no ponto de vista macro do autor também estão a vista quando tentamos pensar em termos humanos sobre a inevitabilidade do retorno sobre capital, de 4% a 5%, que é maior que a taxa de crescimento da economia, que vai de 1% a 1,5%. De acordo com o autor, esta diferença de alguns pontos percentuais, quando acumulada através dos anos, pode fazer com que a desigualdade econômica seja “potencialmente aterrorizante”. Mas dois fatores chaves fazem com que esta tendência dificilmente persista por muito tempo na vida da maioria dos indivíduos.
Para começar, idas e vindas, ao invés de permanência, tendem a caracterizar o padrão da maior parte dos empreendimentos bem sucedidos. Mais cedo ou mais tarde, a entrada de competidores e as mudanças nos gostos dos consumidores freiam o crescimento da empresa, quando não reduz absolutamente o tamanho delas ou as leva a falência. Somente em 2013, 33 mil empresas nos EUA declararam moratória, um número típico em anos de expansão econômica. Em segundo lugar, e mais importante, capitalistas bem sucedidos raramente criam filhos e netos que igualam o sucesso dos ancestrais. Existe uma regressão de volta à média. Note que o aterrorizante, bem sucedido capitalista Bill Gates dificilmente irá ser sucedido por Gates mais jovens preparados para se capitalizarem sobre o sucesso dele.
Podemos até mesmo deixar de lado os planos por parte de pessoas como os Gates e Warren Buffet de doar uma grande parte da própria fortuna, ou o papel redistributivo da filantropia. Os dados empíricos sugerem que a rotatividade é a norma entre os capitalistas ricos, ao invés da construção de uma plutocracia permanente. A lista do “Top 400 declarações de imposto de renda” do I.R.S. (N. do T.: Receita Federal americana) nos dá evidências da instabilidade no topo. Ao longo dos 18 anos, desde 1992 até o fim de 2009, 73% dos indivíduos que apareciam nesta lista, apareceram apenas por um ano. Somente um punhado de indivíduos apareceu na lista em dez ou mais anos. A riqueza se dilui com o tempo, quando deixada para diferentes herdeiros, e se dilui ainda mais graças aos impostos, filantropia e mudanças nas condições de mercado.
AS FALAS DE PIKETTY sobre a estabilidade da riqueza dos capitalistas negam esta realidade. Por exemplo, ele escreve que “[O] Capital nunca é quieto: ele é sempre empreendedor e orientado para o risco, pelo menos na origem, e ainda assim ele sempre tende a se transformar em rendas a medida que ele se acumula em quantias grandes o bastante. Essa é a vocação do capital, o destino lógico”. Leia-se: O elemento de risco, empreendedor na formação de negócios, eventualmente regride em importância até o negócio naturalmente evoluir em direção ao “destino lógico” – o de eterna máquina de dinheiro que regularmente cospe “renda”.
Em um caminho similar, Piketty observa, “O que poderia ser mais natural de pedir a um bem de capital do que pedir para produzir ume renda fixa e certa: este é, de fato, o objetivo de um mercado de capital ‘perfeito’, como os economistas definem”. Pode ser “natural” pedir isto de um bem de capital. Mas somente economistas que tratam sobre mercados “perfeitos” de capital são inocentes o bastante para esperar um “sim” como resposta.
Se Piketty realmente acredita em um mercado “perfeito” de capital, dando aos capitalistas uma renda fixa e certa, ele pode se perguntar porque a gigante e falida rede de livrarias Borders não está vendendo mais livros, enquanto a Amazon  cresceu e desafiou toda a rede de varejistas não-virtuais. No mundo de Piketty, o capitalismo é um sistema de lucros. No mundo real, é um sistema de lucros e prejuízos.
O desprezo de Piketty pelo raciocínio econômico básico cega ele de todas as forças importantes do mercado que trabalham no mundo real – forças essas que, se deixadas livres pelo governo, produzem uma prosperidade crescente para todos. Ainda assim, ele alegremente restringiria essas forças com impostos absurdos.
Louvavelmente, apesar de tudo, ele expressa preocupação sobre o potencial do regime de impostos proposto para expandir o tamanho do governo: “Antes de podermos aprender a organizar eficientemente as finanças públicas equivalentes de dois terços a três quartos da renda nacional”, ele diz,  “seria bom melhorar a organização e operação do setor público existente”. De fato, seria “bom” fazer essas melhorias. Eu gostaria de imaginar que, se Karl Marx fosse vivo hoje, ele iria informar ao colega menos experiente que, infelizmente a 150 anos atrás, socialistas tiveram a mesmíssima ideia. Não funcionou da maneira que eles esperavam.
// Tradução de Daniel Coutinho. Revisão de Ivanildo Terceiro. | Artigo Original

Sobre o autor

Donald J. Boudreaux
Donald J. Boudreaux é professor de economia na George Mason University, e ex-presidente da Foundation for Economic Education (FEE). Autor do livro "Globalization (Greenwood Guides to Business and Economics)", escreve com frequência no seu blog "Cafe Hayek".

quinta-feira, 12 de junho de 2014

A estupidez monumental de Piketty - Peter Schiff

O autor deste artigo, um capitalista de sucesso e sem vergonha de sê-lo, argumenta que o economista francês que quer tirar dos ricos para dar aos pobres é motivado basicamente pela inveja.
Pode ser.
Mas a conclusão que eu tiro da leitura deste artigo é que ele é um estúpido fundamental, já que sua "solução" para o problema da desigualdade -- que eu não considero um problema, obviamente, apenas uma faceta da condição humana -- apenas criaria mais problemas, e não representaria solução alguma.
Em todo caso, leiam com atenção.
Quem quiser ler no original, siga este link: http://finance.townhall.com/columnists/peterschiff/2014/06/02/pikettys-envy-problem-n1846197/page/full
Paulo Roberto de Almeida

O problema de inveja de Piketty

Portal Libertarianismo, 10 de junho de 2014
Não há dúvida de que o novo livro de Thomas Piketty, Capital in the 21st Century (tradução livre, Capital no Século XXI) despertou a atenção do mundo. Na verdade, o fenômeno Piketty (o equivalente econômico à Beatlemania) tem em alguns aspectos se tornado uma história maior do que as ideias em si. Contudo, a popularidade do livro não é de todo surpreendente quando você considera que sua premissa central – como a redistribuição radical de riqueza criará uma sociedade melhor – sempre teve entusiastas (muitos dos quais instigaram revoltas e revoluções). O que é surpreendente, todavia, é que as ideias absurdas contidas no livro possam atrair tantas pessoas que supostamente são inteligentes.
Antes do século XX, o impulso da redistribuição foi refreado somente pelo poder incontestável das classes dominantes e, em menor medida, pelas restrições morais e prática contra o roubo. Karl Marx driblou as objeções morais sob o argumento de que os ricos se tornavam ricos somente por meio do roubo, e que a eliminação da propriedade privada era a chave para o crescimento econômico. No entanto, os resultados funestos das revoluções comunistas do século XX levaram os ventos das velas dos redistribucionistas. Depois dessa derrota, novas ideias eram necessárias para salvar a causa. As 700 páginas de Piketty aparentemente preencheram essa lacuna.
Qualquer pesquisador político dirá que a batalha das ideias é ganha ou perdida nos primeiros 15 segundos. A principal conquista de Piketty não reside na importância do seu livro, ou na sua análise de séculos de estatísticas sobre renda (a qual mostrou sinais de desgaste), mas sim na proposição de uma ideia sedutora e emocionalmente simples: que os ricos enriqueceram porque o retorno sobre o capital investido (r) é geralmente duas a três pontos percentuais maiores anualmente do que o crescimento econômico (g). Portanto, as pessoas com dinheiro para investir (os ricos) sempre enriquecerão, num ritmo mais rápido, do que todas as outras pessoas. O livre mercado, portanto, é uma via de mão única em direção ao crescimento da desigualdade.
Como Piketty vê a riqueza em termos de ganhos de soma zero (alguém enriquece empobrecendo a outrem), ele acredita que o sofrimento das massas aumentará até que esse ciclo seja quebrado por meio de: 1) destruição de riqueza que ocorre durante a guerra ou depressão (o que empobrece os ricos) ou 2) redistribuição de riqueza alcançada por meio da tributação sobre a renda, a riqueza e a propriedade. E embora Piketty pareça admirar os resultados alcançados pela guerra e a Depressão, ele não as defende como políticas. Restam os tributos, os quais deveriam ser majorados o suficiente para evitar as altas rendas e a riqueza sob forma de herança.
Antes de demolir o núcleo de sua tese, devemos nos maravilhar com a absurdidade de sua premissa. No seu livro, ele declara “para aqueles que trabalham para viver, o nível de desigualdade nos Estados Unidos é provavelmente maior do que em qualquer outra sociedade em qualquer momento do passado”. Dado que a igualdade é seu padrão de medida de prosperidade econômica, isso significa que ele acredita que os Estados Unidos é provavelmente o pior lugar possível para uma pessoa não rica ter nascido. Essa é uma declaração muito arrogante. E é verdade, em um sentido muito superficial e limitado. Por exemplo, de acordo com a Forbes, Bill Gates é US$ 78 bilhões de dólares mais rico do que o norte-americano mais pobre. Encontrar outro exemplo de tal disparidade monetária pode ser difícil. Contudo, a riqueza é medida de forma muito mais eficiente de outras formas, através do padrão de vida, particularmente.
Por exemplo, acredita-se que o romano mais rico que existiu até hoje foi Crassus, um proprietário de terras do 1º século antes de Cristo. Em um momento quando uma fatia de pão era vendida por 1/2 de um sestércio, Crassus tinha um valor líquido estimado de 200 milhões de sestércios, ou cerca de 400 milhões de fatias de pão. Hoje, nos Estados Unidos, onde uma fatia de pão custa cerca de US$ 3, Bill Gates poderia comprar cerca de 25 bilhões deles.  Então, quando medida em termos de pão, Gates é mais rico. Mas essa é praticamente a única categoria onde isso é verdade.
Crassus vivia em um palácio que teria estado além da compreensão de muitos romanos. Ele consumia alimentos exóticos e vinhos finos até se saciar, tomava banhos quentes todos os dias, e tinha seu próprio grupo de servos, criados, cozinheiros, artistas, massagistas, artistas de teatro e músicos. Seus filhos possuíam tutores privados. Se a temperatura aumentasse muito, ele era carregado em um veículo privado até sua casa de praia, tendo servos abanando-o 24 horas por dia. Em contraste, os romanos mais pobres, se não estavam acorrentados a remos ou gladiando com feras selvagens na arena, provavelmente estariam trabalhando pesado nos campos comendo nada mais do que pão, se houvesse pão, é claro. Ao contrário de Crassus, eles não tinham acesso a uma dieta variada, saúde, educação, diversão ou água encanada.
Por outro lado, veja como Bill Gates vive em comparação com os norte-americanos mais pobres. A pia usada por ambos é notavelmente similar, e ambos disfrutam de água corrente quente e fria. Gates certamente tem acesso a alimento e plano de saúde de melhor qualidade, mas os norte-americanos não morrem de fome ou caem mortos nas ruas por causa de doenças, além de terem muito mais para comer do que meramente pão. Para entretenimento, Bill Gates provavelmente liga a TV e assiste aos mesmos programas que os norte-americanos mais pobres assistem, e quando a temperatura se eleva, ele liga o ar-condicionado, algo que muitos norte-americanos pobres também podem fazer. Obviamente que virar hambúrgueres no McDonald´s não é algo agradável, contudo, é muito melhor do que ser um escravo de uma galera. A mesma disparidade pode ser detectada em outros momentos da história, de Kublai Khan a Louis XIV. Monarcas e a nobreza alcançou riqueza inimaginável enquanto era cercada de pobreza atroz. A mesma coisa acontece hoje em lugares como a Coréia do Norte, onde Kim Jong-un vive em esplendor enquanto seus cidadãos literalmente morrem de fome.
Desemprego, enfermidades ou deficiências não são sentenças de morte nos Estados Unidos como eram em outros lugares no decorrer da história. Na verdade, é possível ganhar até mais sem trabalhar. Mesmo assim, Piketty quer que acreditemos que a desigualdade nos Estados Unidos hoje é pior do que em qualquer outro lugar na história. Se você pode engolir esse abacaxi, acho que você está preparado para aceitar tudo mais que ele quer servir.
Todos os economistas, independentemente de sua orientação política, reconhecem que o aumento do capital produtivo é essencial para o crescimento econômico. Somos tão bons quanto as ferramentas ao nosso dispor. Alimento, roupas e moradia são muito mais abundantes hoje em relação a 200 anos atrás porque o capital na forma de equipamentos torna os processos da agricultura, manufatura e construção muito mais eficientes e produtivos (apesar das regulamentações governamentais e dos tributos que diminuem essa eficiência). Piketty tenta mostrar que foi além de Marx, reconhecendo os problemas das economias planificadas.
No entanto, ele acredita que o Estado deveria estipular limites sobre a quantidade de riqueza que os capitalistas podem reter dos frutos de seu trabalho. Para fazê-lo, ele imagina alíquotas de imposto de renda que se aproximariam de 80% sobre rendas acima de US$ 500 mil, combinada com uma alíquota anual de 10% sobre a riqueza existente (em todas as suas formas: propriedades, artes, propriedade intelectual, etc). Para ser efetiva, ele argumenta que esses tributos confiscatórios deveriam ser impostos globalmente de forma que as pessoas ricas não pudessem transferir seus ativos para outras partes do mundo, fugindo, assim, da tributação. Ele admite que essas transferências podem na verdade não aumentar a arrecadação tributária, as quais poderiam ser usadas, supostamente, para ajudar os pobres. Em vez disso, ele afirma que a questão principal é simplesmente evitar que as pessoas ricas permaneçam ricas ou que enriqueçam.
Dado que seria ingenuidade presumir que os ricos continuariam a trabalhar e investir no nível atual uma vez que tivessem de encarar as barreiras impostas por Piketty, ele claramente acredita que a economia não sofreria nada com isso. Dado o esforço que é demandado para se obter o lucro e o valor que todo mundo coloca sobre o seu tempo livre, provavelmente todos aqueles empreendedores simplesmente decidirão que 100% de esforço por um retorno de 20% não vale a pena.  Piketty realmente acredita que a economia seria beneficiada se os Steve Jobs e os Bill Gates do mundo simplesmente decidissem parar de trabalhar tão logo fizessem meio milhão de dólares?
Como ele considera a riqueza herdada como o pecado econômico original, ele também advoga políticas tributárias que colocarão um fim nela. O que essa medida alcançaria? Se impedirmos a possibilidade de transferir dinheiro ou propriedade a crianças, as pessoas bem sucedidas tenderão a gastar em serviços de luxo (viagem e entretenimento) do que poupar e se planejar para o futuro. Enquanto a maioria dos economistas modernos acredita que a poupança é prejudicial já que reduz o gasto corrente, ela é, na verdade, o capital que financia o crescimento econômico de longo prazo. Ademais, negócios gerenciados com vistas ao longo prazo tendem a oferecer valor incremental à sociedade. Colocar os filhos nos negócios da família também gera valor, não somente para os acionistas, mas para os consumidores. Contudo, Piketty preferiria que os empresários fechassem as portas antes que seus filhos crescessem e fizessem parte do negócio. Como, exatamente, isso beneficia a sociedade?
Se a renda e a riqueza são cortadas, as pessoas com capital e rendas acima desse limite não terão incentivos para investir ou emprestar dinheiro. Acima de tudo, porque correr o risco quando quase todo o retorno seria perdido em tributos? Isso significa que existirá menos capital disponível para ser emprestado aos negócios e indivíduos. A consequência direta será o aumento das taxas de juros, prejudicando o crescimento econômico. Os tributos sobre a riqueza exercerão pressão altista similar sobre as taxas de juros, através da redução dos volumes de capital que estão disponíveis para empréstimo. Pessoas ricas saberão que qualquer riqueza não gasta será tributada em 10% anualmente, de forma que somente os investimentos com retorno maior do que 10%, por uma margem ampla o suficiente para compensar o risco, deveria ser considerado. Essa é uma grande barreira.
A falha principal nos seus argumentos não é moral, ou mesmo computacional, mas sim lógico. Ele nota que o retorno do capital é maior do que o crescimento econômico, todavia falha em considerar comm o capital “gera” benefícios para todos. Por exemplo, é fácil ver que Steve Jobs recebeu bilhões pelo desenvolvimento e venda de produtos da Apple. Tudo o que você precisa fazer é verificar a conta bancária dele. Contudo, é muito mais difícil, se não impossível, medir o benefício muito maior gerado pelas suas ideias na sociedade. Isso é perceptível se você fizer as perguntas corretas. Por exemplo, quanto alguém teria de pagá-lo para que você, voluntariamente, não usasse a Internet por um ano? Provavelmente, a maioria dos americanos escolheria um valor superior a US$ 10.000 dólares. Isso por um serviço que muitas pessoas pagam menos do que US$ 80,00 mensais (às vezes é até grátis, se você consumir uma xícara de café). Esse diferencial é a “matéria escura” que Piketty não consegue identificar, porque nem mesmo se importa em procurar.
De alguma forma, nas várias décadas de sua pesquisa, Piketty negligenciou o fato de que a Revolução Industrial reduziu a desigualdade como um todo. Os camponeses, que tinham estado presos na agricultura de subsistência por séculos, se encontraram com possibilidades econômicas muito maiores dentro de poucas gerações. Então, enquanto a sociedade feudal era dividida em alguns grupos que eram muito ricos e as massas que eram miseravelmente pobres, o capitalismo criou a classe média pela primeira vez na história e permitiu a possibilidade de real mobilidade econômica.  Como subproduto, alguns dos empreendedores mais bem sucedidos obtiveram as maiores fortunas vistas até então. No entanto, Piketty somente dá importância aos extremos. Isso porque ele, e seus seguidores, são impulsionados muito mais pela inveja do que pelo desejo do sucesso. No mundo real, todavia, onde a inveja não é comestível, o padrão de vida é o que realmente importa.
// Tradução de Matheus Pacini. Revisão de Ivanildo Terceiro. | Artigo Original

Sobre o autor

Peter Schiff
Peter David Schiff (23 de março de 1963) é um autor, empresário e comentarista financeiro dos Estados Unidos. Schiff é o CEO e chief global strategist da corretora de valores Euro Pacific Capital Inc.