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quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

O silêncio do Brasil sobre a derrocada da democracia na Guiné-Bissau - Vanicleia Silva Santos, Marcos Leitão de Almeida, Abdulai Silá (FSP)

 O silêncio do Brasil sobre a derrocada da democracia na Guiné-Bissau País que busca liderança no Sul Global está omisso diante de virtual ditadura 

 Vanicleia Silva Santos, Professora na Universidade da Pensilvânia (EUA); Marcos Leitão de Almeida, Professor na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) Abdulai Silá, Escritor guineense 
Folha de S. Paulo, 

A Guiné-Bissau é lembrada pelos brasileiros por sua conexão ancestral com as populações afrodescendentes, especialmente na região amazônica. Após uma longa história de escravidão, colonialismo português e independência conquistada em 1973, o país africano enfrentou desafios políticos e sociais. A guerra civil de 1998-99 deixou marcas duradouras. Desde então, a democracia tem sido instável, com frequentes mudanças de governo. Em 2020, o general Umaro Sissoco Embaló, conhecido como o "Bolsonaro da África", ganhou as eleições com um discurso religioso e étnico, voltado para as populações muçulmanas do país. Seu governo é marcado por tensões com a Assembleia Nacional Popular e o Judiciário, além de uma crise econômica persistente.

 Em fevereiro de 2022, ocorreu uma suposta tentativa de golpe de Estado, seguida por tensões políticas. Em junho de 2023, a oposição obteve maioria absoluta nas eleições parlamentares, mas o presidente se recusou a indicar o líder do partido vencedor como primeiro-ministro. Com a finalidade de buscar a conciliação, a coligação vencedora indicou outro nome, que foi aceito e, então, formou-se o novo governo. No entanto, em dezembro de 2023, alegando outra "tentativa" de golpe, Sissoco dissolveu o Parlamento, sem respeitar a constituição. Para piorar, ele escolheu e nomeou um novo governo, sem consulta, e não estabeleceu data para novas eleições para o Congresso, indicando que poderão ser realizadas somente no final deste ano.

 Diante das intenções ditatoriais do presidente, a oposição convocou uma manifestação pela democracia em 8 de janeiro último, mas a polícia dispersou os manifestantes antes mesmo de o ato começar. Portanto, está caracterizado o caráter ditatorial do golpe institucional e a violação da Constituição da Guiné-Bissau. Durante os dois primeiros governos Lula, o Brasil passou a ter uma presença na Guiné-Bissau com alguns programas de cooperação na área de segurança e da massiva vinda de estudantes guineenses para estudar nas universidades brasileiras.

 Isso gerou um saldo muito positivo, como a formação de milhares de quadros qualificados para a Guiné-Bissau, que possui precária estrutura de ensino superior. O impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016 e os governos seguintes mudaram as prioridades diplomáticas brasileiras para a África. O governo Lula 3 representa uma esperança na retomada das relações Brasil-África. Porém, o país está omisso diante desta ditadura virtualmente instaurada na Guiné. 

O Itamaraty emitiu apenas uma nota curta na qual declara que "acompanha com preocupação a corrente situação na Guiné-Bissau, no âmbito da qual foi recentemente dissolvida a Assembleia Nacional Popular, eleita em julho passado. O Brasil insta ao diálogo entre as partes e conclama as autoridades ao respeito dos direitos fundamentais". Esta fraquíssima nota pública contrasta com o enorme esforço diplomático do governo para dialogar nos conflitos na Ucrânia, Venezuela e em Gaza, por exemplo. Apesar de haver muitos países envolvidos nos casos citados, o Brasil buscou se apresentar como mediador. 

No entanto, no caso da Guiné-Bissau, onde há uma enorme conexão com o Brasil, o governo segue se omitindo, deixando os diálogos com Portugal e até mesmo com os EUA. Esse episódio nos lembra que, em 1974, Samora Machel questionou a ausência do Brasil durante a luta contra o colonialismo e recusou a presença brasileira na celebração da independência de Moçambique e a abertura de uma embaixada em Maputo. Portanto, o Brasil não pode negligenciar essa grave ameaça à democracia em um momento em que busca a liderança do Sul Global. 

O país deve dialogar ativamente entre as diferentes partes para defender a democracia e os direitos humanos também na Guiné-Bissau. A valorização dos laços com a África deve ir além da celebração das ancestralidades africanas em nossa sociedade e se efetivar em uma verdadeira cooperação.  

quarta-feira, 7 de junho de 2023

Ucrânia se queixa de silêncio do Brasil sobre explosão de barragem de hidrelétrica - Felipe Frazão (O Estado de S. Paulo)

 Ucrânia ainda aguarda uma nota do Itamaraty, alguma manifestação do governo brasileiro sobre a destruição da barragem e a inundação por ela provocada. (PRA)


Ucrânia se queixa de silêncio do Brasil sobre explosão de barragem de hidrelétrica

Por Felipe Frazão

O Estado de S. Paulo, 06/06/2023 | 22h27


BRASÍLIA - O governo da Ucrânia esperava mais “apoio” do Brasil e gostaria que o governo Luiz Inácio Lula da Silva levantasse a voz contra a explosão da barragem de Kakhovka, disse nesta terça-feira, dia 6, a embaixada do país em Brasília. A detonação da barragem da usina hidrelétrica é considerada por Kiev um ato de terrorismo provocado pela Rússia.

O encarregado de negócios ucraniano, Anatoliy Tkach, atualmente chefe da missão diplomática no País, disse ter informado o Itamaraty sobre o incidente na represa e a situação de emergência, mas afirmou que não recebeu nenhuma resposta.

“Evidentemente gostaríamos de contar com a condenação do governo brasileiro contra atos de terrorismo em massa”, afirmou Tkach. “A embaixada informou ao governo sobre a explosão na usina de Kakhovka. Até o momento não temos um comunicado do governo brasileiro. Gostaríamos de ter um maior apoio nas situações críticas, em particular como nessa da usina.”

Até a noite desta terça-feira, a diplomacia brasileira não havia publicado nenhuma nota sobre o caso, o que contrasta com reações de conflitos em outras partes do mundo, como na África e no Oriente Médio. O presidente Lula também não falou sobre o assunto.

Segundo Tkach, os russos tinham como objetivo atrapalhar a contraofensiva militar ucraniana, na tentativa de recuperar terreno na região e fazer as forças russas recuarem. Segundo ele, os danos causados pelos russos pretendiam ainda provocar mortes, seja de civis ou militares. O diplomata afirmou que Kiev ainda não contabilizou as vítimas.

“Isso é um crime de guerra, cometido intencionalmente, e foi planejado. As Forças Armadas russas discutiram essa possibilidade, assim como propagandistas russos na TV”, disse o encarregado de negócios a jornalistas. “A Rússia é totalmente responsável. A explosão da barragem é o maior desastre causado pelo homem na Europa nas últimas décadas. Não há dúvida de que a destruição proposital da barragem foi realizada pelos invasores russos para criar um desastre ecológico e complicar a desocupação dos territórios ucranianos. É mais um crime inédito que terá consequências ecológicas, econômicas e que ameaça a radiação e a segurança alimentar. Os efeitos serão sentidos não só pela população do Sul da Ucrânia, mas também dos outros países.”

O governo de Volodimir Zelenski considera que os russos planejaram um ato de sabotagem. Eles falam em “terrorismo” contra a infraestrutura crítica da Ucrânia. Segundo o diplomata, autoridades ucranianas já sabiam que os militares russos haviam instalado, há cerca de um ano, explosivos na barragem da usina hidrelétrica, que fica em uma região ocupada por Moscou. Ele diz que um míssil não causaria danos comparáveis em extensão.

A explosão vai alagar cerca de 80 assentamentos civis e pode afetar a produção agrícola na área. A barragem, localizada na cidade de Nova Kakhovka, sustentava um volume de 18 milhões de metros cúbicos de água. Ao menos 42 mil pessoas deveriam ser removidas, sendo 17.130 no território controlado por forças ucranianas, na marquem esquerda do rio Dnipro, e cerca de 25 mil em terreno sob comando russo, na margem direita. As estimativas são do governo ucraniano.

A expectativa de Kiev é que a água continue a subir nas cidades por ao menos cinco dias e que o nível caia ao longo do tempo. A altura máxima ainda não foi atingida. Haverá problemas para abastecimento de água potável nas regiões de Kherson, Dnipro, na península da Crimeia e Zaporizhzia.

A usina nuclear em Zaporizhzhia é abastecida com água da mesma represa, cujo nível caiu, mas segundo a embaixada da Ucrânia ainda não há risco maior apresentado ao funcionamento até o momento.

A cobrança da Ucrânia ocorre depois do desencontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Volodimir Zelenski, em Hiroshima, no Japão, por ocasião da cúpula do G-7. Questionado sobre o episódio, o chefe da missão ucraniana disse que continua em contatos com o governo brasileiro e que há intenção de um diálogo de alto nível. Ele repetiu a versão oficial de que houve uma incompatibilidade de agendas durante o G-7. Antes, Lula dissera que Zelenski não apareceu para a conversa, enquanto o presidente da Ucrânia afirmou que não foi o culpado pelo desencontro.

O diplomata apelou que os “parceiros internacionais” apoiem a “fórmula da paz” proposta por Zelenski. O plano com as condições de Kiev para o fim do conflito inclui dez pontos, como segurança nuclear, ambiental, energética, punição pelos crimes, devolução total das áreas tomadas e libertação de presos. A proposta difere dos termos que Lula considera factíveis - o presidente já disse que tanto Zelenski quando Vladimir Putin tenham que ceder um pouco.

https://www.estadao.com.br/internacional/ucrania-se-queixa-de-silencio-do-brasil-sobre-explosao-de-barragem-de-hidreletrica/