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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Brasil dos companheiros: ditadura cubana "contagiosa" - Editorial Estadao


Editorial O Estado de S.Paulo
Ao cancelar o registro para exercício da medicina pela cubana Ramona Matos Rodríguez, que veio ao Brasil no programa Mais Médicos do governo federal, o Ministério da Saúde exibiu mais uma violação dos direitos individuais dos profissionais da saúde "importados" da ilha caribenha para clinicar no País. Esta portaria do Ministério da Saúde institucionaliza uma situação de "dois pesos e duas medidas", que contraria a igualdade dos cidadãos perante a lei, essencial na democracia.
Há dois anos, o governo brasileiro vinha negociando com a ditadura dos irmãos Castro a vinda de médicos de Cuba para suprir deficiências de pessoal para a saúde pública em nossos grotões. Sob desconfiança generalizada, a equipe de Dilma Rousseff tentou manter tais tratativas sob sigilo. Mas, enfim, seguindo a prioridade do marketing da administração petista, anunciou o programa Mais Médicos para preencher vagas em postos de saúde dos ermos do interior com profissionais estrangeiros, a grande maioria deles cubanos. Empreendido na gestão do ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, candidato do PT, partido da presidente, ao governo do maior Estado da Federação, São Paulo, o plano já mostrou ser uma eficiente forma de conquistar votos nas eleições de outubro, seja para a reeleição de Dilma, seja para a pretensão de fazer de Padilha sucessor do governador de São Paulo, o tucano Geraldo Alckmin, também candidato à reeleição. A população, antes desassistida, do interior mais remoto do Brasil recebeu esses estrangeiros de braços abertos, a ponto de suprir as carências causadas pela baixa remuneração do corpo médico (só no caso dos cubanos) com alimentos e outros mimos. Isso, contudo, não tem sido suficiente para prover uma qualidade de vida compatível com a expectativa destes médicos. A presença de outros estrangeiros, em muito menor número e gozando de condições mais dignas de trabalho, bastou para chamar a atenção dos ilhéus para a cruel discriminação por eles sofrida aqui. Dos 6.658 participantes, 5.378 vieram da ilha caribenha. Os 1.280 de outros países são minoria.
Primeira médica a pedir para se desligar desse programa, Ramona, que trabalhava em Pacajá (PA), deixou o trabalho em 3 de fevereiro, alegando haver desistido do projeto após ter tomado conhecimento de que ganha muito menos do que colegas de outras nacionalidades, embora, por convênio firmado entre Cuba, o Brasil e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), seu salário seja de R$ 10 mil mensais. Conforme informou ao líder do DEM na Câmara dos Deputados, Ronaldo Caiado (GO), a quem pediu abrigo para ficar no País, ela, na verdade, recebia o equivalente a R$ 400 por mês, menos que o salário mínimo, de R$ 724.
O Ministério da Saúde reconheceu que, além de Ramona e de Ortelio Guerra, que fugiu do Recife para os Estados Unidos, as prefeituras para cujos postos foram enviados comunicaram o desaparecimento de mais três cubanos. E é provável que a onda de deserções esteja apenas começando. Segundo a organização Solidariedade Sem Fronteiras, que, em Miami, ajuda médicos cubanos que querem desertar, de sete a oito cubanos a serviço na Bolívia, na Nicarágua e principalmente na Venezuela lhe telefonam por semana. Pelos cálculos da entidade, já fugiram pelo menos 5 mil médicos, enfermeiros e terapeutas cubanos numa década.
A situação dos cubanos no Brasil não é menos degradante do que nos países citados. Além da indignidade de pagar à ditadura dos Castros a parte do leão, ficando os trabalhadores com praticamente um troco como remuneração pelo serviço prestado, o governo brasileiro se submete a exigências da ditadura cubana, como a proibição de médicos cubanos saírem das cidades onde trabalham sem autorização. É também o caso do cancelamento do registro de Ramona, que clinicava aqui para contribuir para as divisas de Cuba e o marketing eleitoral dos companheiros brasileiros. Agora, por ordem do Ministério da Saúde, sempre que um médico cubano faltar ao trabalho, sua ausência deve ser comunicada à polícia. Pelo visto, a ditadura cubana é contagiosa.

Venezuela: porrete ditatorial, no Brasil tambem - Gaudencia Torquato


O porrete está no ar

16 de fevereiro de 2014 | 2h 04
Gaudêncio Torquato - O Estado de S.Paulo
Literalmente. Na Venezuela, o segundo político mais importante do país, Diosdado Cabello, presidente do Parlamento, rival do presidente Nicolás Maduro no governismo, estreou programa semanal de TV, em horário nobre, exibindo um porrete com pregos para "golpear os discursos dos opositores". A imagem bate forte na lição que Simón Bolívar, o Libertador, herói e ícone dos venezuelanos, deixou pouco antes de morrer, em 1830, em Santa Marta, na Colômbia: "O sistema de governo mais perfeito é aquele que produz a maior quantidade de felicidade possível, maior quantidade de segurança social e maior quantidade de estabilidade política". Não é o que ocorre na Venezuela, onde tudo está escasso, até papel higiênico.
Mas o porrete não é arma exclusiva da Venezuela. Circula bastante por estas plagas. Sua multiplicação pelas ruas das grandes cidades não se deve à afinidade do Brasil com o regime implantado pelo falecido comandante Hugo Chávez. É fruto do nosso baixo produto nacional bruto de felicidade.
Por aqui as porretadas começam nos vãos da política. Coisa natural em ano de eleições. O presidente do PT, Rui Falcão, golpeia opositores atribuindo-lhes a pecha de representantes do "neopassadismo" (Aécio Neves, do PSDB) e "neovelhismo" (Eduardo Campos, do PSB), em capciosa referência aos avôs dos dois pré-candidatos, Tancredo Neves e Miguel Arraes. O senador mineiro, em resposta à candidata Dilma Rousseff, que chamara os rivais de "caras de pau", viu nos neologismos e ataques a situação do PT, partido "à beira de uma crise de nervos", enquanto o governador socialista de Pernambuco anunciava que "o País parou" por causa de um "pacto mofado". Ao contrário, refuta a presidente, "todo dia a gente sobe um Himalaia". Estocadas à parte, e até reconhecendo que a expressão tende a subir o tom por conta da emblemática campanha - fim ou continuidade do ciclo petista? -, o fato é que o clima social é turvo: as tensões se acirram, a insegurança se expande, a desordem ocupa as ruas, as milícias mostram-se despreparadas para conter o ímpeto das turbas, os atores políticos encolhem o discurso e o sinal amarelo aparece no farol da economia.
A imagem de um país na corda bamba emerge com força. De um lado, um Estado que realiza uma das mais extraordinárias experiências contemporâneas na frente da distribuição de renda, cantada e proclamada no mote dos 30 milhões de brasileiros que ascenderam à classe média; de outro, um território com visível desequilíbrio na área de serviços públicos essenciais, a partir da mobilidade urbana, faísca que acende fogueiras por todo lado. Esse Estado preparou a infraestrutura para receber o novo contingente de classe média? Onde estão os equipamentos de lazer, as praças e parques, os espaços de convivência?
O porrete está banalizado. E baixa pesado sobre as turbas. Nunca bateu tanto no jornalismo, no qual estão os olhos, os ouvidos e as bocas das democracias. Os dados são assustadores: 118 jornalistas foram agredidos desde junho, 75% dos quais, segundo levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, vítimas dos porretes da Polícia Militar. Em 2013 seis profissionais foram assassinados a mando de grupos políticos, agiotas e narcotraficantes. Incêndio de ônibus virou rotina. Quase todos os dias, um ou mais. Cerca de cem já foram queimados no Estado de São Paulo nos últimos tempos, crimes atribuídos na maior parte ao PCC. O porrete informal açoita os costados do poder formal do Estado.
Os bastões dos vândalos também estão no ar. Para destruir, quebrar, matar. O assassinato de Santiago Andrade, da Band, comoveu o País. Pergunta-se: o que se fez ou se fará para evitar o vandalismo? Lembrança: "a bandidagem mascarada" ocupa as ruas desde meados do ano passado. O que os governos - federal, estadual, municipal - fazem para conter a violência das gangues? As providências são despejadas nos tonéis de promessas e vãs palavras. As autoridades contentam-se em anunciar a óbvia apuração de casos, imaginando que a prisão de delinquentes, como a do rapaz que matou o cinegrafista com o rojão, seja suficiente para produzir catarse e acalmar a alma social. Não veem que a primeira pedrinha do dominó rolou e as outras caem em sequência. A primeira pedra é a da credibilidade dos governantes e, por consequência, de toda a esfera política. Foi derrubada pelo descrédito, fruto da incapacidade dos atores de dar respostas satisfatórias às demandas da sociedade organizada. As outras pedrinhas também levam nome: impunidade, lerdeza, burocracia, ladroagem da coisa pública, superfaturamentos, máfias nas malhas da administração pública, politiquice, falta de seriedade, desprezo pela liturgia do poder.
O que dizer de um magistrado que deixa a toga de lado para sugerir suspeitas de campanhas de arrecadação de recursos para pagar multas de apenados na Ação Penal 470, quando poderia reservar-se e preservar a força simbólica do cargo, eis que imbróglios como o que chamou sua atenção poderão, mais adiante, bater em sua mesa? O que dizer de parlamentar que, com gesticulação incongruente com o evento solene de que participava, procurou fustigar o presidente da Suprema Corte, ao seu lado?
Os atos de desrespeito, deboche, humilhação espalham-se nas cercanias do império da desordem e da anomia que se alastra no País. Nossa vista já alcança a efervescência a ser causada pela Copa do Mundo. Mas não dá para ver se faltarão água e luz nas cidades e nos estádios. Ou se o acesso às arenas esportivas será fácil e tranquilo. A confiar nas autoridades, tudo correrá às mil maravilhas. A acreditar que Deus é brasileiro, teremos de fato a Copa das Copas. Com porretes contidos, claro. Sem quebra-quebra. E aplaudindo o equilibrista, vendo-o chegar ao outro lado da corda esticada a mil metros de altura. Leitor, acredite se quiser.
JORNALISTA, PROFESSOR TITULAR DA USP, É CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO TWITTER@GAUDTORQUATO

Imprensa: uma cortina de silencio e de opressao se abate sobre a America Latina

América Latina, inimiga da imprensa livre
Editorial do jornal O Globo analisa a situação da imprensa na América Latina, pior a cada dia. Em termos de liberdade, aliás, estamos mais para as ditaduras africanas do que para as democracias europeias e norte-americana. Por aqui, abundam os tiranetes, inclusive sufragados pelas urnas - o que atesta a estupidez política dos latino-americanos em geral. O jornal é parcimonioso, no entanto, quanto à situação da imprensa no Brasil, onde o Partido Totalitário faz ataques permanentes à liberdade de expressão e ao Estado de Direito:

A orientação autoritária de governos, interesses econômicos, o crime organizado, conflitos, a violência em algumas situações, como a cobertura de manifestações de rua, e leis com o objetivo de “regular” o trabalho jornalístico têm colocado em risco a vida e os empregos dos jornalistas e enfraquecido a liberdade de imprensa na América Latina, um dos sustentáculos da democracia. O Grupo de Diários América (GDA), do qual O GLOBO faz parte, relatou as dificuldades na série “As ameaças à liberdade de imprensa”.

A hostilidade contra a imprensa profissional se manifesta como padrão de governos bolivarianos, a começar pelos de Venezuela e Equador, que não toleram, de forma visceral, diversidade de opiniões e críticas. Mas é também a situação que prevalece na Argentina, já que o kirchnerismo tem muitos pontos de contato com o chavismo. No Brasil, a integridade física dos jornalistas é ameaçada. Segundo a ONG Repórteres sem Fronteiras (RSF), o país teve o maior número de profissionais mortos nas Américas em 2013 — cinco. Com isso, caiu duas posições e ocupa o 108º lugar entre 179 nações no ranking da RSF. E 2014 começa com a trágica morte do cinegrafista da Bandeirantes Santiago Andrade, atingindo na cabeça por um rojão disparado por black blocs, quando cobria protesto contra aumento das passagens de ônibus no Rio.

Na Venezuela (117º no ranking da RSF), o chavismo, no poder desde 1999, usou todo seu poder político e econômico para transformar a mídia no grande canal oficial. E em grande parte o conseguiu. Pela primeira vez no país, um governo controla quase totalmente a televisão. E agora, em séria crise econômica, o governo Maduro economiza divisas na importação de papel de imprensa. Pelo menos sete periódicos regionais já deixaram de circular. A eficácia do dispositivo oficial foi comprovada quando os jornais e a TV se autocensuraram na cobertura dos protestos de rua dos últimos dias contra o governo, em que três pessoas morreram. Cristina Kirchner levou às últimas consequências as manobras de seu marido e antecessor, Néstor, para manipular a imprensa na Argentina (54º lugar), esgrimindo com a verba oficial de publicidade e uma Lei de Meios para desmantelar a mídia profissional. Numa vitória do Grupo Clarín, o mais hostilizado, a Suprema Corte determinou que o governo promova de forma igualitária a distribuição da publicidade oficial. Mas o Clarín foi derrotado na luta jurídica em torno da Lei de Meios.

No Equador (119º, no rankink da RSF), o presidente Correa dispõe de novos meios para pressionar a imprensa independente depois da entrada em vigor de uma lei que instituiu o Conselho de Regulação da Comunicação com cinco membros, dos quais quatro vinculados ao governo. A democracia precisa evoluir na América Latina. É direito do povo cobrar das autoridades. É dever da imprensa fiscalizar, denunciar o que estiver errado, exigir providências. Só a corruptos e déspotas interessa uma imprensa “chapa branca”.

Venezuela: culpando a conspiracao estrangeira, como sempre...


CARACAS, Venezuela — After several days of student-led protests against his government, President Nicolás Maduro said Sunday that he was expelling three American consular officials who he said had been visiting universities here.
He did not say exactly what the officials had done to deserve expulsion, nor did he identify them, saying they had claimed to be visiting private universities to offer visas to students.
Mr. Maduro, a socialist who was elected in April, has often said the United States is seeking to oust him from office; Sunday was the third time in less than a year that he has announced the expulsion of American officials.
Mr. Maduro kicked out the American chargé d’affaires and two other embassy officials in September. In March, on the same day that he announced the death of his predecessor, Hugo Chávez, Mr. Maduro expelled two American military attachés. In both those cases he said the officials had been conspiring against the government, charges that Washington denied.
Mr. Maduro also said Sunday that a State Department official had contacted Venezuela’s ambassador to the Organization of American States in Washington and warned of negative consequences if Venezuela arrested a prominent opposition politician, Leopoldo López. He said Mr. López was responsible for violence tied to the recent demonstrations.
“I don’t accept threats from anybody,” said Mr. Maduro, who has said the recent protests are part of a coup attempt against him.
Demonstrators say they have taken to the streets to protest rising crime, high inflation and government pressure on the news media, among other complaints.
It was not possible to immediately confirm the conversation with the State Department official.
Secretary of State John Kerry released a statement on Saturday expressing concern about the violence in Venezuela and the reports that the government was seeking to arrest Mr. López.
“These actions have a chilling effect on citizens’ rights to express their grievances peacefully,” Mr. Kerry’s statement said.

Democratas venezuelanos pedem ajuda na luta pela defesa das liberdades



Anistia Internacional faz chamado à comunidade internacional sobre a grave situação na Venezuela


Tres personas han muerto, varias han resultado heridas y decenas más han sido detenidas en enfrentamientos entre manifestantes, fuerzas de seguridad y civiles armados durante las manifestaciones celebradas en toda Venezuela. Puesto que las manifestaciones continúan, sigue existiendo el riesgo de que se produzcan nuevos incidentes.
Desde el 13 de Febrero activistas de diferentes países envían comunicaciones sobre los recientes hechos en Venezuela, en base a esta acción urgente emitida desde el Secretariado Internacional de Amnesty International


Tres personas murieron en Caracas, capital de Venezuela, y decenas más resultaron heridas en todo el país en los violentos enfrentamientos que estallaron durante las manifestaciones antigubernamentales, y después de ellas, celebradas el 12 de febrero para conmemorar el Día de la Juventud de Venezuela. Amnistía Internacional ha recibido información que indica que las fuerzas de seguridad hicieron uso de fuerza excesiva, incluidas armas de fuego, que se produjeron enfrentamientos entre los manifestantes y las fuerzas de seguridad, y que hubo actos violentos contra manifestantes por parte de civiles armados, al parecer perpetrados con el consentimiento de las fuerzas de seguridad. Según las organizaciones locales, los enfrentamientos comenzaron en Caracas al concluir una marcha hasta la sede de la Fiscalía General, donde los manifestantes pretendían entregar una petición en la que se pedía la libertad de los estudiantes detenidos en manifestaciones anteriores. Dos personas –Juan Montoya y Bassil Da Costa– murieron, y varias más resultaron heridas, entre ellas funcionarios públicos. Más tarde, al anochecer del 12 de febrero, estallaron enfrentamientos en el municipio de Chacao, al este de la capital, donde el alcalde del municipio confirmó la muerte de otra persona.

Venezuela: o silencio ensurdencedor da OEA, da Unasur, da Celac, do Mercosul, dos governos latino-americanos...

A solidão da Venezuela

A América Latina dá as costas à violência política, à censura e à criminalização dos protestos que têm se agravado no país

A Organização das Nações Unidas pediu justiça para os mortos. A União Europeia advogou pelo “diálogo pacífico” e pelo respeito à liberdade de imprensa e ao direito ao protesto. O secretário da Organização de Estados Americanos (OEA) clamou para que se evitasse mais confrontos. Mas os principais líderes da América Latina, por outro lado, estão em silêncio diante da violência desatada na Venezuela durante os protestos estudantis desta semana contra o Governo de Nicolás Maduro .

Mais que o funcionamento democrático do Estado venezuelano –medido pela garantia dos direitos sociais e políticos de seus cidadãos e pelo respeito às minorias--, o que tradicionalmente tem preocupado a liderança Latino-americana durante a última década na Venezuela é a estabilidade do Governo; concretamente, a permanência no poder do chavismo, aliado político e, sobretudo, aliado econômico. A última vez que um organismo multilateral se reuniu para tratar da delicada situação política que a Venezuela atravessa, especialmente desde a morte do presidente Hugo Chávez, foi aquela reunião de emergência na qual participaram oito dos doze presidentes dos Estados que formam a União de Nações Sul-Americanas (Unasul). O encontro celebrado em Lima, em abril de 2013, que resultou no respaldo incondicional à eleição de Nicolás Maduro como novo presidente da Venezuela, sem centrar nas denúncias que punham em dúvida a transparência do processo ou nas circunstâncias que rodearam a morte de oito venezuelanos durante os protestos posteriores às eleições.

Neste novo episódio de violência que agita a Venezuela –à nação, como um tudo--, os Governos da América Latina parecem, de novo, de acordo com a informação parcial e inexata que até agora ofereceu o Gabinete de Nicolás Maduro, que novamente denunciou tramas conspiratórias para justificar o uso da força e da censura. Em seu discurso desta quinta-feira à noite, 24 horas após os episódios que resultaram na morte dos estudantes Bassil Dá Costa e Roberto Redman, e do dirigente chavista Juan Montoya, o presidente Maduro se equivocou algumas vezes ao falar os nomes dos mortos, mas disse ter certeza absoluta de onde vieram as balas que mataram dois deles. Na mesma noite de quinta-feira, o chanceler venezuelano Elías Jaua justificou como decisão de Estado a retirada do ar, na Venezuela, da emissora de notícias colombiana NTN24, a única televisão que informava ao vivo o que ocorria nas ruas do país, enquanto as emissoras nacionais de rádio e TV transmitiam programas de variedades e atos oficiais.

A reação dos governos da América Latina foi a seguinte: Equador e Argentina manifestaram seu respaldo irrestrito ao Governo de Maduro, e Panamá anunciou que acompanhará com cautela a situação venezuelana. O chefe de Gabinete argentino, Jorge Capitanich, informou, inclusive, que “até o momento não existe previsão” de uma reunião da Unasur ou dos sócios do Mercosul para tratar do assunto.

Ao mesmo tempo, uma dezena de organizações venezuelanas comprometidas com a defesa dos direitos humanos e com a liberdade de expressão na Venezuela –Provea, Cofavic, la Red de Apoyo por la Justicia y la Paz, o Sindicato de Trabalhadores da Imprensa, entre elas—documentaram com depoimentos, vídeos e fotografias a violação sistemática dos Direitos Humanos na Venezuela, sem que suas denúncias sejam ouvidas por nenhum organismo multilateral. Comprovaram a privação da defesa e, em alguns casos, a tortura –com surras e intimidação—das duas centenas de estudantes presos durante as manifestações. Protestaram contra os ataques e o roubo de material gráfico dos repórteres dos meios nacionais e internacionais que cobriam os acontecimentos desta semana, e que provam o  uso de armas automáticas por parte de policiais e militares e a intervenção de grupos paramilitares próximos ao chavismo - denominados na Venezuela "coletivos" - na repressão das manifestações. São as mesmas organizações que durante mais de duas décadas denunciaram rigorosamente diante da Comissão de Direitos Humanos da OEA (CIDH) a responsabilidade do Estado venezuelano em crimes de lesa humanidade. Talvez desta vez não mereçam ser escutadas?

A comunidade de países Latino-americanos e do Caribe apresenta-se diante destes fatos como uma aliança de governos e não de Estados, que desconhece abertamente as vozes dissidentes de seus cidadãos, em função de interesses conjunturais. O grosso dos países que fazem parte da Organização de Estados Americanos e quase a totalidade dos que integram a Comunidade de Estados Latino-americanos (Celac) e a Unasur, ainda recebem o apoio de Venezuela através de remessas de petróleo barato ou têm neste país um cliente seguro de suas exportações. Ante estas razões práticas, não cabem sequer a preocupação e a dúvida. E assim, quanto mais acompanhado está o presidente Nicolás Maduro de seus pares regionais, mais sós estão os cidadãos para os quais ele Governa: o povo chavista e os opositores, que pedem justiça para que episódios como estes não se repitam ciclicamente e mediação para o diálogo, cada vez mais necessário.

Joaquim Nabuco jornalista - Angela Alonso

O jornalista acidental

O que Joaquim Nabuco aprendeu como correspondente internacional

ANGELA ALONSO

Folha de S.Paulo, 16.02.2014


RESUMO Nova coletânea mostra como a atividade de Joaquim Nabuco como repórter internacional, com base em Londres, moldou sua escrita. Os artigos publicados em meios como o "Jornal do Comércio", onde começou essa carreira, após derrota nas urnas, permitem acompanhar o trajeto ideológico do autor de "O Abolicionismo".

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NO MOMENTO em que você lê este artigo, ele já envelheceu. No hiato entre eu o ter escrito e sua publicação, você foi bombardeado por milhares de informações que pululam na internet. Mas não é de agora que o jornalismo impresso perde para novas tecnologias. Joaquim Nabuco (1849-1910), conhecido como figura-chave do movimento pela abolição da escravidão no Brasil, quando se viu jornalista, em 1882, penou da mesma agrura.

Correspondente em Londres, responsável também por Viena e Berlim, Nabuco reclamava de que o telégrafo, inaugurado no Brasil na década de 1870, sabotava o repórter com notícias frescas, enquanto seus artigos mofavam cerca de três semanas no navio até atingirem o leitor.

De modo que notícia velha não é coisa nova. Nos seus 300 artigos como correspondente estrangeiro, coligidos por Leslie Bethell, José Murilo de Carvalho e Cícero Sandroni na recém-lançada edição "Joaquim Nabuco Correspondente Internacional 1882-1891" [ed. Global/Academia Brasileira de Letras; vol. 1, R$ 79, 672 págs.; vol. 2, R$ 65, 512 págs.], Nabuco se houve com a perenidade da informação optando por ser mais analítico que noticioso. Dava mais a visada geral que o fato a fato.

O jornalismo não estava nos seus planos. Filho de político, estreou no Parlamento em 1879 e se destacou chamando para si a causa da abolição. Correu a Europa em busca de apoio e fundou a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão. Essa estrela política ascendente, contudo, desafiou a liderança de seu Partido Liberal, ao se decidir por abolicionista. E assim, em 1882, não se reelegeu deputado geral pela Província de Pernambuco. Tornou-se, então, correspondente em Londres do "Jornal do Comércio", enquanto esperava as próximas eleições.

A atuação como jornalista nas baixas políticas se configuraria como padrão. O ofício provisório virou ocupação duradoura.

EDITOR Nos tempos em que são comuns os ataques à norma culta em textos que vão direto do computador do autor para o do leitor, a figura do editor perdeu a aura que teve no passado. Editores pautadores, corretores, eruditos. Joaquim Nabuco teve um desses: Francisco Picot, que viveu no Rio, mas, nos anos 1880, editava da capital francesa o maior e melhor dos periódicos brasileiros do século 19, o "Jornal do Comércio". E lia com lupa em Paris o que Nabuco escrevia à pena em Londres.

Quem ligou um homem ao outro foi o barão de Penedo, que era quase um pai substituto de Nabuco e chefe da diplomacia brasileira em Londres. A morte do correspondente do jornal, um experiente analista econômico, abriu o emprego, com o qual Nabuco garantiria sua sobrevivência física e política nos próximos dois anos, independente do Estado escravista que vinha combatendo.

Assim, Picot não escolheu Nabuco, Nabuco não escolheu Picot. O editor esclareceu logo que, em sua escala de valores, o sobrenome Nabuco, seu livro de poemas em francês ("L'Amour et Dieu") e seu brilho político valiam pouco. Diferentemente da maioria das pessoas que Nabuco conheceu, Picot não se rendeu ao seu charme. Ao contrário. Implicava, contrariado por ter o moço inexperiente no lugar de seu velho amigo Clark.

Picot exigia muito, sempre. Além de pautar os artigos, depois os comentava, catando deslizes, ausências, excessos. A relação com Nabuco foi tensa por conta desse olho de águia, atento à menor das faltas. Reclamava da substância e de tudo que a envolvia, até do fecho dos envelopes em que iam os artigos, como nesta carta de 2 de abril de 1882 (que se encontra no acervo da Fundação Joaquim Nabuco): "Teria sido bom dizer na carta de Londres, sem comentário, que o Financier' publicou o artigo sobre garantias de juros [...]. Também teria sido bom dar o resultado do empréstimo do Baring para Buenos Aires.[...] Por último, vou recomendar-lhe que molhe bem molhada a goma que fecha a capa das suas cartas".

Nabuco nunca antes trabalhara e cedo se cansou. Mas, cheio de dívidas, sem alternativas, permaneceu sob ordens de Picot. O editor o disciplinou, incutiu-lhe a ética do trabalho. Cobrava concentração em assuntos áridos para quem antes aspirava a poeta, exigia precisão de um habituado ao diletantismo e sobriedade de um pendente ao derramamento. Pedia acurácia no trato de temas que Nabuco antes não dominava --a economia-- e objetividade naqueles sobre os quais antes divagava --a geopolítica. Quem lê o drama "L'Option", sobre a guerra da Alsácia-Lorena, que Joaquim Nabuco rascunhou nos anos 1870, e vai depois aos artigos sobre a expansão do imperialismo inglês, reunidos nesse volume, enxerga uma metamorfose.

Francisco Picot foi para Joaquim Nabuco o que um bom editor é para um iniciante: uma escola. Obrigou-o a dois aprendizados.

O substantivo diz respeito à profundidade analítica e teve consequências para tudo aquilo que Nabuco escreveria depois, em particular para seu livro londrino, "O Abolicionismo", que saiu às carreiras, em 1884, para ajudar a campanha abolicionista no Brasil e impedir que Nabuco desaparecesse dela, estando do outro lado do Atlântico, enquanto seus companheiros a radicalizavam. O livro é de uma argúcia que seu autor não evidenciara antes.

Outro ganho dos tempos sob Picot foi o apuro do estilo. Basta fazer o "antes e depois". Os discursos parlamentares e os artigos para o jornal "O Globo" (que não estão na coletânea), nos anos 1870, são de sentenças compridas, muitos apostos, afrancesados. Já "O Abolicionismo" [Ed. UnB, R$ 32, 252 págs.] é livro de contundências, de frases que são como tiros.

TEMAS Os artigos reunidos na coletânea não são todos de mesmo tipo. O primeiro volume traz os para o "Jornal do Comércio" e os produzidos quase simultaneamente para o "La Rázon", de Montevidéu. São artigos de jornalista.

A correspondência de Londres para o "Jornal do Comércio" aborda a geopolítica inglesa, sua política doméstica e a candente questão irlandesa. A economia é pauta obrigatória, sobretudo no que tocava os negócios brasileiros. Já os artigos de Viena e Berlim visavam "resumir os acontecimentos" da política local e eram escritos a partir de Londres.

Em conjunto, as três correspondências traçam cenários geopolíticos e perfis e estratégias dos grandes líderes políticos do período, William Gladstone, na Inglaterra, e Otto von Bismarck, na Alemanha. O foco se abre para abarcar Rússia, Prússia, França, políticas dinástica e eclesiástica, reformas modernizadoras, como o voto secreto e a ampliação do sufrágio --Joaquim Nabuco, aliás, não se mostra entusiasta do voto feminino--, e a disputa por territórios na África e mesmo da Europa --caso da Bósnia e da Sérvia.

Os artigos reconstroem as relações de força, o campo de poder internacional cujos desdobramentos alcançariam o século 20. Registram atentados e assassinatos políticos orquestrados pelos "niilistas" (anarquistas); avanços do socialismo, com suas "paredes" (greves); conflitos entre as grandes potências e o Congresso Antissemítico Internacional, de 1882, que, narra Nabuco, tomava os judeus por "animais daninhos".

O fecho dos artigos abriga as variedades: a passagem de um cometa, um banquete com Wagner e Lizst, um naufrágio, um livro, um baile, um obituário --o de Darwin, Garibaldi, Marx. Aí o autor externava mais personalidade, mas, se opinasse muito, Picot cortava suas asas --e o trecho do artigo.

Só ao final de seu período de correspondente, quando o editor amansou, os textos adquiriram tom pessoal. Nabuco inseria referências oblíquas à questão escravista que ardia no Brasil, por exemplo, ao comentar a escravidão no Egito e o livro do norte-americano Henry George, "Progress and Property" (1879), que defendia a socialização da propriedade da terra. Nabuco criticou seu socialismo, que resultaria em Estado "colossal" e ineficiente, colonizado por "classes parasíticas", mas aproveitou para propalar seu próprio ideal liberal, a taxação moderada e progressiva, com vistas a generalizar a pequena propriedade.

No "La Razón", Nabuco escreveu pouco, entre 1883 e 1884, mas opinava mais, em artigos quase normativos sobre liberalismo, democracia, socialismo, nos quais sobressai sua admiração incontida pelo reformismo político inglês.

Aqui e ali, algo de política americana, como o tratado de paz entre Chile e Peru, em 1883, mas o grosso dos textos cozinhava o antes enviado para o "Jornal do Comércio" --a situação desgostou Picot e foi um motivo para interromper sua correspondência em Londres. Outro foram as eleições parlamentares brasileiras de 1884. Nabuco voltou para se jogar de cabeça na campanha abolicionista.

PALANQUE O segundo volume da coletânea traz textos desse tempo, quando enviou do Rio alguns artigos para o "La Razón", e escreveu para "O País". Quintino Bocaiuva, abolicionista e editor do jornal carioca, convidou Nabuco para uma coluna que seria seu palanque abolicionista, com críticas furibundas à política escravista do governo do Partido Conservador.

Entre 1886 e 1888, escreveu cerca de uma centena de artigos. A coletânea, para manter sua unidade como "correspondência internacional", incluiu só os escritos da Europa, para onde foi, como enviado especial, a fim de cobrir tratamento de saúde de dom Pedro 2º.

Como o imperador se restabeleceu, os artigos se concentraram na linha dos anteriores para o "Jornal do Comércio", com foco na política inglesa. Mas, nos textos de 1888, a política brasileira sobressai, como quando narra suas visitas aGladstone e ao papa, em busca de apoio para a abolição da escravidão.

Foi justo a política que tirou Nabuco de "O País", quando o republicanismo tornou-se preponderante na linha editorial. Ao contrário de Picot, Bocaiuva não logrou enquadrar Nabuco, que recorreu ao dono do jornal e assim manteve coluna autônoma, "Campo Neutro". Mas o arranjo durou pouco.

Pós-13 de Maio, os abolicionistas se dividiram. Boa parte, como Bocaiuva, foi para a campanha republicana. Nabuco ficou entre os poucos esperançosos de que o Terceiro Reinado, o de Isabel, faria reformas complementares à abolição. Essa divergência encerrou sua participação em "O País" em 1889.

Nesse ano, a monarquia, assoreada por várias frentes de descontentamento, caiu, e Nabuco, recém-reeleito deputado, ficou sem emprego. Voltou à imprensa, em 1891, no "Jornal do Brasil", criado por monarquistas como polo de crítica ao novo regime.

Esses artigos, escritos de Londres e Buenos Aires, como aqueles para o "Jornal do Comércio", produzidos no retorno ao Brasil (por isso excluídos da seleção), são salpicados de antirrepublicanismo e acusam o militarismo não apenas nacional como noutras partes da América Latina --expressão que usa aí por primeira vez.

Na coletânea, o leitor vai encontrar então três Nabucos: o jornalista, o abolicionista e o monarquista.

LIVROS "O Abolicionismo" deve ao jornal, embora não tenha sido escrito nele, mas outros quatro livros de Nabuco surgiram na imprensa e conformam dois pares.

"Balmaceda" [Cosac Naify, R$ 59, 272 págs.], sobre a guerra civil no Chile, e "A Intervenção Estrangeira durante a Revolta de 1893" [Senado Federal, R$ 10, 150 págs.], a respeito da Revolta da Armada, saíram seriados no "Jornal do Comércio", entre 1895 e 1896, anos de florianismo feroz e de reação monarquista à República, com a Armada.

Tempo de militância, para Nabuco, como um dos fundadores do Partido Monarquista. E tempo de governo militar. Por isso, a análise da política interna chilena, em "Balmaceda", serve para criticar o republicanismo do Brasil de esguelha. "A Intervenção Estrangeira", publicado já no governo Prudente de Morais, é explícito em acusar o apoio dos EUA a Floriano como decisivo na vitória dos republicanos sobre os monarquistas.

O outro par de livros é da virada do século. "Escritos e Discursos Literários" (1901) traz artigos publicados aqui e ali, que destilam a adesão cultural ao antigo regime. Nabuco já não propagandeava a monarquia, a República estava consolidada, mas sua fidelidade ao modo de vida aristocrático persistia e está patente na reconstrução precoce da própria trajetória (tinha 40 anos), escrita em outro jornal monarquista,"O Comércio de São Paulo".

A série era explicitamente política, com o cabeçalho "Minha Formação Monárquica". Ao coligi-la em livro, em 1900, Nabuco encurtou o nome para "Minha Formação" [Editora 34, R$ 49, 288 págs.] --ele aceitara cargo diplomático do governo republicano. Mas o livro guardou certa nostalgia doImpério, até ao falar da escravidão que tanto combatera. Prosa evocativa e de um lirismo evidente no trecho que Caetano Veloso musicou como "Noites do Norte".

TRAÇA Li por primeira vez o que vai nesta coletânea em cópias nas quais às vezes o filé mignon do artigo tinha sido refeição de uma traça. A edição em livro recupera a íntegra e ajunta o que era preciso caçar em diferentes arquivos. Assim, presta inestimável serviço ao pesquisador. Contudo, o leitor de jornais velhos espera que o livro traga refrigério gráfico. Este não traz. Como o volume de artigos é grande, optou-se pelas letras miúdas --com que o martírio para os olhos não se altera.

Também seria bom um sumário detalhado, que orientasse o leitor entre jornais e datas, e uma advertência sobre a autoria de alguns artigos --os do "Jornal do Comércio" não eram assinados, vinham apenas como "correspondência".

O que se lê é variado em assuntos, épocas e finalidades. Notas de rodapé mais abundantes ajudariam o leitor menos informado sobre Nabuco e seu tempo.

A edição o compensa, porém, com quatro textos introdutórios. O primeiro é o erudito, do historiador Leslie Bethell, professor emérito das universidades de Londres e Oxford, sobre a geopolítica e a política inglesa do século 19.

O também historiador José Murilo de Carvalho, professor emérito da UFRJ, assina o segundo, apresentando a conjuntura política doméstica em que Nabuco se movia. Bethell e Carvalho são especialistas consagrados no período e antes coligiram a correspondência de Joaquim Nabuco com os abolicionistas ingleses. A apresentação do jornalista Cícero Sandroni dá o panorama da imprensa brasileira no período, e a de Adriana Mirel Clavijo, especialista em relações internacionais, informa sobre o jornal uruguaio "La Razón".

Para quem nunca leu Nabuco, a coletânea é oportunidade de adentrar o universo de um de nossos melhores analistas e flagrá-lo em formação e burilamento. Quem o conhece vai dar com novo ângulo da figura e aquilatar o que significava ser jornalista no estrangeiro no século 19.

Boa companhia na leitura deste livro são textos oitocentistas correlatos. O "Times" de Londres enviou William Howard Russel para cobrir os conflitos na Crimeia, em 1854, fazendo dele um pioneiro da correspondência de guerra. JoséMartí acompanhou a Primeira Internacional socialista para o "La Nación", em 1888. E Eça de Queiroz, de quem Nabuco foi amigo na velhice, escreveu para um jornal suas "Cartas da Inglaterra", mais ácidas que as de Nabuco, mas igualmente saborosas.

A idade dos textos não deve espantar o leitor. Eles nos são mais próximos do que se imagina.

Um tema de Nabuco foram os ataques terroristas perpetrados na Europa por radicais irlandeses e socialistas russos. Em 1884, por exemplo, houve a "conspiração da dinamite". Malas cheias de explosivos foram postas em quatro grandes estações de metrô em Londres, programadas para explodir no mesmo horário. Três falharam, mas uma arrebentou Victoria Station, no coração da cidade. Como se vê, problemas do tempo de Nabuco que persistem no nosso.

Eleicoes 2014: comeca a mistificacao dos fatos pelos companheiros...

Petistas querem fusão com governo Lula para melhorar índices

João Domingo

O Estado de S. Paulo, 16 de fevereiro de 2014


Desde que chegou ao poder, em 2002, o PT não havia começado um ano eleitoral com um quadro tão adverso na economia. A inflação está perto dos 6%, o crescimento previsto para 2014 é de 2% e produção industrial na casa de 2,2%.Todos índices inferiores aos das eleições de 2010 e de 2006. Na eleição de Dilma, em 2010, por exemplo, o crescimento foi mais que o triplo (7,53%).

Para lidar com a questão, o comando da campanha petista pretende "fundir" os governos Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva na hora de apresentar dados econômicos na eleição. Dilma tem bons resultados no emprego e na renda, mas amargou problemas de inflação, crescimento, balança comercial e superávit primário. Com a ajuda dos números do antecessor, o cenário melhora.

O discurso eleitoral também prevê resposta a críticas sobre os sucessivos apagões da atual gestão. Dilma lembrará que, no governo tucano, houve racionamento de energia. Se a oposição disser que a inflação nunca esteve no centro da meta, a tática é dizer que ela nunca estourou o teto. Se a crítica for de baixo crescimento, Dilma dirá que o objetivo é crescer com "responsabilidade".

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Fraudes e mentiras do lulo-petismo - Mary Zaidan

É cara de pau, por Mary Zaidan

por 

Trem-bala, seis mil creches, 500 UPAs, Brasil rico, sem miséria. Fome Zero, transposição do Rio São Francisco, presídios federais de segurança máxima. Promessas de um futuro espetacular que nunca chega. Especialidade da geração de marqueteiros que alcançou o ápice no período Lula, a venda do paraíso - que tem sido repetida com sucesso - pode não ter tanta valia em 2014.

Os sinais são muitos. Nas ruas e fora delas. No bolso do cidadão que paga cada vez mais impostos sem a recíproca de serviços mínimos, no cotidiano de quem depende da esfera pública para ter educação, saúde e transporte.

Daí ser quase incompreensível a insistência dos arquitetos eleitorais da presidente Dilma Rousseff em apostar nos fogos de artifício do PAC 3, previsto para abril.

Apresentado por Lula em 2007, o primeiro PAC era arrebatador, com obras que pretendiam revolucionar o País. Ganhou forte apoio do empresariado, chegou a causar inveja até em gente da oposição. Mas empacou.

Para turbinar a campanha de 2010, o PAC ganhou uma segunda edição, e uma mãe, a então ministra Dilma Rousseff, a quem Lula atribuía o sucesso da versão anterior que mal saíra do papel: 54% das obras nem projeto tinham. Na época, anunciou-se com estardalhaço que o PAC 2 significaria investimentos em torno de R$ 1,6 trilhão. Os últimos dados apontam a execução de R$ 665 bilhões, a maior parte em financiamento habitacional. O 9º balanço, aguardado para a semana que passou, nem mesmo foi divulgado.

 

Foto: Ed Ferreira / AE

 

Pouco importa se os demais PACs empacaram. O ano de 2014 tem eleição e vem aí o PAC 3. Apelidado como PAC da mobilidade, o mesmo termo que sustentou a ilusão do upgrade das cidades que sediarão a Copa do Mundo da Fifa.

Na mesma toada que deu certo na eleição anterior, no site do PAC, o futuro é hoje. Em destaque estão investimentos de R$ 2,5 bilhões em Belo Horizonte, capital do estado-base do candidato tucano à presidência, Aécio Neves. Antes de tudo, reforça a campanha do mais querido dos auxiliares de Dilma, o ex-ministro Fernando Pimentel, que disputará do governo de Minas.

O PAC oficial festeja ainda o legado dos Jogos Olímpicos de 2016, com quase R$ 1 trilhão de investimentos. Comete-se o mesmo erro dos sonhos dourados da Copa.

Difícil imaginar que os marqueteiros de Dilma, com todo o instrumental de que dispõem, incluindo pesquisas de opinião pagas com o dinheiro do contribuinte, errariam o tom. Deve ser por isso que decidiram misturar o requentado discurso do “quem não está conosco está contra o País” à promessa do Brasil Xangri-La.

Pode até dar certo de novo. Mas é muita cara de pau.

 

Mary Zaidan é jornalista. Trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas. Atualmente trabalha na agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa'. Escreve aqui aos domingos. Twitter:@maryzaidan, e-mail: maryzaidan@me.com