domingo, 29 de março de 2009

1047) Relações Rússia-EUA no novo cenário estratégico

O jornalista Boris Volkhonski, editor do Russia Journal, publicado por uma das mais influentes organizações não-governamentais russas, "Fundação da Política Efetiva" (Foundation for Effective Policy), contatou-me a propósito de uma pesquisa sua, segundo ele, sobre o "sentido não-Ocidental dos negócios estrangeiros da Rússia".
Não sei dizer o que ele quer dizer com isso, exatamente, mas ao lado de diversas outras questões sobre a América Latina e suas relações com o império -- qual, exatamente?; bem, só sobrou um... -- ele me colocou uma questão sobre as relações da Rússia com os EUA, depois que a Secretária de Estado Hillary Clinton fez sua primeira visita ao inimigo cordial dos americanos, levando um "botão" de restart -- aliás, traduzido erradamente para o russo, como sabem os mais informados. Apressadamente, em viagem de Brasilia a Miami, respondi o que vai transcrito (parcialmente) abaixo.

A Rússia: não quer ser o que é, mas não pode ser o que quer... [O título é meu, obviamente, retirado de uma antiga peça de teatro espanhola, sobre um noivo pobre que não consegue convencer o pai da donzela rica a deixá-la casar com ele...]

Pergunta de Boris Volkhonski (em Inglês):
1. Do you think that the intention to press the ‘reset’ button in US–Russian relations expressed by Barack Obama’s administration means a beginning of a new ‘détente’, or is it just a kind of a tactical game aimed at achieving some short-term purposes?

PRA (resposta elaborada em Português, depois vertida para o Inglês):
Provavelmente ambos, mas analistas responsáveis não se prendem a conceitos do passado, ou de uma conjuntura determinada – como o de détente, por exemplo – para expressar e analisar realidades do presente e os desafios do futuro. A história decididamente não se repete, e as circunstâncias e configurações das relações internacionais em geral, das relações ‘especiais’ entre as duas superpotências da era da Guerra Fria, bem como os ‘problemas’ de enfrentamento global daquela época – grosso modo de 1946 a 1991 – não são mais os mesmos, e isso por um fator relativamente simples. A Rússia não é sequer a herdeira da finada União Soviética, embora ele gostaria ou pretendesse sê-lo, mas ela não tem mais o poder e a liberdade de ação de que dispôs a URSS nos tempos do socialismo, muito embora a atual Federação Russa empreenda enormes esforços para recuperar não apenas o prestígio perdido, mas sobretudo o poder – mais aparente do que real – dos tempos de Guerra Fria.
Mesmo que o mundo não seja absolutamente unipolar, como alguns acreditam, e que os EUA deixem de ser arrogantemente unilateralistas, como muitos acreditam que eles sejam, sobretudo nos anos George W. Bush, os EUA são, ainda, o grande definidor da agenda internacional em termos estratégicos e de segurança; eles são a única potência capaz de projetar poder em qualquer cenário estratégico que se conceba, o que a Rússia nem de longe é capaz de fazer. Esse poder não é exercido em sua plenitude, mas o conjunto de bases militares e a presença física dos EUA no mundo – por soldados, diplomatas, agentes diversos, e também via algumas organizações internacionais – aproximam esse país o mais possível do que poderia ser chamado de ‘império universal’. Não se trata de um império ‘extrator’, como os velhos impérios dominadores do passado – chinês, romano, islâmico, espanhol, britânico, inclusive russo-soviético – mas de um império baseado no soft power da dominação econômica indireta, ou seja, um império do livre comércio e dos investimentos.
A crise atual, que deve ser vista numa perspectiva de longo prazo, imporá alguns limites a esse império, traduzindo-se numa provável perda de poder econômico relativo: não haverá declínio tecnológico ou retrocesso econômico substantivo, mas haverá uma ausência temporária de recursos – alguns deles drenados de economias satélites, como a própria China – o que constrangerá a liberdade de ação imperial. No longo prazo, haverá uma redistribuição do poder econômico no mundo, que pode ou não beneficiar a Rússia, dependendo de como esta se insere na economia globalizada.
Atualmente, a Rússia se insere basicamente de duas formas: como grande fornecedora de commodities energéticas e como fonte de poder militar em sua região específica, a Eurásia, especialmente a Ásia central, onde o seu poder de pressão é maior, assim como sobre seus ex-satélites da MittelEuropa. Ou seja, ela pode ‘chantagear’ um pouco os países dependentes de seu suprimento de energia – basicamente os europeus ocidentais e os penduricalhos de seu ex-império imediato – e pode denegar cooperação aos EUA e à OTAN para fins de resolução de problemas regionais ou locais, alguns deles cruciais, no contexto da luta contra o terrorismo de base islâmica, os problemas do Oriente Médio, o Irã, e todos os países no entorno do Mar Negro e do Mar Cáspio.
O botão de ‘reset’ é meramente simbólico, apenas um gesto de boa vontade ao início de uma nova gestão imperial. Mas deve-se ressaltar também que a administração Obama possui uma visão não confrontacionista do mundo, diferente da postura unilateralista por princípio da administração Bush. Se esta foi agressiva, pode-se caracterizar a nova como de détente, mas isso é apenas um conceito, impróprio para os tempos atuais: o mundo já não se organiza apenas em torno dos dois grandes pólos da era da Guerra Fria e a Rússia não tem mais condições de fixar ou estabelecer a agenda do mundo como ela fazia nos tempos da URSS.
Mesmo assim, esse ‘reset’ não se destina apenas a atingir objetivos de curto prazo, limitados às relações EUA-Rússia, e sim objetivos sistêmicos, ou estruturais, da nova política externa dos EUA: estes não têm interesse numa attitude confrontacionista com a Rússia simplesmente porque a maior parte dos problemas que os EUA enfrentam na região e em torno dela, assim como alguns problemas mais distantes, passam por uma cooperação política razoável com a Rússia. Isto envolve Irã, Coréia do Norte, Oriente Médio, Conselho de Segurança da ONU, atuação da OTAN no Afeganistão e vários outros problemas.
Ou seja, resumindo, o botão de reset é de fato substantivo, mas sua importância global, ou estratégica, não pode ser comparada às antigas relações EUA-URSS. Os dados da equação mudaram bastante, e não por ação unilateral, ou imposição dos EUA, e sim por retração, decadência econômica, incapacidade política e diplomática da Rússia. Esta, a despeito de sua recuperação militar e econômica, não consegue mais determinar a agenda mundial.
(...)
Brasília-Miami, 26.03.2009

sábado, 28 de março de 2009

1046) Turismo academico (5): alive, so far...

Ao sabor das tempestades e tornados...

Comecei o dia, em Brunswick, na Georgia do sul, com tempo quente, sol, algumas nuvens, agradável para viajar.
Entramos em Charleston, uma cidade colonial da Carolina do Sul, com tempo coberto e já mais fresco, mas ainda razoável para passear. Era o que tinha para ver no caminho, com exceção de Savannah, ainda na Georgia, mas eu já conhecia de visita anterior.
Em Savannah foi realizada a primeira reunião conjunta do FMI e do Banco Mundial, em 1946, a única a que compareceu John Maynard Keynes, eleito presidente do Banco Mundial. Ele morreu pouco depois. Começou então a 'mania' de se eleger um americano para o Banco Mundial e um europeu para o FMI, até agora seguida, mas provavelmente não vai se manter durante muito tempo mais.
Já tinha estado em Charleston uma vez, para uma reunião de cooperação acadêmica, iniciada pelo ministro Paulo Renato de Souza (MEC, governo FHC) e tinha gostado. A cidade melhorou bastante, com muita restauração em velhas casas coloniais, mas na verdade a maior parte da arquitetura é do século XIX. A cidade é tipicamente turística e deve ficar cheia no verão. Agora tinha gente de bermuda e outros de casaco...
Depois de Charleston, foi uma chuva só, por vezes severa, e muito congestionamento na estrada, com velocidade reduzida a menos de 50 milhas por hora em alguns trechos.
Não consegui ver nenhum tornado, ou nenhum tornado conseguiu me encontrar, mas pode ser que eles estejam esperando por mim amanhã, uma nova jornada de "severe thunderstorms", "heavy rains" e "possible tornados" em cima do meu caminho, justamente.
Em Chicago, perto de onde vou, já caiu abaixo de zero, com novas nevascas e sorvete caindo por todo lado.
Não se pode dizer que a viagem esteja sendo aborrecida...
A bem da verdade, nao sei se conseguirei chegar a Washington amanhã, domingo, como era minha intenção.
Depende de um tornado que deve estar me esperando na estrada...

1045) Turismo academico (4): tempo cão, literalmente...

Bem, de acordo com as previsões meteorológicas, o céu deve nos cair sobre a cabeça, neste sábado dia 28 de março:

Storm Watch
Severe thunderstorms and blizzards

6:55 pm ET
Tornado touches down near Fayetteville, NC, heavy delays on I-95: Police report that a tornado was over or west of Interstate 95, 2 miles southwest of Vander, at 5:30 p.m. Police also report spotting funnel clouds near the Crown Coliseum.
(...)
Damage was reported on Chickenfoot Road, I-95 and Roslin Road in Robeson County.
Extensive delays have developed along Interstate 95 between mile markers 40 and 44 for downed trees and multiple accidents, including an overturned tractor-trailer. State troopers said that after the initial accident, other drivers wrecked while trying get around the scene.
"We're not sure yet if that's storm-related. It's a possibility. But I can tell you troopers are saying several severe thunderstorms that moved into the area," said Cpt. Everette Clendenin, a spokesman for the Highway Patrol.

Ainda no conforto do hotel, mas saindo dentro de uma hora aproximadamente.
Se sobrevivermos, eu continuo postando...

O tempo está ruim na maior parte dos EUA: nevascas no norte e no Texas, inundações em várias partes, tornados no Golfo do México e nas planícies centrais, chiva forte nos estados do Sul, enfim, todas as promessas de um dia miserável.

Carmen Lícia desistiu de ir ao Tip Joe, um mercador de material de arte em Boone, nas montanhas da Carolina do Norte: as estradas provavelmente poderiam ser perigosas.
Vamos continuar pela I-95, onde os acidentes aconteceram mais por imprudência do que por ação do tempo.
Como diria Abraracourcix, nosso único temor é que o céu nos caia sobre a cabeça...

sexta-feira, 27 de março de 2009

1044) Turismo academico (3): da Florida a Georgia

Dia de viagem e de visitas, nesta sexta-feira 27 de março.
Lembrancinhas no aeroporto de Miami, melhor do que que qualquer shopping pela variedade e preços imbatíveis.
Lanche rápido, que passa por almoço, depois saída para a estrada: I-95 Norte e depois Florida Turnpike. No caminho, ainda quente, uma parada numa Plaza de estrada para tomar um Frapuccino Java e entrada em Orlando, depois Winter Park.
Recomendo a visita a este museu:

The Charles Hosmer Morse Museum of American Art
445 North Park Avenue
Winter Park, FL 32789
(407) 645-5311
http://www.morsemuseum.org/about/about.html

Sobretudo em função destas exposições:

Art Jewelry, Favrile Metalwork & Precious Glass
by Louis Comfort Tiffany
Reinstalled in March 2008, this permanent gallery features about three dozen objects, including 11 pieces of jewelry that Tiffany designed for the new art jewelry division he established at Tiffany & Co. after his father died in 1905.
Tiffany Peacock

Selected Works of Louis Comfort Tiffany from the Morse Collection
The first three galleries at the Morse have been installed with more than 100 objects that represent what an art critic in 1900 noted as Tiffany’s “dumbfounding versatility.” These works include 14 leaded-glass windows as well as examples of lamps, art glass, ceramics, and metalwork.
Glassmaking

Secrets of Tiffany Glassmaking
Through photographs, models, tools, and art objects, this teaching exhibit shows the range of Louis C. Tiffany’s glass production, from mosaics and molded-glass jewels to leaded-glass windows and lamps, providing insights into the techniques employed by his artisans.

Posso garantir, como diria o Michelin, que vaut le voyage...

Depois, mais estrada: 4 East e I-95 Norte, em direção à Georgia.
Lanche no caminho e acabamos parando neste hotel, confortável:
Hotel Comfort Suites (GA641)
Brunswick, Georgia
Tel. (1.912) 267-4440
Fax: (1.912) 262-3495
home page: http://www.comfortsuites.com/hotel-brunswick-georgia-GA641

E agora, um pouco de informação, anotações (como esta) e dodô...

Brunswick, GA, 22h40, 27.03.2009

1043) Turismo academico 2): nos EUA

Impressionantes reformas no aeroporto de Miami, desde que aqui estive pela última vez (em 2004 ou 2005, não me lembro): tudo muito amplo e limpo, bem decorado, tinindo de limpo e com muitas atrações para compra.
Tarefas da noite de 26: aluguel de carro, comunicação com Brasília, jornais e revistas locais, informação, etc.
Tarefas desta sexta-feira 27: visita a alguns pontos de Miami, depois estrada para Winter Park, uma cidade de férias, perto de Orlando, onde há um museu famoso pelos sua coleção de Tiffany e decoração belle époque.
No intervalo, respondi aos questionamentos de um jornalista russo sobre a nova política externa dos EUA para a Rússia. Depois vou reelaborar e postar aqui.
Miami International Airport Hotel, 9h46, 27.03.2009

quinta-feira, 26 de março de 2009

1042) Turismo acadêmico (1): a caminho dos EUA

Embarquei nesta quinta-feira, 26 de março de 2009, para os EUA, via Manaus e Miami, a partir de Brasilia, um voo tranquilo, que sai na hora do almoco e chega na hora da janta, sem aquelas canseiras habituais de voos transoceanicos.
Depois, um descanso no hotel do aeroporto de Miami, um carro de aluguel, no qual, eu e Carmen Licia, vamos percorrer alguns estados da costa leste, antes de chegar a Urbana, Illinois, onde passarei um mês, pesquisando, lendo e dando algumas palestras em nível de pós-graduação.
Meio turismo, meio estudo, uma viagem de lazer e de pesquisa, com poucas surpresas e algumas curiosidades.
Manterei este blog informado de minhas andanças, leituras, palestras e descobertas.
Aeroporto de Manaus, 12h25, 26.03.2009

1041) Falacias academicas: alguma sugestao a mais?

Como sabem todos aqueles que acompanham este blog, ou meu site (onde são disponibilizados, com algum atraso, diversos trabalhos publicados em veículos eletrônicos disponíveis e abertos à minha pluma crítica), venho elaborado uma série de ensaios críticos sobre o que me parecem ser as falácias acadêmicas mais evidentes, a partir de um exame do discurso universitário ou da literatura existente sobre diferentes temas de interesse social, político ou econômico.
Fiz algumas, e outras estão previstas, mas aceito sugestões para inclusão em minha lista. Desafios são sempre bem recebidos...

Falácias acadêmicas: a série
(ensaios publicados e sugestões futuras)
Paulo Roberto de Almeida

Lista dos ensaios já elaborados e publicados:

1) Falácias acadêmicas, 1: o mito do neoliberalismo
Brasília, 26 julho 2008, 9 p. Considerações em torno de equívocos conceituais, históricos e empíricos de acadêmico selecionado para avaliação crítica. Espaço Acadêmico (n. 87, agosto 2008); 1912.

2) Falácias acadêmicas, 2: o mito do Consenso de Washington
Brasília, 3 setembro 2008, 16 p. Considerações em torno dos equívocos conceituais, históricos e empíricos de setores acadêmicos com respeito ao CW. Espaço Acadêmico (n. 88, setembro 2008); 1922.

3) Falácias acadêmicas, 3: o mito do marco teórico
Buenos Aires-Brasília, 30 setembro 2008, 6 p. Da série programada, com algumas criticas a filósofos famosos. Espaço Acadêmico (n. 89, outubro 2008); 1931.

4) Falácias acadêmicas, 4: o mito do Estado corretor dos desequilíbrios de Mercado
Brasília, 15 novembro 2008, 12 p. Da série programada, com críticas a economistas keynesianos. Espaço Acadêmico (n. 91, dezembro 2008); 1952.

5) Falácias acadêmicas, 5: o mito do complô dos países ricos contra o desenvolvimento dos países pobres
Brasília, 21 janeiro 2009, 11 p. Continuação da série, tratando desta vez das teses do economista Ha-Joon Chang. Espaço Acadêmico (n. 93, fevereiro 2009); 1976

6) Falácias acadêmicas, 6: o mito da Revolução Cubana
Brasília, 1 de março de 2009, 17 p. Continuidade do exercício, tocando nos problemas do socialismo em Cuba. Espaço Acadêmico (n. 94, março 2009). 1986.

7) Falácias acadêmicas, 7: os mitos em torno do golpe de 1964 (em publicação)

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...