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terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Direito sem Fronteiras: BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional (TV Justiça) - Paulo Roberto de Almeida


 Na continuidade da emissão anterior da TV Justiça, recebi o link da segunda parte deste programa da série Direito Sem Fronteiras, apresentado pelo jornalista Guilherme Menezes. Permito-me retomar, na sequência exata, separadas por uma semana, as duas gravações das entrevistas, como registrei em minha lista de publicados: 

1540. “BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional”, Direito sem Fronteiras, Parte 1, 10/01/2024: https://www.youtube.com/watch?v=ZN9B7NR2yT0.

1544. “BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional”, Direito sem Fronteiras, Parte 2, 15/01/2024: https://www.youtube.com/watch?v=Zo7UGWQyPhA.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

BRICS+: Direito Sem Fronteiras: BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional - Paulo Roberto de Almeida (TV Justiça)

BRICS MAIOR, mas não necessariamente mais relevante

Direito Sem Fronteiras

Paulo Roberto de Almeida 

Priscila Caneparo

Peter Christian Sester

O BRICS está maior desde o dia 1o de janeiro. Agora, o grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul tem a adesão formal de Irã, Egito, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Etiópia. Portanto, no total, são 10 integrantes. Além do peso econômico e geopolítico dos que já faziam parte, o bloco ganhou a participação de outros países com importância regional, e três deles são grandes produtores de petróleo.

Essa nova equação do BRICS é um dos fatores que podem induzir mudanças na governança financeira e econômica mundial. O sistema montado logo após a Segunda Grande Guerra, a partir da Conferência de Bretton Woods, inclui instituições como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio. Todos os três sofrem críticas e são apontados como instrumentos dos interesses dos países mais ricos do Ocidente. Agora, podem ser forçados a cumprir um papel mais amplo e multilateral.

As propostas de reformas nos organismos internacionais que lidam com questões financeiras e econômicas serão debatidas em duas edições do Direito Sem Fronteiras. A primeira parte será no programa desta semana e a segunda parte irá ao ar na semana que vem. O jornalista Guilherme Menezes conversa com Priscila Caneparo, doutora em Direito das Relações Econômicas Internacionais, com Paulo Roberto de Almeida, doutor em Ciências Sociais, e com Peter Christian Sester, doutor em Direito Comercial e Economia.

Direito sem Fronteiras - BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional | Parte 1, 10/01/2024:

https://www.youtube.com/watch?v=ZN9B7NR2yT0

Direito sem Fronteiras - BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional | Parte 2, 15/01/2024:

https://www.youtube.com/watch?v=Zo7UGWQyPhA


quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Direito Sem Fronteiras: organismos econômicos e financeiros internacionais - Paulo Roberto de Almeida

 Direito Sem Fronteiras: organismos econômicos e financeiros internacionais

 

Paulo Roberto de Almeida

Notas sumárias para participação na emissão da TV Justiça, programa “Direito Sem Fronteiras”, em 26 de outubro de 2023, com gravação em duas partes; exibição em 27/10/2023 e 3/11/2023.

 

1)    O que são organismos econômicos e financeiros internacionais?

Não são organismos neoliberais, como acreditam alguns; tampouco aplicam políticas de ajuste que seriam recessivas ou antissociais. 

 

2) Quais são os organismos financeiros que mais impactam no mundo?

            OMC, BM, FMI, pela ordem. Depois pode ser citado um organismo de coordenação econômica, que é a OCDE, mas que não é uma entidade universal, ou seja, aberta a quaisquer candidatos; a OCDE tem protocolos de adesão e de conformidade aos seus princípios e principais políticas. 

 

3) A estrutura e a gestão de organismos econômicos e financeiros internacionais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Banco Mundial privilegiam as nações mais poderosas?

            Diferenças entre elas: a OCDE não é uma organização universal, ou seja, aberta a todos os países, como são o FMI e o BM; essas organizações não privilegiam nações mais poderosas, mas sim recomendam políticas sólidas, no plano macroeconômico e setorial.

 

4) Como esses organismos prejudicam os países em desenvolvimento?

            Ao contrário, eles beneficiam e estão a seu serviço, justamente melhorando a qualidade das políticas econômicas e tendo o social como marca distintiva de atuação. Por que países mais integrados a essas práticas são os mais ricos e desenvolvidos? Justamente por causa delas, que ANTECEDEM o surgimento dessas organizações.

 

5) Existe possibilidade de mudança na estrutura dos organismos financeiros globais?

            Sim, claro, ela deve acompanhar s dinâmica da economia internacional, e assim já ocorreu com quotas-parte do FMI e do BM: a China dobrou a sua participação. A diretoria do BM pode deixar de ser exclusivamente americana, como já foi, e a do FMI também pode deixar de ser europeia. 

 

6) Falta de representatividade adequada dos interesses de países em desenvolvimento nos organismos financeiros internacionais?

            Comensurável com a participação na economia mundial; G20, por exemplo, tem vários países em desenvolvimento.

 

7) Existe falta de transparência em relação às decisões e políticas dos organismos internacionais?

            Não exatamente, mas pode haver decisões que são tomadas nos bastidores, como na ONU, ou na OMC; é muito difícil obter consenso a 155 países membros, ou quase 200 como ocorre, daí os grupos menores, mas representativos.

 

8) Isso pode minar a legitimidade das instituições e prejudicar a confiança em seu funcionamento?

            Não; no FMI-BM, existe o G24, que é uma coordenação dos PEDs.

 

9) Organismos como a OMC frequentemente favorecem os interesses de grandes corporações e países mais ricos em detrimento de preocupações sociais e ambientais?

            Não, exatamente o contrário, mas isso depende de critérios sociais e ambientais não serem usados justamente para fins protecionistas agrícolas, por exemplo, ou normas industriais privilegiando padrões já adotados nos países mais avançados.

 

10) As políticas globais muitas vezes não levam em consideração as particularidades e necessidades de países individuais?

            Políticas globais são muito poucas, reduzidíssimas. As que são globais, costumam ser voluntárias, ou seja, declarações e cartas de boa vontade, sem poder próprio de implementação.

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4497, 26 outubro 2023, 2 p


segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

Direito sem Fronteiras - Disputa pelo mercado brasileiro de remédios contra a Covid-19 - Paulo Roberto de Almeida e Matheus Atalanio (TV Justiça)

Um programa na TV Justiça dedicado ao patenteamento e licenciamento compulsório de medicamentos para o tratamento ou prevenção da Covid-19, gravado ainda em 2021, e que só veio a ser divulgado na data de hoje. O Matheus Atalanio foi meu aluno no programa do Uniceub em mestrado e doutoramento em Direito. 

1434. “Disputa pelo mercado brasileira de remédios contra a Covid-19”, Direito Sem Fronteiras, 14/02/2022; link:https://www.youtube.com/watch?v=kXVg2eRZeSM; entrevista ao programa da TV Justiça, na companhia do advogado e professor de Direito Internacional Matheus Atalanio.  

Direito sem Fronteiras - Disputa pelo mercado brasileiro de remédios contra a Covid-19


O laboratório farmacêutico MSD, um dos maiores do mundo, espera a aprovação da Anvisa para vender um antiviral contra a Covid-19 no Brasil em caráter emergencial. 
O produto já foi aprovado por agências importantes, como as do Japão e do Reino Unido. 
E o programa Direito sem Fronteiras desta semana vai discutir esse mercado de medicamentos, com destaque para a possibilidade de quebra de licenças de forma compulsória. O jornalista Guilherme Menezes vai conversar sobre o assunto com Matheus Atalanio, professor de Direito Internacional da Universidade de Fortaleza, e com Paulo Roberto de Almeida, diplomata e professor de Relações Internacionais.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Geopolitica e fronteiras: notas para entrevista na TV Justiça - Paulo Roberto de Almeida

Geopolítica e fronteiras: notas para entrevista na TV Justiça

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: anotações breves; finalidade: entrevista em programa da TV Justiça]


Introdução
Fui contatado pela TV Justiça, via Uniceub, para participar de um programa de entrevistas – que não tenho ideia qual alcance terá – chamado “Direito sem Fronteiras”, focado em questões geopolíticas da atualidade, com destaque para o caso dos Estados Unidos. Informaram-me que seria uma entrevista sobre “o ‘desenho’ do mundo hoje pela ótica do direito internacional e da geopolítica. Vamos destacar a importância da geopolítica nos Estados Unidos, debater os conflitos históricos, discutir como esse país se posicionou nas duas primeiras décadas e qual a expectativa até o final deste século, abordar os tratados internacionais existentes e se eles são cumpridos.”
Outras questões que poderiam aflorar no debate seriam as seguintes: “Os limites territoriais podem ser alterados pela força? Como ocorre o respeito às fronteiras? Quais os acordos que permitem, ou não, que uma fronteira seja redesenhada? O que o direito internacional faz para evitar conflitos?”
Recebi um série de perguntas, cujo teor apresento a seguir, agregando em seguida notas e observações minhas que poderão servir de base a meus comentários meus durante o programa ao qual fui convidado.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19 de julho de 2018

Questões possíveis de abordagem: 

1) É NO MÍNIMO CURIOSO QUE UM APLICATIVO DE CORRIDAS REVELE A LOCALIZAÇÃO SECRETA DE BASES MILITARES, NÃO É? DE QUE FORMA ELAS TÊM A VER COM A GEOPOLÍTICA? QUAL O USO POLÍTICO DESTAS BASES?

PRA: Bases militares são comuns nos impérios, ou seja, vastas extensões de territórios, alguns sob tutela ou proteção de um centro hegemônico, que delas necessita para garantir a ordem estabelecida a partir do seu centro em direção de regiões periféricas, ou dependentes. Algumas bases militares podem ser igualmente instaladas em territórios perfeitamente autônomos, com governos soberanos, desde que esses governos sintam a necessidade de receber “proteção” do império em questão, contra possíveis ameaças de vizinhos ou de impérios tidos como adversários. Essas bases têm um uso logístico, em primeiro lugar, qual seja, o reabastecimento, o provisionamento, uma estada de recomposição das forças militares do império, em suas jornadas para objetivos mais distantes; elas também exibem um significado político, que pode o ser o de aliança – se não forem instaladas numa relação puramente mercenária – e de apoio mútuo, muito embora quem receba a base não tenha condições de prestar esse apoio ao império. Elas também podem servir como elemento de dissuasão, se integradas a uma estratégia militar definida. 


2) E OS ESTADOS UNIDOS TÊM DIVERSAS BASES AO REDOR DO MUNDO, NÃO É MESMO? COMO É O ACORDO PARA TER UMA BASE EM OUTRO PAÍS?

PRA: Se as bases são feitas entre dois Estados soberanos, a base é geralmente objeto de um tratado bilateral de assistência militar, ou seja, integrada a um esquema mais amplo de aliança estratégica; elas podem também resultar de uma estrutura mais ampla, montada em bases regionais, tomando apoio num acordo multilateral, que pode ser sob a forma de um pacto militar. Os EUA tiveram, e ainda tem vários, nesse modelo, sendo o mais famoso a OTAN, para o Atlântico Norte, mas atualmente cobrindo todo o universo praticamente. Podemos ainda citar o TIAR, para a América Latina, o ANZUS, com Austrália e Nova Zelândia, esquemas já superados atualmente para o Oriente Próximo e a Ásia do Sul e outros mais específicos no plano bilateral (com o Japão e a Coreia do Sul, por exemplo). A própria China mantém bases navais no Oceano Índico, e planeja ter mais bases em outros mares.


3) NO PRIMEIRO PROGRAMA A GENTE CONTEXTUALIZOU BASTANTE A GEOPOLÍTICA. MAS EU GOSTARIA DE OUVIR VOCÊS SOBRE COMO ISTO TEM SIDO USADO PELOS PAÍSES, EM ESPECIAL PELOS ESTADOS UNIDOS. OS PAÍSES MAIS RICOS AVANÇAM MUNDO AFORA?

PRA: Não são os países mais ricos que avançam mundo afora, pois a Suíça, o Luxemburgo e a Noruega, três dos países mais ricos do mundo, não avançam para lugar algum, e estão entre os mais pacíficos do planeta (ainda que a Noruega faça parte da OTAN). Quem avança pelo mundo afora são os impérios, e nem todos constituem necessariamente países ricos. Rússia e China, dois grandes impérios, junto com os EUA, exibem uma renda per capita das mais modestas, comparada à dos europeus e dos norte-americanos. Grandes impérios tendem a projetar seus interesses econômicos e estes demandam certa proteção militar, pelo menos para fins de dissuasão; essa é a base da extensão estratégica sob a forma de bases militares. 


4) COMO FICAM OS INTERESSES POLÍTICOS E ECONÔMICOS EM DETRIMENTO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS?

PRA: Tratados internacionais não costumam ser impostos contra a vontade dos Estados soberanos, daí que interesses nacionais comandam supostamente a decisão de governos autônomos no sentido de aceitar ou não um tratado internacional. O Brasil, por exemplo, recusou o Tratado de Não Proliferação Nuclear durante 30 anos, pois o considerava contrário aos seus interesses nacionais, por ser discriminatório e desigual. Depois, com base numa outra percepção do seu interesse nacional, decidiu aceitar esse instrumento de controle de atividades nucleares, mesmo considerando-o como ainda desigual e discriminatório. O mesmo Brasil não aceita, por exemplo, diversas convenções da OIT – como a da liberdade sindical – e não creio que isto corresponda a qualquer interesse nacional digno de respeito, e sim a uma indisfarçável vontade de preservação de monopólios e feudos sindicais por parte de uma classe de oportunistas.
Já os Estados Unidos não aceitam, tampouco, diferentes tratados internacionais, inclusive um dos mais significativos que é o TPI, o Tribunal Penal Internacional, por temor, justamente, que seus soldados ou cidadãos sejam acusados de crimes cobertos pelo Estatuto de Roma, ao serem, precisamente, um império com muitas bases externas.


5)  O QUE ACONTECE SE UM TRATADO INTERNACIONAL É DESRESPEITADO?
PRA: Depende do estatuto do tratado, das obrigações contraídas, e de um julgamento das demais partes sobre as intenções ou atos da parte que se subtrai a um determinado tratado. A Coreia do Norte, por exemplo, abandonou legalmente o TNP, e desenvolveu atividades nucleares sem a supervisão de um órgão de controle, como é a AIEA; expôs-se, nesse sentido, a sanções multilaterais, ou bilaterais de certos países.
A África do Sul do apartheid foi objeto de várias sanções decorrentes de atos internacionais do direito humanitário, até que o nefando regime fosse extinto. A Rússia desrespeitou a soberania da Ucrânia, ao tomar parte do seu território – a Crimeia – e ao apoiar uma guerra civil no leste do país: foi objeto, não de sanções multilaterais (pois ela mesma faz parte do Conselho de Segurança da ONU), mas de sanções de diversos países, notadamente os da Europa ocidental e da América do Norte. 


6)  NO PLANO GEOPOLÍTICO, OS ESTADOS UNIDOS MANTÊM INTERVENÇÕES NA MAIORIA DOS GRANDES CONFLITOS ARMADOS E CRISES INTERNACIONAIS. A ONU, É FREQUENTEMENTE ACUSADA POR OUTRAS NAÇÕES POR SE SUBMETER ÀS ORDENS E VONTADES DOS NORTEAMERICANOS. COMO VOCÊS ANALISAM ISTO?

PRA: Não é verdade que a ONU se submete às ordens dos Estados Unidos: caberia dar exemplos de onde e quando isso ocorreu. Os Estados Unidos, na época da Guerra Fria, mantiveram guerras diretas ou por procuração em diversas regiões do planeta, no quadro da chamada “estratégia da contenção”, ou seja, de um outro império, no caso o soviético. Eles podem, porque são poderosos, intervir unilateralmente, como fizeram no Iraque, em 2003, por exemplo, ou podem ser chamados a cooperar em operações de paz da ONU – no caso da invasão do Kuwait pelo Iraque, em 1991, em outro exemplo – ou em operações parcialmente autorizadas pela ONU, nos Balcãs, nos anos 1990, ou na Líbia, mais recentemente. 
Uma coisa precisa ser dita: em caso de guerras civis, entre Estados ou qualquer outro confronto armado, a ONU não pode fazer nada, absolutamente nada, na oposição de um só dos membros permanentes do seu Conselho de Segurança. Portanto, a ONU não pode, mesmo que quisesse, se submeter à vontade de um único Estado, e geralmente ela não o faz: não o fez na guerra do Vietnã, dificilmente o faz nos diferentes conflitos no Oriente Médio, na Cachemira ou em outras regiões. Ela atua, quando tem mandato para tanto, nos cenários onde existe um mínimo de cooperação entre os membros permanentes do CSNU.


7) OS ESTADOS UNIDOS SÃO A ÚNICA NAÇÃO A ACUMULAR A LIDERANÇA NO PODERIO INDUSTRIAL, MILITAR, FINANCEIRO, NUCLEAR, ESTRATÉGICO E CULTURAL. PODE-SE DIZER, ENTÃO, QUE O PODER DOS EUA É MULTIDIMENSIONAL E ATINGE PRATICAMENTE TODAS AS PARTES DO GLOBO TERRESTRE?

PRA: Sim, pode-se dizer isso, mas para acumular todo esse poderio, que nem sempre é liderança, os EUA o fizeram com base em sua própria capacitação interna, em seu bom desempenho econômico, em sua disponibilidade financeira e de recursos de diversos tipos, entre eles organização e, justamente, liderança adquirida ao longo dos diversos cenários de conflitos ao redor do mundo. Os EUA não participaram de nenhum dos muitos conflitos europeus até a Grande Guerra, e só a partir de 1917, quando viram seus interesses nacionais ameaçados. Da mesma forma, só participaram efetivamente da Segunda Guerra Mundial a partir do final de 1941, quando foram atacados. Nos dois casos, pode-se dizer que eles salvaram de uma derrota humilhante aliados e parceiros europeus, com os quais possuíam imensas afinidades políticas e culturais, quais sejam, uma crença comum em certos valores e princípios, que são os dos direitos humanos, os da democracia política, o da democracia de mercado. 
Difícil dizer que esse imenso poderio atinja todas as partes do globo terrestre. Certamente que a capacidade de projeção militar dos EUA os habilitaria a fazer isso, se o desejassem, mas não há sentido na afirmação, pois os EUA só o fariam em linha com sua percepção do seu interesse estratégico em matéria de segurança nacional, apenas por isso. Por que gastar recursos com objetivos puramente exibicionistas. Os EUA também são um país pragmático, na maior parte das vezes, e não depende unicamente do presidente, ou dos militares, essa projeção universal, pois é o Congresso quem precisa aprovar qualquer gasto orçamentário ou qualquer operação militar que não seja em regime de urgência de defesa nacional. 


8) A PARTIR DESSA LIDERANÇA MUNDIAL, OS ESTADOS UNIDOS COMEÇARAM A INTERVIR EM DIVERSAS QUESTÕES DIPLOMÁTICAS E MILITARES NO MUNDO. ATÉ QUE PONTO A FORÇA POLÍTICA DOS ESTADOS UNIDOS DEIXA OUTROS PAÍSES SEM SAÍDA, COAGIDOS?

PRA: A questão é hipotética, e precisaria ser sustentada com o apelo a estudos de casos. Os EUA intervieram na política de países latino-americanos na vigência da Guerra Fria, como o Brasil em 1964, ou o Chile em 1973? Certamente, pois a percepção das elites dirigentes dos EUA era a de que uma virada à esquerda por parte desses países, como tinha ocorrido com Cuba entre 1959 e 1961, era vista como prejudicial aos interesses nacionais americanos. No caso da Venezuela, atualmente, essa interferência não se reproduziu, pois não se configurou, mesmo com um chavismo especialmente antiamericano, uma ameaça credível aos seus interesses nacionais. Golpes foram liderados ou até operados pelos Estados Unidos em outras circunstâncias, como no caso do Irã, em 1953, ou da Guatemala no ano seguinte. Ocorreu até uma invasão em Cuba, em 1961, totalmente fracassada, provavelmente porque não havia, justamente, a percepção de que Cuba, naquele momento, significasse um risco maior para os EUA.


9)  E, POR OUTRO LADO, ISSO ACABOU ANGARIANDO MUITOS INIMIGOS PARA O PAÍS?

PRA: Eventualmente sim: os iranianos conservaram um ódio indisfarçado aos Estados Unidos, devido à derrubada do líder nacionalista Mossadegh, em 1953, postura reavivada pelo apoio dado ao Xá Reza Phalevi no final dos anos 1970. Ocorreram outros exemplos de apoio direto ou indireto dos Estados Unidos a regimes de força, ou anticomunistas, no Terceiro Mundo – como na República Dominicana, na Indonésia, por exemplo –, assim como no caso de países europeus desenvolvidos, como França e Itália, que tinham partidos comunistas relativamente fortes no imediato pós-guerra. O antiamericanismo, paradoxalmente, é mais forte na França do que na Itália. 


10) A GENTE PODE DIZER QUE OS ATENTADOS DE 11 DE SETEMBRO FORAM A ÚNICA VEZ NA HISTÓRIA DA ERA MODERNA EM QUE OS ESTADOS UNIDOS SOFRERAM UM ATAQUE DIRETO DENTRO DE SUAS FRONTEIRAS?

PRA: Teoricamente sim, mas não se tratou de um ataque militar por um Estado inimigo, e sim um atentado terrorista por um grupo específico, ou seja, não submetido às leis da guerra. O exemplo precedente, e real, ocorreu fora do território continental, no Havaí, em dezembro de 1941, aplicando-se a partir daí todos os procedimentos previstos nas leis da guerra, que os próprios japoneses não respeitaram (como tampouco as potências fascistas e comunistas da Europa, ao dar início à guerra contra a Polônia, em setembro de 1939). 
Os ataques de 11 de Setembro foram objeto de uma Resolução do CSNU, que autorizou a intervenção subsequente dos Estados Unidos (e outros países associados) contra o governo Talibã no Afeganistão, assim como tinha havido a autorização precedente no caso da invasão do Kuwait. Um caso bem anterior é o da guerra da Coreia, iniciada em 1950, e ainda não encerrada formalmente (existe apenas um armistício, de 1953, jamais convertido em tratado de paz, ou declaração formal de cessação de hostilidades).


11) EU GOSTARIA DE MOSTRAR AGORA ALGUNS MAPAS PARA A GENTE ENTENDER MELHOR O TERRITÓRIO AMERICANO E COMO ISTO PODE DESPERTAR O INTERESSE DE OUTRAS NAÇÕES.

 (O entrevistador analisa com convidados os mapas a seguir:
- Mapa geral dos EUA;
- Louisiana;
- Bacia do Mississipi;
- Texas/Novo México;
- Califórnia;
- Grand Canyon;
- Washington / Seattle / Oregon
- Flórida / Cuba)

PRA: Creio que existe certa obsessão com o império americano; por que não alguns mapas russos, da era czarista, e depois da era comunista? Ou da Ucrânia?


12) POR SE ENCONTRAR EM UMA LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA PRIVILEGIADA, PROTEGIDO POR DOIS GRANDES OCEANOS, BEM COMO POR TER DESENVOLVIDO UMA MELHOR TECNOLOGIA BÉLICA E NUCLEAR, OS EUA TERMINARAM A SEGUNDA GRANDE GUERRA NA LIDERANÇA DO PODERIO POLÍTICO-MILITAR. E CONTINUAM ASSIM, NÃO É?

PRA: É! 


13) AGORA, O TRUMP REJEITA A IDEIA DE QUE OS ESTADOS UNIDOS TÊM A RESPONSABILIDADE DE LIDERAR. É UMA TENDÊNCIA A TER MENOS LIDERANÇA MUNDIAL?

PRA: Parece que sim. 


14) ANALISTAS AFIRMAM QUE O ANO DE 2017 MARCA O INÍCIO DE UMA RECESSÃO GEOPOLÍTICA COM ESSA FALTA DE LIDERANÇA COMEÇANDO A INFLUENCIAR NA FORMA COMO OS CONFLITOS GLOBAIS SÃO RESOLVIDOS, EXACERBANDO OS RISCOS PROVENIENTES DA EUROPA E TORNANDO A RELAÇÃO ENTRE ESTADOS UNIDOS E CHINA O PRINCIPAL E MAIOR RISCO GEOPOLÍTICO PARA OS PRÓXIMOS ANOS. QUAL ANÁLISE VOCÊS FAZEM DESTE FATO?

PRA: Existe muita especulação a esse respeito, a maior parte desprovida de um correto embasamento em fatos, ou apenas com base em digressões de acadêmicos distantes das responsabilidades do poder. Mas também existe muita paranoia por parte de militares ou políticos, dominados pela ideia do conflito, ou atuando com base na hipótese de um conflito. 
Pode-se estar em face da conhecida “armadilha de Tucidides”, ou seja, o enfrentamento entre um poder declinante e um outro ascendente, o que parece ter sido o caso entre Esparta, o poder militar autocrático, e Atenas, a potência comercial democrática. Não é seguro que todos os conflitos posteriores, inclusive os provocados pela ascensão agressiva da Alemanha, entre 1870 e 1939, tenham sido provocados necessariamente por essa “armadilha” mais teórica do real. Existem muito fatores que podem provocar conflitos entre Estados, nem todos situados nessa equação assimétrica. 
O fato é que militares são paranoicos por definição e por obrigação, e de toda forma sempre necessitam agitar alguma ameaça credível para justificar orçamentos mais ou menos gordos. E existem psicopatas que podem provocar guerras, como era o caso de Hitler, especialmente. Não creio que isso confirme uma regra, ou que tenha um calendário próprio de realização, seja 2017 ou qualquer outro ano. Isso é especulação sem muita fundamentação nos processos reais em curso ou emergentes.
À diferença dos grandes conflitos globais até 1945, existe esse fator inédito na história das relações internacionais que é a detenção da arma nuclear, o supremo equalizador do potencial destrutivo, o que altera em grande medida qualquer equação geopolítica ou estratégia militar. A arma nuclear criou essa situação que já tinha sido diagnosticada por Raymond Aron desde 1947-48 (e isso antes da explosão atômica por parte da URSS): “Paz impossível, guerra improvável”.
Acredito que ainda estejamos na mesma situação, o que não impede, entretanto, as proxy wars, as guerras por procuração, e os conflitos de baixa intensidade.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19 de julho de 2018

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Apresentação do programa: 

O programa Direito sem Fronteiras, da TV Justiça é exclusivo para o direito internacional e comparado e a diplomacia judicial. O programa debate temas de grande repercussão. Tem exibição inédita toda segunda-feira, às 20 horas e 4 reprises exibidas em horários alternativos durante a programação.
Na próxima edição, vamos falar sobre o “desenho” do mundo hoje pela ótica do direito internacional e da geopolítica. Vamos destacar a importância da geopolítica nos Estados Unidos, debater os conflitos históricos, discutir como esse país se posicionou nas duas primeiras décadas e qual a expectativa até o final deste século, abordar os tratados internacionais existentes e se eles são cumpridos. Os limites territoriais podem ser alterados pela força? Como ocorre o respeito às fronteiras? Quais os acordos que permitem, ou não, que uma fronteira seja redesenhada? O que o direito internacional faz para evitar conflitos?
A gravação vai acontecer na sede da TV Justiça em Brasília, anexo 1 do Supremo Tribunal Federal no dia 20 de julho, às 16h30. 
Uma consideração muito importante, o programa será gravado valendo, ou seja, é como se fosse ao vivo, as respostas devem ter em média 2 minutos.

terça-feira, 12 de abril de 2016

Programa Iluminuras na TV Justiça-DF: Paulo Roberto de Almeida

Finalmente pude assistir à minha própria entrevista feita em 11/03/2016 (divulgado em 8/04/2016),  pelo jornalista Paulo Teles, para o programa "Iluminuras" da TV Justiça, gravado na Biblioteca de Obras Raras da Federação Espírita Brasileira, um espaço decorado por livros, aliás com estantes que eu gostaria de ter, para poder acomodar todos os meus livros.
O programa figura neste link:
https://www.youtube.com/watch?v=qh4ULayECgQ
 











Antes do programa, o jornalista Paulo Teles me submeteu um roteiro de perguntas que seriam abordadas por ele na entrevista.
Para atender sua curiosidade, fiz o seguinte texto.

2936. “Iluminuras: minha vida com os livros”, Brasília, 7 março 2016, 9 p. Respostas a questões do jornalista Paulo Leite, para o programa literário da TV Justiça. Gravado na biblioteca de obras raras da Federação Espírita Brasileira (SGAN 603, Conj. F, Avenida L2 Norte, Brasília, DF).

 
Iluminuras: minha vida com os livros

Paulo Roberto de Almeida
[Respostas a questões do jornalista Paulo Leite,
para o programa literário da TV Justiça]


1) Qual é sua formação? E sua ocupação atual?
Venho de uma formação em Humanidades, tendo iniciado o curso de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, em 1969, mas abandonada no segundo ano, época da ditadura militar no Brasil. O curso foi retomado na Universidade de Bruxelas em 1971, tendo sido concluído em 1975, a mesma universidade onde obtive o grau de Doutor em Ciências Sociais em 1984, iniciado em 1977, mas interrompido por motivo de retorno ao Brasil e ingresso na carreira diplomática (doutoramento retomado em 1981, durante meu primeiro posto diplomático na Europa). No intervalo, e logo após concluir o curso de graduação, fiz um mestrado em economia do desenvolvimento, na Universidade do Estado de Antuérpia, com uma dissertação sobre comércio exterior brasileiro. No quadro dos estudos em diplomacia, fiz o Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, tendo defendido uma tese sobre a formação da diplomacia econômica no Brasil.
Sou diplomata desde 1977, tendo servido nas embaixadas em Berna, Belgrado e Paris, nas delegações em Genebra e Montevidéu e como Ministro-Conselheiro na Embaixada em Washington (1999-2003). Fui também Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE) da Presidência da República, em Brasília (2003-2007). Na Secretaria de Estado, chefiei a Divisão de Política Financeira (1996-1999) e ocupei diferentes cargos de assessoria. Em 2010 atuei como comissário geral adjunto do Pavilhão do Brasil na Exposição Universal de Xangai (Abril-Outubro), e entre 2013 e 2015 fui Cônsul Geral Adjunto no Consulado do Brasil em Hartford, CT-EUA. Regressei recentemente do exterior e encontro-me cooperando com a Fundação Alexandre de Gusmão em diversos projetos de natureza cultural.

2) Qual é o primeiro livro que você se lembra de ter lido e a impressão que teve dele?
Frequentei bibliotecas públicas antes mesmo de aprender a ler, para jogos e cinema. Quando aprendi a ler, devo ter lido quase todos os livros existentes na Biblioteca Infantil Municipal Anne Frank, no bairro do Itaim-Bibi, em São Paulo, capital. Destaco toda a coleção infantil de Monteiro Lobato, com ênfase na História do Mundo para as Crianças, que devo ter lido diversas vezes, daí minha conexão extremamente forte com estudos de história, a despeito da formação em Ciências Sociais. História do Mundo para as Crianças não foi certamente o primeiro livro lido, pois eu já devia ter nove ou dez anos, mas foi o que mais profundamente me marcou, não apenas na infância, mas durante toda a vida, pois data dessa leitura minha motivação para a carreira acadêmica no terreno das Humanidades, onde se concentra minha produção intelectual.

3) Onde você nasceu? Sua cultura lhe influenciou nas primeiras leituras?
Nasci em São Paulo, capital, quase na exata metade do século 20, em novembro de 1949, e posso dizer que não dispunha de qualquer “cultura” especial em minha primeira infância. Explico-me: tenho vivido com livros, pelos livros e para os livros uma boa parte de minha vida, provavelmente dois terços de uma existência passada na atenta fixação do papel impresso. Entretanto, até onde alcançam minhas lembranças da primeira infância, não se pode dizer que o gosto da leitura constituísse uma espécie de kismet pessoal ou que ele estivesse entranhado num certo ambiente familiar.
Não me lembro, por exemplo, que minha casa contivesse muitos livros, pelo contrário, provavelmente muito poucos. Meus pais, típicos filhos de imigrantes pobres, de extração camponesa portuguesa e italiana, tinham sido criados entre o trabalho e a escola, processo que conduziu a uma educação primária incompleta nos dois casos. Mas, como todos os imigrantes, ambos davam uma importância muito grande à educação formal dos filhos, o que, dadas as condições de penúria material em que vivíamos, não necessariamente se traduziu em aquisição voluntária de outros livros que não, chegada a hora, os didáticos. 
Foram circunstâncias fortuitas que me fizeram chegar aos livros e com eles passar boa parte de minha vida. Minha casa, na então Chácara Itaim, bairro paulistano do Jardim Paulista, ficava muito próxima de uma biblioteca infantil, que eu passei a frequentar antes mesmo de estar formalmente alfabetizado. Na “Biblioteca Anne Frank” passei todos os anos de minha infância e os primeiros da adolescência. Uma vez treinado nas primeiras letras, na “atrasada” idade dos sete anos, passei a ler furiosamente: lia com avidez, não só na própria biblioteca, como todos os dias retirava sistematicamente um ou dois livros para ler em casa, à noite. Se não li todos os livros da biblioteca, devo ter chegado muito perto disso.
Alguns anos depois, trabalhando durante o dia e estudando à noite, passei a frequentar as bibliotecas do centro de São Paulo: a pública “Mário de Andrade”, a liberal e circunspecta da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, a especializada em economia do Centro das Indústrias, a da USIS, junto ao Consulado dos Estados Unidos, a da União Cultural Brasil-Estados Unidos e várias outras mais. Também comecei a percorrer incessantemente as livrarias do centro da cidade, em especial a velha Brasiliense, na Barão de Itapetininga, e a Zahar, na Praça da República.
Enfim, foram anos e anos de contato com os livros, lendo em toda e qualquer circunstância, em casa ou no trabalho, na escola e nos transportes públicos, sob chuva ou sol quase se poderia dizer. Raramente, ou quase nunca, saía de casa sem um livro na mão ou na pasta: qualquer oportunidade era boa para se avançar na leitura, mesmo na fila do recrutamento militar (quando estava acompanhado de Gustavo Corção, uma leitura insuspeita nos anos do regime militar). Ao deixar o Brasil pela Europa, no começo dos anos 70, arrastei comigo uma biblioteca que certamente deve ter intrigado diversos agentes alfandegários. No velho continente, como não podia deixar de ser, passei boa parte de uma longa estada de sete anos voluntariamente encerrado em bibliotecas universitárias, sobretudo a do Instituto de Sociologia da Universidade de Bruxelas. Continuei depois esse hábito nas demais cidades a que fui levado por força de uma vida profissional sempre nômade.
Desde muito cedo, habituei-me também a fazer fichas de livros, sob a forma de notas sintéticas, algumas compilações mais ou menos longas ou mesmo resenhas críticas, em cadernos ou folhas esparsas. Infelizmente, algumas dessas resenhas pioneiras foram perdidas com os papéis da juventude, entre a partida e a volta da Europa. Minha primeira resenha publicada parece ter sido a de uma obra do Erich Fromm, A Sobrevivência da Humanidade (tradução brasileira, pela Zahar, de Can Man Survive?), que saiu no jornal do centro acadêmico do Colégio Costa Manso, onde eu cursava o Clássico (em torno dos 16 anos, portanto). Muitos outros trabalhos dessa época, que precedeu minha saída do Brasil, se perderam: lembro-me de extensos resumos de obras políticas, de leituras anotadas de Sartre, Celso Furtado, Caio Prado, Florestan Fernandes e muitos outros autores brasileiros ou estrangeiros.
Mais tarde, durante minha estada universitária na Europa, preenchi diversos cadernos quadriculados, organizando-os por temas, ali compilando apreciações críticas e resumos de dezenas de livros, sem considerar as simples notas bibliográficas, que tinham seus cadernos especiais. Mas, essas anotações não cobrem senão uma parte de minhas leituras, aquelas ligadas diretamente ao estudo acadêmico ou às preocupações políticas. Dezenas de outros livros, cujos títulos se perderam em agendas extraviadas, permaneceram sem registro, sem falar dos muitos romances, policiais ou literários, que nunca foram objeto de qualquer tentativa de “crítica literária”. Se fosse possível fazer uma lista mais ou menos abrangente de minhas leituras, ela certamente ocuparia dezenas de páginas e nunca estaria completa.

4) E a paixão pelas letras, de onde veio?
Esta é precisamente uma de minhas grandes falhas: sou mais afeto à leitura de livros de história, de política, de economia, ou de ciências sociais aplicadas, no sentido lato, do que à literatura propriamente dita. Mas na literatura, adoro ler romances históricos, e sem qualquer hesitação indico Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, como o maior monumento literário da humanidade. Trata-se de meu grande romance, na verdade um livro que fala sobre os homens, como eles são. Por isso não tenho outra frase que mais aprecio nesse livro do que esta, que copio de uma edição em espanhol de Cervantes:
Es, pues, de saber, que este sobredicho hidalgo, los ratos que estaba ocioso... se daba a ler...; y llegó a tanto su curiosidad y desatino en esto, que vendió muchas hanegas de tierra... para comprar libros... y así llevó a su casa cuantos pudo haver dellos. (...) En resolución, él se enfrascó tanto en su lectura, que se le pasaban las noches leyendo de claro en claro, y los dias de turbio en turbio; y así, del poco dormir y del mucho leer se le secó el celebro, de manera que vino a perder el juicio.
Ainda não me ocorreu, apesar do excesso de leituras, a fatalidade que se abateu sobre o cavaleiro da Mancha. Em todo caso, meu cérebro não parece ter secado pelo fato de também passar muitas noites na companhia dos livros ou escrevendo sobre eles.

5) O que gosta de ler? (contos, crônicas, poesias?)
Um pouco de tudo, mas concentro-me nas já referidas ciências sociais. Em literatura, gosto de bons romances policiais, com destaque para Conan Doyle e a série Sherlock Holmes, que devo ter lido toda. Mas, nessa categoria, aprecio apócrifos de Holmes, isto é, pastiches colocando o célebre detetive a serviço ou em confrontação com personagens históricos conhecidos, como Karl Marx (duas vezes, uma na Comuna de Paris, envolvendo inclusive o anarquista russo Bakinin), com Freud, com Oscar Wilde, com Albert Einstein, e outros. Desse gosto por esse nicho especial de literatura, comecei a escrever, muitos anos atrás, um Sherlock Holmes Contra Floriano Peixoto – bem antes que Jô Soares escrevesse o seu Xangô de Baker Street – mas que infelizmente nunca terminei. Talvez um dia retome esse “romance” apócrifo, fazendo o detetive inglês perder uma contenda contra Floriano Peixoto, no início da República.

6) Quais autores você mais lê?
Como disse, leio basicamente livros nas áreas de ciências sociais, com destaque, nos últimos anos, para história econômica, mundial e do Brasil, uma vez que estou escrevendo livros nessa área.

7) O senhor tem quantos livros? 
Impossível dizer, pois tenho livros ainda em caixas, de minha última mudança. Ao sair do Brasil, no final de 2012, deixei alguns milhares – não sei dizer quantos, pois estão colocados uns na frente de outros, em diversas estantes – guardados numa kit-biblioteca na 912 Norte, adquirida especialmente para essa finalidade. Mas, no decorrer de uma longa vida acadêmica, já me desfiz de muitos livros, geralmente encaminhando para bibliotecas (da UnB, do Itamaraty, do Instituto Rio Branco). Devem ser, contando subjetivamente, seis ou sete mil, mas ainda preciso quantificar exatamente, os que estão na kit e os que tenho comigo ainda em caixas em meu apartamento da 213 Sul.

8) Fale um pouco sobre o processo de criação de seus livros?
Todos os meus livros, listados abaixo, são o resultado de estudos feitos em determinadas áreas, seja como resultado do trabalho profissional na diplomacia (em integração e em comércio internacional, por exemplo), seja como resultado de aulas em diversas faculdade, nos últimos dez anos no mestrado e doutorado em Direito do Centro Universitário de Brasília, Uniceub, onde sou professor.
Meu processo é muito simples, e ao mesmo tempo complicado. Toda e qualquer atividade que desenvolvo e que implica em algum trabalho intelectual – reuniões diplomáticas, seminários, palestras, aulas e pesquisa, propriamente dita – é objeto de anotações detalhadas, preparação de sínteses explicativas e textos-guia para palestras, que depois me servem para compor um novo livro. Devo dizer que também costumo tomar notas de todos os livros que leio. Posso dizer que quando concebo, virtualmente, um livro, ele já se encontra pronto, em minha cabeça: a etapa seguinte é simplesmente a de sentar e escrever, com base nessas notas esparsas, nas sínteses parciais, nas palestras feitas. Geralmente faço um esquema, que é o equivalente de um índice, e depois o sigo metodicamente, inclusive escrevendo a introdução (depois revista) antes mesmo de escrever o primeiro capítulo. Ou seja, trata-se de um processo relativamente organizado de leituras, anotações, concepção do livro e redação organizada. Isso envolve, portanto, uma lenta e longa preparação e muitas vezes recupero notas de vários anos antes – em cadernos ou arquivos de computador – para escrever um novo livro.
Na verdade, os meus “working files”, os livros e trabalhos em preparação, atualmente organizados metodicamente em meu computador, são ainda mais numerosos do que os livros acabados e publicados. Também disponho de muitos documentos em arquivo, centenas e centenas de papeis acumulados, que correspondem a cópias de livros, de documentos, notas de pesquisas em arquivos que, algum dia, serão integrados em novos livros, ou em reedições dos já publicados.
Abaixo uma parte pequena de minha produção intelectual, ou seja, apenas os livros individuais e impressos, publicados por editoras comerciais, ou então, no período recente, em formato digital, e em quase todos os casos disponíveis livremente para alunos e outros interessados. Existe um certo número de livros editados por mim (conferir aqui: http://www.pralmeida.org/01Livros/1NewBoooks/2OrganizaEdita.html), e dezenas de capítulos oferecidos em contribuição em obras coletivas, a quase totalidade a convite de editores ou organizadores (que podem ser conferidos neste link: http://www.pralmeida.org/01Livros/1NewBoooks/4Colabora.html).
Minha vida se dá em torno de livros, que conformam meu vício, minha compulsão mais conhecida, a que me dá maior prazer espiritual e satisfação intelectual.

Livros por Paulo Roberto de Almeida
impressos e Digitais

Situação ao final de 2015:

Em preparação:
31) Going Global: Brazil and Latin America in International Context (Rockville, MD: Global South Press, 2016).

Publicados:
30) Révolutions bourgeoises et modernisation capitaliste: Démocratie et autoritarisme au Brésil (Sarrebruck: Éditions Universitaires Européennes, 2015, 496 p.; ISBN: 978-3-8416-7391-6).

29) Die brasilianische Diplomatie aus historischer Sicht: Essays über die Auslandsbeziehungen und Außenpolitik Brasiliens (Saarbrücken: Akademiker Verlag, 2015, 204 p.; Übersetzung aus dem Portugiesischen ins Deutsche: Ulrich Dressel; ISBN: 978-3-639-86648-3).

28) O Panorama visto em Mundorama: Ensaios Irreverentes e Não Autorizados (Hartford: Author edition, 2015, 294 p.; DOI: 10.13140/RG.2.1.4406.7682), disponível: Research Gate; link: https://www.researchgate.net/publication/280883937_O_Panorama_visto_em_Mundorama_Ensaios_Irreverentes_e_No_Autorizados?showFulltext=1&linkId=55ca738508aeb975674a4d44).


26) Volta ao Mundo em 25 Ensaios: Relações Internacionais e Economia Mundial (Kindle edition; ASIN: B00P9XAJA4; link: http://www.amazon.com/dp/B00P9XAJA4).

25) Rompendo Fronteiras: a Academia pensa a Diplomacia (Amazon Digital Services: Kindle edition, 2014, 414 p.; ASIN: B00P8JHT8Y; link: http://www.amazon.com/dp/B00P8JHT8Y).

24) Codex Diplomaticus Brasiliensis: livros de diplomatas brasileiros (Amazon Digital Services: Kindle edition, 2014, 326 p.; ASIN: B00P6261X2; link: http://www.amazon.com/dp/B00P6261X2).

23) Polindo a Prata da Casa: mini-resenhas de livros de diplomatas (Amazon Digital Services: Kindle edition, 2014, 151 p., 484 KB; ASIN: B00OL05KYG; link: http://www.amazon.com/dp/B00OL05KYG).

22) Prata da Casa: os livros dos diplomatas (resenhas, edição de autor; DOI: 10.13140/2.1.4908.9601; 2014, 663 p.; disponível: Academia.edu: https://www.academia.edu/5763121/Prata_da_Casa_os_livros_dos_diplomatas_Edicao_de_Autor_2014_).

21) Nunca Antes na Diplomacia...: A política externa brasileira em tempos não convencionais (Curitiba: Appris, 2014, 289 p.; ISBN: 978-85-8192-429-8).

20) O Príncipe, revisitado: Maquiavel para os contemporâneos (Kindle edition; 2013; ASIN: B00F2AC146; disponível: http://www.amazon.com/dp/B00F2AC146).


18) Relações internacionais e política externa do Brasil: a diplomacia brasileira no contexto da globalização (Rio de Janeiro: LTC, 2012, 309 p.; ISBN 978-85-216-2001-3).


17) Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização (Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2011, xx+272 p.; ISBN: 978-85-375-0875-6).

16) O Moderno Príncipe (Maquiavel revisitado) (Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2010, 195 p.; ISBN: 978-85-7018-343-9)

15) O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado (Rio de Janeiro: Freitas Bastos, e-book, 2009, 191 p.; ISBN: 978-85-99960-99-8)

14) O Estudo das Relações internacionais do Brasil: um diálogo entre a diplomacia e a academia (Brasília: LGE Editora, 2006, 385 p.; ISBN: 85-7238-271-2).

13) Formação da diplomacia econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império (2nd ed.: São Paulo: Editora Senac, 2005, 680 p., ISBN: 85-7359-210-9).

12) Relações internacionais e política externa do Brasil: história e sociologia da diplomacia brasileira (2nd ed.: Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004, 440 p.; ISBN: 85-7025-738-4).

11) A Grande Mudança: consequências econômicas da transição política no Brasil (São Paulo: Editora Códex, 2003, 200 p.; ISBN: 85-7594-005-8).

10) Une histoire du Brésil: pour comprendre le Brésil contemporain (avec Katia de Queiroz Mattoso; Paris: L’Harmattan, 2002, 142 p.; ISBN: 2-7475-1453-6).

09) Os primeiros anos do século XXI: o Brasil e as relações internacionais contemporâneas (São Paulo: Editora Paz e Terra, 2002, 286 p.; ISBN: 85-219-0435-5).

8) Formação da diplomacia econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império (São Paulo: Editora Senac, 2001, 680 pp., ISBN: 85-7359-210-9).

7) Le Mercosud: un marché commun pour l’Amérique du Sud, Paris: L’Harmattan, 2000, 160 p.; ISBN: 2-7384-9350-5).

6) O estudo das relações internacionais do Brasil (São Paulo: Editora da Universidade São Marcos, 1999, 300 p.; ISBN: 85-86022-23-3).

5) O Brasil e o multilateralismo econômico (Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 1999, 328 p.; ISBN: 85-7348-093-9).

4) Velhos e novos manifestos: o socialismo na era da globalização (São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 1999, 96 p.; ISBN: 85-7441-022-5).

3) Mercosul: Fundamentos e Perspectivas (São Paulo: Editora LTr, 1998, 160 p.; ISBN: 85-7322-548-3).

2) Relações internacionais e política externa do Brasil: dos descobrimentos à globalização (Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1998, 360 p.; ISBN: 85-7025-455-5).

1) O Mercosul no contexto regional e internacional (São Paulo: Edições Aduaneiras, 1993, 204 p.; ISBN: 85-7129-098-9).

Livros editados:

Capítulos em livros:

Artigos em periódicos:

Artigos em revistas e jornais:

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