As perguntas abaixo foram respondidas a um jornalista espanhol, que preferiu dirigir-me as perguntas em inglês, mas alertando que eu poderia responder em português. Sequer reli o que respondi na ocasião, em
24 de maio de 2004, mas todas as respostas devem ser lidas no contexto da época.
Relações Mercosul –União
Européia
Respostas a questionário
Paulo Roberto de Almeida
(www.pralmeida.org; Brasília,
24 maio 2004)
1) Do you think
it is possible to concrete an agreement among The European Union and Mercosur
in order to sign up the final agreement in November? What do you thing are the major problems that
could explain the fact that this
agreement had been postponed so many times?
PRA: É, sim, possível um acordo
entre o Mercosul e a UE, mas não acredito que ele seja abrangente como poderia
ser, ou verdadeiramente caracterizado pelos princípios do livre comércio. Por
caracterísitcas próprias a cada bloco, o acordo será o reflexo dos
protecionismos setoriais que bloquiam uma verdadeira liberalização abrangente,
convertendo esse acordo em algo mais do que comércio administrado. Ainda assim,
a situação do comércio recíproco estará facilitada, e novos fluxos de
intercâmbio vão se estabelecer.
Os problemas principais se situam,
por um lado, no renitente, reiterado e injusto protecionismo agrícola europeu
e, por outro lado, no renitente, reiterado e irracional protecionismo
industrial e de serviços por parte do Mercosul. Nenhum dos lado parece disposto
a fazer um verdadeiro esforço para se libertar desses protecionismos setoriais,
que prejudicam em primeiro lugar seus próprios consumidores, ainda que
beneficiem os lobbies agrícolas, industriais e comerciais com eles
identificados.
Em outros termos, teremos
liberalização parcial dos fluxos de comércio mas não verdadeiramente livre
comércio.
2) If the
parties don´t make any agreement, do you think that might be harmful for the
progresses of Mercosur carried out by Lula´s initiatives? Could this disagreements change the mind of the members
of MERCOSUR in relation to ALCA in
detriment of the European Union? Could this be perjudicial for MERCOSUR in
relation to its subregional identity?
PRA: Não há uma relação direta entre
os progressos internos ao Mercosul e os acordos comerciais que este bloco possa
fazer externamente, nos planos regional (com a CAN, por exemplo), hemisférico
(Alca), birregional (com a UE) e multilateral (OMC). O Mercosul padece de
problemas internos que derivam de suas fortes assimetrias macroeconômicas e
sociais, bem como da incapacidade política dos governos dos países membros em internalizar
de fato as medidas propostas, discutidas, acordadas e muitas vezes adotadas,
que independem do aprofundamento da liberalização comercial externa para serem
implementadas.
Por outro lado, progressos da
liberalização nos planos regional e multilateral podem estimular, ou induzir, o
Mercosul a aprofundar seu próprio processo de integração, na medida em que se
não o fizer ele pode se tornar irrelevante do ponto de vista das preferências
internas ou retirar legitimidade intrínseca ao próprio processo de integração.
Do ponto de vista político,
persistem inclusive diferenças de percepção, entre os países membros do
Mercosul, entre as vantagens respectivas da Alca e do acordo com a UE, segundo
os parceiros. Uruguai e Argentina parecem privilegiar um acordo na Alca, ao
passo que o Brasil, por razões essencialmente políticas do partido que agora
ocupa o poder (PT), parece privilegiar um acordo com a UE, por considerá-lo
mais benéfico. Trata-se, porém, em grande medida, de preconceito contra os
Estados Unidos e a Alca.
Não há uma definição clara do que
poderia ser prejudicial para o Mercosul em termos de identidade regional, uma
vez que a maior parte dos países parece enfatizar a importância de uma relação
mutuamente proveitosa com os Estados Unidos e vêem como positivo um acordo no
âmbito da Alca, ao passo que o Brasil inclina-se mais favoravelmente a um
acordo com a UE.
3) Do you think that the enlargement of the
European Union can be harmful for the agreement between the European Union and
Mercosur?
PRA:
Os efeitos são diversos e complexos, mas motivos de preocupação existem, na
medida em que todo bloco comercial, restrito ou amplo, sempre significa um
certo potencial de desvio de comércio. A ampliação do bloco europeu poderá
significar maior desvio de comércio intra-bloco e portanto menores
oportunidades para exportações a partir do bloco do Mercosul. Deve-se
igualmente considerar os efeitos em termos de reforço de certas políticas
negativas como o subvencionismo interno e externo na área agrícola, onde estão
concentradas as vantagens comparativas do Mercosul.
Ou seja, mesmo que exista um acordo
Mercosul-UE, ele pode produzir efeitos limitados em vista da ampliação da UE
aos novos países membros.
Por outro lado, em outras linhas
produtivas, o mercado europeu pode estar ainda mais atrativo, pela sua nova
amplitude e extensão.
4) One of the items is the beginning of a
possible agreement with the Andinean
Countries and Central America, do you think it would take so more time
as the negotiations with MERCOSUR?
PRA:
Já existe um acordo de princípio entre o Mercosul e a CAN, que se aproxima mais
do conceito de preferências tarifárias do que de livre comércio, mas
progressivamente os intercâmbios entre as duas regiões vão se intensificar.
Não há, por outro lado, nenhum
progresso real em termos de acordo comercial entre o Mercosul e países da
América Central, que sempre vai estar mais vinculada aos mercados da América do
Norte, a começar pelos Estados Unidos.
5) Do you think that the cooperation between
Kirchner, Lula and Chaves could benefit the estrategic assotiation between the
two regions? Why this cooperation, this
new way of cooperation that was very important two in the creation of G-3 and G-20?
PRA:
Não há essa cooperação tripartite, mas tão somente uma excelente cooperação,
institucionalizada, entre o Brasil e a Argentina, com maior aproximação
política dependendo dos presidentes (o que parece ser o caso agora com Lula e
Kirchner), e uma certa aproximação política entre esses dois países e a
Venezuela de Chavez, mas este dirigente parece ter problemas mesmo com aqueles
outros líderes que poderiam ser seus aliados na defesa da legalidade, ao
administrar mal a crise política da Venezuela.
Não há esse G-3 entre os três
países, pois o únicoG-3 de que se fala atualmente no Brasil é o esquema que
aproxima este país da África do Sul e da Índia. O outro G-3 da América Latina
refere-se a um acordo de liberalização comercial Chile-México-Colômbia,
concluído na Aladi, no início dos anos 90.
O G-20, por sua vez, tem vida
própria e está mais vinculado às posições negociadoras em agricultura na OMC do
que a qualquer esquema político na América do Sul.
6) Do you think Spain is vitalizing the
relations between the two regions in this third meeting? What is the balance of
the Spain initiatives in the last two?
PRA: A Espanha tem desempenhado um
papel fundamental não apenas nos processos de cooperação política e econômica
(cúpulas ibero-americanas e euro-latino-americanas), como também na
implementação prática da interdependência econômica recíproca, ao ser um dos
maiores investidores, se não o maior, na região. Ela continuará a ter um papel
relevante nesses processos político-diplomáticos e econômicos, voltando a
dispor, em conseqüência, de um poder político e econômico que ela nunca mais
tinha tido desde o final da dominação colonial sobre o continente. Esse poder,
obviamente, é feito atualmente em benefício de todos os povos da região e da
Espanha.