O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 6 de junho de 2020

The Vietnam War - PBS series

The Vietnam War episode 1

  • Post Author:
  • Post Category:History

The Vietnam War episode 1 – Déjà Vu

After a long and brutal war, Vietnamese revolutionaries led by Ho Chi Minh end nearly a century of French colonial occupation. With the Cold War intensifying, Vietnam is divided in two at Geneva. Communists in the north aim to reunify the country, while America supports Ngo Dinh Diem’s untested regime in the south.
The Vietnam War is a ten-part, 18-hour documentary film series directed by Ken Burns and Lynn Novick that will air on PBS in September 2017.
In an immersive 360-degree narrative, Burns and Novick tell the epic story of the Vietnam War as it has never before been told on film. THE VIETNAM WAR features testimony from nearly 80 witnesses, including many Americans who fought in the war and others who opposed it, as well as Vietnamese combatants and civilians from both the winning and losing sides.
Six years in the making, the series brings the war and the chaotic epoch it encompassed viscerally to life. Written by Geoffrey C. Ward, produced by Sarah Botstein, Novick and Burns, it includes rarely seen, digitally re-mastered archival footage from sources around the globe, photographs taken by some of the most celebrated photojournalists of the 20th Century, historic television broadcasts, evocative home movies, revelatory audio recordings from inside the Kennedy, Johnson and Nixon administrations and more than 100 iconic musical recordings by many of the greatest artists of the era.
The film will be accompanied by an unprecedented outreach and public engagement program, providing opportunities for communities to participate in a national conversation about what happened during the Vietnam War, what went wrong and what lessons are to be learned. In addition, there will be a robust interactive website and an educational initiative designed to engage teachers and students in multiple platforms.
https://hdclump.com/the-vietnam-war-episode-1/

Jamil Chade: saída da OMS prejudicará o Brasil (UOL)

Jamil Chade 6/06/2020

Saída da OMS isolará Brasil; acesso à vacina e tratamento será prejudicado
Jamil Chade
Colunista do UOL
06/06/2020 10h46

A ameaça do presidente Jair Bolsonaro de deixar a OMS foi recebida na diplomacia internacional como uma tentativa deliberada do governo brasileiro de desviar a atenção e se eximir da responsabilidade pelas mortes no país por conta da covid-19.
Na noite de sexta-feira, o presidente alertou que se a OMS não mudasse seu comportamento considerado como "ideológico" pelo Palácio, ele poderia seguir o mesmo caminho de Donald Trump e romper com a agência.

Oficialmente, a OMS indicou neste sábado que não irá reagir ao anúncio do presidente brasileiro. Mas não faltaram comentários no alto escalão da diplomacia de críticas e apontando como uma manobra para encontrar um culpado externo pela crise, exatamente a mesma tática usada pela Casa Branca quando os EUA registraram 100 mil mortes. Naquele dia, Donald Trump anunciou que estava "rompendo" com a agência de Saúde.
A OMS, sob duros ataques, admite que vai iniciar um processo de revisão de seu trabalho. Entre europeus e diversos governos latino-americanos, a percepção é de que uma mudança no sistema precisa ocorrer. Mas há um entendimento quase unânime de que que tal reforma ocorrerá depois de a batalha contra o vírus ter terminado. Caso contrário, o risco é de que o foco na pandemia perca força.
Para negociadores internacionais, escolher a OMS como foco de ataques é buscar uma "cortina de fumaça". Mas embaixadores e técnicos apontam que a realidade é que Bolsonaro ignorou os alertas da entidade.
No dia 30 de janeiro, a OMS declarou a emergência global, o máximo nível dentro das regras internacionais. Mais de um mês depois, em 9 de março, o presidente brasileiro insistiu que a questão estava "superdimensionada".
Dois dias depois, a OMS declarou a pandemia global. Mas, naquele mesmo momento, Bolsonaro indicou outras gripes mataram mais que a covid-19. Uma semana depois, Bolsonaro chamou de "histeria" o assunto.
Quase depois meses depois do alerta de emergência da OMS, em 24 de março, o presidente brasileiro insistiu em termos como "gripezinha" e "resfriadinho". No dia 12 de abril, ele ainda indicou que o vírus estava "indo embora".
Hoje, o Brasil supera os EUA na contagem de novos casos nas últimas duas semanas. Nos últimos sete dias, o Brasil também supera os americanos em mortes neste período. Dentro da OMS, a constatação é de que o país se consolida como o novo epicentro da crise internacional.

Abismo
Em Genebra, os comentários diante da declaração de Bolsonaro variam entre constatar o "papel ridículo" que o país assume ao repetir a mesma estratégia de Donald Trump e análises que apontam que tal gesto apenas ampliaria o isolamento internacional do país.
Fora da agência, o Brasil poderia estar excluído de um esforço internacional liderado pela OMS e europeus para garantir a produção e acesso à vacina contra a covid-19.
O governo brasileiro hesitou em fazer parte do esforço e sequer havia sido convidado para o lançamento do projeto. Mas, na semana passada, uma reunião ministerial em Brasília decidiu dar o sinal verde para que o governo solicitasse a adesão ao mecanismo.
De fato, se o Brasil imita a tática de Trump, negociadores alertam que o impacto de uma eventual saída do país da entidade não seria a mesma.
O governo americano é responsável por US$ 400 milhões de um orçamento de US$ 2 bilhões da OMS. No fundo, portanto, os americanos em parte sustentam a resposta global a diversas crises sanitárias.
O Brasil, ao contrário, é um dos beneficiários do sistema e hoje mantém uma das maiores dívidas com a entidade, de US$ 33 milhões. "O Brasil perde mais que ganha saindo da OMS", apontou um experiente negociador.
Hoje, é do braço da OMS nas Américas, a Organização Panamericana de Saúde, que o Brasil compra milhares de testes para a covid-19. A negociação estipulava o envio de 10 milhões de testes ao país. Uma parte inclusive ja foi entregue. Fora da entidade, o Brasil também ficaria sem essa opção de compra.
No ano passado, foi também negociado a entrega da vacina tríplice viral ao Brasil e, em diversas crises nos últimos anos, estados do país puderam recorrer à ajuda da organização.
Durante a crise da Zika, a Opas e a OMS foram fundamentais para a resposta dada pelo país.
Também foi graças ao papel dos diferentes governos na OMS que o acesso a remédios e quebra de patentes passou a ser uma realidade. O Brasil ainda revolucionou a forma pela qual a OMS passou a lidar com o vírus do HIV. Foi também um brasileiro que, entre os anos 50 e 70, liderou a entidade e a consolidou como referência mundial.

Nova ordem
Desde o início da crise, o Brasil passou a adotar uma postura considerada como "problemática" na OMS. Nas reuniões, optou na maioria das vezes pelo silêncio ou simplesmente não aparecer, enquanto Bolsonaro atacava Tedros Ghebreyesus, o diretor da agência.
Em cada comentário da agência, porém, o governo apresentava queixas à cúpula. Cartas ainda foram enviadas pelo Itamaraty e foram interpretadas como pressões sobre Tedros.
Mas, dentro do governo, a aposta é de que a aliança com o governo americano compense a ruptura com o resto das entidades e que o Brasil faça parte de um grupo de países que estão questionando o próprio multilateralismo.
De uma forma sistemática, o Brasil tem repetido as críticas de Donald Trump e seus aliados contra as Nações Unidas e o sistema multilateral.
Os golpes contra o multilateralismo já tinham sido iniciados em 2019, com a paralisação completa dos tribunais da OMC. Para Trump, a entidade liderada pelo brasileiro Roberto Azevedo favoreceu o crescimento comercial da China. Quando, sem explicações plausíveis, Azevedo decidiu anunciar que estava se retirando do comando da OMC, rapidamente senadores aliados de Trump foram às redes sociais para dizer: "apague a luz ao sair".
Na OMS, o padrão americano foi repetido. O governo dos EUA iniciou uma série de ataques contra o diretor-geral Tedros Ghebreyesus o acusando justamente de aceitar a influência chinesa. Ainda que a agência tenha falhado na gestão da pandemia, seu alerta foi lançado ao mundo cinco semanas antes de Trump admitir a gravidade da crise e iniciar medidas.
Aproveitando-se do contexto e do início do vírus ter sido identificado na China, o governo americano proliferou uma campanha com o objetivo de minar a credibilidade da OMS e de Pequim. O golpe final foi dado na sexta-feira passada, quando Trump anunciou que estava rompendo com a agência.
Existe, de fato, um processo nos bastidores para redesenhar a nova ordem internacional pós-pandemia. Os Estados Unidos, a fim de isolar a China, rival comercial, articulam um G7 ampliado como uma espécie de novo centro do poder. Mas, desta vez, composto apenas por seus principais aliados.
Na semana passada, o presidente americano, Donald Trump, fez dois anúncios que compõem uma reação: a organização de um G7 com novos países convidados e sua ruptura com a OMS, por supostamente estar aliada aos chineses.
Para fontes diplomáticas ouvidas pela coluna, Trump está tentando criar uma frente para conter a China e, para isso, precisa estabelecer novos organismos ou fóruns internacionais. É nesse sentido que vem a proposta da Casa Branca por uma reunião do G7 com Índia, Brasil, Austrália, Coreia do Sul e Rússia. Trump, ao fazer o anúncio, deixou claro que o G7 estava "obsoleto" e que precisaria ser recriado.
No fundo, porém, sua manobra foi interpretada de outra maneira: o esvaziamento não é do G7, mas do G20, fórum onde os americanos precisam dividir o espaço com a China.
Não é por acaso, sinalizam negociadores, que desde o início da pandemia o G20 tem sido inoperante e vazio. Diversas reuniões terminaram sem uma declaração final, vetadas pelos EUA num passo deliberado para minar sua influência.

Chanceler abordou "nova ordem" em reunião com Bolsonaro
O chanceler brasileiro Ernesto Araújo já havia feito uma sinalização neste sentido na reunião de ministros com Bolsonaro do dia 22 de abril, liberada pela Justiça. Naquele momento, ele indicava como de fato uma nova ordem estava sendo desenhada. E apostava como o Brasil poderia fazer parte do grupo de países que ajudariam a desenhar essa nova estrutura.
Em encontros internacionais e artigos, o chanceler também tem aproveitado para alertar ao mundo sobre o risco de um "plano comunista" infiltrado em organismos internacionais.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

O Fascismo Tabajara de Bolsonaro - Fernando Gabeira

“Os generais viram que a proposta de Bolsonaro é a guerra civil”, afurma Gabeira
Entrevista O Estado de S. Paulo, 5/06/2020

RIO - Um ano atrás, o jornalista Fernando Gabeira tinha críticas ao presidente Jair Bolsonaro, mas avaliava que as instituições eram suficientes para contê-lo, como expressou em junho de 2019 em entrevista ao Estadão, onde é colunista. Não pensa mais da mesma forma. A pregação em favor de armar a população, que o mandatário fez na reunião de 22 de abril com ministros, seus movimentos para atrair as Forças Armadas com verbas e cargos e sua aproximação das Polícias Militares foram decisivos para o jornalista mudar de ideia. Agora, Gabeira defende a mobilização dos brasileiros para neutralizar Bolsonaro até 2022 ou para afastá-lo do cargo definitivamente. Para ele, a ação do presidente sugere o espectro de uma guerra civil ou um golpe de Estado, sem, necessariamente, participação direta das Forças Armadas.
"Muito possivelmente ele pode estar articulando um golpe usando Polícias Militares e neutralizando as Forças Armadas", diz Gabeira, em nova conversa com o Estadão, nesta quinta-feira, 4. "Ele pode estar até em um ponto em que não precise usar as Forças Armadas. Basta que elas fiquem neutras e deixem a Polícia Militar atuar."
Eliane Cantanhêde: Desigualdade de armas
Eliane Cantanhêde: Desigualdade de armas
Gabeira critica a postura dos generais que ocupam cargos no ministério porque na reunião do dia 22 de abril ouviram calados o que considerou a defesa explícita da constituição de milícias com fins políticos. "Para mim é absolutamente novo na história do Brasil: os generais ouvindo a ideia de armamento, armar a população para a sua expressão política, sem terem algum tipo de reação", afirma.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Há quase um ano, em entrevista ao Estadão, o senhor fez algumas críticas ao governo Bolsonaro, mas se mostrou confiante nas instituições para contê-lo. Recentemente, o senhor passou a defender que os brasileiros, no Brasil e no exterior, se mobilizem para barrar um possível golpe do presidente. O que aconteceu?
O primeiro aspecto da minha confiança eram os contrapesos democráticos, que estavam baseados no Congresso e no Supremo. Esses contrapesos não foram alterados, continuam tentando fazer frente a esse processo. Mas há sobre eles, hoje, uma carga muito intensa, a partir do bolsonarismo e dos seus aliados. As manifestações foram claramente dirigidas ao fechamento do Congresso e do Supremo. Então, o que alterou bastante é que o Bolsonaro não está aceitando muito bem a presença desses contrapesos, pelo contrário, está tentando neutralizar alguns deles. Esse é um fato. Outro é a relação com as Forças Armadas, que sempre (desde a redemocratização) tiveram, aparentemente, um papel democrático, e funcionaram, ao longo desses anos, recuperando a sua imagem. E as Forças Armadas foram muito envolvidas pelo Bolsonaro. Não só através do trabalho orçamentário, mas também pela visão da reforma da Previdência dos militares, pela entrada de 3 mil militares no governo, entende? E sobretudo agora pela aliança que fizeram na Saúde. Praticamente, (as Forças Armadas) estão atraindo, participando ou partilhando uma política que pode trazer para elas uma repercussão nefasta. Então, isso tudo alterou muito o quadro.
Recentemente, houve algum fato que acelerou a sua mudança de opinião sobre o governo Bolsonaro? Por exemplo, a saída do Sérgio Moro?
Não, a saída do Sérgio Moro, não. Mas aquela reunião do (dia) 22 (de abril), que foi divulgada (por vídeo, liberado por ordem do ministro Celso de Mello, do STF)apresentou alguns fatos alarmantes. O primeiro deles, o mais importante para mim, foi a defesa pelo Bolsonaro do uso de armas. Se você lembrar da campanha eleitoral, o Bolsonaro tinha como (base da) proposta de armamento da população a necessidade de se defender do caos urbano, da violência urbana. Cada pessoa poderia ter uma arma para se defender, eventualmente, de um assalto, de uma invasão da sua propriedade. Mas naquela reunião ficou evidente que ele tem uma visão de armas para a expressão da sua visão política. A pessoa armada teria condições de se expressar politicamente através das armas. Inclusive, sugeriu que isso fosse feito contra a quarentena. Quatro generais do Exército estavam presentes e não moveram uma palha, nem houve um expressão de surpresa. Isso para mim é absolutamente novo na história do Brasil: os generais ouvindo a ideia de armamento, armar a população para a sua expressão política, sem terem algum tipo de reação.
Na campanha de 2018, muita gente dizia "Bolsonaro só fala essas coisas horríveis para ganhar voto, isso não é a sério". Ou então diziam: "Ele já pensou assim, não pensa mais." De certa forma, não ocorreu com ele o mesmo erro que houve com (Donald) Trump (presidente dos EUA), o de achar que ele tinha um discurso para campanha, mas governaria de outra forma?
Bolsonaro, na Câmara dos Deputados, tinha um tática de popularização. Ele utilizava vários temas, como direitos humanos, como a questão das mulheres, da homossexualidade... Ele usava isso para poder se popularizar. A tática dele era pegar algumas pessoas conhecidas, por exemplo Maria do RosárioJean Wyllys, e fazer diante das câmeras alguns debates que sustentariam o seu público. Mas ele não tinha muito ideia de uma proposta para o Brasil. Tinha um saudosismo do governo militar, mas que não tinha correspondência naquele momento com a própria situação das Forças Armadas. Ao chegar ao governo, ele faz uma política de sedução das Forças Armadas. Com uma política de sedução que, em alguns aspectos, é muito certa. Em primeiro lugar, através do Orçamento, da reforma da Previdência, da inclusão de 3 mil militares no governo, da parceria em uma política temerária em relação à covid-19, na utilização do ministro da Defesa em manifestações propondo o fechamento do Congresso e o fechamento o STF... Ele está usando as Forças Armadas, de uma forma bem clara, como um elemento de intimidação. E as Forças Armadas, pura e simplesmente, estão se deixando usar. E isso não é o único perigo dele. Ele tem uma boa penetração nas Polícias Militares. Então, muito possivelmente, ele pode estar articulando um golpe usando Polícias Militares e neutralizando as Forças Armadas. Ele pode estar até em um ponto em que não precise usar as Forças Armadas. Basta que elas fiquem neutras e deixem a Polícia Militar atuar.
O senhor falou em projeto; quando era deputado, na sua opinião, Bolsonaro não tinha um projeto, era apenas uma coisa de agitação, digamos assim. Pode-se dizer que Bolsonaro tem um projeto hoje? 
Ele não tinha um projeto, nunca teve. Mas ele andou se relacionando com pessoas que tentaram trazer um recheio teórico para o projeto dele. É o caso do Olavo de Carvalho, é o caso do ministro Ernesto Araújo, que tentam dar assim a visão de um projeto cristão, em primeiro lugar um projeto cristão. Em segundo lugar, um projeto nacionalista, contra organismos globais, quer dizer, contra o que eles chamam de marxismo global. Então, isso foi acontecendo. E mais ainda: foi dada a ele, através do Olavo de Carvalho, a necessidade de uma guerra cultural, contra todos os setores da cultura que eles consideram adversários e ligados de alguma forma à esquerda.
Voltando aos militares, quando começou o governo, havia uma expectativa de que seriam um fator moderador dos impulsos do Bolsonaro. Isso ficou para trás?
Olha, aconteceu o seguinte: ao invés de os militares se tornarem moderadores do Bolsonaro, ele se tornou um fator de radicalização dos militares. O general Augusto Heleno, por exemplo, tem se tornado um radical, cada vez maior, dentro do governo. É claro que, no caso do general Heleno, pesou também aquela prisão, lá na Espanha, de um oficial (na verdade, o sargento Manoel Silva Rodrigues) da Aeronáutica com grande quantidade de cocaína. E ele, como o homem do GSI, foi considerado responsável pelo furo de segurança pelo Carlos Bolsonaro. Depois disso ele ficou um pouco assustado e começou a tomar posições mais radicais e se unir a este chamado grupo ideológico. Outros generais, por exemplo, o general Braga Netto (chefe da Casa Civil), que esteve no Rio de Janeiro, na intervenção (na Segurança do Estado em 2018), tem até uma capacidade de organização boa. Ele é um homem que entende de organização, gosta de organizar. Eu vi, ele me mostrou o trabalho dele de organização, mas ele não tem condições de segurar o Bolsonaro. Da mesma maneira, o (vice-presidente Hamilton) Mourão não tem esse papel. O Mourão sempre foi considerado pelos próximos ao Bolsonaro como um adversário em potencial. Então, ele se recolheu também. O general (Luiz Eduardo) Ramos (chefe da Secretaria de Governo), que deu entrevista dizendo que é um democrata, que são todos democratas e que é uma ofensa às Forças Armadas pensar que elas podem estar sendo cúmplices de um golpe, ele também é o cara que está fazendo a política do Bolsonaro. Por exemplo, ele estava presente naquele dia em que Bolsonaro falou que ia armar todo mundo, que era necessário armar todo mundo. Então, esses generais viram que a proposta do Bolsonaro é a guerra civil. Eles sabem muito bem que Bolsonaro é um homem que ganha as eleições e denuncia as eleições como fraudadas. Então, com as armas na mão, o que vai querer fazer? Vai querer se rebelar. Eles sabem disso. Então, não adianta o general Ramos dizer é uma ofensa às Forças Armadas pensar que elas podem (dar um golpe). Mas diante desse silêncio de cumplicidade ali, o que você pode pensar? Se você não ofende as Forças Armadas pensando nisso, você ofende a sua própria inteligência tendo que escolher entre uma coisa e outra
O que explica a reação do Bolsonaro à pandemia, chamando de gripezinha, pregando contra o isolamento, saindo às ruas e provocando aglomerações?
Olha, Bolsonaro pensa muito curto. Ele pensou o seguinte: "O que isso pode fazer comigo? O que isso pode representar para o meu governo? Então, uma crise econômica, o desemprego, vão atrapalhar minha gestão. Então, vou negar essa epidemia." Ele negou a epidemia porque achava que era contrária a ele. O mesmo lance que o Trump fez nos Estados Unidos, até certo ponto. Eles intrepretaram a epidemia como uma coisa que era destinada a enfraquecer o governo deles. Eles não viram a neutralidade da epidemia. Tanto que aqui no Brasil o próprio ministro das Relações Exteriores chamou de vírus comunista. O vírus era um produto do comunismo, destinado a enfraquecer os governos democráticos ocidentais. Então, ele (Bolsonaro) pode ter tido essa visão, de que era um vírus comunista, destinado a enfraquecer o governo dele. Então, ele precisava negar o vírus. Qual foi o processo de negação? Primeiro, dizer que não era importante, que era apenas uma gripezinha. Quando começaram a surgir as mortes, eles disseram que o número de mortos era inflacionado, que estavam dizendo que morreu mais gente de coronavírus que de fato morreu — quando, na realidade, tudo indica que essas mortes são subnotificadas. Quando começaram a enterrar as pessoas, eles começaram a negar que os corpos estivessem dentro dos caixões, que eram pedras, que estavam enterrando caixão vazio...
É uma visão de política como guerra, não?
Exatamente. "Não existe vírus, existem eles contra mim. Se eles estão do lado que acha que o vírus é importante, é porque é alguma coisa contra mim..."
Inicialmente, o governo avaliou que a divulgação do vídeo do dia 22 foi boa, porque reforçou o entusiasmo do bolsonarismo, fortaleceu a narrativa do governo nas redes. Mas depois o presidente viu sua rejeição aumentar nas pesquisas, com redução na proporção dos que consideravam o seu governo regular. A exibição do Bolsonaro raiz em horário nobre assustou as pessoas?
O que aconteceu foi o seguinte: a divulgação do vídeo mostrou que Bolsonaro não tem condição de ser presidente da República. Mostrou que ele é um presidente incensado por aquelas pessoas que veem nele um mito. Acho que o Bolsonaro está cada vez mais reduzido àquela fração de pessoas despolitizadas ou os polititizados que estão muito agrupados na extrema direita. Isso é um processo que está avançando e não terminou, o isolamento dele não terminou.
Como explicar o apoio de neofascistas? De onde veio essa turma?
Olha, essa crise mundial, que repercutiu, que acabou avançando na eleição de presidentes como Trump, como Bolsonaro, só se agrava. Então, nesses momentos de crise, esses movimentos surgem, tanto à direita como à esquerda. Neste momento, os mais visíveis estão à direita. Então, eles encontaram no Bolsonaro uma espécie de possibilidade de projeção política. As manifestações estão cada vez mais claramente demonstrando os símbolos. Aquela manifestação feita diante do Supremo Tribunal Federal, você vendo a imagem, diz: é a Ku Klux Klan. Ou é uma imagem do nazismo, daquele momento, quer dizer, tem todas as características simbólicas. E tem outros símbolos de supremacia branca, os caras tomando copo de leite, curiosamente, para passar mensagem subliminar (em uma live nas redes sociais em 1º de junho Bolsonaro aparece tomando um copo de leite puro; naquele dia era comemorado o Dia Internacional do Leite, porém, nas redes sociais, o gesto foi associado com um costume dos supremacistas brancos dos Estados Unidos de usar leite como um símbolo). Essas coisas que a gente está vendo.
Uma hora é um secretário que se fantasia de Goebbels para praticamente lhe repetir as palavras. Outra são apoiadores de tocha e máscaras na porta do STF, lembrando caminhadas nazistas. O próprio presidente citou uma frase que foi usada por Mussolini. É tudo coincidência?
Eles negam, mas se você olhar... O livro do Umberto EcoO Fascismo Eterno, lista as 14 características essenciais, que ele considera do fascismo eterno. E quase todas estão presentes no Brasil. O ultracionalismo, a admiração pelas armas... Quer dizer, todas as características principais do fascismo estão presentes, o pavor da modernidade... Isso está presente, são características do fascismo eterno. O machismo, o culto das armas, o namoro com a morte, tudo isso é caracteristica do fascismo. Está lá no livro do Umberto Eco, que acho uma pessoa insuspeita para falar disso. Escrevia composições, pariticipava de concursos de composições, sob o fascismo, viu chegarem os americanos, estudou a vida inteira isso. Agora, estamos caminhando para o fascismo tabajara, com características próprias, não tem a consistência teórica necessária para isso, mas tem caracteristicas.
Como o senhor avalia a participação de Bolsonaro nas manifestações que pedem o fechamento do Supremo e do Congresso?
Evidentemente, qualquer democrata, diante de uma manifestação desse tipo, passa longe. Ele (Bolsonaro) vai lá saudar os manifestantes. Meio que demonstra, com isso, que tem uma simpatia pela causa deles. Ele tem alguma simpatia pela causa do fechamento do Congresso e do fechamento do Supremo. Agora, no último domingo, ele agravou isso mais. Trouxe com ele no mesmo helicóptero, para participar ou para descer na manifestação, o ministro da Defesa (Fernando Azevedo e Silva). Deu um passo além, simbolicamente. Não significa que trouxe as Forças Armadas para o lado dele. Então, simbolicamente, o ministro da Defesa desceu com ele em uma manifestação. Agora, o ministro da Defesa, depois, foi pedir desculpas, pedir desculpas não, foi se justificar junto à Camara dos Deputados, depois foi se justificar ao Alexandre de Moraes, dizer que não foi bem assim,que pegou uma carona, que não sabia... Afinal, o ministro da Defesa não é o ministro da Defesa da Suécia. Ele sabe que todo domingo tem manifestação ali. Por que ia pegar uma carona? Se ele é tão inocente, não pode ser ministro da Defesa.
Bolsonaro pode ser apaziguado, pode ser levado a respeitar as leis?
Acho que é evidente agora, depois de tudo que ele mostrou, quem viu aquela reunião, que Bolsonaro está querendo armar o povo para uma expressão política, para que o povo tome uma posição politica que eles querem. Está querendo criar milícias armadas. Aquilo ele falou com toda a sinceridade. E não voltou atrás nisso, pelo contrário. Continuou disposto a isso. E um homem que quer armar uma parte da população está preparando uma guerra civil. Naquele momento, ficou bastante claro para mim qual é o desígnio dele, qual é a posição. Então, acho que tem que trabalhar para ou neutralizá-lo visando ir até 2022, ou afastá-lo antes disso.

Uma reflexão e um alerta, em meio a um labirinto de incertezas Paulo Roberto de Almeida

Uma reflexão e um alerta, em meio a um labirinto de incertezas
Paulo Roberto de Almeida

Creio ser de meu dever, sobretudo de ordem moral, como diplomata, alertar meus colegas — ou pelo menos todos aqueles que ainda não sucumbiram ao Zeitgeist e às misérias do momento — para o trabalho em curso de destruição dos fundamentos conceituais e operacionais de nossa instituição, o Itamaraty, assim como de desmantelamento das bases intelectuais e espirituais de nossa política externa, cujos padrões de trabalho — o multilateralismo e todos os princípios constitucionais que a sustentam — e os grandes valores e orientações de atuação, que sempre estiveram presentes em suas manifestações concretas, estão sendo sistematicamente solapados desde o início do presente governo.
Não preciso lembrar que uma corporação de Estado, orgulhosa de suas realizações do passado, consciente de suas altas aspirações do presente, e desejosa de bem cumprir com suas obrigações perante as gerações do futuro, não deveria permanecer passiva em face dos ataques de insanidade política e de total incorreção diplomática que vêm sendo constantemente exibidos pela tropa de ineptos que desgoverna o país.
Nunca tive vocação para Cassandra, mesmo em momentos difíceis de ostracismo e isolamento, como também é o caso atualmente. Sempre registrei meu pensamento, minhas reflexões de momento e meus trabalhos mais analíticos em textos de variada dimensão e escopo, e os deixei à disposição dos interessados, como uma espécie de convite a um debate de qualidade sobre os rumos de nossa política externa e de nossa diplomacia, em meus canais de comunicação, em especial no meu quilombo de resistência intelectual que é o blog Diplomatizzando.
Não me recordo de jamais ter sentido a necessidade de formular um alerta dotado de tal gravidade, dirigido expressamente a meus colegas de carreira. Não creio que a História possa ser leniente com qualquer passividade e inação de nossa parte ante o trabalho de destruição que agora contemplamos.
Vale!
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 6/06/2020

Ninguém – menos ainda um juiz – pode ser ‘neutro’ diante do crime - Flavio Tavares

Flavio Tavares, um sobrevivente de 1964, homenageia o juiz Celso de Mello por sua postura corajosa em face do perigo autoritário. 
 Paulo Roberto de Almeida

Ninguém – menos ainda um juiz – pode ser ‘neutro’ diante do crime
O fantasma sempre presente e atual
Flávio Tavares*
O Estado de S. Paulo, Página 2 – Sexta-feira 5 de junho de 2020

A lúcida visão, de décadas atrás, do pensador católico Alceu Amoroso Lima desponta atual, agora, no Brasil. “O passado não é aquilo que passa, mas aquilo que fica do que passou”, disse ele.
    Como se não bastasse o horror da covid-19, acumulando cadáveres Brasil afora, o final de maio desnudou a mais perigosa ameaça que jamais surgiu no País. Vimos o presidente da República solidarizar-se com os manifestantes que, em Brasília, pediam uma “intervenção militar”, cujo nome real e concreto é “ditadura”. Ao lado do general-ministro da Defesa, Bolsonaro solidarizou-se com os manifestantes e até desfilou a cavalo entre eles, como um Napoleão tropical.
    Antes disso, o filho deputado de Bolsonaro havia frisado que, agora, se trata apenas de saber “quando” se deve romper o sistema democrático e voltar aos tempos do AI-5, com medo e perseguição comandando tudo. Já não se discute (disse ele, como numa alucinação) a necessidade, mas apenas o “quando”.
    Nunca houve no Brasil algo tão despudorado. Nem sequer em 1964, quando se pregava a derrubada do governo para “preservar a democracia”, mas em seguida se instalou a ditadura. Hoje já não se trata de opção política entre “ditadura” e “democracia” (dualismo inaceitável, pois não se escolhe entre “o mal” e “o bem”), mas de posição moral e ética. Está em jogo a segurança que só a democracia proporciona a cada habitante do País.
       Nesse contexto de aberta pregação ditatorial, indiretamente estimulada pelo Palácio do Planalto, surgiu o alerta do decano do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, comparando o Brasil atual à Alemanha de 1933, quando Hitler subiu ao poder pelo voto, “guardadas as devidas proporções”. É desnecessário falar do terror de Hitler ou repetir o que Celso de Mello resumiu sobre o eleito que virou ditador brutal.
     O alerta de Celso de Mello não afeta a imparcialidade do decano do STF. Apenas mostra que ninguém – menos ainda um juiz – pode ser “neutro” diante do crime. Não há crime maior do que estraçalhar os Poderes que guiam a democracia, tal qual pregam os próximos a Bolsonaro.
No Brasil, a confusão domina a política e o que dela deriva passa a simulacro. Os partidos já não definem posições e ideias diferentes sobre a organização da sociedade, hoje são meros aglomerados de gente ansiosa por desfrutar o poder.
       A definição tradicional entre “direita”, “esquerda” ou “centro” já não existe. Ainda que os termos sigam em voga, são apenas fantasmas num mundo aqui desaparecido.
Os exemplos gritantes são, de um lado, o PT e Lula da Silva e, de outro, Jair Bolsonaro. O antigo metalúrgico chefia um partido que, até pela denominação, seria de “esquerda”, mas se jacta de que os bancos (símbolos da “direita”) “nunca lucraram tanto” quanto nos seus anos de presidente da República. Não oculta sequer o que, em si mesmo, é aberrante e contraditório.
        De outro lado, em 2018 Bolsonaro usou os novos instrumentos das chamadas “redes sociais” e chefiou uma rebelião popular que o levou à Presidência da República sem jamais definir o que sua rebeldia significava. Ao contrário, sempre silenciou. Sob a alegação de que estava sob cuidados médicos devidos à facada que sofreu, não participou sequer dos debates com seu adversário no segundo turno. Foi, de fato, um rebelde sem causa.
     Antes, quando o juiz Sergio Moro e a Polícia Federal desmontavam a rede corrupta entre grandes empresários e os chefes dos partidos no poder (do PT ao MDB, PP e outros da “base alugada”), o candidato Bolsonaro aproveitou-se da nova situação psicossocial e, de apagado deputado do chamado “baixo clero” na Câmara dos Deputados, travestiu-se no candidato que prometia ser “o vingador” do ultraje cometido pela baixa política.
     Usou uma situação de que foi mero espectador como se fosse um dos atores. A “novidade” das chamadas “redes” chegou às famílias brasileiras como “a volta” à honestidade ou à ordem e ao progresso da Bandeira. O estelionato eleitoral ficou claro 16 meses após a posse de Bolsonaro, quando o ministro da Justiça, Sergio Moro, teve de se demitir ao denunciar as manobras do presidente para fazer da Polícia Federal uma instituição protetora da prole presidencial.
      Esse simulacro que domina a política é, ainda, um dos resquícios herdados dos 21 anos da ditadura implantada em 1964. Ali, tudo era simulação. A ditadura se implantou em nome da “liberdade”, manteve aberto os Legislativos com eleições sob controle, em que os opositores mais aguerridos não podiam concorrer. O Ato 5 permitiu ao governo controlar o Judiciário e a sociedade toda ao censurar a imprensa. Esses 21 anos se impregnaram de tal forma na visão política do País que ainda hoje o povo confunde “democracia” com “eleição”, como se o debate livre não existisse.
    Vivemos já 35 anos sob democracia, mas não nos libertamos por inteiro do fantasma principal da ditadura, ainda presente e atual.

✽ JORNALISTA E ESCRITOR, PRÊMIO JABUTI DE LITERATURA 2000 E 2005, PRÊMIO APCA 2004, É PROFESSOR APOSENTADO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

sexta-feira, 5 de junho de 2020

Mini-reflexão sobre a falta de reflexões - Paulo Roberto de Almeida

Um trabalho escrito e divulgado em primeira mão no Facebook, na data de ontem, hoje transplantado para este espaço.


Mini-reflexão sobre a falta de reflexões

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: reflexão; finalidade: debate público]
Brasília, 4/06/2020


Influenciadores deveriam influenciar, não é mesmo?
Ou seja, espera-se que pelo menos produzam textos que façam algum sentido, que congreguem novos adeptos, ou que pelo menos aliciem os já iniciados.
Mas, para isso é preciso um mínimo de “explicações” razoáveis sobre a realidade.
Ora, não é isso o que se observa.
Até agora não vi nada de realmente aproveitável nos escritos recentes (se existem) do olavo-bolsonarismo. 
O capitão é um inepto total; os filhos não sabem pensar ou escrever; o chanceler acidental tem textos erráticos (alias denotando uma personalidade profundamente desequilibrada), e o guru não escreve mais nada, só xinga em vídeos demenciais, o que apenas revela um ser torturado pela loucura.
O que sobrou? 
Nada!
Apenas um livro, organizado por um seguidor depois decepcionado, que ainda tinha coisas antigas relativamente compreensíveis, recolhidas em diversas bases: “O Mínimo que...”, mas parou por aí.
Disso, só sobraram invectivas furiosas e expletivamente escabrosas dirigidas a supostos adversários. 
Eu aliás cai na lista dos nomes a atacar, e até a intimidar no plano profissional.
Não sou de me assustar ou de recuar ante a suprema MEDIOCRIDADE na qual os olavo-bolsonaristas jogaram o Brasil: vou continuar denunciando a obra nefasta de terra arrasada que esse ignaros autoritários pretendem instalar no país.
Como disse num de meus livros, isso seria a destruição da inteligência.
Não sem a minha resistência intelectual.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de junho de 2020
Divulgado no Facebook (4/06/2020; link: https://www.facebook.com/paulobooks/posts/3288023341261093).

Amigo de Bannon, Gerald Brant pode quebrar tabu e ter cargo no Itamaraty - Daniel Rittner (Valor)

Amigo de Bannon, Gerald Brant pode quebrar tabu e ter cargo no Itamaraty
Daniel Rittner
Valor Econômico, 5/06/2020

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/06/05/amigo-de-bannon-gerald-brant-pode-quebrar-tabu-e-ter-cargo-no-itamaraty.ghtml

O executivo do mercado financeiro Gerald Brant, diretor de uma empresa de investimentos em Wall Street e bastante próximo do estrategista americano Steve Bannon, é cotado para assumir um cargo relevante no Ministério das Relações Exteriores.

Ele foi sondado para atuar como uma espécie de “conselheiro” do Itamaraty, como assessor especial e ligado diretamente ao gabinete do chanceler Ernesto Araújo, conforme apurou o Valor. Brant, que mora em Nova York, ainda não teria batido o martelo na sua vinda para o governo Jair Bolsonaro. A interlocutores, o executivo afirmou que está disposto a se somar como “soldado” e por “algum tempo”.

Filho de mãe americana e pai brasileiro, que trabalhava no Itamaraty, Brant nasceu em Chicago e morou no Rio de Janeiro na juventude. Passou parte da infância em Varsóvia, quando a Polônia era parte da União Soviética, e por isso brinca que é “anticomunista desde criancinha”.

Forte defensor do liberalismo econômico e conservador nos costumes, ele foi peça-chave na organização da primeira visita do então pré-candidato Bolsonaro a Nova York, no fim de 2017. Brant construiu pontes para sua ida ao Council of Foreign Relations - prestigiado centro de estudos americano - e o ajudou a sentar-se frente a frente com importantes investidores e analistas financeiros, numa época em que o brasileiro era desconhecido no exterior.

Amigo de longa data do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), ajudou na aproximação da família presidencial com Steve Bannon, ex-estrategista de Donald Trump e fundador do grupo internacional de direita Movimento.

Os dois - Bannon e Brant - organizaram, em março do ano passado, um evento em Washington para homenagear o escritor Olavo de Carvalho e apresentar sua obra a formadores de opinião de linha conservadora nos Estados Unidos. No evento, o executivo distribuiu aos participantes bonés com o lema “Make Brazil Great Again”.

Todos eles participaram, na noite seguinte, de um jantar de Bolsonaro com conservadores americanos na embaixada do Brasil. Naquela viagem, o presidente brasileiro encontrou-se com Trump na Casa Branca, quando obteve apoio formal dos Estados Unidos à entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a designação do país como aliado extra-Otan.

As gestões de José Serra e Aloysio Nunes (governo Michel Temer), no Itamaraty, tiveram nomeações em caráter temporário de assessores fora da carreira diplomática - embora nomes de muito menos relevância, sem conexão direta com o presidente e por meio da cessão de outros órgãos da Esplanada, como a Apex.

Nos primeiros dias de Araújo como chanceler, entretanto, um decreto presidencial permitiu a nomeação de três assessores especiais de fora do Itamaraty, o que representava uma quebra de paradigma e provocou aflição entre servidores. A prerrogativa nunca foi efetivamente exercida e Brant, caso confirme sua vinda, seria o primeiro caso registrado.

O Itamaraty passa pela segunda onda de reformulação desde a chegada de Araújo. Além de mudança em embaixadas relevantes, como Buenos Aires e Santiago, o chanceler está trocando secretarias e outros cargos de confiança. Uma das substituições foi a do chefe de comunicação, o diplomata João Alfredo dos Anjos, com quem Araújo vinha demonstrando insatisfação pela dificuldade em conter reportagens mais críticas na imprensa.

Nas redes sociais, o chanceler respondeu duramente à publicação de um artigo co-assinado por ex-ministros e ex-embaixadores, classificando o texto como “mantra patético” que tenta “compensar com estridência a falta de ideias”. O artigo foi firmado por Fernando Henrique Cardoso, Celso Amorim, Celso Lafer, Rubens Ricupero, Aloysio Nunes, José Serra, Francisco Rezek e Hussein Kalout. Eles manifestaram preocupação com a “sistemática violação” de princípios constitucionais pela atual política externa.


Araújo chamou os autores de “paladinos da hipocrisia” e cobrou, em postagem no Twitter, que “não fiquem usando a Constituição como guardanapo para enxugar da boca a sua sede de poder”.