Uma de minhas colaborações a livros coletivos mais recentemente publicada:
3948. “O Brasil e a pandemia da covid-19: aspectos internacionais”, Brasília, 10 julho 2021, 22 p. Colaboração à obra coletiva A crise da covid-19 no Brasil e seus reflexos; organizadores: Gleisse Ribeiro Alves, Gabriel Blouin Genest, Eric Champagne, Nathalie Burlone (Brasília: Ceub; 2021; ISBN: 978-65-87823-87-4; p. 77-101); Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/61811047/1427_O_Brasil_e_a_pandemia_da_covid_19_aspectos_internacionais_2021_). Relação de Publicados n. 1427.
O Brasil e a pandemia da covid-19:
aspectos internacionais
Paulo Roberto de Almeida
Colaboração à obra coletiva A crise da covid-19 no Brasil e seus reflexos; organizadores: Gleisse Ribeiro Alves, Gabriel Blouin Genest, Eric Champagne, Nathalie Burlone (Brasília: Ceub; 2021; ISBN: 978-65-87823-87-4; p. 77-101).
Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/61811047/1427_O_Brasil_e_a_pandemia_da_covid_19_aspectos_internacionais_2021_)
Sumário:
1. Introdução: ideologia e negacionismo importados no governo Bolsonaro
2. A lenta e longa marcha do Brasil em direção à vacina: um programa frustrado
3. Conclusão: Bolsonaro, o último negacionista do planeta e a tragédia brasileira
1. Introdução: ideologia e negacionismo importados no governo Bolsonaro
As conexões internacionais da questão da pandemia no caso brasileiro apresentam mais de um aspecto. Por um lado, o fato, relativamente subjetivo, de o presidente brasileiro eleito em outubro de 2918, Jair Bolsonaro, ter colocado suas ações e posturas (internas e externas) no contexto ideológico da chamada “nova direita americana”, ou seja, o movimento que presidiu à ascensão à presidência americana de Donald Trump, em 2016, e que já vinha se manifestando, sob outras roupagens, no continente europeu e em outros continentes em torno de ideias altamente conservadoras: fundamentalismo religioso, antiglobalismo, rejeição da imigração de povos “exóticos” e agenda de costumes, de maneira geral (antiaborto, ideologia de gênero, minorias sexuais, etc.); essas ideias, ademais das próprias posturas e declarações do presidente Trump pautaram, e de certa forma moldaram, o comportamento e as posturas do seu colega brasileiro – chamado pelos jornalistas americanos de “Trump dos trópicos”– no enfrentamento (ou falta de, mais corretamente) da pandemia.
De outro lado, num contexto mais objetivo, uma visão, mesmo perfunctória, em escala comparativa internacional confirma os resultados nitidamente negativos registrados pelo governo Bolsonaro no enfrentamento do desafio da pandemia quando colocados no contexto mundial, sendo imediatamente visível o mau desempenho do governo federal ao se confrontarem os números de infectados e mortos (em proporção da população, não de modo absoluto) com países relativamente similares. Comparações internacionais, feitas em forma de gráficos, tabelas ou simples alinhamentos estatísticos, revelam a performance deplorável do governo de Bolsonaro, até meados de 2021, no tocante ao acúmulo de milhares de vítimas “excedentárias” (em relação ao número de habitantes), do que se observou ser o caso, quando verificados os mesmos indicadores em países cujos governantes empreenderam ações mais decisivas nessa área. Nesse sentido, Bolsonaro se distanciou, neste quesito, em relação à postura de outros dirigentes nacionais, mesmo declaradamente de direita, como ele pretende ser.
Todavia, mesmo num registro mais linear, são impactantes os indicadores brasileiros no confronto com outros países, o que vem sendo registrado por algumas instituições internacionais dedicadas ao cômputo dos dados relativos à incidência da pandemia. Em diversos momentos desde o início da pandemia, em 2020, o Brasil foi sucessivamente apresentado como o “homem doente da América do Sul”, como um possível super spreader de novas variantes do vírus e como um país irresponsável no tratamento da sua própria população, tendo enfrentado o fechamento de diversas fronteiras e de aeroportos em conexões internacionais para outros continentes.
Esses aspectos internacionais merecem, portanto, uma atenção especial neste ensaio sintético. Três países se destacam relativamente aos vínculos internacionais do governo Bolsonaro na questão da pandemia da covid-19: os Estados Unidos, em primeiro lugar, ou mais especificamente o presidente Trump, pelo menos durante a ascensão e propagação no novo vírus, no decorrer de 2020; a China “comunista”, objeto do desconforto aberto ou implícito da diplomacia “bolsonarista”, quando não sujeita à hostilidade explícita por parte de “responsáveis” do setor – oficialmente da parte do primeiro chanceler, de modo oficioso pelo filho deputado do presidente –, sendo o gigante asiático o principal parceiro comercial e potencial grande investidor no Brasil, ademais de fornecedor de primeira grandeza de todo tipo de equipamentos médico-sanitários, bem como de vacinas e insumos para a fabricação de vacinas no Brasil; a Índia, finalmente, em posição relativamente secundária, mas elevada ocasionalmente à condição de grande parceira na área vacinal, já em 2021, justamente em função das antipatias acima referidas.
Esses três países estiveram e estão presentes em grande parte do debate interno – do governo com a sociedade, assim como dentro do Parlamento – na sequência registrada quanto ao conteúdo mesmo desse “debate” (bastante confuso, por sinal): o presidente Trump, na origem do negacionismo de Bolsonaro durante toda a fase ascensional da pandemia; a China, como a primeira fornecedora confiável de equipamentos e vacinas entre o final de 2020 e o início de 2021, mas com a qual (e com o seu embaixador em Brasília) foram travados diversos embates pouco diplomáticos em diversos episódios, sendo que estes também exibem conteúdo político doméstico, dado o relacionamento próximo do governador de São Paulo, candidato à presidência em 2021, com os chineses (o estado possui um escritório oficial de representação em Xangai); a Índia, finalmente, já no decorrer do primeiro semestre de 2021, em direção da qual são feitas tentativas desesperadas do governo federal de aquisição de vacinas, justamente para diminuir o papel da China nesse fornecimento, sendo que as iniciativas revelaram demonstrações evidentes de corrupção, em análise na Comissão Parlamentar de Inquérito (de âmbito senatorial), após duas fases iniciais dedicadas a “tratamento precoce” e a falhas do governo federal no atendimento de demandas dos estados.