O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 12 de abril de 2016

Programa Iluminuras na TV Justiça-DF: Paulo Roberto de Almeida

Finalmente pude assistir à minha própria entrevista feita em 11/03/2016 (divulgado em 8/04/2016),  pelo jornalista Paulo Teles, para o programa "Iluminuras" da TV Justiça, gravado na Biblioteca de Obras Raras da Federação Espírita Brasileira, um espaço decorado por livros, aliás com estantes que eu gostaria de ter, para poder acomodar todos os meus livros.
O programa figura neste link:
https://www.youtube.com/watch?v=qh4ULayECgQ
 











Antes do programa, o jornalista Paulo Teles me submeteu um roteiro de perguntas que seriam abordadas por ele na entrevista.
Para atender sua curiosidade, fiz o seguinte texto.

2936. “Iluminuras: minha vida com os livros”, Brasília, 7 março 2016, 9 p. Respostas a questões do jornalista Paulo Leite, para o programa literário da TV Justiça. Gravado na biblioteca de obras raras da Federação Espírita Brasileira (SGAN 603, Conj. F, Avenida L2 Norte, Brasília, DF).

 
Iluminuras: minha vida com os livros

Paulo Roberto de Almeida
[Respostas a questões do jornalista Paulo Leite,
para o programa literário da TV Justiça]


1) Qual é sua formação? E sua ocupação atual?
Venho de uma formação em Humanidades, tendo iniciado o curso de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, em 1969, mas abandonada no segundo ano, época da ditadura militar no Brasil. O curso foi retomado na Universidade de Bruxelas em 1971, tendo sido concluído em 1975, a mesma universidade onde obtive o grau de Doutor em Ciências Sociais em 1984, iniciado em 1977, mas interrompido por motivo de retorno ao Brasil e ingresso na carreira diplomática (doutoramento retomado em 1981, durante meu primeiro posto diplomático na Europa). No intervalo, e logo após concluir o curso de graduação, fiz um mestrado em economia do desenvolvimento, na Universidade do Estado de Antuérpia, com uma dissertação sobre comércio exterior brasileiro. No quadro dos estudos em diplomacia, fiz o Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, tendo defendido uma tese sobre a formação da diplomacia econômica no Brasil.
Sou diplomata desde 1977, tendo servido nas embaixadas em Berna, Belgrado e Paris, nas delegações em Genebra e Montevidéu e como Ministro-Conselheiro na Embaixada em Washington (1999-2003). Fui também Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE) da Presidência da República, em Brasília (2003-2007). Na Secretaria de Estado, chefiei a Divisão de Política Financeira (1996-1999) e ocupei diferentes cargos de assessoria. Em 2010 atuei como comissário geral adjunto do Pavilhão do Brasil na Exposição Universal de Xangai (Abril-Outubro), e entre 2013 e 2015 fui Cônsul Geral Adjunto no Consulado do Brasil em Hartford, CT-EUA. Regressei recentemente do exterior e encontro-me cooperando com a Fundação Alexandre de Gusmão em diversos projetos de natureza cultural.

2) Qual é o primeiro livro que você se lembra de ter lido e a impressão que teve dele?
Frequentei bibliotecas públicas antes mesmo de aprender a ler, para jogos e cinema. Quando aprendi a ler, devo ter lido quase todos os livros existentes na Biblioteca Infantil Municipal Anne Frank, no bairro do Itaim-Bibi, em São Paulo, capital. Destaco toda a coleção infantil de Monteiro Lobato, com ênfase na História do Mundo para as Crianças, que devo ter lido diversas vezes, daí minha conexão extremamente forte com estudos de história, a despeito da formação em Ciências Sociais. História do Mundo para as Crianças não foi certamente o primeiro livro lido, pois eu já devia ter nove ou dez anos, mas foi o que mais profundamente me marcou, não apenas na infância, mas durante toda a vida, pois data dessa leitura minha motivação para a carreira acadêmica no terreno das Humanidades, onde se concentra minha produção intelectual.

3) Onde você nasceu? Sua cultura lhe influenciou nas primeiras leituras?
Nasci em São Paulo, capital, quase na exata metade do século 20, em novembro de 1949, e posso dizer que não dispunha de qualquer “cultura” especial em minha primeira infância. Explico-me: tenho vivido com livros, pelos livros e para os livros uma boa parte de minha vida, provavelmente dois terços de uma existência passada na atenta fixação do papel impresso. Entretanto, até onde alcançam minhas lembranças da primeira infância, não se pode dizer que o gosto da leitura constituísse uma espécie de kismet pessoal ou que ele estivesse entranhado num certo ambiente familiar.
Não me lembro, por exemplo, que minha casa contivesse muitos livros, pelo contrário, provavelmente muito poucos. Meus pais, típicos filhos de imigrantes pobres, de extração camponesa portuguesa e italiana, tinham sido criados entre o trabalho e a escola, processo que conduziu a uma educação primária incompleta nos dois casos. Mas, como todos os imigrantes, ambos davam uma importância muito grande à educação formal dos filhos, o que, dadas as condições de penúria material em que vivíamos, não necessariamente se traduziu em aquisição voluntária de outros livros que não, chegada a hora, os didáticos. 
Foram circunstâncias fortuitas que me fizeram chegar aos livros e com eles passar boa parte de minha vida. Minha casa, na então Chácara Itaim, bairro paulistano do Jardim Paulista, ficava muito próxima de uma biblioteca infantil, que eu passei a frequentar antes mesmo de estar formalmente alfabetizado. Na “Biblioteca Anne Frank” passei todos os anos de minha infância e os primeiros da adolescência. Uma vez treinado nas primeiras letras, na “atrasada” idade dos sete anos, passei a ler furiosamente: lia com avidez, não só na própria biblioteca, como todos os dias retirava sistematicamente um ou dois livros para ler em casa, à noite. Se não li todos os livros da biblioteca, devo ter chegado muito perto disso.
Alguns anos depois, trabalhando durante o dia e estudando à noite, passei a frequentar as bibliotecas do centro de São Paulo: a pública “Mário de Andrade”, a liberal e circunspecta da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, a especializada em economia do Centro das Indústrias, a da USIS, junto ao Consulado dos Estados Unidos, a da União Cultural Brasil-Estados Unidos e várias outras mais. Também comecei a percorrer incessantemente as livrarias do centro da cidade, em especial a velha Brasiliense, na Barão de Itapetininga, e a Zahar, na Praça da República.
Enfim, foram anos e anos de contato com os livros, lendo em toda e qualquer circunstância, em casa ou no trabalho, na escola e nos transportes públicos, sob chuva ou sol quase se poderia dizer. Raramente, ou quase nunca, saía de casa sem um livro na mão ou na pasta: qualquer oportunidade era boa para se avançar na leitura, mesmo na fila do recrutamento militar (quando estava acompanhado de Gustavo Corção, uma leitura insuspeita nos anos do regime militar). Ao deixar o Brasil pela Europa, no começo dos anos 70, arrastei comigo uma biblioteca que certamente deve ter intrigado diversos agentes alfandegários. No velho continente, como não podia deixar de ser, passei boa parte de uma longa estada de sete anos voluntariamente encerrado em bibliotecas universitárias, sobretudo a do Instituto de Sociologia da Universidade de Bruxelas. Continuei depois esse hábito nas demais cidades a que fui levado por força de uma vida profissional sempre nômade.
Desde muito cedo, habituei-me também a fazer fichas de livros, sob a forma de notas sintéticas, algumas compilações mais ou menos longas ou mesmo resenhas críticas, em cadernos ou folhas esparsas. Infelizmente, algumas dessas resenhas pioneiras foram perdidas com os papéis da juventude, entre a partida e a volta da Europa. Minha primeira resenha publicada parece ter sido a de uma obra do Erich Fromm, A Sobrevivência da Humanidade (tradução brasileira, pela Zahar, de Can Man Survive?), que saiu no jornal do centro acadêmico do Colégio Costa Manso, onde eu cursava o Clássico (em torno dos 16 anos, portanto). Muitos outros trabalhos dessa época, que precedeu minha saída do Brasil, se perderam: lembro-me de extensos resumos de obras políticas, de leituras anotadas de Sartre, Celso Furtado, Caio Prado, Florestan Fernandes e muitos outros autores brasileiros ou estrangeiros.
Mais tarde, durante minha estada universitária na Europa, preenchi diversos cadernos quadriculados, organizando-os por temas, ali compilando apreciações críticas e resumos de dezenas de livros, sem considerar as simples notas bibliográficas, que tinham seus cadernos especiais. Mas, essas anotações não cobrem senão uma parte de minhas leituras, aquelas ligadas diretamente ao estudo acadêmico ou às preocupações políticas. Dezenas de outros livros, cujos títulos se perderam em agendas extraviadas, permaneceram sem registro, sem falar dos muitos romances, policiais ou literários, que nunca foram objeto de qualquer tentativa de “crítica literária”. Se fosse possível fazer uma lista mais ou menos abrangente de minhas leituras, ela certamente ocuparia dezenas de páginas e nunca estaria completa.

4) E a paixão pelas letras, de onde veio?
Esta é precisamente uma de minhas grandes falhas: sou mais afeto à leitura de livros de história, de política, de economia, ou de ciências sociais aplicadas, no sentido lato, do que à literatura propriamente dita. Mas na literatura, adoro ler romances históricos, e sem qualquer hesitação indico Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, como o maior monumento literário da humanidade. Trata-se de meu grande romance, na verdade um livro que fala sobre os homens, como eles são. Por isso não tenho outra frase que mais aprecio nesse livro do que esta, que copio de uma edição em espanhol de Cervantes:
Es, pues, de saber, que este sobredicho hidalgo, los ratos que estaba ocioso... se daba a ler...; y llegó a tanto su curiosidad y desatino en esto, que vendió muchas hanegas de tierra... para comprar libros... y así llevó a su casa cuantos pudo haver dellos. (...) En resolución, él se enfrascó tanto en su lectura, que se le pasaban las noches leyendo de claro en claro, y los dias de turbio en turbio; y así, del poco dormir y del mucho leer se le secó el celebro, de manera que vino a perder el juicio.
Ainda não me ocorreu, apesar do excesso de leituras, a fatalidade que se abateu sobre o cavaleiro da Mancha. Em todo caso, meu cérebro não parece ter secado pelo fato de também passar muitas noites na companhia dos livros ou escrevendo sobre eles.

5) O que gosta de ler? (contos, crônicas, poesias?)
Um pouco de tudo, mas concentro-me nas já referidas ciências sociais. Em literatura, gosto de bons romances policiais, com destaque para Conan Doyle e a série Sherlock Holmes, que devo ter lido toda. Mas, nessa categoria, aprecio apócrifos de Holmes, isto é, pastiches colocando o célebre detetive a serviço ou em confrontação com personagens históricos conhecidos, como Karl Marx (duas vezes, uma na Comuna de Paris, envolvendo inclusive o anarquista russo Bakinin), com Freud, com Oscar Wilde, com Albert Einstein, e outros. Desse gosto por esse nicho especial de literatura, comecei a escrever, muitos anos atrás, um Sherlock Holmes Contra Floriano Peixoto – bem antes que Jô Soares escrevesse o seu Xangô de Baker Street – mas que infelizmente nunca terminei. Talvez um dia retome esse “romance” apócrifo, fazendo o detetive inglês perder uma contenda contra Floriano Peixoto, no início da República.

6) Quais autores você mais lê?
Como disse, leio basicamente livros nas áreas de ciências sociais, com destaque, nos últimos anos, para história econômica, mundial e do Brasil, uma vez que estou escrevendo livros nessa área.

7) O senhor tem quantos livros? 
Impossível dizer, pois tenho livros ainda em caixas, de minha última mudança. Ao sair do Brasil, no final de 2012, deixei alguns milhares – não sei dizer quantos, pois estão colocados uns na frente de outros, em diversas estantes – guardados numa kit-biblioteca na 912 Norte, adquirida especialmente para essa finalidade. Mas, no decorrer de uma longa vida acadêmica, já me desfiz de muitos livros, geralmente encaminhando para bibliotecas (da UnB, do Itamaraty, do Instituto Rio Branco). Devem ser, contando subjetivamente, seis ou sete mil, mas ainda preciso quantificar exatamente, os que estão na kit e os que tenho comigo ainda em caixas em meu apartamento da 213 Sul.

8) Fale um pouco sobre o processo de criação de seus livros?
Todos os meus livros, listados abaixo, são o resultado de estudos feitos em determinadas áreas, seja como resultado do trabalho profissional na diplomacia (em integração e em comércio internacional, por exemplo), seja como resultado de aulas em diversas faculdade, nos últimos dez anos no mestrado e doutorado em Direito do Centro Universitário de Brasília, Uniceub, onde sou professor.
Meu processo é muito simples, e ao mesmo tempo complicado. Toda e qualquer atividade que desenvolvo e que implica em algum trabalho intelectual – reuniões diplomáticas, seminários, palestras, aulas e pesquisa, propriamente dita – é objeto de anotações detalhadas, preparação de sínteses explicativas e textos-guia para palestras, que depois me servem para compor um novo livro. Devo dizer que também costumo tomar notas de todos os livros que leio. Posso dizer que quando concebo, virtualmente, um livro, ele já se encontra pronto, em minha cabeça: a etapa seguinte é simplesmente a de sentar e escrever, com base nessas notas esparsas, nas sínteses parciais, nas palestras feitas. Geralmente faço um esquema, que é o equivalente de um índice, e depois o sigo metodicamente, inclusive escrevendo a introdução (depois revista) antes mesmo de escrever o primeiro capítulo. Ou seja, trata-se de um processo relativamente organizado de leituras, anotações, concepção do livro e redação organizada. Isso envolve, portanto, uma lenta e longa preparação e muitas vezes recupero notas de vários anos antes – em cadernos ou arquivos de computador – para escrever um novo livro.
Na verdade, os meus “working files”, os livros e trabalhos em preparação, atualmente organizados metodicamente em meu computador, são ainda mais numerosos do que os livros acabados e publicados. Também disponho de muitos documentos em arquivo, centenas e centenas de papeis acumulados, que correspondem a cópias de livros, de documentos, notas de pesquisas em arquivos que, algum dia, serão integrados em novos livros, ou em reedições dos já publicados.
Abaixo uma parte pequena de minha produção intelectual, ou seja, apenas os livros individuais e impressos, publicados por editoras comerciais, ou então, no período recente, em formato digital, e em quase todos os casos disponíveis livremente para alunos e outros interessados. Existe um certo número de livros editados por mim (conferir aqui: http://www.pralmeida.org/01Livros/1NewBoooks/2OrganizaEdita.html), e dezenas de capítulos oferecidos em contribuição em obras coletivas, a quase totalidade a convite de editores ou organizadores (que podem ser conferidos neste link: http://www.pralmeida.org/01Livros/1NewBoooks/4Colabora.html).
Minha vida se dá em torno de livros, que conformam meu vício, minha compulsão mais conhecida, a que me dá maior prazer espiritual e satisfação intelectual.

Livros por Paulo Roberto de Almeida
impressos e Digitais

Situação ao final de 2015:

Em preparação:
31) Going Global: Brazil and Latin America in International Context (Rockville, MD: Global South Press, 2016).

Publicados:
30) Révolutions bourgeoises et modernisation capitaliste: Démocratie et autoritarisme au Brésil (Sarrebruck: Éditions Universitaires Européennes, 2015, 496 p.; ISBN: 978-3-8416-7391-6).

29) Die brasilianische Diplomatie aus historischer Sicht: Essays über die Auslandsbeziehungen und Außenpolitik Brasiliens (Saarbrücken: Akademiker Verlag, 2015, 204 p.; Übersetzung aus dem Portugiesischen ins Deutsche: Ulrich Dressel; ISBN: 978-3-639-86648-3).

28) O Panorama visto em Mundorama: Ensaios Irreverentes e Não Autorizados (Hartford: Author edition, 2015, 294 p.; DOI: 10.13140/RG.2.1.4406.7682), disponível: Research Gate; link: https://www.researchgate.net/publication/280883937_O_Panorama_visto_em_Mundorama_Ensaios_Irreverentes_e_No_Autorizados?showFulltext=1&linkId=55ca738508aeb975674a4d44).


26) Volta ao Mundo em 25 Ensaios: Relações Internacionais e Economia Mundial (Kindle edition; ASIN: B00P9XAJA4; link: http://www.amazon.com/dp/B00P9XAJA4).

25) Rompendo Fronteiras: a Academia pensa a Diplomacia (Amazon Digital Services: Kindle edition, 2014, 414 p.; ASIN: B00P8JHT8Y; link: http://www.amazon.com/dp/B00P8JHT8Y).

24) Codex Diplomaticus Brasiliensis: livros de diplomatas brasileiros (Amazon Digital Services: Kindle edition, 2014, 326 p.; ASIN: B00P6261X2; link: http://www.amazon.com/dp/B00P6261X2).

23) Polindo a Prata da Casa: mini-resenhas de livros de diplomatas (Amazon Digital Services: Kindle edition, 2014, 151 p., 484 KB; ASIN: B00OL05KYG; link: http://www.amazon.com/dp/B00OL05KYG).

22) Prata da Casa: os livros dos diplomatas (resenhas, edição de autor; DOI: 10.13140/2.1.4908.9601; 2014, 663 p.; disponível: Academia.edu: https://www.academia.edu/5763121/Prata_da_Casa_os_livros_dos_diplomatas_Edicao_de_Autor_2014_).

21) Nunca Antes na Diplomacia...: A política externa brasileira em tempos não convencionais (Curitiba: Appris, 2014, 289 p.; ISBN: 978-85-8192-429-8).

20) O Príncipe, revisitado: Maquiavel para os contemporâneos (Kindle edition; 2013; ASIN: B00F2AC146; disponível: http://www.amazon.com/dp/B00F2AC146).


18) Relações internacionais e política externa do Brasil: a diplomacia brasileira no contexto da globalização (Rio de Janeiro: LTC, 2012, 309 p.; ISBN 978-85-216-2001-3).


17) Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização (Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2011, xx+272 p.; ISBN: 978-85-375-0875-6).

16) O Moderno Príncipe (Maquiavel revisitado) (Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2010, 195 p.; ISBN: 978-85-7018-343-9)

15) O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado (Rio de Janeiro: Freitas Bastos, e-book, 2009, 191 p.; ISBN: 978-85-99960-99-8)

14) O Estudo das Relações internacionais do Brasil: um diálogo entre a diplomacia e a academia (Brasília: LGE Editora, 2006, 385 p.; ISBN: 85-7238-271-2).

13) Formação da diplomacia econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império (2nd ed.: São Paulo: Editora Senac, 2005, 680 p., ISBN: 85-7359-210-9).

12) Relações internacionais e política externa do Brasil: história e sociologia da diplomacia brasileira (2nd ed.: Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004, 440 p.; ISBN: 85-7025-738-4).

11) A Grande Mudança: consequências econômicas da transição política no Brasil (São Paulo: Editora Códex, 2003, 200 p.; ISBN: 85-7594-005-8).

10) Une histoire du Brésil: pour comprendre le Brésil contemporain (avec Katia de Queiroz Mattoso; Paris: L’Harmattan, 2002, 142 p.; ISBN: 2-7475-1453-6).

09) Os primeiros anos do século XXI: o Brasil e as relações internacionais contemporâneas (São Paulo: Editora Paz e Terra, 2002, 286 p.; ISBN: 85-219-0435-5).

8) Formação da diplomacia econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império (São Paulo: Editora Senac, 2001, 680 pp., ISBN: 85-7359-210-9).

7) Le Mercosud: un marché commun pour l’Amérique du Sud, Paris: L’Harmattan, 2000, 160 p.; ISBN: 2-7384-9350-5).

6) O estudo das relações internacionais do Brasil (São Paulo: Editora da Universidade São Marcos, 1999, 300 p.; ISBN: 85-86022-23-3).

5) O Brasil e o multilateralismo econômico (Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 1999, 328 p.; ISBN: 85-7348-093-9).

4) Velhos e novos manifestos: o socialismo na era da globalização (São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 1999, 96 p.; ISBN: 85-7441-022-5).

3) Mercosul: Fundamentos e Perspectivas (São Paulo: Editora LTr, 1998, 160 p.; ISBN: 85-7322-548-3).

2) Relações internacionais e política externa do Brasil: dos descobrimentos à globalização (Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1998, 360 p.; ISBN: 85-7025-455-5).

1) O Mercosul no contexto regional e internacional (São Paulo: Edições Aduaneiras, 1993, 204 p.; ISBN: 85-7129-098-9).

Livros editados:

Capítulos em livros:

Artigos em periódicos:

Artigos em revistas e jornais:

CV completo, com todos os trabalhos (livros, capítulos, artigos, etc.):









Impeachment: vem pelo conjunto da obra - José Matias-Pereira (OESP)

Link: http://www.estadao.com.br/noticias/geral,os-destaques-do-estadao-noite-desta-segunda-feira--11,1854678

Estadão Noite – Segunda-feira, 11 de abril de 2016

O impeachment virá pelo conjunto da obra    

José Matias-Pereira

A deflagração da votação, nesta segunda-feira, do parecer da comissão especial que analisou o pedido de impeachment contra Dilma Rousseff, sinaliza que o sistema político está buscando encontrar uma saída para a grave crise política, econômica, social e ética que paralisou o país. Observa-se, nesse ambiente de turbulências políticas, de um lado os defensores da processada, acuados por um cenário de insatisfação generalizado, em função do fracasso do governo na gestão da economia, na política e no combate a corrupção; e do outro lado, os parlamentares oposicionistas, apoiados pela quase totalidade da população e pelo segmento econômico, que desejam afasta-la da presidência. No grupamento pró-governo, coordenado pelo “ministro informal” Lula, a estratégia divulgada por revistas semanais, é fazer promessas de cargos e liberação de emendas, para garantir a fidelidade dos aliados na tentativa de barrar a qualquer custo o processo de impeachment de Dilma. 

Torna-se relevante observar, diante desse contexto de conflitos e indefinições, que um processo de impeachment, conforme ficou evidenciado no afastamento do ex-presidente Fernando Collor, possui inúmeras nuances, considerando o seu caráter jurídico-político. A votação do parecer do relator na comissão especial de impeachment é apenas o primeiro passo nesse julgamento longo e traumático na vida política de qualquer país, lembrando que a decisão da comissão antecede a votação pelo plenário da Câmara dos Deputados da aceitação do pedido de impeachment. A aprovação pela comissão do parecer favorável do relator, deve-se ressaltar, tende a influenciar nos desdobramentos seguintes, pois sinaliza que existem motivos para iniciar um julgamento de impeachment contra o presidente.  

É oportuno destacar a consistência do voto do relator, deputado Jovair Arantes (PTB-GO), que ressaltou, em relação a abertura de créditos suplementares sem autorização legislativa, que os atos praticados, se confirmados, representam condutas gravíssimas e conscientes de desrespeito a um Poder da República, em uma de suas missões mais nobres e relevantes para a função de representação popular, e, portanto, consistem, à primeira vista, em um atentado à Constituição. Os fatos mostram sérios indícios de inconstitucionalidade, ilegalidade e irresponsabilidade fiscal.No que se refere as pedaladas fiscais, sustenta que há fortes indícios de que as transações financeiras constituíram um tipo de financiamento sobre o qual incidiria a vedação de contratação prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal, o que depõe em favor da admissibilidade da denúncia. Estão presentes os requisitos mínimos para a admissibilidade da denúncia.

Deve-se reiterar, assim, que existem diversos estágios a serem cumpridos num processo de impeachment, a partir do exame do pedido pela comissão especial. A manifestação da citada comissão sobre a recomendação do parecer do relator ao impeachment é uma decisão não vinculante, que deve ser publicada no dia seguinte, ou seja, na terça-feira, no Diário Oficial da Câmara dos Deputados. O presidente da Câmara deverá esperar no mínimo 48 horas para incluir o processo na ordem do dia e submetê-lo ao plenário de 513 deputados. Uma moção de impeachment exigirá o apoio de 342 deputados (dois terços), independentemente do número de legisladores presentes. O quórum para abrir a sessão é, precisamente, de 342 presentes, o mínimo para conseguir uma eventual aprovação. Se a moção não somar este número de apoios, o processo é arquivado. Se os 513 deputados estiverem presentes e nenhum se abstiver, serão necessários 171 votos (um terço) para bloquear a iniciativa, caso o presidente da Câmara não vote.

Aprovada a moção de impeachment, ela passa ao Senado, que é composto por 81 membros. O Senado formará uma comissão de 21 membros, que dará sua opinião sobre a admissibilidade do processo. Este trâmite pode ser mais rápido do que na Câmara dos Deputados e seguirá parâmetros similares a este órgão quanto ao quórum e quanto às maiorias necessárias. Para que uma decisão de impeachment seja aprovada no Senado e o processo seja instaurado, é necessária maioria simples, uma vez alcançado um quórum de 41 senadores. Se o Senado validar uma moção de destituição, Dilma será afastada de maneira provisória de suas funções por um máximo de 180 dias, para abrir caminho ao julgamento propriamente dito. Será substituída por seu vice-presidente, Michel Temer (PMDB-SP). A sessão final do julgamento será realizada no plenário do Senado, sob a direção do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). São necessários dois terços dos votos do Senado (54 de um total de 81) para destituir a presidente de forma definitiva, independentemente do número de presentes. Do contrário, ela reassume imediatamente suas funções.

Verifica-se, nessa trajetória que o rito do processo de impeachment contra Dilma Rousseff por crime de responsabilidade foi conduzido na comissão especial dentro dos parâmetros definidos pela Constituição Federal e pela lei que trata do impeachment. As reiteradas manifestações de inconformismo da presidente Dilma, de que o processo é um “golpe”, presentes também na retórica dos discursos do advogado geral da União, sinaliza que o governo vai tentar barrar o pedido no Supremo Tribunal Federal, por meio da judicialização do processo. É oportuno destacar, com base em diversas manifestações de juristas, incluindo ex-ministros do STF, a possibilidade de que a Suprema Corte acate um pedido da AGU para analisar eventuais irregularidades na tramitação do processo no âmbito da comissão especial do impeachment é quase nula.  

Feitas essas considerações, pode-se concluir que, o destino político de Dilma Rousseff foi lançado nesta segunda-feira, com a votação do parecer da comissão do impeachment. O fracasso de Dilma à frente do governo é a soma de inúmeros erros, iniciados no governo de seu antecessor Lula, decorrentes de incompetência, populismo, patrimonialismo, demagogia e corrupção. Não é por acaso que, contra ela pesa uma colossal rejeição junto à população, e a completa perda da credibilidade e legitimidade, perdendo dessa forma, a capacidade de governar o Brasil. Com o tombo no desempenho da economia que levou o país a depressão, provocando queda na arrecadação tributária, aumento do desemprego, redução na renda dos trabalhadores, inflação alta e juros elevados, aprofundou os problemas sociais do país. O esforço dos “negociadores” do Planalto de continuar investindo em indecisos e tentando evitar traições vai se revelando uma tarefa inglória, visto que promessas feitas com "cheques pré-datados" não convence ninguém quando a sobrevivência do político junto aos seus eleitores está em jogo. As perspectivas de Dilma Rousseff evitar o impeachment, diante da tragédia provocada no país pelo conjunto nefasto de sua obra, são muito pequenas.

José Matias-Pereira. Economista e advogado. Doutor em ciência política (área de governo e administração pública) pela Universidade Complutense de Madri, Espanha, e Pós-doutor em administração pela Universidade de São Paulo. Professor de administração pública e pesquisador associado do programa de pós-graduação em contabilidade da Universidade de Brasília. Autor, entre outras obras, do Curso de economia política (2015), publicado pela Atlas. 

http://www.estadao.com.br/noticias/geral,os-destaques-do-estadao-noite-desta-segunda-feira--11,1854678


segunda-feira, 11 de abril de 2016

Octavio Brandao: o primeiro marxista-leninista da esquerda brasileira - Augusto Buonicore (Fundacao Grabois)

Uma análise da obra deste pioneiro do marxismo-leninismo, que já li décadas atrás, não sei em qual edição, e que agora volta pelas mãos (e gráfica) dos camaradas do PCdoB.
O livro é um exemplo de interpretação marxista-leninista extremamente sectária, com todos os chavões a que Brandão tinha direito nessa fase inicial do pensamento marxista no Brasil.
Esse mesmo caráter sectário, simplista, redutor, estaria presente, durante toda a sua vida, em líderes como Luiz Carlos Prestes e alguns outros stalinistas.
Mas, seja o antigo PCdoB -- que foi o nome do Partidão até 1962 -- seja o Partidão depois disso, teve gente melhor, como por exemplo Caio Prado Jr., Leandro Konder, e alguns poucos outros. Marxistas esclarecidos são poucos. Eles tendem a ser religiosos...
Paulo Roberto de Almeida
Artigos
http://www.grabois.org.br/cdm/artigos/141021/2012-03-23/agrarismo-e-industrialismo-o-primeiro-encontro-do-marxismo-com-o-brasil

Agrarismo e Industrialismo: o primeiro encontro do marxismo com o Brasil

Augusto Buonicore  
Fundação Grabois, 23.03.2012
Em 2006 a Editora Anita Garibaldi relançou uma obra fundamental para a reconstituição da história do pensamento político da esquerda brasileira no século XX: Agrarismo e Industrialismo: Ensaio marxista-leninista sobre a revolta de São Paulo e a guerra de classes no Brasil. Seu autor, Octávio Brandão, foi um dos principais dirigentes e ideólogos do Partido Comunista do Brasil que, na ocasião da publicação, dava seus primeiros passos. Não deixa de ser sintomático o fato de que apenas depois de 80 anos de sua publicação, tenha conseguido uma merecida segunda edição. Vários fatores contribuíram para este prolongado esquecimento. O primeiro deles, sem dúvida, é a cultura autoritária de nossas classes dominantes. O livro foi produzido e começou a circular em pleno Estado de Sítio imposto pelo governo de Arthur Bernardes. A Revolução de 1930, que pôs fim ao domínio da oligarquia paulista, também não deu trégua aos comunistas. Ainda em 1931, Octávio Brandão e sua família foram exilados pelo novo regime e só puderam voltar ao país após o fim do Estado Novo. A legalidade do Partido, conquistada em 1945, durou menos de dois anos. Ao longo do século XX, além da ditadura getulista, o Partido Comunista teve de enfrentar o governo autoritário do General Dutra (1946-1950) e uma ditadura militar que durou mais de 20 anos (1964-1985). Essas rupturas democráticas ocasionaram também rupturas na memória da esquerda brasileira. Foram muitos os recomeços e muitos os esquecimentos.
Nasce um clássico
“A 28 de julho de 1924, os revoltosos evacuaram a cidade de São Paulo. O governo Bernardes delirou com a ‘vitória’. Os pequeno-burgueses urbanos ficaram muito desanimados (...). No fundo da sala de jantar, sentado no primeiro degrau de uma escada de ferro, ouvi a narrativa da derrota e, serenamente, comecei a escrever Agrarismo e Industrialismo.
Terminei a parte fundamental menos de um mês depois, a 22 de agosto de 1924. Tirei imediatamente cópias à máquina e espalhei-as entre os amigos”. Assim Octávio Brandão descreveu o início da produção da obra que teria um impacto decisivo na vida do Partido Comunista do Brasil naqueles primeiros tempos.
No entanto, passaria mais de um ano e meio para que o livro pudesse, finalmente, vir a público. Período que Brandão aproveitou para adicionar-lhe mais duas partes: “Síntese”, datada de março de 1925, e “A revolta permanente”, de março de 1926.
Quando ainda estava sendo composto, a polícia política do governo Bernardes invadiu a tipografia. Ela pretendia dar o flagrante e apreender a edição, que supunha estar pronta. Enganara-se, pois o trabalho não havia começado.
Rapidamente, sem que ela percebesse, os operários “jogaram toda composição nas caldeiras das linotipos” destruindo-a. Não conseguindo as provas de que necessitavam, os policiais tiveram de se retirar. Na mesma noite, reiniciou-se o trabalho de impressão daquela que entraria para a história como a primeira tentativa de interpretação marxista-leninista do Brasil.
Em abril, ainda com a capital da República sob Estado de Sítio, Agrarismo e Industrialismo começou a circular. Ele trazia como autor um tal de Fritz Mayer e a informação de que tinha sido publicado em Buenos Aires. Os comunistas espalharam ainda que Mayer era um oficial alemão que tinha participado do levante tenentista de São Paulo e fugira para a Argentina. Tudo isso foi feito com o objetivo de despistar a polícia brasileira. A artimanha parece ter dado resultados.
Naquele mesmo ano, mais de uma dezena de exemplares foi levada a Moscou e um acabou chegando às mãos do líder dos tenentes revolucionários Luiz Carlos Prestes. Mas os mais entusiasmados com aquela obra foram os militantes ligados ao PC do Brasil. A grande imprensa, como era de se esperar, ignorou solenemente sua aparição.

Uma obra pioneira e original
Os objetivos centrais de Agrarismo e Industrialismo eram expor a dinâmica da revolução democrática em marcha no país e uma linha política adequada para o jovem movimento comunista. Não havia, até então, nenhuma formulação tática ou estratégica mais consistente que norteasse a ação da esquerda marxista brasileira. Por isso as teses ali expostas tiveram um forte impacto nas formulações do Partido Comunista e influenciaram as resoluções dos seus 2º e 3º Congressos, realizados em 1925 e 1928.
Octávio Brandão procurou apresentar as peculiaridades da revolução brasileira e o papel das diversas classes naquele processo. Ele foi um dos primeiros a compreender os danos causados pelo domínio imperialista e a identificar a competição existente entre os interesses do imperialismo inglês, decadente, e do norte-americano, ascendente.
Por fim, teve o mérito de destacar a importância da luta que se travava entre a oligarquia latifundiária (os agraristas) e os setores vinculados à indústria (os industrialistas).
Antes mesmo que o 6º Congresso da Internacional Comunista (1928) viesse a estabelecer o cânone da predominância de relações feudais (ou semifeudais) na totalidade dos países da América Latina e da Ásia, Brandão já afirmava o caráter feudal da nossa formação econômica, política e social. Escreveu ele:
“Dominado por esse agrarismo econômico bem centralizado, o Brasil tinha de ser dominado pelo agrarismo político (...). O agrarismo político é a dominação política dos grandes proprietários (...). O fazendeiro de café, no sul, como o senhor de engenho, no Norte, é o senhor. O senhor feudal implica a existência do servo.
O servo é o colono sulista das fazendas de café, é o trabalhador de enxada dos engenhos nortistas. A organização social proveniente daí é o feudalismo na cumeeira e a servidão no alicerce”.
A chamada “tese feudal” teria uma longa vida no interior do movimento comunista brasileiro, até começar a ser questionada mais fortemente por marxistas como Caio Prado Jr. nas décadas de 1950 e 1960.
 
Uma estratégia leninista para o Brasil
Para enfrentar o agrarismo dominante, Brandão propôs a constituição de uma frente única policlassista: “O fazendeiro de café só será derrubado pela frente única momentânea do proletariado com a pequena-burguesia e a grande burguesia industrial”. A estratégia da revolução no Brasil teria como paradigma a Revolução Francesa de 1789 e Russa de fevereiro de 1917. Buscou reproduzir, a seu modo, a tática leninista indicada por Lênin em 1905.
Continuou ele: “Apoiemos, como classe independente, a pequena-burguesia na sua luta contra o fazendeiro de café, pois, segundo Marx, é preciso sustentar os partidos pequeno-burgueses quando estes resistem à reação.
Empurremos a pequena-burguesia à frente da batalha (...). Procuremos arrastar as grandes massas operárias e camponesas em torno de palavras de ordem simples, concretas, práticas e imediatas. Não esqueçamos que o Brasil, como a Rússia, é um país agrário (...)
Empurremos a revolução da burguesia industrial – o 1789 brasileiro, o nosso 12 de março de 1917 – aos seus últimos limites, a fim, de, transposta a etapa da revolução burguesa, abrir-se a porta da revolução proletária, comunista”, escreveu ele.
Brandão tinha a convicção de que ocorreria uma terceira revolta tenentista e que esta seria uma consequência das duas anteriores, ocorridas em 1922 e 1924. Para ele, as contradições que geraram aquelas conflagrações armadas continuavam de pé e se agravando.
Tendo por base essa perspectiva, fez uma previsão genial sobre a crise revolucionária que se abriria alguns anos depois: “Temos, pois em perspectiva, sérias batalhas de classe, isto é uma situação revolucionária.
Se os revoltosos pequeno-burgueses souberem explorar a rivalidade imperialista anglo-americana e a luta entre os agrários e os industriais, se procurarem uma base de classe para a sua ação, se o proletariado entrar na batalha e se essas contradições coincidirem com a luta presidencial e as complicações financeiras, será possível o esmagamento dos agrários (...).
Dada esta situação objetiva, a vitória da pequena-burguesia aliada à grande burguesia industrial e, posteriormente, a vitória do proletariado, serão meras questões subjetivas. Dependerão da capacidade dos revoltosos pequeno-burgueses e dos revolucionários proletários”.
As resoluções do 2º Congresso do PC do Brasil (1925), baseadas no esboço inicial de Agrarismo e Industrialismo, apontavam a "luta entre o capitalismo agrário semifeudal e o capitalismo industrial moderno como sendo a contradição fundamental da sociedade brasileira após a República".
Tendo em vista as particularidades da primeira etapa da revolução brasileira, os comunistas a definiram como revolução democrático-pequeno-burguesa. Baseavam tal formulação na destacada participação política das camadas médias urbanas, através do movimento tenentista, nos processos revolucionários que vinham ocorrendo nos estertores da República Oligárquica.
Era nítida a confusão entre o conteúdo social das tarefas a serem realizadas pela revolução – burguesa ou proletária – e o das forças sociais que teriam um papel mais destacado no processo revolucionário em curso: a pequena-burguesia.
No entanto, devemos destacar que o próprio termo utilizado para definir a revolução brasileira (democrático-pequeno-burguesa) visava a distingui-la da revolução ocorrida na Rússia em 1917; ou seja, procurava captar as suas particularidades e sua originalidade.
Afinal, no Brasil, as classes médias urbanas estavam tendo uma importância política e social bem maior que a dos camponeses. A situação brasileira era bastante diferente da que existira na Rússia e na China revolucionárias.
Dentro desse esquema teórico-político – nascido com Agrarismo e Industrialismo – é que Astrojildo Pereira, secretário-geral do PCB, elaborou o relatório sobre a situação brasileira – que foi enviado ao Secretariado Sul-Americano da Internacional Comunista e publicado na revista Correspondência Internacional em 1928.
Vejamos o que afirmavam os comunistas brasileiros: “a situação econômica e política do país, objetivamente examinada, faz prever uma conjuntura francamente revolucionária, que resultará da coincidência dos seguintes fatores: 1º) Crise econômica resultante de uma catástrofe na política cafeeira (...); 2º) crise política vinculada ao problema da sucessão presidencial no Brasil (1930); 3º) possibilidade de uma repetição de um novo 5 de julho”.
Diante desta terceira revolta que se aproximava e “que tomará proporções muito maiores que as de 24-26”, afirmavam, “não era de se supor que as massas trabalhadoras se mantivessem indiferentes ou neutras (...). Nessas condições, o dever do partido comunista consistirá em colocar-se à frente dela, procurando conquistar não somente a direção da fração proletária, mas a hegemonia de todo o movimento”.
Para derrotar as possíveis tendências direitistas existentes no movimento tenentista, eles apresentavam sua proposta tática:
“No nosso entender, a intervenção decidida do Partido Comunista no movimento, em estreita aliança como os revolucionários pequeno-burgueses (...) na luta comum contra o inimigo, pelo menos dificultará e poderá vencer com maior facilidade essa tendência fascista”.
Esses parágrafos demonstram a sagacidade política daqueles jovens dirigentes comunistas. Eles previram, com anos de antecedência, a crise revolucionária de 1930 – e o fim da República Oligárquica – e apresentaram uma estratégia bastante ajustada àquela situação, especialmente tendo em vista o domínio ainda limitado que tinham do instrumental teórico fornecido pelo marxismo-leninismo.

A guinada esquerdista e a crise no PCB
Em 1929 o movimento comunista pendeu perigosamente para a esquerda. Ao lado do esquerdismo começavam a predominar práticas autoritárias e sectárias – a política leninista de proletarização se transformava em “obreirismo”. Nesse ambiente, marcado pela intolerância, é que foram analisadas a tática e a estratégia dos comunistas brasileiros.
As ideias de Octávio Brandão e Astrojildo Pereira sobre a terceira revolta e a política de aliança centrada na pequena-burguesia urbana – traduzidas nas resoluções dos 2º e 3º Congressos do PCB – foram duramente criticadas pela Internacional Comunista (IC).
Na Conferência do Bureau Sul-Americano da IC, realizada entre abril e maio de 1930, eles foram acusados de desvios de direita e de serem "pequeno-burgueses". A sua tese sobre o caráter "democrático-pequeno-burguês" da revolução brasileira foi alcunhada de menchevique, antimarxista e antileninista por, supostamente, negar a hegemonia do proletariado na revolução democrática e superestimar o papel da pequena-burguesia urbana (os tenentes) em detrimento das massas camponesas.
Logo após a Conferência Sul-Americana, Brandão e vários outros camaradas foram retirados do Comitê Central. Em novembro de 1930 foi a vez de Astrojildo Pereira ser afastado do cargo de secretário-geral, que exercia desde 1922, e do Comitê Central.
Assim, em poucos meses, quase toda a antiga direção, forjada no curso das lutas travadas nos anos 1920, foi afastada de seus postos e substituída por novos militantes que, em sua maioria, eram operários com pouquíssima experiência partidária.
Uma das resoluções do pleno que afastou Brandão afirmava: “O Partido Comunista do Brasil deverá acrescentar sua atividade em sua luta política, estabelecendo sua própria fisionomia, tendendo a adquirir a todo preço a hegemonia do movimento revolucionário que se desenvolve no Brasil, cujas principais forças motrizes serão o proletariado, a massa de assalariados agrícolas e os camponeses pobres”.
Esta era uma aplicação mecânica das resoluções da Internacional Comunista. Elas não tinham em conta o processo revolucionário real que já vinha se desenvolvendo no país e refletiam um profundo desconhecimento das forças sociais em presença, subestimando o papel das classes médias urbanas e superestimando o papel dos camponeses naquela conjuntura.
A partir de então o esquerdismo e o obreirismo, também, passaram a imperar no interior do partido. Abandonou-se a proposta de aliança preferencial com a pequena-burguesia urbana, através do movimento tenentista.
Os prestistas foram considerados os principais inimigos do proletariado revolucionário. No final de 1930 o Bloco Operário e Camponês – órgão de frente única criado pelos comunistas – foi fechado pela direção partidária.
Nesta mesma linha esquerdista, o vereador Octávio Brandão afirmou na tribuna da Câmara do Rio de Janeiro: “O que caracteriza a Aliança Liberal é a sua demagogia. Demagogia caracteristicamente fascista, empregada por Mussolini quando quis apoderar-se do poder, em 1922 (...) O fascismo declarado dos presidentes Washington Luis e Júlio Prestes a ninguém ilude. Mas o fascismo disfarçado da Aliança Liberal ilude muita gente”.
Aqui temos uma adaptação ao Brasil da nefasta teoria do “social-fascismo”, que vinha sendo fabricada no interior da Internacional Comunista, que afirmava serem a social-democracia e o liberalismo irmãos gêmeos do fascismo.
Em setembro de 1930, às vésperas da revolução, um documento do PC do Brasil dizia: “a Coluna Prestes era o inimigo pronunciado do movimento revolucionário, defendia os interesses dos capitalistas estrangeiros, sustentava os feudais e estava pronta a lutar contra todo verdadeiro movimento de massa”. A palavra de ordem dos comunistas passou a ser: “Criai o governo operário e camponês, baseado nos Sovietes!” e “Pela União das Repúblicas Soviéticas da América Latina!”.
As reflexões originais sobre a formação econômica e social brasileira foram abandonadas e substituídas por esquemas mais rígidos que não correspondiam a nossa realidade. Como resultado,  quando, em outubro de 1930, chegou a “terceira revolta”, prevista por Octávio Brandão e Astrojildo Pereira, os comunistas estavam desarmados teórica e politicamente para dela participar com firmeza e independência.
Os sucessivos erros políticos levaram ao isolamento do Partido em relação às massas populares e às correntes progressistas. Ao lado da crise política, ocorreu uma séria crise de direção que desorganizou quase completamente o Partido. Nos quatro anos que se seguiriam à destituição de Astrojildo, o PCB teve seis secretários-gerais.

Da crítica à reabilitação
Tendo em vista os nítidos limites teóricos desse trabalho pioneiro, alguns intelectuais buscaram, consciente ou inconscientemente, desqualificar o livro. Em geral, esses críticos caíram num evidente anacronismo ao cobrarem do jovem dirigente comunista um nível de conhecimento do instrumental teórico marxista que ele – e ninguém no país – poderia ter naqueles anos.
É bom lembrar que o Manifesto do Partido Comunista (1848) de Marx e Engels – obra seminal do socialismo científico – foi publicado no Brasil apenas em 1924, traduzido do francês pelo próprio Brandão.
Na década de 1980, Michel Zaidan Filho escreveu uma série de trabalhos que, entre outras coisas, enalteciam as contribuições originais de Octávio Brandão e Astrojildo Pereira. Nos anos 1990 Agrarismo e Industrialismo foi analisado, sem preconceito, por autores marxistas como Marcos Del Roio, Paulo Cunha, Ângelo José da Silva e João Quartim de Moraes. Este último, em seu ensaio introdutório, escreveu:
“A justiça histórica é lenta como a dos tribunais, mas às vezes não falha (...). Agrarismo e Industrialismo, assim, foi encontrando o lugar que merecia no pensamento marxista brasileiro”. O seu relançamento contribuiu, ainda que modestamente, para o processo de revalorização da elaboração teórica e da prática política dos primeiros comunistas brasileiros.
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*Augusto Buonicore é historiador e secretário geral da Fundação Maurício Grabois.

Bibliografia

BRANDÃO, Octávio. Agrarismo e Industrialismo: Ensaio marxista-leninista sobre a revolta de São Paulo e a guerra de classes no Brasil – 1924. São Paulo: Anita Garibaldi.
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CARONE, Edgar. O PCB – 1922 a 1943. Vol. 1, São Paulo: Difel, 1982.
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QUARTIM DE MORAES, João. “A influência do leninismo de Stalin no comunismo brasileiro”, in: QUARTIM DE MORAES, João (org.). História do Marxismo no Brasil, Vol. 1, São Paulo: Paz e Terra, 1991.
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