O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 23 de setembro de 2018

Meu trabalho n. 2000 (2009) - Paulo Roberto de Almeida

Ao chegar ao trabalho 3333, neste domingo 23 de setembro, fui revisitar alguns trabalhos anteriores sob números representativos. Não encontrei nada nas centenas precedentes, mas encontrei um especialmente elaborado – todos os anteriores simplesmente receberam a numeração serial de quando ficaram prontos, sem qualquer "reserva numérica" – para o "segundo milenário", que foi este aqui, quando eu estava voltando do Meio Oeste americano, visitando mais uma vez Nova York.
Por que o transcrevo novamente? Porque estou fazendo um especial para o número 3333. Apenas isto. Vejamos o que escrevi, nove anos atrás: 
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 23/09/2018

Um balanço da produção e seu sentido...
reflexões livres por ocasião do trabalho n. 2000

Paulo Roberto de Almeida
New York, 2000, 28/04/2009

A título de introdução
Números redondos convidam a um balanço e, por vezes, a comemorações. Acabo de participar de um colóquio, na Universidade do Wisconsin em Madison, sobre os cem anos do ‘commencement speech’ escrito pelo Joaquim Nabuco, em 1909, e meu trabalho – sob o titulo de “The share of the United States and Brazil in the modern civilization: A centennial homage to Joaquim Nabuco’s commencement speech of 1909” (Urbana, 23 abril2009, 15 p.; paper presentedat the Symposium: Nabuco and Madison: A Centennial Celebration - Madison, WI: University of Wisconsin, April 24-25, 2009) – recebeu justamente o número 1999. Este texto, escrito em sua imediata seqüência, receberá, portanto, o número 2000, o que não deixa de provocar algum excitação, se este último termo se aplica, efetivamente.
Talvez, na medida em que são dois mil trabalhos que podem receber essa designação – isto é, textos acabados e completos, destinados ou não a publicação, mas em todo caso podendo corresponder a esse nome, posto que possuindo coerência intrínseca, tendo começo, meio e fim – ao longo de mais ou menos 40 anos de produção intelectual registrada. De fato, meu arquivo de originais, no momento de sua organização – em torno de 1986, aproximadamente –, registrava um primeiro trabalho escrito em maio de 1968, com cópia em carbono preservada: se tratava de um ensaio escrito sob pseudônimo para um concurso de trabalhos escolares: “001. ‘Quais os Fatores que Determinam uma Escolha Profissional Consciente?’ (São Paulo, Maio 1968, 9 pp. Trabalho escrito para concurso promovido pelo jornal Folha de São Paulo).” Mais tarde, graças a encontros com colegas do Ginásio Estadual Vocacional Osvaldo Aranha (Brooklin Paulista, na cidade de São Paulo, entre 1962 e 1964), vim a descobrir dois outros trabalhos escritos em 1964, que por enquanto não foram numerados, no aguardo de mais alguma pesquisa geológica ou arqueológica em fundos documentais onde sei existirem antigos trabalhos meus (jornal do Grêmio Estudantil do curso clássico, justamente, ou mais exemplares do jornal ginasial). 
Se formos dividir o número total cronologicamente, daria mais ou menos 50 trabalhos por ano, mas é óbvio que o número se acelerou nos últimos anos, with a little helpdas tecnologias de processamento da informação e de comunicação. Antigamente, sem querer ser redundante, dava o maior trabalho fazer trabalhos. Era preciso preparar uma versão manuscrita mais ou menos organizada e depois começar a datilografia cuidadosamente nas folhas de papel, de preferência com carbono e folhas de seda atrás, pois as tecnologias de cópia eram de difícil acesso ou muito caras. Era preciso ficar cuidando das margens, das separações de palavras, das notas de rodapé, e sobretudo datilografar com cuidado, para evitar erros, rasuras, correções e outras imperfeições estilísticas, que poderiam comprometer a boa apresentação do “trabalho” (sim o termo se justifica, estrito e lato senso). Mesmo quando fiz a minha tese de doutoramento – dois pesados volumes com mais de 500 páginas no total – o trabalho permanecia quase o mesmo, ainda que contando com uma poderosa IBM elétrica, de esfera (inclusive uma exclusiva para itálicos, exigindo a troca a cada vez) e com copiadora própria, ambos um pesado investimento próprio, ainda mais que pagos num dos países mais caros do mundo, na Suíça. Conclusão: até hoje não disponho do teor da tese integramente em meu computador, assim como diversos outros trabalhos escritos antes de 1987 (data da compra de meu primeiro Macintosh).
Não pretendo aqui – ou neste momento, pelo menos – oferecer um balanço puramente contábil de minha produção, ainda que eu possa indicar, rapidamente, os números envolvidos (numa abordagem geográfico-quantitativa, ao final). Basta com dizer que os trabalhos só recebem número, data e local, quando são considerados terminados, arquivados sob esse número em pastas anuais, com listas cronológicas geralmente divididas por ano e local principal de residência naquele ano. Uma outra lista, necessariamente menor, apenas lista os trabalhos publicados, mas deixei de preservá-los em arquivos independentes em pastas próprias, pois representaria uma duplicação de arquivos (embora provavelmente útil, posto que alguns trabalhos publicados diferem ligeiramente, por diversas razões, dos originais registrados). Cópias físicas de originais e publicados foram feitas até o ano de 1998, ocorrendo aí, portanto, uma lacuna de mais de dez anos sem suporte físico completo (o que caberia providenciar em algum momento). Mas estas são preocupações secundárias neste momento de registro do trabalho número 2000.
Talvez seja mais útil tecer algumas considerações sobre o sentido da produção e minhas reflexões a esse respeito, inclusive porque, no momento da redação do trabalho número 1000 eu estava muito ocupado com trabalhos atrasados ou urgentes e deixei passar a oportunidade do devido registro comemorativo, o que cabe agora remediar. Não o faço por vaidade, ou egocentrismo (embora tais sentimentos possam ser justificados ou legítimos, em seu mérito próprio), mas apenas para responder a meu espírito de historiador improvisado. Acho que todo e qualquer esforço intelectual merece ser retraçado em suas origens e circunstâncias, já que esses trabalhos sempre responderam a alguma necessidade interna ou foram motivados pelo ambiente em que me encontrava vivendo e produzindo durante a sua elaboração. 

Da necessidade da escrita (e seu registro)
Desde quando comecei a ler, na “tardia” idade de sete anos, sempre fiz notas de livros e elaborei trabalhos em torno dessas leituras. Já não tenho certeza se foi no ‘quinto’ ano do primário ou no primeiro do ginasial que impressionei a professora com meu conhecimento de história ‘clássica’, que nessa época queria dizer Grécia e Roma antigas. Devo isto graças à leitura de Monteiro Lobato: não apenas História do Mundo para as Crianças, mas também O MinotauroOs Doze Trabalhos de Hércules(bem, tive de deixar a Emília de lado, nesses relatos sérios, mas ela merecia ter feito parte do trabalho...).
Na partida para a Europa, tive de deixar muitos registros para trás, mas passei a acumular cadernos de leituras, alguns dos quais já foram resumidos em um post antigo em um dos meus blogs (ver: 17) Meus cadernos de leitura (1971-1983); link: http://vivendocomlivros.blogspot.com/2007/06/17-meus-cadernos-de-leitura-1971-1983.html#links). Muitas leituras foram feitas a partir de uma pequena bibliografia de mais ou menos 500 livros, que eu tinha feito para ler sistematicamente (não devo ter chegado nem a 10% da lista, mas em compensação li muitos outros livros, provavelmente mais interessantes): os interessados em saber quais são, podem referir-se a outro post (34. Uma 'pequena' bibliografia para leitura e notas; link: http://vivendocomlivros.blogspot.com/2009/04/34-uma-pequena-bibliografia-para.html#links). De todas essas leituras, emergiram trabalhos acadêmicos ou artigos independentes, vários dos quais publicados, mas de forma não sistemática e muitas vezes sem o devido registro ou preservação de originais. 
Minhas listas de trabalhos originais e de publicados podem ser conferidas no seguintes links respectivos de meu site pessoal (http://pralmeida.org/originais/) e (http://pralmeida.org/publicados/), uma construção muito posterior à organização desses arquivos e feita não por narcisismo e sim para atender a demandas de alunos por informações em torno de questões relativas à integração regional e ao Mercosul, portanto, com objetivos didáticos muito definidos. 
E por que essa compulsão, quase uma obsessão pela escrita e eventual publicação de trabalhos? Confesso que não sei fornecer uma resposta única, exclusiva ou especificamente válida a esta pergunta: alguns podem achar que é por exibicionismo pessoal, o que provavelmente não explicaria a enorme diferença entre o número de originais e o dos trabalhos efetivamente publicados, o que indica que escrevo por necessidade interior, quase uma segunda natureza, ou inclinação natural. Comecei de maneira informal, mas como as notas e manuscritos se multiplicavam, com muitas cópias carbono feitas – muitas delas sem registro preciso quanto a local e data –, logo senti a necessidade colocar ordem na bagunça. Daí surgiram as listas seriadas e depois a organização dos originais em pastas de classificados, uma providência praticamente dispensada na era do computador e dos arquivos eletrônicos (nem sempre adequadamente preservados em back-ups regulares, o que é sempre um risco, como todos sabem). 
Enfim, creio que não preciso justificar o ato da escrita, inerente a todos os que lêem intensamente – OK, nem todos – ou pelo menos no caso daqueles que também possuem uma preocupação didática, ainda que indireta, como é o meu caso (ou seja, não o faço por ser professor, pois apenas exerço a atividade por vontade própria, não por necessidade ou como ocupação principal, sempre em detrimento do lazer ou descanso pessoal). Poderia apenas parafrasear Descartes: “Leio, logo escrevo” (por favor, alguém versado em latim, me transcreva esta frase, para ficar bonita...).

O que o Brasil fez por mim (e o que eu, pretensamente, estou fazendo por ele)
Não sou dado a patriotismos, nem a chauvinismos ultrapassados e um pouco ridículos. A nacionalidade é um acidente geográfico, partindo do ponto de vista da unidade fundamental da espécie humana. Sou brasileiro, como poderia ter nascido esquimó ou hotentote, e ninguém seria responsável por esse acaso demográfico, nem mesmo meus pais, posto que ninguém ‘fabrica’ uma personalidade humana com base em especificações pré-determinadas. Somos em grande parte (mas provavelmente não a mais decisiva) o resultado da herança genética, em outra parte o resultado do meio e das influências que experimentamos em diversas etapas formativas, mas também (uma parte que espero substancial) o produto de nossa formação ativa, por meio dos estudos empreendidos e dos esforços que nós mesmos fazemos para moldar um estilo de vida e um padrão de pensamento com base em escolhas e preferências que foram adotadas ao longo de toda uma vida, especialmente em seu primeiro terço.
Tendo nascido no Brasil, de pais descendentes de imigrantes europeus analfabetos, ainda assim beneficiei-me da herança cultural européia, visivelmente dotada de maior densidade do que a média brasileira tradicional, ou seja, um substrato desprovido de maior sofisticação técnica ou instrumental em relação aos requisitos modernos de uma sociedade caracterizada por uma produtividade satisfatória. O que o Brasil meu deu, uma vez iniciado o processo de escolarização (entre meados dos anos 1950 e meados da década seguinte), foi uma escola pública de qualidade razoável para os padrões conhecidos ulteriormente (e certamente no período recente). Esse ensino, a cargo de professoras ‘normalistas’, foi complementado por uma freqüência regular e intensa a uma biblioteca pública infantil – depois batizada de Anne Frank, no Itaim-Bibi, bairro da zona sul de São Paulo – onde devo ter lido praticamente todos os livros interessantes, dos quais guardei enormes e boas lembranças: lia quase todas as tardes – quando não me desviavam para alguma pelada de esquina – e ainda levava um ou dois para ler em casa, noite adentro (a ausência de televisão ajudou-me enormemente, e não por escolha própria, pois no final da tarde íamos assistir National Kid ou o Patrulheiro Rodoviário na casa de um vizinho). 
Na verdade, não sei dizer se foi o Brasil quem me deu a chance de ingressar numa faculdade pública de boa qualidade – o curso de Ciências Sociais da USP, a partir de 1969 – ou se foi o meu próprio esforço de leituras intensas, aliás alternadas com o trabalho desde muito jovem. Daí o meu hábito de ler em toda e qualquer circunstância, anteriormente em ônibus ou trem, ou andando, depois diretamente em bibliotecas e livrarias, ou até dirigindo (o que não recomendo a ninguém...). Acho que foi apenas isto que o Brasil de fato me deu, além, involuntariamente, de uma consciência aguda sobre problemas sociais, miséria, pobreza, desigualdades, políticas econômicas (e suas conseqüências sempre surpreendentes...) e as muitas soluções propostas para resolver esses problemas. A adesão à sociologia – a arte de resolver rapidamente os problemas do Brasil, segundo Mário de Andrade – e ao socialismo veio naturalmente, sem qualquer ânimo ‘religioso’, porém, posto que sempre li materiais de todas as escolas filosóficas e tendências políticas. 
Dito isto, pode-se dizer que o que o Brasil não me deu foi um bom ambiente de debate intelectual sobre essas questões, já que a qualidade intelectual da ‘pesquisa’ – se é que ela existe, de fato – é precária, para dizer o mínimo, com muita bobagem passando por argumentação de qualidade. E o que eu estou tentando ‘devolver’ ao Brasil, se ouso dizer? Como valorizo tremendamente os estudos, e acredito que a sociedade brasileira, como um todo, foi capaz de oferecer-me, numa determinada época, uma educação de qualidade relativamente satisfatória, julgo-me no dever de ‘devolver’ à sociedade parte do que recebi, contribuindo para que outros jovens, em situação talvez similar à minha na mesma faixa etária possam dispor de condições adequadas para também disputar uma posição condizente com suas aspirações. Como fazer isso? Bem, talvez exercendo também atividades docentes, embora consciente de que não estou atingindo os mais necessitados: mas já terá sido uma contribuição boa se eu conseguir atuar em direção dos ‘multiplicadores’ de conhecimento, ou seja, pela formação dos formadores, posto que muitos dos meus alunos poderão se dirigir para o sistema de ensino de primeiro ou de segundo grau.

Onde pretendo chegar com tantos trabalhos?
Boa pergunta, mas não sei responder, sinceramente. Certamente não estou em nenhum concurso quantitativo, nem sei se existe algum Guinness para volume de originais, o que aliás importa pouco. O mais relevante é aprender com as leituras, sintetizar o que se aprende nos livros – e não observação direta da realidade – e transmitir o conhecimento adquirido em linguagem adaptada aos novos receptores, provavelmente jovens que não tiveram acesso ao volume de livros e de informações (em diversas línguas) de que disponho em virtude de circunstâncias excepcionais. 
Provavelmente preciso fazer um balanço qualitativo da minha produção e passar a trabalhar menos – ou em menor velocidade de escrita – e melhor, com trabalhos mais focados sobre aspectos específicos das carências didáticas já identificadas. Talvez, organizando um plano para trabalhos seriais que depois possam ser unificados em obras de divulgação mais ampla – necessariamente sob a forma de livros – em lugar dos muitos trabalhos dispersos e erráticos que respondem a demandas de terceiros para veículos eletrônicos nem sempre estáveis ou bem administrados. O excesso pode prejudicar a reflexão de maior densidade analítica, com pesquisa bem fundamentada e dados empíricos controláveis, para evitar polêmicas inúteis em torno de argumentos principistas. 
De fato, está na hora de fazer um plano de trabalho e segui-lo de forma sistemática, de maneira a deixar uma obra caracterizada pela permanência, e não apenas uma coleção infindável de escritos dispersos, divulgados em suportes precários como podem ser os muitos sites e blogs de nossa era dominada pela facilidade da informação e da comunicação. Tenho alguns livros no pipeline – aliás, as minhas pastas de ‘working files’, ou seja, trabalhos em preparação, são provavelmente mais numerosas e mais dispersivas ainda do que os trabalhos concluídos e numerados – e caberia organizar, doravante, um roteiro-calendário para um esforço dirigido melhor organizado.

Uma palavra final, comemorativa (finalmente)
Bem, este é o trabalho número 2000. Como não comemorei o número 1000, não sei bem o que fazer com este, a não ser tê-lo como registro pessoal de um balanço parcial de minhas atividades de escrevinhador compulsivo. Não consigo sequer comprar um bolo com velinhas para festejar o evento, estando atualmente num hotel de Nova York. Vou apenas dizer a mim mesmo: parabéns, legitimamente, mas seja menos prolífico e mais focado, a partir de agora. 
Ok, nem vou tentar fazer a contabilidade da produtividade escrevinhadora neste momento, apenas registrar um resumo das listas de originais, como abaixo. Vou precisar reorganizar o meu site – sou um desastre em matéria de web-design, aliás, não tenho a menor idéia de como se desenha um site – em função de grandes áreas de pesquisa ou de interesse, de maneira a poder fazer esse planejamento mais focado em resultados qualitativos, do que em volume aritmético de trabalhos. 
Não tenho idéia do efeito que meus trabalhos – e livros e artigos publicados – possam estar tendo sobre o público visado: tipicamente os jovens universitários brasileiros, a não ser raramente, por meio de contatos ocasionais através do formulário do site (e de alguns pedidos de ajuda por e-mail). Suspeito que algo de bom possa resultar desse volume apreciável de trabalhos divulgados voluntariamente, ainda que muitos deles devem despertar reações negativas em vários dos supostos destinatários, tendo em vista o ambiente universitário típico no Brasil, atualmente. Não me importo muito com as críticas, aliás muitos dos trabalhos são suficientemente provocadores para provocar críticas, justamente. O que seria mais relevante seria um ambiente adequado para um bom debate intelectual no Brasil, o que infelizmente ocorre muito raramente hoje em dia.
Esperando que esse ambiente possa surgir e se desenvolver, continuarei a colaborar da forma que sempre fiz: lendo, sintetizando, escrevendo e divulgando meus trabalhos e os de terceiros (em meus escritos ou nos blogs dedicados a tais finalidades). Uma ultima palavra quanto aos curiosos quanto a minhas atuais posições políticas ou filosóficas: não me considero absolutamente nada, ou seja, não me filio a nenhuma escola determinada de pensamento ou a qualquer tendência ou movimento político. Considero-me absolutamente livre, e por isso mesmo recuso filiações ou adesões a qualquer entidade ou organização que possua regras ou ‘filosofias’ determinadas.
Meus únicos princípios poderiam ser resumidos em duas expressões: racionalismo moderado – posto que sentimentos sempre fazem parte das ações e intenções humanas – e ceticismo sadio, ou seja, desconfiança de tudo o que não vem suportado em evidências alcançados por meio de dados empíricos, da experiência prática, da lógica formal. Uma coisa não pode ser simplesmente aceitável por conveniência ou por relativismo cultural: neste ponto, é preciso ter coragem de defender suas convicções, a despeito de frustrações eventuais, derivadas do meio ambiente em que se vive ou trabalha. As pessoas são em geral acomodadas, o que não creio que seja o meu caso, pois estou sempre aceitando novos desafios.
Por fim, quanto ao método de trabalho, creio que ele pode ser resumido numa única expressão: honestidade intelectual, e isso não requer nenhum tipo de explicação complementar. Voilà: creio que o meu trabalho 2000 está agora completo e posso me despedir de meus poucos leitores...

Paulo Roberto de Almeida
New York, 2000, 28/04/2009

==========
Anexo:
Paulo Roberto de Almeida
Uma informação quantitativa da produção acumulada
(a partir das 23 listas de trabalhos seriados)
(listas de originais e publicados disponíveis no site pessoal: www.pralmeida.org)

1) São Paulo, 1968; Bruxelas, 1976: do nº 001 ao nº 041
2) São Paulo, 1977; Brasília, 1978-79; Berna, 1980-82; Belgrado, 1982-84; Bruxelas, 1984: do nº 042 ao nº 093
3) Brasília, 1985-1987: do nº 095 ao nº 149
4) Genebra, 1987-1990: do nº 150 ao nº 184
5) Montevidéu, 1990-1992: do nº 185 ao nº 223
6) Brasília: 1992-1993: do nº 224 ao nº 383
7) Paris, 1993-1995: do nº 384 ao nº 503
8) Brasília, 1996: do nº 504 ao nº 545
9) Brasília, 1997: do nº 546 ao nº 600
10) Brasília, 1998: do nº 601 ao nº 650
11) Brasília, 1999: do nº 651 ao nº 708
12) Washington, 1999: do nº 709 ao nº 718
13) Washington, 2000: do n. 719 ao n. 764
14) Washington, 2001: do n. 765 ao n. 843
15) Washington, 2002: do n. 844 ao n. 993
16) Washington, 2003: do n. 994 ao n. 1136
17) Brasília, 2003: do n. 1137 ao n. 1168
18) Brasília, 2004: do n. 1169 ao n. 1368
19) Brasília, 2005: do n. 1369 ao n. 1518
20) Brasília, 2006: do nº 1519 ao nº 1706
21) Brasília, 2007: do nº 1707 ao nº 1847
22) Brasília, 2008: do nº 1848 ao nº 1969
23) Brasília, 2009: do nº 1970 ao nº 2---

Roque Callage contra a equiparação da revista IstoE

Roque Callage pronuncia-se claramente contra a equiparação moral feita na revista ISTOÉ entre um chefe de quadrilha encarcerafo por seus crimes provados e um pretenso Messias salvador da pátria agredida pelos mafiosos representantes de uma esquerda anacrônica.
Creio que ele tem razão. Fatos passados não podem ser apagados.
Calamidades futuras podem ser controladas pela ação previdente de democratas e instituições comprometidas com a estabilidade política e a correção moral da nação.
Considero que se deva afastar o risco do retorno dos corruptos, dos ineptos e, sobretudo, dos totalitários. Os perigos futuros trataremos no devido tempo.
Paulo Roberto de Almeida

A capa abaixo da revista Isto É tenta tornar igual o que não é igual . Mas esta ainda é a que menos histeria faz. 
Já os intelectuais do PSDB , alguns grupos conhecidos de universidades federais e da USP e a Rede Globo estão em  surto psicótico, achando que o PT é o campeão da democracia, que sempre apoiou causas democráticas, que nunca quis comprar ninguém, que nunca corroeu a administração e assaltou as estatais no Brasil, que não é uma organização criminosa, que está limpinho, que Haddad é bom moço e que  Bolsonaro é um vilão maldoso, que vai comer criancinhas e mulheres e instalar o nazismo no Brasil...
Fernando Henrique sempre ele, quer formar uma aliança nacional democrática contra Bolsonaro.
Tanta gente que gosta de PIXULECO  contra Bolsonaro, deve ser porque ele contraria muitos interesses.
Vejo muita histeria na midia e em alguns assim ditos formadores de opinião da cultura que se sabe bem sua origem.. Acho que sim,o que há é o  golpismo da máfia política que domina o País e está em pleno andamento e atividade febril como sempre esteve. 
* José Dirceu solto, a organização criminosa que reúne políticos dos partidos cúmplices tentando se reciclar com o jovem moço obediente ao chefão criminoso direto da cadeia, um atentado programado e comandado com dinheiro pago adiantado ao esfaqueador que tinha até cartão de crédito internacional e que até agora não foi esclarecido, Recursos suspeitos do Exterior na mão de um ditador africano que ele alegou iam ser entregues a um médico (!) - conta outra ...a PF já está investigando para que campanha iria este enorme soma.Um terrorista procurado no mundo inteiro passeando na fronteira ao estilo bolivariano (simples coincidência? Sim, pode até ser, mas a PF está investigando esta coincidência) . 
Estas são as ameaças reais, o resto é conversa de botequim de gente sempre ociosa no uso do pensamento e dada a exercícios de Napoleões de hospício.    


A Justissa da banda podre do STF contra o procurador da Lava Jato

Trata-se de um combate desigual, mas que aparece claramente aos olhos de todos como  evidências concretas de que os companheiros aparelharam deliberadamente o Supremo para proteger a quadrilha de mafiosos.
Apenas um Senado diferente do que existe poderia legalmente constranger os togados cúmplices.
Paulo Roberto de Almeida

Josias de Souza
23/09/2018

Em sua primeira entrevista como presidente do Supremo Tribunal Federal, o ministro Dias Toffoli soou enfático: ''O STF sempre deu suporte à Lava Jato, vamos parar com essa lenda urbana, com esse folclore'', declarou (reveja no vídeo acima). O procurador da República Deltan Dallagnol protocolou na Corregedoria Nacional do Ministério Público um documento que contradiz Toffoli. Ele relaciona dezenas de decisões anti-Lava Jato tomadas pela Segunda Turma do Supremo. São deliberações reais, não fantasiosas ou folclóricas.
Coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Dallagnol produziu o documento, suprema ironia, em resposta a um procedimento disciplinar aberto contra ele a pedido de Toffoli. Enumerou 27 decisões da Segunda Turma contra a Lava Jato. Entre elas 16 liberações de presos, quatro rejeições de denúncias e cinco remessas de processos para a Justiça Eleitoral ou outras jurisdições. Listou também decisões monocráticas (individuais) dos ministros, com especial realce para 47 habeas corpus concedimentos por Gilmar Mendes para libertar presos.
Sem alarde, a reclamação disciplinar contra Dallagnol começou a tramitar na corregedoria do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em 17 de agosto, exatamente um mês antes do encontro de Toffoli com os repórteres, na última segunda-feira (17). A peça com a defesa do procurador foi entregue há dez dias, em 13 de setembro, a mesma data em que Toffoli assumiu o comando do Supremo, no lugar de Cármen Lúcia.
O embate entre o ministro e o procurador foi motivado por uma entrevista do chefe da Lava Jato à rádio CBN, em 15 de agosto. Nela, Dallagnol criticou a decisão da Segunda Turma que transferiu do juiz Sérgio Moro para a Justiça Eleitoral em Brasília processo contra o ex-ministro petista Guido Mantega. O caso foi relatado por Toffoli. Envolve a troca de medidas provisórias por propina de R$ 50 milhões da Odebrecht. Parte da verba suja remunerou João Santana e sua mulher Monica Moura, o casal do marketing das campanhas petistas.
Na entrevista, Dallagnol lamentou o fato e a decisão ter sido tomada por 3 votos a 1. Referindo-se a Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, o trio anti-Lava Jato da Segunda Turma, o procurador emendou: “Os três mesmos de sempre do Supremo Tribunal Federal que tiram tudo de Curitiba e que mandam tudo para a Justiça Eleitoral e que dão sempre os habeas corpus, que estão sempre formando uma panelinha assim, que manda uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”.
Dallagnol teve o cuidado de enfatizar: “Não estou dizendo que [os ministros] estão mal-intencionados nem nada”. Contudo, ele deixou seu ponto de vista bastante claro: “Estou dizendo que, objetivamente, a mensagem que as decisões mandam é de leniência. E esses três de novo olham e querem mandar para a Justiça Eleitoral como se não tivesse indicativo de crime? Isso para mim é descabido.”
Um dia depois da entrevista de Dallagnol, Toffoli reuniu-se com o corregedor do CNMP, Orlando Rochadel Moreira. Solicitou providências contra o procurador. Acusa-o de falta de decoro e de violação do dever funcional de manter uma conduta respeitosa à dignidade da instituição que representa e da Justiça.
Num procedimento inusitado, a ação disciplinar contra o chefe da Lava Jato foi inaugurada a partir da troca de um par de mensagens de WhatsApp. Numa, Toffoli enviou ao corregedor o link com a notícia sobre as declarações de Dallagnol. Noutra o doutor Orlando Rochadel acusou o recebimento da queixa e comprometeu-se a adotar as “providências pertinentes.” E Toffoli: ''Grato''. (veja abaixo)
Dallagnol enxerga na providência uma tentativa de censurá-lo. Sustenta em sua defesa que não fez senão exercitar a liberdade de expressão.“Procuradores e promotores não são meio-cidadãos”, escreveu. “Têm direito legítimo a realizar críticas, mesmo ácidas e contundentes, contra decisões judiciais.” O procurador avalia que é parte de sua obrigação funcional a “prestação de contas de seu trabalho para a sociedade.” Isso inclui “avaliar criticamente o significado de decisões judiciais.”
De resto, o procurador teve a preocupação de demonstrar que não disse inverdades na entrevista que aborreceu Toffoli. Daí ter empilhado as decisões prejudiciais à Lava Jato. Fez mais: comparou o refresco servido pela Segunda Turma aos corruptos com o tratamento draconiano dispensado a réus que cometeram crimes mais brandos. Quem atravessa a peça do procurador do primeiro parágrafo ao ponto final emerge da leitura com a impressão de que a “lenda urbana” de que falou Toffoli inclui um conjunto de decisões desconexas que, reunidas num mesmo documento, emitem “uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”.
Dallagnol citou o julgamento em que a Segunda Turma decidiu libertar José Dirceu por 3 votos a 2. Reproduziu trechos dos votos divergentes de Edson Fachin e Celso de Mello para demonstrar que havia sólidas razões para manter o ex-chefão da Casa Civil de Lula atrás das grades. O procurador comparou a decisão que beneficiou Dirceu a outras deliberações da mesma Turma. O resultado do cotejo exala incoerência.
Por exemplo: o ex-prefeito da cidade de Redenção do Gurgueia (PI), Delano Parente, foi acusado dos mesmos crimes atribuídos a Dirceu: corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Mas teve o habeas corpus negado pela Segunda Turma. Alegou-se que a prisão tinha sido baseada na prática habitual e reiterada dos crimes. Exatamente o mesmo argumento usado para encarcerar o ex-ministro petista. Delano desviara R$ 17 milhões. Dirceu, R$ 19 milhões, noves fora o mensalão.
Há coisa pior: preso há mais de dois anos, Thiago Maurício Sá Pereira, conhecido como Thiago Poeta, teve um pedido de habeas corpus negado pela Segunda Turma em março. Acusado de traficar drogas, foi preso com 162 gramas de cocaína e 10 gramas de maconha. Sua pena foi menor que a de Dirceu: 17 anos e 6 meses, contra 30 anos. Mas os ministros não tiveram com o “Poeta” a complacência dedicada a Dirceu.
Não é só: réu primário, Alef Gustavo Silva Saraiva foi flagrado com menos de 150 gramas de cocaína e maconha. Depois de passar quase um ano na cadeia, pediu um habeas corpus ao Supremo. Num julgamento ocorrido em dezembro de 2016, a prisão foi mantida por 4 votos. Gilmar Mendes ausentou-se.
Ricardo Lewandowski, adepto da política de celas abertas para réus graúdos, disse o seguinte sobre o caso de Alef: “..Há farta jurisprudência desta Corte, em ambas as Turmas, no sentido de que a gravidade in concreto do delito ante o modus operandi empregado e a quantidade de droga apreendida – no caso, 130 invólucros plásticos e 59 microtubos de cocaína, pesando um total de 87,90 gramas, e 3 invólucros plásticos de maconha, pesando um total de 44,10 gramas (apreendidas juntamente com anotações referentes ao tráfico e certa quantia em dinheiro), permitem concluir pela periculosidade social do paciente e pela consequente presença dos requisitos autorizadores da prisão cautelar elencados no art. 312 do CPP, em especial para garantia da ordem pública.”
E Dallagnol: “Diz-se que o tráfico de drogas gera mortes indiretas. Ora, a corrupção também. A grande corrupção e o tráfico matam igualmente. Enquanto o tráfico se associa à violência barulhenta, a corrupção mata pela falta de remédios, por buracos em estradas e pela pobreza. Enquanto o tráfico ocupa territórios, a corrupção ocupa o poder e captura o Estado, disfarçando-se de uma capa de falsa legitimidade para lesar aqueles de quem deveria cuidar. A mudança do cenário, dos morros para gabinetes requintados, não muda a realidade sangrenta da corrupção. Gostaria de poder entender o tratamento diferenciado que recebeu José Dirceu…”
O coordenador da Lava Jato mencionou também os casos de encrencados no petrolão que continuam atrás das grades. Receia que todos acabem ganhando o meio-fio: “Na Lava Jato, os políticos Pedro Correa, André Vargase Luiz Argolo estão presos desde abril de 2015, assim como João Vaccari Neto. Marcelo Odebrecht, desde junho de 2015. Os ex-diretores da Petrobras Renato Duquee Jorge Zelada,desde março e julho de 2015. Todos há mais tempo do que José Dirceu.”
As comparações tornam-se mais grotescas quando incluem réus humildes. Dallagnol reproduziu artigo publicado há três meses pelo procurador regional da República José Augusto Vagos em O Globo. O texto trata de exceções abertas no Supremo à regras prevista na súmula 691, que veda a concessão do chamado “habeas corpus canguru” (contra indeferimento de liminar na instância inferior). O tratamento excepcional beneficia os graúdos da corrupção, nunca a arraia-miúda.
Eis um trecho do texto do procurador: “…A Defensoria Pública de São Paulo impetrou no STF o HC 157.704, para obter a liberdade de Valdemiro Firmino, acusado de ter roubado R$ 140,00, em 2013. Alegava a Defensoria razões humanitárias: Valdemiro é cego, HIV positivo e sofria de ataques de convulsão na unidade prisional. O relator, ministro Gilmar Mendes, foi rigoroso. A liminar foi indeferida no último dia 4: ‘Na hipótese dos autos, não vislumbro nenhuma dessas situações ensejadoras do afastamento da incidência da Súmula 691 do STF.’.''
O texto prossegue: “Nesse dia, a mesma caneta conferiu maior sorte a quatro acusados na Operação Câmbio, Desligo, que desvendou um esquema de lavagem de dinheiro de US$ 1,6 bilhão. Outros 17 acusados em operações da Lava-Jato no Rio de Janeiro mereceram a mesma deferência entre maio e junho deste ano. Ao contrário do Valdemiro, todos esses réus foram beneficiados por liminares que devolveram as suas liberdades sem que fosse preciso esperar o julgamento definitivo dos HCs que impetraram no TRF-2 e no STJ. Alguns desses HCs sequer chegaram a passar por essas instâncias.”
Noutra passagem, o procurador escreveu: “Em junho deste ano, o ministro Dias Toffoli negou habeas corpus que objetivava reconhecer insignificância a um morador de rua alcoólatra que furtou uma bermuda de R$ 10,00, que foi devolvida à loja (HC 143921). […] Um mês antes, o mesmo ministro manteve na prisão um homem acusado de ter furtado sacas de café, cujo valor era de R$ 81,00, as quais foram mais tarde devolvidas. Do mesmo modo, o ministro Lewandowski, há 8 anos, negou habeas corpus para um acusado de furtar objetos que, no conjunto, valiam R$ 202,00.”
O conjunto da obra da Segunda Turma deixa a “lenda” mencionada por Toffoli aos jornalistas muito parecida com um conto da carochinha. A dúvida é se o cardápio de decisões da Segundona compõe ou não uma conspiração contra o esforço anticorrupção. As evidências indicam que sim. Falta apenas um crachá. As orelhas, o focinho e os dentes são de lobo. Mas Toffoli deseja que o coordenador da força-tarefa de Curitiba diga em suas entrevistas que se trata de uma inocente vovozinha disfarçada.

De um turno a outro: o que dizer, o que fazer? - Paulo Roberto de Almeida

De um turno a outro: o que dizer, o que fazer?

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: digressões ex-ante; finalidade: planejar o ex-post]

Introdução: olhando a “coisa” algumas semanas à frente
Decidido o primeiro embate, e antecipando sobre o próximo, já não é mais hora de tergiversar, enganar, prometer, ou seja, ser candidato. A hora é de se mostrar como um verdadeiro estadista, falar a verdade, expor e abordar os principais problemas, e dizer exatamente o que pretende fazer, uma vez convertido em responsável maior pelos problemas do país. Não cabem mais frases vagas, de que vai abrir centenas de creches ou investir tantos milhões neste ou naquele setor. Isso é demagogia barata. O que se tem de prometer é unicamente, e justamente, uma única coisa: trabalho, trabalho, trabalho.
Cabe em primeiro lugar apresentar um cenário realista da crise brasileira, que vai continuar no próximo governo – não há porque esconder isto –, mencionar quais são as perspectivas para o primeiro ano e meio de governo, esclarecendo devidamente quais são as raízes da crise atual, e porque é difícil corrigi-las em pouco tempo, e depois, aí então, dizer exatamente o que pretende oferecer como o conjunto de medidas corretivas para superar a crise e deixar as bases para o crescimento numa fase posterior ao seu mandato. Deixar de pronto muito claro que o tamanho da destruição foi de tal monta que, infelizmente, sua correção exigirá provavelmente a extensão completa do próximo governo. Anunciar que em 2022, quando se comemorará o bicentenário da formação do Estado independente, a situação econômica não será muito diferente daquela conhecida antes da crise, mas esta é infelizmente a verdade pura e simples. Dito isto vamos ao que interessa: (a) o cenário da crise; e (b) as perspectivas de um mandato de puro trabalho.

1. O cenário da profunda crise brasileira
A crise brasileira não é apenas conjuntural, ou tão somente derivada da queda de crescimento a partir dos desajustes provocados por políticas econômicas equivocadas implementadas pelos três governos anteriores do lulopetismo; trata-se de uma crise estrutural, não apenas econômica – aqui essencialmente no plano fiscal, ou seja, interno, sem qualquer conexão com uma alegada “crise internacional”, apresentada como a fonte da recessão pelos seus responsáveis –, mas também política, resultante de uma cisão nos círculos dirigentes, todos ele operando num ambiente profundamente disfuncional, que surgiu a partir da descoordenação entre os poderes e seus líderes, incapazes de propor e implementar um projeto comum de reformas e de inovações no sistema político e nas bases das políticas econômicas (macro e setoriais). Mas trata-se, também e sobretudo, de uma profunda crise moral, confirmada por investigações, indiciamento e condenação de inúmeros atores da vida política, dos meios empresariais, ou seja, das próprias elites dirigentes. A Justiça, por sua vez, tampouco está isenta de críticas, na medida em que ou delonga processos que envolvem esses personagens, ou adota liminares especialmente rápidas, que parecem demonstrar complacência e leniência com práticas de corrupção. 
 Cabe indicar precisamente os responsáveis pela maior recessão da história do Brasil, que provocou perda considerável de renda, desemprego recorde e retraimento ainda maior do Brasil nos fluxos internacionais de comércio de bens, de serviços e de investimentos. A atribuição de responsabilidades pela crise é essencial para evitar novos exercícios de demagogia política e de populismo econômico e para evitar a repetição dos mesmos erros, derivados das mesmas políticas equivocadas, que conduziram o país ao desastre atual. O componente principal do desastre é o fiscal, e se manifesta na persistência dos déficits orçamentários, no crescimento da dívida pública e na redução dramática da capacidade de investimento do setor público, convertido em responsável pela crise e ainda agora em núcleo obstrutor das reformas necessárias, pela força dos seus mandarins, pelo monopólio irresponsável dos políticos eleitos, e pelo extremo dirigismo e intervencionismo a que chegamos com o atual modelo constitucional. 
Este é o quadro de impasses, de bloqueios e da falta de consenso em torno de uma agenda factível de recuperação e de retomada do crescimento e da normalidade da vida política. Relevante para explicar o estado atual de quase anomia no sistema político é o ânimo e as práticas divisionistas permanentemente promovidas pelo partido que encarna a recusa do jogo democrático como princípio da governança, que é o PT: este sempre apostou na divisão do país, em termos de classes sociais, de renda, de raças, e acabou criando, justamente, o fracionamento da nação em torno de duas propostas situadas aparentemente nos extremos, mas que se encontram na solução polarizada que é a da recusa absoluta das propostas situadas na outra ponta (aparente) do sistema.
Este é o triste resultado de processo fragmentado de representação política, exacerbado pela permissividade da legislação eleitoral e partidária, pela promiscuidade corruptora demonstrada por alianças espúrias entre donos do dinheiro e donos do poder, e que promete se manter na próxima legislatura, a despeito justamente do desprezo que lhe devotam grande parte dos eleitores, e que por isso mesmo se refugiaram numa opção aparentemente fora do sistema (como pode ter sido a percepção em 1989, com os efeitos e consequências frustrantes que se lhe seguiram). Tal cenário impõe como prioritária uma reforma política, mesmo presumivelmente tão difícil quanto a reforma tributária, como agora se passa a debater no quadro das propostas de correções que se impõem.

2. O que se tem de fazer para corrigir os problemas?
Qualquer que seja a orientação ideológica ou as preferências políticas do próximo presidente – de centro, de “direita” ou de “esquerda”, com as ressalvas que cabem nesse tipo de dicotomia –, uma coisa é certa: ele terá de corrigir imediatamente a tendência de déficits orçamentários crescentes, sob risco de precipitar a economia numa crise mais devastadora do que a atualmente enfrentada. O ajuste do déficit, não para o superávit, mas simplesmente para o equilíbrio nominal, consumirá provavelmente todo o seu mandato, o que implica um regime de emagrecimento rigoroso, cujo componente principal é, obviamente, a reforma previdenciária. Os inimigos principais dessa reforma estão encastelados no próprio Estado, com suas corporações mandarinescas, dispondo de recursos suficientes para sustentar campanhas mentirosas contra uma reforma que deveria, em primeiro lugar, instaurar a igualdade cidadã, ademais de reduzir benefícios e instaurar um regime progressivo de capitalização para se colocar de acordo com as tendências irreprimíveis da demografia. É uma luta difícil, mas essencial para o destino ulterior do imenso conjunto de reformas que são imprescindíveis para o futuro do país.
Ao lado de uma reforma previdenciária radical, eliminando todos os regimes especiais e tratamentos abusivos, figura um início de reforma tributária que sempre esteve na retórica dos governantes, mas que nunca foi de fato empreendida, dadas as complexidades do sistema federativo e da própria estrutura tributária atual. Como um entendimento sobre as diferentes mudanças no imenso cipoal de impostos, taxas e contribuições divididas nos três níveis da federação será necessariamente delongado e difícil, senão impossível, uma proposta rudimentar, mas em todo caso indicativa do sentido para o qual se deve caminhar – que não é o do aumento ou da manutenção dos níveis correntes da carga fiscal total –, seria a da aprovação consensual de uma redução gradual, progressiva, extremamente moderada, dos diferentes tributos, mediante o decréscimo (anual ou semestral) de alguns pontos percentuais das alíquotas ou níveis aplicados em todos os impostos, taxas e contribuições (talvez meio por cento cada vez) até que um grande acordo parlamentar possa ser encontrado (digamos em dez anos). 
Uma reforma política é absolutamente indispensável para se reduzir o quantum de irracionalidade existente no atual sistema político-eleitoral-partidário-representativo, o que exigiria, obviamente, uma enorme pressão popular sobre o parlamento. A extrema fragmentação partidária poderia ser imediatamente corrigida por um gesto ousado e corajoso – que provavelmente não virá – tendente a aprovar, simplesmente, o fim de dois fundos, o partidário e o eleitoral, na suposição de que partidos são entidades de direito privado, e devem ser sustentados unicamente por seus membros e militantes, assim como os seus candidatos a quaisquer cargos eletivos. Aos que recusam tal tipo de reforma radical invocando o abuso do poder econômico, cabe retrucar com a evidência do poder inconteste que possuem atualmente as corporações de ofício, já que o Brasil é um país eminentemente corporativo, mais até do que associativo ou representativo. A eliminação de tais fundos faria convergir o sistema partidário a limites razoáveis, assim como a adoção de um sistema distrital misto faria diminuir o custo das eleições, fonte principal, senão exclusiva, da imensa corrupção que hoje grassa nos meios políticos.
Quaisquer que sejam os resultados eventuais das três reformas, previdenciária, tributária e política – absolutamente indispensáveis para melhorar, modestamente, a baixíssima qualidade de nossa democracia –, o fato é que os níveis de prosperidade e de bem-estar da população melhorarão ainda mais modestamente no horizonte previsível, em vista da mediocridade do crescimento econômico. O Brasil precisar incrementar de modo significativo seus indicadores de produtividade, sobretudo a do fator trabalho, uma vez que a do capital pode ter um componente importado mais fácil de adquirir. O elemento crucial nessa equação é a qualidade da educação fundamental, sem a qual não se poderá melhorar o capital humano e sua contribuição para a inovação tecnológica. O sistema de ensino no Brasil não requer simples reformas adaptativas, mas uma grande revolução, nos métodos, nos conteúdos, na gestão e na organização do sistema público, sendo que o setor privado teria de ganhar maior autonomia para que as induções do próprio mercado contribuam para esse esforço gigantesco de reforma e modernização. 
Muitas outras medidas urgentes e até emergenciais precisariam ser consideradas, sobretudo no terreno da segurança pública e no funcionamento dos serviços básicos sob responsabilidade da União e das instâncias federativas, assim como, entre outras, a abertura econômica e a liberalização comercial. Mas sua complexidade dificulta uma apresentação sintética como a aqui feita para as quatro grandes reformas que devem figurar entre as prioridades máximas do próximo governante. Voltaremos a elas...

Paulo Roberto de Almeida 
(Brasília, 23 de setembro de 2018)

Aproveito para divulgar a brochura que compus com base em trabalhos escritos nas últimas décadas sobre os processos eleitorais no Brasil e os grandes temas da política externa, cuja capa figura ao alto: 

3237. Eleições presidenciais no Brasil: Relações internacionais, política externa e diplomacia brasileira, 1985-2018, Brasília, 25 janeiro 2018, 299 p. Compilação de artigos, ensaios e postagens sobre a interface da política externa com o sistema político, publicados e inéditos. Sumário no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/01/politica-externa-e-eleicoes.html) e o arquivo na plataforma Academia.edu (https://www.academia.edu/s/01644a871c/eleicoes-presidenciais-no-brasil-arelacoes-internacionais-politica-externa-e-diplomacia-brasileira-1985-2018) e Research Gate (https://www.researchgate.net/publication/322775393_Eleicoes_presidenciais_no_Brasil_Relacoes_internacionais_politica_externa_e_diplomacia_brasileira_1985-2018), com a geração do seguinte DOI:10.13140/RG.2.2.10413.18404.

ABC: projetos de cooperacao cientifica internacional - brochura

Brochura neste link.

imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 10/09/2018 
   
 

Grandes Projetos de Colaboração Internacional da Ciência Brasileira

 
 Serão apresentados projetos nas áreas de física de partículas, mudanças climáticas, biotecnologia, genômica, supercomputação, atividades espaciais e  oceanos. 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 
  
imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 17/09/2018 
   
 

Grandes projetos de cooperação internacional na Amazônia

 
 Recursos decrescentes comprometem projetos na região, que é a chave da sustentabilidade global e um fantástico laboratório para ciência inovadora, de acordo com o Acadêmico Paulo Artaxo. 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 
  
imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 17/09/2018 
   
 

Grandes projetos de cooperação no Atlântico Sul

 
 O físico e oceanógrafo Edmo Campos alertou para o aumento do nível do mar em função do derretimento das geleiras do Ártico. 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 
  
imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 21/09/2018 
   
 

Colaboração internacional: grandes telescópios, ciência e tecnologia espaciais

 
 Os Acadêmicos João Steiner e Ricardo Galvão apresentaram os projetos Gemini, SOAR, GMT e CBERS em evento organizado pela ABC e SBPC, em 12 e 13 de setembro. 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 
  
imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 19/09/2018 
   
 

Grandes projetos de colaboração internacional em física e engenharia genética

 
 Confira os projetos apresentados pelos pesquisadores Ettore Segreto (LBNF), Irina Nasteva (Connie), Elibio Rech (GP-write) e Carla Göbel (Renafae). 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 
  
imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 19/09/2018 
   
 

Grandes projetos de colaboração internacional em astronomia, física e biologia

 
 Conheça os projetos apresentados pelos pesquisadores Eduardo Pacheco (Plato), Elcio Abdalla (Bingo), Carlos Morel (genômica) e Wagner Rodrigues (microscopia eletrônica). 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 
  
imagem da noticia
   
 ATUAÇÃO DA ABC | 18/09/2018 
   
 

Grandes projetos de colaboração internacional em computação e física

 
 Confira os projetos apresentados por Wagner Léo (SDumont), Jacques Lépine (LLAMA), Sergio Novaes (LHC), Beatriz Barbuy (ESO), Elisabete dal Pino (CTA) e Luiz Nicolaci (LIneA). 
 Compartilhar no FacebookCompartilhar no TwitterLeia agora no Site da ABC 

sábado, 22 de setembro de 2018

Golpe versus golpe: os perigos dos extremos - Carlos José Marques (IstoE)

Golpe versus golpe

Carlos José Marques, editor
Revista IstoÉ, 21/09/2018

Um fato ninguém discute: tanto Bolsonaro como Lula – e, por tabela, seu preposto – são, lado a lado, odiados por uma ampla parcela da população. Carregam insuperáveis índices de rejeição às suas ideias, práticas e propostas. São alvo de repulsa especialmente pelo que representam – em direções opostas, é bem verdade. Como diria em sua antológica frase o ex-congressista Roberto Jefferson, um e outro despertam “os instintos mais primitivos” dos eleitores. E eis que chegamos às vésperas das urnas na inusitada situação de conceder a vitória àquele menos odiado. Ou o “menos” pior. Ou o que galvaniza a porção majoritária de defensores dos extremos à direita e à esquerda. Lula encarnado na figura de Haddad, que usa a máscara do próprio mentor para dizer que um e outro representam o mesmo ser, tal filho e espírito santo, o postiço funcionando como um mero pau-mandado do padrinho. Serão juntos recriadores de um caudilhismo singular – que fez história no velho coronelismo da caatinga – com todos os vícios, roubos e aberrações de gestão já experimentados por essas paragens. A divindade Lula reencarnará, tomará forma e método na imagem mimetizada de Haddad. Assim prega o lulopetismo. E assim deve ser. Haddad, que empresta corpo e alma, não recusa o papel, de mais a mais bem melhor que o de um prefeito paulistano apagado, desprezado, marcado pela ineficiência administrativa, pela mediocridade de projetos e pela arrogância na conduta. Na outra ponta do ringue, a imprudência fardada. Bolsonaro e seu general de estimação, Mourão, o vice das incontinências verbais, já demonstraram ter zero de noção sobre o que fazer para reconsertar o País. Na prática, nem estão preocupados com o assunto. Não tratam disso. Sugerem implantar um modelo liberticida de poder escorado na intolerância (como se fosse possível tamanha ambiguidade). A radicalização prende, extermina o contraditório, extirpa do convívio os adversários que não concordam com seus mandamentos. O trunfo de Bolsonaro e Mourão é surfar a onda do desencanto, pegar todo mundo na base da raiva. Atrair os insatisfeitos que seguem largados por todos os lados, sem respostas. Querem mover e moer a máquina na base dos impulsos tribalistas, vingativos, irracionais. Contra tudo que está aí, quem sabe até contra a democracia, por que não? E eis o inacreditável: a proposta de trucidar a democracia lidera as pesquisas como o último toque de recolher na caserna após a fuzarca. Restam os órfãos, a expressiva maioria localizada no centro ideológico, aqueles que temem ser esta talvez a derradeira das eleições democráticas por uma longa e tenebrosa era, caso nada reverta o quadro ou vinguem os anseios totalitários em ascensão. Já é possível contemplar: um aparato rudimentar de governo aguarda o Brasil logo ali na esquina, na virada das eleições, em uma marcha da insensatez em ritmo acelerado nesse sentido. Como foi possível chegar a tal ponto de degradação política? Que forças ocultas ou de corpo presente empurram o País para tão sombria perspectiva que, nem de longe, representa a expressão dos sentimentos da maioria, mas que deve se confirmar como única fórmula disponível, pelo mero desencanto daqueles que desistiram de lutar por saídas alternativas? O dueto de Bolsonaro/Mourão versus o de Lula/Haddad possuem no escopo de princípios deploráveis de suas respectivas cartilhas muitas similaridades de interpretações, adaptadas às versões de cada lado. Sobre o golpe, por exemplo. Ambos pregam que ele existiu ou existirá – se desconte diferenças de timing na conclusão de um para o outro. A chapa verde oliva passou a alertar sobre um tresloucado golpe em gestação na forma de fraude nas urnas, tese conspiratória logo ridicularizada pelas autoridades competentes. A chapa vermelho raivoso sustenta a pregação de uma eleição golpista por não contar com o nome de Lula nas urnas. Irresponsavelmente, ambos os lados atentam contra as instituições, as leis e as regras do jogo democrático. É golpe versus golpe, abrindo margem a contestações futuras, anarquia e flerte com eventuais ditaduras. Nem o mais insensato dos cidadãos pode vir a concordar com tamanho despautério. Ainda dá tempo. Seu voto é carimbo para um melhor futuro.